Por Vitória Dell’Aringa Rocha
Em 2024, um total de 1859 brasileiros foram deportados dos Estados Unidos, cifra esta que sobe para 7100 indivíduos se considerados os últimos quatro anos. O tema ganha relevância pela retirada de migrantes indocumentados ser uma das questões centrais da agenda de Donald Trump em seu segundo mandato – e as recentes devoluções ao Brasil trouxeram o tema para a agenda política brasileira.
Desde o retorno de Trump à Casa Branca, em 20 de janeiro deste ano, o Brasil já recebeu 199 repatriados. Segundo o Serviço de Imigração e Controle Aduaneiro estadunidense, outros 39 mil brasileiros estariam aguardando deportação. E este número ainda pode aumentar exponencialmente: em 2022, o Departamento de Segurança Interna (DHS) norte-americano estimou que 230 mil brasileiros estão indocumentados no país, o oitavo maior grupo por nacionalidade, estando vulneráveis às ações de deportação em massa.
Embora o Brasil conte desde 2017 com uma legislação migratória considerada avançada em relação a garantias de direitos, ela ainda carece de uma política que regule sua aplicação. Além disso, também não conta com uma diretriz específica para acolhimento de cidadãos deportados de outros países – elemento que poderia figurar dentro dessa política nacional migratória.
Além de serem obrigados a deixar a maior parte do seu patrimônio para trás, quem é repatriado enfrenta situações traumáticas e de negação, conforme destacado pela professora Sueli Siqueira, da Universidade Vale do Rio Doce, em entrevista à Folha de S.Paulo. Ela salienta que muitos retornam confusos e sem “dimensão econômica”, gastando boa parte de suas reservas sem um objetivo definido, chegando a perder 70% do que trazem ao Brasil. Tal situação os torna vulneráveis a coiotes e a traficantes de pessoas, uma vez que, diante da referida realidade econômica, sentem necessidade de retornar aos EUA.
Ações pontuais
No dia 28 de janeiro, a Ministra dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo, anunciou a criação de um posto de atendimento humanizado no aeroporto de Confins (MG), seguindo os moldes da estrutura que já existe no Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP).
A criação desse tipo de estrutura no Estado de Minas Gerais se explica pelo fato da região ser considerada de alta emigração. Algumas das principais cidades mineiras são apelidadas de “exportadoras de migrantes”, como Governador Valadares, no leste do Estado.
No início de fevereiro, a deputada federal Talíria Petrone (PSOL-RJ) protocolou um projeto de lei (PL 194/2025) que estabelece um auxílio emergencial para brasileiros que forem deportados ou expulsos de outros países. O auxílio proposto seria no valor de um salário mínimo (R$ 1518) e com duração de doze meses. Além disso, o beneficiário deverá seguir alguns critérios: ter sido repatriado a partir de 20 de janeiro de 2025, não ter cometido crimes reconhecidos pela lei brasileira e não ter renda garantida. Apenas uma pessoa por núcleo familiar poderá receber o auxílio, recomendando-se que seja uma mulher.
No momento, o PL ainda aguarda despacho do presidente da Câmara para continuar a tramitação. A partir desse aval será definido o caminho pelo qual a proposta deve passar dentro da Casa, que costuma ser longo – além disso, depois de aprovado pelos deputados, ainda deve ser apreciado pelo Senado.
Ainda no âmbito legislativo, integrantes da Comissão Mista sobre Migrações Internacionais e Refugiados do Congresso (CMMIR) informaram que vão acionar a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil para tratar da deportação de migrantes sob Trump. No entanto, o colegiado ainda não definiu formalmente sua agenda para este ano.
Por fim, há ainda no Congresso uma Frente Parlamentar em Apoio a Migrantes Transnacionais e Refugiados, composta basicamente por parlamentares de oposição ao governo federal, que articula o envio de documentos ao governo Donald Trump para reverter o corte de recursos norte-americanos na Operação Acolhida.
Iniciativas fora do Brasil
O Brasil não é o único país latino-americano a receber repatriados dos Estados Unidos. Diante da falta de políticas específicas, algumas iniciativas na região podem servir de inspiração.
No México, a presidente Claudia Sheinbaum lançou o programa de benefícios sociais “México te Abraza”, que auxiliará financeiramente repatriados para que consigam chegar às suas cidades de origem e para tirar documentos. Além disso, empresários dos setores de serviços e manufatura já colocaram 35 mil postos de trabalho à disposição dessas pessoas. O programa é similar ao projeto “Hermano, vuelve a casa”, do governo de Honduras, que também oferece um bônus financeiro, alimentação e a inserção em um programa de emprego.
Já na Guatemala, o governo anunciou um plano de atendimento psicológico, que também oferecerá direcionamento trabalhista e apoio para a realização de entrevistas de emprego.
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