DIREITO À COMUNICAÇÃO
             NO BRASIL
        •Base constitucional e legal
        •Implementação
        •O papel dos diferentes atores
        •Tendências atuais e futuras


         Intervozes - Coletivo Brasil
         de Comunicação Social


         Projeto de Governança Global
         Campanha CRIS - Communication Rights
         in the Information Society

         Apoio:
         Fundação Ford
E-Book Direito à Comunicação no Brasil: Base Constitucional e Legal, Implementação, o Papel dos Diferentes Atores e Tendências Atuais e Futuras
Relatório da Pesquisa
         Direito à Comunicação
                 no Brasil
 Base constitucional e legal, implementação, o papel
  dos diferentes atores e tendências atuais e futuras




                         Terceira Versão
                                  Versão
                         Junho de 2005




      Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social



                 Projeto de Governança Global
Campanha CRIS - Communication Rights in the Information Society



                     Apoio - Fundação Ford

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Índice
Introdução                                                     5
Quadro genérico de referência                                  9

Pilar A: A esfera pública                                     19
A 1 - Liberdade de expressão                                  19
A 2 - Liberdade de imprensa                                   23
A 3 - Acesso a informações públicas e governamentais          28
A 4 - Acesso a informações empresariais                       34
A 5 - Diversidade, pluralidade e acessibilidade               36
A 6 - Participação efetiva da sociedade civil                 59

Pilar B: Uso do conhecimento e domínio público                67
B 1 - Por um regime balanceado do conhecimento                68
B 2 - Implementação deste regime                              76
B 3 - Conhecimento financiado por recursos públicos para o
       domínio público                                        85
B 4 - Participação efetiva da sociedade civil                 87

Pilar C: Liberdades civis na sociedade da
informação                                                    89
C 1 - Privacidade de informação e proteção de dados           89
C 2 - Direito à privacidade na comunicação                    95
C 3 - Ausência de censura eletrônica                          99
C 4 - Liberdade de associação                                101
C 5 - Participação efetiva da sociedade civil                102

Pilar D: Acesso eqüitativo a TICs                            105
D 1 - Acesso de todo o povo e suas comunidades a TICs        105
D 2 - Disponibilidade de conteúdo para minorias              122
D 3 - Disseminação de competências e habilidades             124
D 4 - Participação efetiva da sociedade civil                126

Referências                                                  129
Créditos                                                     135




                                                              3
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Introdução


    Este é o relatório de pesquisa produzido como       rentemente dos anos 70, hoje busca-se tratar de
resultado do Projeto de Governança Global da            uma série de direitos que devem ser considerados
Campanha CRIS ( Communication Rights in the             em conjunto, entendidos a partir de sua
Information Society). Esse estudo pretende revelar      complementariedade e indivisibilidade. Na práti-
a situação atual no Brasil dos diversos elementos       ca, o que o quadro de referência tenta responder
que formam, em conjunto, o direito à comunica-          é de que direitos estamos falando, quais são seus
ção. São abordados temas como liberdade de              atributos e que indicadores podem medir a sua
expressão, pluralidade dos meios, propriedade           efetivação.
intelectual, respeito à diversidade cultural,              Tendo esse quadro de referência ( generic
privacidade nas comunicações, acesso às                 framework) como baliza, partimos para uma apli-
Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs)          cação dos indicadores nele definidos à realidade
e participação da sociedade civil nas decisões          brasileira. A orientação geral da pesquisa nos cin-
sobre essas questões.                                   co países em que ela está sendo feita (Brasil, Co-
    O objetivo de sua realização é, antes de tudo,      lômbia, Filipinas, Quênia e Itália – esta última
materializar uma referência tão importante quan-        avaliando a União Européia) foi trabalhar sempre
to ampla: o direito à comunicação. Entender suas        com quatro parâmetros: a base legal, a
nuances, possibilidades, variações e interferênci-      implantação dessa legislação, o papel dos atores
as. Além disso, esse estudo experimenta um              envolvidos e as tendências para o futuro.
Quadro de Referência Genérico, concebido em con-           Essa abordagem evidencia que o que se bus-
junto por pesquisadores de diversos países (Bra-        cou nessa pesquisa foram essencialmente as refe-
sil, Colômbia, Quênia, Filipinas, Itália, Canadá, Ir-   rências de políticas públicas para os temas, mais
landa, Estados Unidos, Reino Unido, entre outros)       do que tentar entender tudo o que se passa nas
a fim de que possa ser usado em estudos compa-          esferas privada e não governamental. Tanto em-
rados, tanto entre países, como ao longo do tem-        presas quanto entidades da sociedade civil têm
po.                                                     papel fundamental no atual quadro político, mas
    Esse quadro de referência pretende identificar,     partiu-se da premissa de que processos
com olhos de um novo século, qual a amplitude e         regulatórios dependem de políticas públicas e,
quais os limites do campo da comunicação. Desde         portanto, esse deveria ser o objeto da pesquisa.
Jean D’Arcy, no final dos anos 60, e da Nova Ordem         A metodologia utilizada partiu do acesso a fon-
Mundial para Informação e Comunicação (NOMIC),          tes primárias e secundárias, tais como legislação,
nos anos 70, a questão do direito à comunicação         documentos de governo, relatórios de instituições,
é uma referência fundamental nos estudos da área.       entrevistas com especialistas, levantamentos de
Contudo, com a convergência tecnológica e a             agências do governo etc. Mais do que precisão
efetivação da globalização econômica, é preciso         científica, buscamos aqui um levantamento fiel da
observar quais são suas características, como ele       realidade das políticas públicas e de seu estágio
muda e o que o define.                                  de implementação. Sem dúvida, há dificuldades
    Em inglês, a opção foi substituir o termo right     inerentes ao processo. A checagem das
to communicate por communication rights,                informações, por exemplo, é trabalhosa e por vezes
ampliando o conceito. Embora em português haja          impossível de ser realizada com absoluto rigor.
um debate sobre qual a melhor expressão a se               Sempre que possível, buscamos índices e indi-
utilizar, continua-se usando o mesmo termo, di-         cadores de fontes sabidamente confiáveis, que nos
reito à comunicação, que se tomado literalmente         pudessem servir de referência para análises mais
está “localizado” entre as duas formulações ingle-      aprofundadas. Inerente a um trabalho desse tipo
sas. Independentemente da solução adotada, mais         é a sensação permanente de que poderíamos ter
do que uma questão semântica, está expressa nes-        ido além. A cada mês, surgiam novas informações,
sa mudança uma alteração na abordagem. Dife-            novos dados, mudança nas políticas públicas.



                                                                                                        5
Temas como inclusão digital, acesso a informações     indígenas têm garantido seu conhecimento
públicas e política do audiovisual, por exemplo,      tradicional. A escassez de dados desse tipo também
estão em constante modificação, o que exige a         tornou frágil a abordagem desse ponto. Aqui é
atenção permanente dos interessados no debate.        importante ressaltar que a versão do quadro de
   Assim, mais do que um relato definitivo, este      referência utilizada na pesquisa foi a preliminar, e
trabalho é um retrato instantâneo do quadro do        que versões mais recentes já consideram essa
direito à comunicação no Brasil. Ao mesmo tem-        questão com mais profundidade. O Intervozes
po que pode servir como referência importante,        procurará disponibilizar em sua página na Internet
uma de suas características é ter que ser             as versões mais recentes do quadro de referência.
constantemente atualizado. Buscamos encarar isso         Por último, foi apontada a necessidade de ca-
como um fato natural do processo, e não como          pítulos analíticos e conceituais, que pudessem
limitante.                                            explicitar os termos com os quais trabalhamos, a
                                                      visão de sociedade da informação adotada e os
VALIDAÇÃO                                             referenciais teóricos. Aproveitamos essa observa-
   Essa versão final da pesquisa já expressa mais     ção para esclarecer o caráter da pesquisa. Enten-
do que o trabalho realizado pelo Intervozes. Após     demos que o quadro de referência busca
realizada uma primeira versão, ela passou por um      estabelecer indicadores a partir de definições
processo de validação, incluindo uma oficina em       objetivas das questões envolvidas e que em poucos
que especialistas das diversas áreas puderam          casos suscita dúvidas quanto a qual parâmetro
opinar sobre o texto, sugerir fontes e avaliar a      ideal está implícito. Assim, os próprios indicadores,
abordagem em cada pilar. A essas pessoas,             por exemplo, respondem à definição dos conceitos
agradecemos muitíssimo a contribuição e               presentes nos atributos. De qualquer forma, por
registramos a importância desse olhar externo         ser realizada concomitantemente por cinco equipes
como balizador de qualidade da pesquisa.              em diferentes partes do mundo, a pesquisa
   Algumas observações desse processo de vali-        responde a conceitos pactuados internacio-
dação merecem destaque, especialmente aquelas         nalmente, que são explicitados no relatório
que tivemos dificuldade de traduzir na pesquisa.      internacional do Projeto de Governança Global.
A primeira delas é o desafio de expressar, em um      Portanto, não pode ser vista isolada de seu
texto como esse, as realidades dos diversos Brasis.   contexto e deve ser entendida como parte de um
Grande parcela dos debates feitos ainda parte de      projeto internacional mais amplo.
uma visão urbana, especialmente dos grandes
centros. No entanto, buscamos observar sempre         OBSERVAÇÕES SOBRE O PROCESSO
                                                      OBSERV                   PROCESSO
que possível como as políticas públicas se                É pertinente observarmos aqui algumas opções
materializam nas diferentes regiões do país, e        feitas no processo de pesquisa.
pudemos notar uma recente preocupação em
equalizar oportunidades. Contudo, essa preocu-           Politização
pação é ainda marginal, o que fica evidente ao se         Percebemos, de imediato, a necessidade de
analisar, por exemplo, uma lei de rádios comuni-      definir o quanto se deveria ou não “politizar” as
tárias que limita a 1 km de raio o alcance das        respostas a esses indicadores. Em quase todos eles,
emissoras. Se isso já se conforma como limitação      era possível escolher um tom mais neutro ou um
no meio urbano, o que se dirá no meio rural? O        tom mais crítico. Como parte dos indicadores não
que é 1 km na região amazônica? Qual realidade        definia com precisão a resposta buscada (o
o legislador teve como referência ao criar a lei?     parâmetro “ideal”), em alguns casos fizemos a
Ficou claro que esse é um debate a ser                opção a partir de convicções que expressamos no
aprofundado.                                          próprio relatório de pesquisa. Na oficina de
   Outra questão importante que surgiu na ofici-      validação, a indicação dos participantes foi a de
na de validação foi a discussão de diversidade cul-   que deveríamos optar por um tom crítico o
tural, bem como os desafios de abordar as questões    suficiente para evidenciar o quadro real de cada
étnico-raciais e de gênero. O próprio quadro de       uma das questões tratadas. Concordamos que não
referência trata desses pontos em alguns quesitos,    valeria optar por uma suposta neutralidade se isso
mas não confere a eles um tratamento especial.        significasse uma resposta que não deixasse claro
No Brasil, é fundamental conseguirmos analisar,       o real estado daquela questão no Brasil. Acabamos
por exemplo, a presença do negro e da negra na        assumindo que, embora o relatório tenha o papel
realização da comunicação, como as mulheres são       de ser o mais objetivo possível, ele parte de uma
atingidas pela exclusão digital ou como os            orientação política de defesa do direito à comuni-


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cação. Portanto, todas as violações a esse direito         R epetição
deveriam ser tratadas como tal.                            Como há assuntos que se cruzam entre os in-
                                                       dicadores, muitas vezes as respostas tendiam a se
   Amplitude e natureza                                repetir. A escolha sobre como lidar com essa situ-
   A amplitude que cada indicador alcança é muito      ação dependia do tipo de leitura que se espera ter
diferente. Há alguns que pediam respostas curtas,      do relatório. Se a idéia é que a abordagem seja de
específicas sobre algum aspecto do direito à           leituras fragmentadas por indicadores, fazia total
comunicação. Há outros mais genéricos, em que          sentido repetir as informações em cada indicador.
eram necessárias respostas longas e que cobriam        Se a proposta é que se dê uma leitura contínua do
uma grande gama de assuntos, como no caso do           texto todo, então não fazia sentido a repetição de
A5. A natureza dos indicadores também era              todas as informações. No nosso caso, fizemos a
diferente. Alguns se referiam à existência ou não      opção de manter a repetição, por preferir pecar
de legislação naquele sentido, outros, à sua           pelo excesso do que pela falta. No entanto, ao in-
implementação ou a dados quantitativos. Em             vés de repetir todas as informações de maneira
certos momentos era impossível tratá-los               igual, escolhemos abordagens diferentes do mes-
separadamente, por serem todos baseados na             mo tema para cada indicador. Um exemplo é o
mesma base legal e terem as mesmas característi-       Comitê Gestor da Internet no Brasil, citado em três
cas quanto à implementação. Isso fez com que em        dos quatro pilares. Em um dos pilares, o destaque
alguns momentos, como no Pilar B, tenhamos             são aspectos como a democracia na escolha de
optado por fazer uma abordagem por atributo,           seus membros; em outros pilares, o principal é a
unindo indicadores.                                    posição adotada pelo Comitê em relação a
                                                       determinada questão.
   Aprofundamento
   Esse quesito nos requereu uma opção desde o             Peso
primeiro momento. Havia a possibilidade de ado-            Ainda que todas as questões expressas no qua-
tarmos uma visão mais superficial da pesquisa,         dro de referência sejam extremamente importan-
simplificando as respostas e obtendo um resulta-       tes, elas podem (ou até devem) ter pesos diferen-
do mais enxuto. No entanto, consideramos que           tes. No momento em que se reúnem em um só
dessa forma ficaria pouco clara a realidade de cada    atributo (A5) quase todas as grandes questões de
um dos atributos e indicadores tratados. Preferi-      mídia, por exemplo, fica claro o peso maior de
mos, então, a opção de uma abordagem mais pro-         alguns atributos e indicadores em relação a ou-
funda na grande maioria dos temas tratados. Houve      tros.
alguns sobre os quais foi muito difícil obter infor-
mações, em virtude da ausência de fontes e até         POR FIM
mesmo da não definição de políticas públicas. Em           Aproveitamos para agradecer a revisão técnica
todos os outros casos, foi possível uma aborda-        feita pelo pesquisador Gustavo Gindre, que mesmo
gem completa.                                          contando com pouco tempo para a tarefa
                                                       contribuiu com obser vações absolutamente
    Rigor da divisão                                   relevantes. Ressaltamos, no entanto, que nenhuma
    A proposta era tratarmos, para cada indicador,     das falhas, erros ou ausências nessa versão final
a base legal, a implentação, os atores envolvidos      deve ser creditada a ele ou aos colaboradores,
e as tendências futuras. No entanto, em alguns         sendo de única responsabilidade da equipe
dos casos, essa divisão não tinha como ser preci-      realizadora.
sa. Por vezes, por exemplo, a base legal e os ato-         Essa pesquisa não se encerra com sua publica-
res envolvidos eram os mesmos para todos os            ção; ao contrário, o objetivo é que ela engendre
indicadores. Foi difícil, portanto, escolher um        ações práticas a partir de seus resultados. Espera-
padrão único, e acabamos preferindo definir um         mos que esse documento possa servir como refe-
padrão específico para cada pilar.                     rência, ajudando na tarefa de compreender a situ-
                                                       ação do direito à comunicação no Brasil e na ár-
                                                       dua luta pela sua efetivação plena para toda a
                                                       população.




                                                                                                       7
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Quadro genérico de referência
    do direito à comunicação:
                                  Atributos e indicadores

              Pilar A: A criação de espaços para ambientes democráticos:
                                     a esfera pública
       Atributos do Direito à                      Indicadores de um ambiente propício
            Comunicação                                para o direito à comunicação

A1: Liberdade de expressão, inclusi-    A1.1 Provisão constitucional e leis que garantam a liberda-
ve uma atmosfera de abertura e o        de de expressão.
direito a criticar aqueles no poder.    A1.2 A ausência de ações governamentais ou de empresas
                                        que restrinjam a liberdade de expressão e a garantia ativa do
                                        cumprimento das leis de liberdade de expressão.
                                        A1.3 Medidas ativas para a promoção de uma atmosfera de
                                        abertura e discussão ampla.

A2: Liberdade de imprensa e mídia,      A2.1 Provisão constitucional e/ou leis que garantam a
inclusive para jornalistas realizarem   liberdade da imprensa e de todos os tipos de mídia, além de
seu trabalho e responsabilidades        independência editorial, com o mínimo de restrições, inclu-
relacionadas.                           indo a proibição de monopólios em qualquer mídia.
                                        A2.2 Medidas para prevenir a violação de direitos humanos
                                        dos jornalistas na execução de seu trabalho, especialmente
                                        em áreas de conflito.
                                        A2.3 Medidas para apoiar a liberdade editorial de jornalis-
                                        tas, inclusive segurança no emprego, sindicalização, direitos
                                        morais de autor e resistência à coerção moral e outras
                                        formas de coerção por parte de empregadores ou outrem.
                                        A2.4 Instrumentos independentes e medidas que assegu-
                                        rem o direito de resposta, que protejam o público contra
                                        processos difamatórios, protejam a privacidade e evitem o
                                        incitamento à violência, e outras provisões contidas em
                                        acordos internacionais.
                                        A2.5 Medidas para prevenir censura por parte de entidades
                                        comerciais de material relevante para a esfera pública,
                                        inclusive de conteúdo eletrônico e para a internet – por
                                        parte, por exemplo, de provedores de acesso à internet,
                                        mecanismos de busca e provedores de banda (infra-estrutura
                                        de internet, empresa de telefonia, internet a cabo ou via
                                        satélite).

A3: Acesso e pronta disponibilida-      A3.1 Legislação sobre liberdade da informação, com a
de de informações públicas e gover-     mínima retenção por parte de órgãos públicos e governa-
namentais, de modo abrangente,          mentais, e com acesso máximo por parte do mais amplo
útil e rápido, especialmente no que     público.
concerne ao desenvolvimento e           A3.2: A implementação de tais leis que tornem tal informa-
implementação de políticas e ques-      ção disponível de maneira acessível economicamente e em
tões de interesse público, como         tempo correto para todos.
saúde, segurança etc.


                                                                                                   9
A3.3 Esforços ativos por parte dos setores público e
                                      estatal para expandir a abertura e a transparência, inclusive
                                      através de meios como:
                                      -        estruturas ou escritórios para reunir e divulgar
                                      informações de forma apropriada;
                                      -        a publicação de objetivos e planejamentos de
                                      políticas e serviços públicos;
                                      -        proteção para funcionários públicos que revelem
                                      informação de e em prol do interesse público;
                                      -        a transmissão das deliberações dos representantes
                                      eleitos e órgãos públicos;
                                      -        transparência do processo decisório em questões de
                                      interesse público, como decisões de gabinete.
                                      A3.4 Abertura e transparência governamental em negocia-
                                      ções e instituições internacionais relacionadas à mídia e à
                                      esfera pública.

A4: Acesso a informações empre-       A4.1: Legislação/regulamentação sobre quebra de sigilo
sariais, de modo abrangente e         corporativo, além das informações financeiras básicas, de
rápido, quando relevantes para o      modo a incluir informação disponível das corporações que
interesse público.                    terão influência sobre políticas públicas e o interesse públi-
                                      co.

A5:     Diversidade, pluralidade e    A5.1 Legislação e medidas efetivas para impedir a concen-
acesso a mídias e conteúdo, assegu-   tração da propriedade na mídia ou controles por parte de
rando um amplo espectro de visões     qualquer interesse setorial, indivíduo ou entidade, incluin-
por parte de todos os setores da      do:
sociedade, inclusive minorias e       -        concentração da propriedade de um tipo de mídia
grupos marginalizados, e a justa      em particular;
representação de todos os grupos,     -        propriedade cruzada entre mídias;
inclusive mulheres, minorias e        -        propriedade cruzada da produção, disseminação de
grupos étnicos.                       conteúdo e componentes de infra-estrutura dos meios de
                                      comunicação;
                                      -        propriedade excessiva por parte de estrangeiros e
                                      empresas não-ligadas ao setor de mídia.
                                      A5.2 Um quadro legal que ampare a emergência de uma
                                      pluralidade de tipos de canais e empresas em nível nacional
                                      e, quando apropriado, em níveis regionais (internacional) e
                                      local: canais e empresas públicas, comerciais e comunitárias/
                                      independentes, inclusive a alocação de modo transparente e
                                      igualitário do espectro de radiofreqüências e outros bens
                                      públicos.
                                      A5.3 Medidas efetivas para assegurar que canais e empresas
                                      públicas tenham disponíveis financiamento e recursos
                                      adequados, especialmente em relação ao noticiário e ao
                                      trato de assuntos atuais, de forma completamente indepen-
                                      dente dos governos e não sujeita a interferências arbitrárias,
                                      e livre de regulamentações desnecessariamente pesadas.
                                      A5.4 Medidas efetivas que assegurem que empresas e
                                      canais comunitários e sem fins lucrativos tenham recursos
                                      adequados, inclusive bens públicos como o espectro de
                                      freqüências; estejam livres de interferências arbitrárias;
                                      sejam transparentes, democráticos e participativos; e apóiem
                                      e tenham participação de comunidades excluídas e
                                      marginalizadas.


10
A5.5 Obrigações regulatórias aplicáveis sobre empresas e
                                        canais comerciais, inclusive difusores, quando apropriado,
                                        para assegurar o cumprimento dos requisitos da prestação
                                        de serviço público.
                                        A5.6 Medidas efetivas para assegurar acessibilidade, até
                                        mesmo econômica, às mídias relevantes (inclusive jornais e
                                        televisão) e conteúdos, especialmente por parte de grupos
                                        culturais e lingüísticos marginalizados. Por exemplo, regi-
                                        mes de impostos diferenciados, difusão livre em TV aberta,
                                        obrigar os operadores de rede a aceitar os canais (must-
                                        carry) etc.
                                        A5.7 Medidas efetivas, de acordo com a necessidade, para
                                        enfrentar a representação inadequada ou torpe de mulheres,
                                        grupos étnicos, grupos mais pobres e marginalizados por
                                        parte da mídia.
                                        A5.8 Apoio a medidas nas instituições e fóruns multilaterais
                                        que assegurem a proteção e o apoio a mídias nacionais,
                                        inclusive o direito a discriminar em favor de empresas e
                                        canais locais, e a regulação de conteúdo estrangeiro.
                                        A5.9 Medidas efetivas para impedir que a propaganda
                                        exerça uma influência negativa sobre a esfera pública, por
                                        exemplo com a identificação ostensiva, limitação do volume
                                        de propaganda e de conteúdo político ou religioso. Os
                                        gastos públicos em propaganda também podem ser usados
                                        para apoiar a esfera pública.


A6: Participação efetiva por parte      A6.1 Consultas públicas abertas e extensivas e
de todos os elementos da sociedade      participação no desenvolvimento de políticas para a mídia,
civil na preparação, implementação      inclusive em instituições e fóruns inter-governamentais.
e avaliação de estruturas e políticas   A6.2 Meios efetivos e dinâmicos que façam com que preo-
de governança da mídia.                 cupações e reclamações públicas sejam ouvidas e atendidas,
                                        de acordo com as políticas de mídia.
                                        A6.3 Mecanismos permanentes para participação indepen-
                                        dente e direta do público na revisão e implementação de
                                        políticas em curso, de modo descentralizado quando apro-
                                        priado – por exemplo, através de conselhos públicos e
                                        conferências públicas periódicas, que contem com ampla
                                        participação da sociedade civil.
                                        A6.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança,
                                        desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos
                                        ou não pelo governo.




                                                                                                 11
Pilar B: Retomando o uso do conhecimento e do domínio público
       Atributos do direito à                    Indicadores de um ambiente propício
            comunicação                              para o direito à comunicação

B1:     Um regime equilibrado de     B1.1 Uma estratégia nacional e uma orientação política com
partilha do conhecimento que         relação a criação, disseminação e uso do conhecimento
assegure que o conhecimento          (especialmente copyright, incluindo materiais e softwares
gerado ou disseminado por empre-     educacionais publicados) cujos objetivos explícitos sejam
sas, canais e setores de             enriquecer o domínio público, satisfazer as várias necessida-
comunicação esteja disponível para   des de conhecimento e encorajar a criatividade de todos os
todos de modo igualitário e          setores da sociedade. Isto pode ser expresso em termos de
acessível financeiramente, e que     posições e políticas sobre Direitos de Propriedade Intelectual
encoraje a criatividade da forma     (IPR) em uma ‘sociedade da informação’, em mídia e outras
mais ampla possível por toda a       áreas, tanto em organizações nacionais como internacionais,
sociedade.                           acordos e tratados.

B2:   Medidas práticas para          B.2.1 Políticas públicas e ações para encorajar e possibilitar
implementar este regime.             a mais ampla e difusa geração e comunicação do conheci-
                                     mento, que podem incluir:
                                     -        modos de celebrar bons trabalhos por parte de
                                     profissionais e do público;
                                     -        incentivos públicos para pesquisa e criação local/
                                     nacional do conhecimento em áreas de reconhecida necessi-
                                     dade;
                                     -        instrumentos públicos para facilitar o acesso ao
                                     conhecimento, inclusive uma política de disseminação de
                                     conteúdo de interesse público;
                                     -        apoio público para software livre e de código aberto
                                     – por exemplo através de uma política pública de provisão –
                                     e para o desenvolvimento de especialistas nacionais;
                                     -        currículos escolares que encorajem métodos críticos
                                     e questionadores de aprendizado;
                                     -        apoio prático ao desenvolvimento de abordagens
                                     voltadas ao desenvolvimento e amistosas à comunidade
                                     para a partilha do conhecimento, como copyleft, General
                                     Public License (GPL) etc.

                                     B2.2 Uma interpretação ativa e a implementação, por
                                     parte de órgãos públicos e estatais, das leis e acordos
                                     nacionais e internacionais sobre copyright e patentes
                                     relevantes, favorecendo uma partilha equilibrada do conheci-
                                     mento, ou seja:
                                     -       apoio para o ‘uso justo’ de material sobre copyright,
                                     freqüentemente barrado por termos de licenciamento não
                                     negociáveis para material digital, como publicações
                                     especializadas;
                                     -       reconhecimento e proteção dos ‘direitos morais’ dos
                                     autores;
                                     -       restrições sobre o gerenciamento de direitos digitais,
                                     encriptação e mecanismos anti-burladores que inibam o uso
                                     justo de informação eletrônica;
                                     -       esforços para formatar a propriedade intelectual de
                                     acordo com condições nacionais, o que freqüentemente irá
                                     contra tendências nos acordos internacionais;


12
-       esforços para formatar a propriedade intelectual em
                                      produtos digitais que promovam novos modelos de negóci-
                                      os, baseados na partilha do conhecimento, e que coíbam
                                      medidas (como o patenteamento de software) que mante-
                                      nham monopólios ou oligopólios e inibam a inovação;
                                      -       esforços para assegurar que expressões de folclore
                                      não sejam registradas e exploradas por terceiras partes
                                      (incluindo o problema do ‘autor identificável’), ou seja, pela
                                      incorporação da proteção folclórica na legislação nacional
                                      (casos de Bolívia, 1968, e Quênia, 1975).

B3: Todos os trabalhos financia-      B3.1 Políticas públicas e medidas práticas para assegurar
dos e produzidos de forma pública     que todo o conhecimento apoiado por fundos públicos se
se tornam parte do domínio públi-     torne imediatamente parte do domínio público.
co.                                   B3.2 (Ver A3.3) O volume de informação mantida por
                                      órgãos públicos deve ser colocado sob domínio público.
                                      B3.3 Canais e empresas públicas devem colocar seus
                                      arquivos sob domínio público.

B4: Participação efetiva da socie-    B4.1 Um processo participativo de desenvolvimento de
dade civil no processo de             políticas, que inclua participação significativa da sociedade
governança, inclusive em sua formu-   civil e os recursos necessários para que todos os parceiros
lação, preparação, regulação,         dêem contribuições efetivas.
implementação e revisão, além de      B4.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações
apoio para participação em nível      públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas
internacional.                        e atendidas.
                                      B4.3 Mecanismos permanentes para participação pública
                                      na revisão e implementação de políticas em curso, de modo
                                      descentralizado quando apropriado, inclusive em relação
                                      aos acordos internacionais.
                                      B4.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança,
                                      desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos
                                      ou não pelo governo.




                                                                                                 13
Pilar C: Liberdades civis e direitos políticos na Sociedade da Informação
       Atributos do direito à                       Indicadores de um ambiente propício
            comunicação                                 para o direito à comunicação

C1:     Privacidade de informação e     C1.1 Leis que assegurem que dados pessoais são mantidos
proteção de dados, atendendo ao         pelo mínimo período necessário, bem como utilizados
direito de saber, acessar, corrigir e   apenas para os propósitos autorizados expressamente pela
controlar o uso de toda informação      pessoa a qual se referem. Isto inclui dados pessoais
pessoal mantida em forma digital        fornecidos a serviços (saúde, finanças, compras etc.),
por outrem.                             atividades de segurança pública ou privada, material de
                                        vigilância em vídeo, informações inclusas em fichas de
                                        identificação (em eventos ou pedidos de emprego) e dados
                                        de funcionários mantidos por empregadores.
                                        C1.2 Garantia do cumprimento de tais leis de modo acessí-
                                        vel financeiramente, transparente e pró-ativo, e com o
                                        direito de revisão quando direitos tiverem sido violados.
                                        C1.3 Existência de uma cultura ampla e difundida de auto-
                                        regulação e códigos de conduta em termos de privacidade e
                                        proteção de dados, entre atores da sociedade civil, do
                                        governo e do setor privado.

C2: O direito à privacidade na          C2.1 Leis e regulações que assegurem o direito à privacida-
comunicação é um direito humano e       de na comunicação, seja através da internet, telefonia ou
é essencial para o desenvolvimento      outros meios eletrônicos, com exceções apenas em circuns-
humano auto-determinado, em             tâncias extremas e claramente definidas, e que valham em
atividades tanto cívicas, políticas,    ambientes privados, públicos e comerciais.
sociais e econômicas como               C2.2 Garantia do cumprimento de tais leis de modo trans-
culturais.                              parente, não-partidário e pró-ativo, inclusive contra
                                        violações praticadas pelos governos, e com o direito de
                                        revisão quando direitos tiverem sido violados.
                                        C2.3 Leis para controlar SPAM (mensagens comerciais de
                                        correio eletrônico não solicitadas) e impedi-lo de inibir a
                                        capacidade geral de interação na internet.

C3:     Ausência de censura             C3.1 Leis de proteção contra censura na internet ou
eletrônica. O direito de transmitir     outros meios de publicação eletrônica, seja através de filtros,
informação eletrônica sem censura       sites prescritos, sanções contra provedores de acesso ou
ou controle por parte de agentes do     conteúdo e a responsabilização dos provedores por
Estado, judiciais, comerciais,          conteúdo hospedado.
empregadores ou outrem.                 C3.2 Leis ou regulações, inclusive auto-regulação por
                                        parte da indústria, que inclua obrigações para que operado-
                                        res comerciais de publicações e difusão eletrônicas (provedo-
                                        res de acesso, mecanismos de busca, provedores de banda
                                        [infra-estrutura de internet, empresa de telefonia, internet a
                                        cabo ou via satélite]) ajam como operadores de rede
                                        (common carriers) para material judicialmente legal.
                                        C3.3 Garantia do cumprimento de tais leis de modo acessí-
                                        vel financeiramente, transparente e pró-ativo, e com o
                                        direito de revisão quando direitos tiverem sido violados.




14
C4.     Liberdade de associação no    C4.1 Leis que salvaguardem contra vigilância em vídeo
meio eletrônico, para participar de   excessiva e seu possível efeito intimidante sobre a liberdade
protestos públicos ou debates         de associação.
online.

C5. Participação efetiva da socie-    C5.1 Um processo participativo de desenvolvimento de
dade civil no processo de             políticas, que inclua participação significativa da sociedade
governança, incluindo sua formula-    civil e os recursos necessários para que todos os parceiros
ção, projeto, regulação,              dêem contribuições efetivas.
implementação e avaliação.            C5.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações
                                      públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas
                                      e atendidas.
                                      C5.3 Mecanismos permanentes para participação pública
                                      na revisão e implementação de políticas em curso, de modo
                                      descentralizado quando apropriado, inclusive em relação aos
                                      acordos internacionais.
                                      C5.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança,
                                      desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos
                                      ou não pelo governo. (ver C1.3 acima)




                                                                                                15
Pilar D: Assegurando acesso eqüitativo e a preços razoáveis a TICs
       Atributos do direito à                       Indicadores de um ambiente propício
            comunicação                                 para o direito à comunicação

D1:      Acesso a TICs, inclusive à     D1.1 Um quadro legal e regulatório que favoreça fortemen-
telefonia, à internet e a outros        te a extensão de modo universal dos serviços e do acesso a
serviços, de modo econômico,            TICs como a prioridade para este setor.
igualitário e apropriado para todo o    D1.2 Medidas políticas, convencionais e inovadoras, que
povo e suas comunidades.                vão além das abordagens mercadológicas e corporativas,
                                        para incluir, por exemplo, redes comunitárias, subsídios
                                        cruzados efetivos por parte de usuários mais ricos com fins
                                        de universalização do serviço, e assim por diante. Serão
                                        então considerados:
                                        -       infra-estrutura fixa e telefonia;
                                        -       telefonia móvel, inclusive em termos de custos;
                                        -       telecentros comunitários;
                                        -       licenciamento de provedores de acesso, portais de
                                        internet e medidas de apoio à internet;
                                        -       links de satélite Vsat e de dados.
                                        D1.3 Apoio ao desenvolvimento de indústrias locais ao
                                        longo dos setores relacionados a TICs, tais como incentivos
                                        específicos, períodos de transição para a criação de compa-
                                        nhias locais etc.
                                        D1.4 Estatísticas e indicadores que demonstrem que o
                                        efeito cumulativo das políticas implementadas está realmen-
                                        te reduzindo a exclusão em termos de acesso, disponibilida-
                                        de, acessibilidade econômica, acessibilidade e uso, e na
                                        promoção do bem-estar público.

D2:    Disponibilidade de               D2.1 Ações de apoio para produção de conteúdo por e para
conteúdo relevante para todas as        todas as comunidades lingüísticas.
comunidades lingüísticas e grupos       D2.2 Apoio ao desenvolvimento de softwares lingüísticos
marginalizados.                         técnicos e interfaces de hardware.

D3:     Competências e habilidades      D3.1 Apoio para desenvolvimentos de competências e
que permitam ao povo e a suas           habilidades, como treinamentos, programas de intercâmbio,
comunidades fazerem uso das TICs        módulos curriculares formais etc., amplamente disponíveis
para atingir seus objetivos individu-   em estabelecimentos de ensino comuns, como escolas,
ais e coletivos.                        bibliotecas, centros comunitários etc.

D4: Participação efetiva da socie-      D4.1 Um processo participativo e multilateral de
dade civil no processo de               desenvolvimento de estratégias, que inclua participação
governança, incluindo sua formula-      significativa da sociedade civil e os recursos necessários para
ção, projeto, regulação,                que todos os participantes dêem contribuições efetivas. Isto
implementação e avaliação.              inclui infra-estrutura (seja fixa, sem-fio ou outros) e serviços
                                        (como telefonia, celulares, transmissão de dados e internet);
                                        e a natureza da compreensão e planejamento estratégicos
                                        por parte de todos.
                                        D4.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações
                                        públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas
                                        e atendidas.




16
D4.3 Mecanismos permanentes para participação pública
na revisão e implementação de políticas em curso, de modo
descentralizado quando apropriado, inclusive em relação aos
acordos internacionais.
D4.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança,
desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos
ou não pelo governo.




                                                         17
18
Pilar A
A criação de espaços para
ambientes democráticos:
a esfera pública
A1 – Liberdade de expressão, inclusive uma atmosfera de
abertura e o direito a criticar aqueles no poder.
A1.1 - Provisão constitucional e leis que garantam a liberdade de expressão.
A1.2 - A ausência de ações governamentais ou de empresas que restrinjam a
liberdade de expressão e a garantia ativa do cumprimento das leis de liberdade
de expressão.
A1.3 - Medidas ativas para a promoção de uma atmosfera de abertura e
discussão ampla.
BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                        Carta Democrática Interamericana e a Declaração
   A base legal que sustenta o princípio da liber-                 de Princípios sobre Liberdade de Expressão.
dade de expressão é bastante ampla e tem refe-                         Também existem leis no Brasil que, em dife-
rências nacionais e internacionais.                                rentes níveis, interferem na liberdade de expres-
   A Constituição Federal Brasileira de 1988, no                   são, mas que funcionam como proteção aos direi-
capítulo DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS                        tos individuais fundamentais: as chamadas leis de
E COLETIVOS, determina no inciso IV do artigo 5º                   calúnia, injúria e difamação. No direito penal
que “é livre a manifestação do pensamento, sendo                   brasileiro, estes dispositivos, também chamados
vedado o anonimato”. No mesmo artigo, o inciso                     de crimes contra a honra, estão presentes ao
IX estabelece que “é livre a expressão da atividade                mesmo tempo no Código Penal e na Lei de
intelectual, artística, científica e de comunicação, in-           Imprensa. Alguns juristas afirmam que bastaria que
dependentemente de censura ou licença”. Em outro                   estivessem no Código Penal para que a sua
capítulo, DA COMUNICAÇÃO SOCIAL, o artigo 220                      aplicação fosse feita sem com isso gerar nenhum
diz que “a manifestação do pensamento, a criação, a                mecanismo restritivo à expressão livre do
expressão e a informação, sob qualquer forma, processo             pensamento.
ou veículo não sofrerão qualquer restrição”. E o seu                   São situações em que a liberdade de expressão
parágrafo 1º afirma que “nenhuma lei conterá dis-                  fica sujeita a outras aplicações legais:
positivo que possa constituir embaraço à plena liber-                  1. Considera-se crime fazer propaganda de
dade de informação jornalística em qualquer veículo                guerra, de processos violentos ou ilegais de alte-
de comunicação social”. O parágrafo 6º, que “a                     ração da ordem social ou política, ou de qualquer
publicação de veículo impresso de comunicação                      forma de preconceito (racial, religioso ou de
independe de licença de autoridade”.                               classe). Disposições legais: a) artigo 22 da Lei 7.170/
   O Brasil também é signatário de alguns trata-                   83 (Lei de Segurança Nacional); b) artigo 20 da Lei
dos internacionais que abordam essa questão. São                   7.716/89 (crimes resultantes do preconceito de raça
eles a Declaração Universal dos Direitos do Ho-                    ou cor); c) artigo 1°, parágrafo 1°, e artigo 14 da
mem, o Tratado Internacional de Chapultepec, a                     Lei de Imprensa1.
Declaração Americana Sobre Direitos Humanos, a                         2. Quando estiver em pauta a segurança naci-

1 Veja mais sobre a atual Lei de Imprensa e sobre o projeto para a nova lei em “Tendências Atuais e Futuras” do atributo A2.



                                                                                                                               19
onal, a preparação interna ou externa do país, e          o direito de resposta. O intuito da lei é permitir
houver determinação prévia sobre o sigilo neces-          que as ofensas veiculadas pela mídia – em qual-
sário, aquele que publicar ou divulgar segredo de         quer de suas modalidades – não fiquem impunes
Estado ou informação sigilosa (de acordo com o            e tenham, de fato, a oportunidade de resposta.
dito no início) deverá ser punido. Isso é previsto        Esse direito está expresso no inciso V do artigo 5º
nos: a) artigo 15 da Lei de Imprensa; b) artigo 21        da Constituição, prevendo que seja proporcional
da Lei 7.170/83 (Lei de Segurança Nacional).              ao agravo, e no capítulo IV (artigos 29 a 36) da Lei
    3. Há normas que afirmam ser crime publicar           5.250/67, que regula a liberdade de manifestação
ou divulgar notícias falsas ou verdades truncadas         do pensamento e de informação. Direito também
(incompletas) que perturbem a ordem pública,              expresso no artigo 14 da Convenção Americana:
incitem desconfiança sobre instituição financeira         “toda pessoa afetada por declarações falsas ou
ou que abalem o sistema financeiro, em nível pes-         agravantes emitidas em seu prejuízo através de meios
soal (pessoa física) ou empresarial (pessoa jurídi-       de difusão legalmente regulamentados e que se dirijam
ca), havendo abalo de crédito, ou em nível                ao público em geral tem direito a realizar pelo mesmo
governamental, quando houver prejuízo ao crédi-           meio de difusão sua retificação ou resposta nas
to das esferas administrativas. As disposições            condições que estabeleça a lei”.
normativas são: a) artigo 16 da Lei de Imprensa;
b) artigo 3° da Lei 7.192/86 (crimes contra o siste-
ma financeiro nacional).                                  IMPLEMENTAÇÃO
                                                          IMPLEMENTAÇÃO
    4. Manipular a liberdade de expressão consis-             Comparado a países em que o Estado exerce
te em fazer, em não fazer ou em impedir que se            forte repressão à liberdade de expressão, o Brasil
faça publicação, transmissão ou distribuição da           mantém desde 1985, com o fim da ditadura mili-
notícia, por quaisquer meios, utilizando como             tar, um regime de tolerância. Não tem havido apli-
causa a procura por dinheiro ou favores (vanta-           cação, por exemplo, dos artigos autoritários da
gens). Sobre esse assunto, regem: a) artigo 18 da         Lei de Imprensa que possibilitam o recolhimento
Lei de Imprensa; b) artigo 158 do Código Penal.           de material impresso, ou mesmo um uso excessi-
    5. É crime utilizar a liberdade de expressão a        vo das leis de injúria, calúnia e difamação que
fim de estimular a infração de leis, fazendo apolo-       configurem censura na prática.
gia de ato criminoso ou do próprio criminoso.                 No entanto, a implementação das leis que ga-
Pode-se analisar: a) artigo 19 da Lei de Imprensa;        rantam essa liberdade esbarra em questões de
b) artigos 286 e 287 do Código Penal.                     ordem prática e sofre muitas vezes os efeitos do
    6. É crime ofender “a moral pública e os bons         poderio econômico na comunicação. São entraves
costumes” (artigo 17 da Lei de Imprensa). São             reais à liberdade de expressão na nação brasileira:
puníveis a calúnia (imputação de fato criminoso a             Censura implícita e velada - Uma democracia ple-
alguém, de forma falsa, equivocadamente), a difa-         na e irrestrita prevê o fim da censura de qualquer
mação (imputação de fato ofensivo à reputação             tipo – sutil ou agressiva, tácita ou explícita, polí-
de alguém) e a injúria (ofensa, insulto), os três         tica ou econômica, social ou individual. A existên-
abusos ofendendo tanto pessoas físicas vivas quan-        cia de ações sutis de controle e de censura mere-
to a memória dos mortos. Em termos de legisla-            cem grande reflexão no Brasil, pois podemos en-
ção:                                                      contrar ameaças veladas ou explícitas de demis-
    - calúnia: a) artigo 20 da Lei de Imprensa; b)        são de profissionais, censura a matérias
artigo 138 do Código Penal.                               jornalísticas e artigos que contrariam interesses
    - difamação: a) artigo 139 do Código Penal; b)        políticos ou empresariais, além de exposição a
artigo 21 da Lei de Imprensa.                             pressões e constrangimentos variados. Essas são
    - injúria: a) artigo 140 do Código Penal; b) artigo   práticas correntes porque, embora a liberdade seja
22 da Lei de Imprensa.                                    garantida pelo direito positivado, não existem no
                                                          país leis que explicitamente atinjam ações que
   Na Lei de Imprensa, dispõe o parágrafo único           atacam a plena liberdade de expressão, a não ser
do artigo 22, que o juiz não poderá aplicar a pena        quando há explicitamente ou dinheiro envolvidos.
quando o ofendido tiver provocado diretamente                 Em visita feita ao Brasil em abril de 2004, o
a injúria ou quando há retorsão imediata, que             Relator Especial da Organização dos Estados Ame-
consista em outra injúria. O caso de ofensa contra        ricanos (OEA), advogado argentino Eduardo
a memória dos mortos é regido pelo artigo 24 da           Bertoni, informou que nos dois últimos relatórios
Lei de Imprensa.                                          anuais (2002 e 2003) preparados pela Relatoria,
   Existem também os dispositivos que garantem            ambos aprovados pela CIDH (Comissão Interame-


20
ricana de Direitos Humanos), constam quatro as-           pelos governos. Apesar desse tipo de manifesta-
sassinatos de jornalistas brasileiros como conse-         ção ser permitido por lei, muitas vezes há o uso
qüência de seu trabalho, no ano de 2003. Porém,           de força policial para reprimi-las, com a alegação
segundo o próprio Bertoni, a OEA tem recebido             de subversão da ordem pública.
informações que demonstram o avanço das inves-
tigações das autoridades para esclarecer esses fa-
tos e coibir esse tipo de prática.                            PAPEL
                                                          O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES ATORES
    Ações de censura por meio do Poder Judiciário – A         A sociedade civil organizada
Lei de Imprensa não prevê a possibilidade de pro-             No Brasil, os principais atores da sociedade ci-
va da verdade pelo veículo que apresenta uma              vil organizada que lidam com o tema da liberda-
denúncia. Um caso recente de uso da força do              de de expressão são: a Federação Nacional dos
Judiciário como forma de intimidação e censura à          Jornalistas (Fenaj), que reúne sindicatos de jorna-
liberdade de expressão foi uma liminar sentencia-         listas de todo o país; a Associação Brasileira de
da contra o jornal Correio Braziliense, do Distrito       Imprensa (ABI), tradicional órgão que reúne pro-
Federal. Por meio de ação impetrada pela advoca-          fissionais de jornalismo em suas diversas
cia do governador Joaquim Roriz (acusado de estar         modalidades e tem por finalidade maior “a defesa
envolvido com a máfia da grilagem de terras no            da ética, dos direitos humanos e da liberdade de
Distrito Federal), o jornal sofreu censura prévia         informação e expressão”; a Ordem dos Advoga-
de possível matéria que relacionasse a ocorrência         dos do Brasil (OAB), conselho profissional que con-
com o governador. Casos como esse ainda têm               trola e regulamenta o exercício da advocacia e tem
espaço por conta da vigência da Lei de Imprensa           tradição na defesa da liberdade de expressão; e o
da época da ditadura militar.                             Movimento Nacional de Direitos Humanos
    Concentração e oligopólio dos meios de                (MNDH), que congrega 316 entidades de defesa
comunicação – A forte concentração (horizontal,           dos direitos humanos de todo o país.
vertical e cruzada) da propriedade dos meios de               Entre os órgãos com atuação internacional, há
comunicação no Brasil nas mãos de empresas pri-           a Relatoria Especial para a Liberdade de Expres-
vadas implica potencial redução da liberdade de           são, criada em 1998 pela Comissão Interamericana
expressão da sociedade brasileira. Quanto maior           de Direitos Humanos da OEA. Trata-se de um or-
a concentração dos meios de comunicação, menor            ganismo de caráter permanente, com
a quantidade de grupos que se expressam através           independência funcional e orçamento próprio, que
desses meios. Atualmente, a oposição à liberdade          monitora e elabora informes anuais sobre a situa-
de expressão não se dá mais pelo Estado - como            ção da liberdade de expressão no países
acontecia na época da ditadura militar - mas pelas        americanos e também produz relatórios especiais
próprias empresas jornalísticas. Grosso modo,             sobre assuntos relacionados com esse direito. Há,
podemos dizer que existe a liberdade das nove             ainda, a Rede Internacional para a Liberdade de
famílias que detêm os oligopólios da mídia,               Expressão (IFEX), grupo de organizações não-go-
controlando cerca de 85% da informação que                vernamentais e profissionais comprometido com
circula no país, contra cerca de 180 milhões de           o alerta e a coordenação de ações contra ameaças
brasileiros que não têm acesso à produção de sua          à liberdade de informação. O IFEX, que tem o apoio
própria comunicação. Além disso, restrições legais,       da Unesco, possui mais de 300 integrantes, em
dificuldade na liberação de outorgas e persegui-          92 países (a maioria deles em desenvolvimento).
ção criminal aos veículos comunitários ajudam a
manter essa situação de desigualdade no cenário              A grande mídia
brasileiro.                                                  Normalmente, quando algum abalo à liberda-
    Falta de liberdade de manifestações públicas – Atu-   de de expressão (exceto aqueles de cunho implíci-
almente, garantir a liberdade de expressão tam-           to e velado) se manifesta nas entranhas do meio
bém através das manifestações públicas é funda-           jornalístico, os grandes meios de comunicação do
mental, já que estas se constituem, efetivamente,         Brasil levantam-se para rechaçar atitudes desse
como ações de interesse público. Exemplos brasi-          cunho. São alguns exemplos recentes o caso Tim
leiros são as manifestações sindicais, estudantis e       Lopes, jornalista investigativo da Rede Globo de
de movimentos sociais como os sem-terra e os              Televisão, assassinado enquanto produzia matéria
sem-teto, que todos os anos ocupam praças e ave-          em favela do Rio de Janeiro; e a morte durante
nidas de várias cidades do país. Essas manifesta-         exercício profissional do repórter fotográfico da
ções funcionam como canais de expressão forma-            revista Época, Luís Antônio da Costa, assassinado
dos por opiniões contrárias às decisões tomadas           por assaltantes fugitivos enquanto fazia a


                                                                                                          21
cobertura de uma ocupação em um acampamen-             ao verificarem que os interesses da Rede Globo
to de trabalhadores sem-teto em São Bernardo do        estavam prevalecendo sobre os das demais, SBT,
Campo (SP).                                            Record, Bandeirantes e RedeTV (as outras quatro
   Também é comum os empresários da comuni-            grandes redes de TV) saíram da Abert e criaram,
cação falarem em censura, em restrições à liber-       em março de 2002, a UneTV, transformada em
dade de expressão e de imprensa a qualquer sinal       novembro de 2004 na Abra. Atualmente, a Abert
de discussão sobre regulamentação das comuni-          reúne apenas a Globo e emissoras regionais.
cações no Brasil, principalmente se o debate vier
de fora do setor empresarial. Esse tipo de postura
configura uma clara estratégia de encerrar a dis-                     ATUAIS
                                                       TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
cussão sem efetivamente fazê-la, já que o debate           Está no Congresso Nacional, há quase seis
pode gerar mudanças contrárias a seus interesses.      anos, uma proposta que regula o direito de
O tratamento que se deu em 2004 aos projetos           publicação pelo Ministério Público de informações
de criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ)     das instâncias públicas sob investigação. O Projeto
e Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual          de Lei da Câmara 65/99, apresentado pela
(Ancinav) – sem qualquer avaliação de mérito –         Presidência da República, “proíbe magistrados,
são exemplos contundentes dessa postura empre-         membros do Ministério Público, integrantes do
sarial, que tenta classificar qualquer projeto de      Tribunal de Contas, bem como autoridades policiais e
regulação como censura logo quando surge e, com        administrativas de revelarem ou permitirem,
isso, tenta encerrar, ou ao menos fragilizar, a dis-   indevidamente, que cheguem ao conhecimento de
cussão de interesse público. O setor empresarial       terceiro ou aos meios de comunicação fatos ou
normalmente age como se estivesse acima das leis       informações de que tenha ciência em razão do cargo e
e se julga isento de toda e qualquer forma de          que violem o sigilo legal, a intimidade, a vida privada,
regulação estatal e/ou pública.                        a imagem e a honra das pessoas (...)”.
   Entre as entidades que representam os inte-             Esse projeto foi considerado por vários órgãos
resses dos empresários estão a Associação Nacio-       de imprensa um atentado à liberdade de expressão.
nal de Jornais (ANJ), a Associação Nacional de Edi-    Ao não permitir a divulgação de informações cons-
tores de Revista (Aner), a Associação Brasileira de    tantes de processos ainda não públicos, o projeto
Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e a Associ-     questiona o fato de a liberdade de expressão ser
ação Brasileira de Radiodifusores (Abra). Histori-     um conceito absoluto. Esse debate apresenta
camente, a Abert sempre foi uma entidade muito         nuances e revela a linha tênue entre a censura e a
poderosa e representativa, pois reunia a grande        proteção à privacidade.
maioria das emissoras de TV brasileiras. Porém,




22
A 2 – Liberdade de imprensa e mídia, inclusive para
jornalistas realizarem seu trabalho e responsabilidades
relacionadas
A 2.1 - Provisão constitucional e/ou leis que garantam a liberdade da imprensa e
de todos os tipos de mídia, além de independência editorial, com o mínimo de
restrições, incluindo a proibição de monopólios em qualquer mídia.

A 2.2 - Medidas para prevenir a violação de direitos humanos dos jornalistas na
execução de seu trabalho, especialmente em áreas de conflito.

A 2.3 - Medidas para apoiar a liberdade editorial de jornalistas, inclusive
segurança no emprego, sindicalização, direitos morais de autor e a resistência à
coerção moral e outras formas de coerção por parte de empregadores ou
outrem.

A 2.4 - Instrumentos independentes e medidas que assegurem o direito de
resposta, que protejam o público contra processos difamatórios, protejam a
privacidade e evitem o incitamento à violência, e outras provisões contidas em
acordos internacionais.

A 2.5 - Medidas para prevenir censura por parte de entidades comerciais de
material relevante para a esfera pública, inclusive de conteúdo eletrônico e para a
internet – por parte, por exemplo, de provedores de acesso à internet,
mecanismos de busca, e provedores de banda (infra-estrutura de internet,
empresa de telefonia, internet a cabo ou via satélite).
BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                           casos, sofre aplicação com restrições e alterações
    A base legal que sustenta a liberdade de im-      de penalidades. A lei em vigor prevê apreensão
prensa é, em sua maioria, a mesma que garante a       de jornais que incitem a subversão da ordem po-
liberdade de expressão, visto que os direitos es-     lítica e social. Prevê, também, que, em caso de
tão diretamente conectados. Vale destacar o pará-     processo por calúnia, injúria ou difamação, este
grafo 6º do artigo 220 da Constituição, que prevê     deve ser encaminhado contra o diretor ou editor,
que “a publicação de veículo impresso de comunica-    e não contra a empresa. Os órgãos de imprensa
ção independe de licença de autoridade”.              podem ser punidos por questionar o poder públi-
    Além destas, destaca-se na legislação brasilei-   co e não têm direito à prova da verdade contra o
ra a Lei 5.250, a Lei da Imprensa, datada de 09/      Presidente da República, o presidente do Senado
02/1967 (no período da ditadura militar), que re-     Federal, o presidente da Câmara dos Deputados,
gula a liberdade de manifestação do pensamento        os ministros do Supremo Tribunal Federal, chefes
e da informação. A atual regulamentação que trata     de Estado ou de Governo estrangeiros, ou seus
de liberdade de imprensa é defasada, já que a Lei     representantes diplomáticos. Isto é, não podem
de Imprensa de 1967 não foi incorporada pela          provar que a denúncia ou acusação é procedente.
Constituição Federal de 1988 e até hoje ainda não     Em virtude de seu caráter autoritário, a lei há tem-
foi definida uma nova lei, o que gera alguns          pos não vem sendo aplicada em seus pormenores
choques de interpretação e prevalência. Contudo,      e foi criado um vácuo pela falta de outra que a
mesmo sob fortes críticas de setores da área          substitua.
jornalística, ela continua sendo aplicada pelo            Sobre a proposta de substituição da Lei de Im-
Poder Judiciário, com a ressalva de que, em certos    prensa, veja em “Tendências Atuais Futuras”.


                                                                                                     23
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                    à liberdade de expressão. Um bom exemplo dessa
    Alguns impeditivos à liberdade de imprensa                   dificuldade da aplicabilidade da Lei de Imprensa é
surgem no cotidiano da atividade jornalística.                   a falta de limitação para as multas referentes aos
Muitos deles se configuram como problemas de                     crimes de imprensa. A decisão fica a cargo do juiz,
ordem econômica e política.                                      que algumas vezes pode ter interesse particular
    A propriedade de veículos de comunicação por                 em coibir uma ação jornalística através de
políticos de âmbito local, regional e nacional pode              intimidação jurídica. O valor da indenização do
se configurar como importante entrave à liberda-                 dano moral decorrente de ofensa praticada através
de de expressão e de imprensa, visto que, não ra-                da imprensa não está limitado ao disposto nos
ramente, interesses entre as redações e os que                   artigos 51 e 52 da Lei 5.250/67, que regula a
detêm o poder político e econômico tomam o lu-                   liberdade de manifestação do pensamento e de
gar do interesse público. Muitas vezes, portanto,                informação. Essa lei também determina em seu
existe a liberdade para os donos de empresa, mas                 artigo 29 que “toda pessoa natural ou jurídica, órgão
não para os jornalistas. Nesses casos, configura-                ou entidade pública, que for acusado ou ofendido em
se uma situação em que o interesse público é pre-                publicação feita em jornal ou periódico, ou em
judicado pelo interesse particular.                              transmissão de radiodifusão, ou a cujo respeito os meios
    Outra questão de importância é a dependência                 de informação e divulgação veicularem fato inverídico
que os veículos têm da publicidade. Dados de 2002                ou errôneo, tem direito a resposta ou retificação”.
da Associação Nacional de Jornais (ANJ) apontam                      Existem também os impeditivos de natureza
que o Brasil tinha 523 jornais diários, com                      arbitrária e mesmo criminosa. Nos últimos anos,
circulação média de 6,97 milhões de cópias (num                  o Brasil registrou a ocorrência contra a imprensa
país de mais de 180 milhões de habitantes).                      de ameaças, agressões, censuras, restrições, pres-
Desses 523 jornais, pouco mais de cinco têm                      sões, intimidações, prisões arbitrárias, danos ao
relevância nacional. A importância dos anuncian-                 patrimônio, apreensões de jornais, processos,
tes dentro dos veículos também se constitui como                 condenações judiciais, seqüestro e assassinatos de
um fator que diminui a real liberdade de expressão               profissionais da imprensa, diretamente vinculados
dos comunicadores, pois os veículos são cada vez                 ao exercício do jornalismo. Segundo o Relatório
mais dependentes do capital publicitário, o que                  Anual sobre Liberdade de Imprensa no Brasil, or-
torna, na prática, difícil a divulgação de opiniões              ganizado pela ANJ – que abrange o período de
contrárias aos interesses desses patrocinadores.                 agosto de 2002 a agosto de 2003 – foram
Isso inclui a dependência também de anunciantes                  registradas sete agressões e duas ameaças a jor-
oficiais, como os governos federal, estaduais e                  nalistas. Três veículos impressos sofreram censu-
municipais. A dependência de propaganda,                         ra prévia por mandado judicial, dois jornais im-
portanto, torna-se um limitador da liberdade de                  pressos e uma emissora de TV sofreram processo.
imprensa. Por outro lado, algumas vezes, a publi-                Além disso, dois jornalistas foram processados e
cação de notícias negativas funciona como forma                  um foi condenado à prisão2.
de pressão a governos e empresas para que anun-                      No relatório da Federação Internacional de Jor-
ciem em seus veículos, configurando uma                          nalistas (FIJ) de 2004, foram apontados seis jorna-
“chantagem velada” do veículo.                                   listas mortos no Brasil no exercício da profissão, o
    A atuação da Justiça nesse campo também pode                 que coloca o país no 4º lugar do ranking mundial,
se constituir um problema, dependendo do tipo                    atrás de Filipinas, Índia e Iraque. A maioria deles
de encaminhamento dado. Isso também se dá pelo                   foi assassinada por motivo de denúncias políticas
atual “limbo regulatório”, em que a Lei de                       ou relacionadas ao crime organizado.
Imprensa vigente (que é de 1967) e o Código
Brasileiro de Telecomunicações (de 1962) não
acompanham o que diz a Constituição de 1988 e                      PAPEL                    ATORES
                                                                 O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
nem são condizentes com as discussões atuais no                     Duas entidades que freqüentemente têm de-
que diz respeito à imprensa, aos meios de                        batido as questões da liberdade de imprensa são
comunicação de maneira geral e particularmente                   a ANJ e a Associação Brasileira de Jornalismo


2. O relatório não se posiciona a respeito, mas nem todas as acusações e processos emitidos foram equivocados ou emitidos pela
Justiça como uma retaliação qualquer. Algumas funcionam como medidas cabíveis no sentido de se garantir a defesa das partes
que se sentiram difamadas pelos jornais e jornalistas. Está correta a imprensa quando afirma que ninguém deve impor-lhe censura
prévia, mas a mídia e os jornalistas não têm imunidades. Depois de publicada a notícia, os cidadãos que se sentirem lesados
devem ter o direito de contestar e cobrar retificações e reparações que acharem necessárias.



24
Investigativo (Abraji). A ANJ defende os interesses                   proferida. Em agosto de 2004, a Fenaj propôs a
dos empresários donos de jornais e, portanto, faz                     criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ) e
grandes esforços para garantir a plena liberdade                      encaminhou projeto de lei ao Congresso Nacional
de acesso e publicação de informações                                 por meio do Palácio do Planalto (a quem cabia a
jornalísticas, incluindo polêmicas governamentais                     prerrogativa legal). Essa proposta causou bastante
e outras. Já a Abraji tem, no que concerne ao acesso                  polêmica, já que a criação desse órgão poderia
a informações governamentais e públicas, um                           mudar as relações trabalhistas na área da produção
grande interesse em defender a liberdade de                           jornalística, tocando em questões centrais como
expressão e de imprensa, pois são direitos chaves                     a emissão dos registros (que passaria a ter controle
para a execução do trabalho de seus associados.                       nacional e unificado), a fiscalização do exercício
Outras entidades como a Associação Brasileira de                      profissional e, indiretamente, a obrigatoriedade
Imprensa (ABI) e a Ordem dos Advogados do Brasil                      do diploma de jornalista. O projeto foi rejeitado
(OAB) têm desempenhado papéis importantes nos                         no Congresso.
debates sobre liberdade de imprensa, principal-                           Em termos de acompanhamento da situação
mente em casos de repercussão pública.                                da liberdade de imprensa, duas organizações so-
    Outros atores importantes são os sindicatos de                    ciais fazem relatórios com rankings mundiais. A
jornalismo e a Federação Nacional dos Jornalistas                     organização não-governamental Freedom House
(Fenaj), que buscam defender os interesses dos                        publica anualmente um ranking de liberdade de
jornalistas em relação às pressões das empresas.                      imprensa4. O Brasil está na 80ª posição, juntamen-
Uma das principais questões a partir da qual eles                     te com México, Mongólia e Cabo Verde; recebeu
se inserem no debate da liberdade de imprensa é                       nota 36 e é considerado parcialmente livre no
a obrigatoriedade do diploma do curso universi-                       quesito liberdade de imprensa. No topo da lista
tário de jornalismo para o exercício da profissão                     do ano de 2004 (que reflete o estágio de liberda-
de jornalista, como tentativa de garantir a quali-                    de no ano de 2003), encontramos Dinamarca, Is-
dade do trabalho e a não precarização da profis-                      lândia e Suécia, com nota 8, seguidas por Bélgica,
são3. Recentemente, duas liminares diferentes da                      Noruega e Suíça, com nota 9.
Justiça brasileira deram pareceres favoráveis à não                       Em outra classificação mundial de liberdade de
obrigatoriedade do diploma, baseando-se para tal                      imprensa – publicada pela organização Repórteres
no artigo 5º da Constituição Federal. Com isso,                       sem Fronteiras (RSF) – o Brasil ocupa o 66º lugar
muitos brasileiros sem formação universitária em                      no ranking5 (que vale para o período 2003-2004),
jornalismo puderam obter nas Delegacias                               uma melhoria de cinco posições em relação ao re-
Regionais de Trabalho seus registros como                             latório anterior, publicado em outubro de 2002.
jornalistas profissionais. Contudo, a decisão final                   Segundo o ranking atual, em que foram avaliados
ainda não foi tomada pelas instâncias superiores                      167 países, o Brasil aparece avaliado com nota
da Justiça brasileira e não tem prazo para ser                        16,50. No ano anterior o Brasil teve nota 16,75.


3. Segundo estimativa da Fenaj, publicada em setembro de 2004, com base em dados do Ministério do Trabalho e levantamento
junto aos sindicatos, existem aproximadamente 100 mil registros profissionais expedidos desde 1969: 20 mil jornalistas que
trabalham em redações (rádio, tv, jornais, revistas, Internet); 20 mil jornalistas em assessorias (setor público e privado), universi-
dades e free lancer; 10 mil jornalistas desempregados; 50 mil não exercem a profissão por motivo de falecimento, aposentadoria
ou mudança de atividade profissional.

4. Tal ranking é construído a partir das informações obtidas pela instituição acerca de três conjuntos de critérios: legais (leis e
regulamentações que garantem ou obstruem a liberdade de expressão); políticos (formas políticas de se controlar a liberdade de
expressão, como censura) e econômicos (como o sistema de propriedade do setor). A partir da coleta das informações são
atribuídas notas aos critérios e, ao final, os países podem ter uma pontuação global entre 0 e 100 pontos, sendo a nota 0 um
indicador de total liberdade de imprensa e a nota 100, de total restrição. A instituição trabalha com três grandes categorias de
países: países com médias que variem entre 0 e 30 pontos são considerados livres, entre 31 e 60 temos os países parcialmente
livres e, entre 61 e 100, os países não livres.

5. O ranking foi constituído a partir de entrevistas com mais de 100 correspondentes ao redor do mundo, representantes de 14
organizações de liberdade de expressão nos cinco continentes, jornalistas, pesquisadores, juristas e ativistas de direitos
humanos. Eles responderam 52 perguntas relativas ao conjunto dos atentados contra a liberdade de imprensa (assassinatos ou
ameaças de jornalistas, censura, prisões, monopólio do Estado em determinados aspectos, sanções para os delitos de imprensa,
regulação dos meios de comunicação etc.) que ajudaram a indicar o estado de liberdade de imprensa nos 167 países relacionados.
Os países que ocupam o primeiro lugar no ranking são Dinamarca, Finlândia, Islândia, Irlanda, Holanda, Noruega, Eslováquia e
Suíça, todos com nota 0,50. Já os piores classificados são a Coréia do Norte, em último lugar, com nota 107,50; Cuba, em 166º
lugar, com nota 106,83; e Myanmar (ex-Birmânia), em 165º, com nota 103,63.



                                                                                                                                  25
Outra iniciativa de acompanhamento do tema            caso mostra uma tentativa clara de intimidação
é a Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa,             pelo uso da força legal.
iniciativa conjunta da Organização das Nações                Esse caso levantou um amplo debate no Brasil
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura            sobre liberdade de expressão e de imprensa,
(Unesco) e da ANJ. Foi criado um sítio web               embora a matéria não tenha sido originalmente
(www.liberdadedeimprensa.org.br) com o intuito           publicada por um órgão brasileiro.
de ser um meio de acesso aos assuntos                        As tendências relacionadas à liberdade de im-
relacionados à liberdade de imprensa no Brasil e         prensa no Brasil podem, muitas vezes, ser
oferecer ampla informação sobre a ocorrência de          identificadas a partir de exemplos pontuais. Um
fatos atentatórios, restritivos ou contrários ao livre   caso atual e que envolve a aplicabilidade da Lei
exercício do jornalismo. No entanto, por ser             da Imprensa é o fato do Supremo Tribunal Federal
promovida pelo setor patronal, ela se mostra             (STF) ter julgado inconstitucional o artigo da lei
extremamente limitada, já tendo dado exemplos            atual que fixa em três meses o prazo para a pes-
de que não pretende tocar em questões que                soa que se sentir ofendida por uma reportagem
afrontem qualquer dos jornais associados à ANJ.          mover ação de indenização por dano moral con-
No Pará, por exemplo, houve uma agressão de              tra a empresa jornalística. O Supremo examinou
Rômulo Maiorana, dono de um dos principais               no dia 1º de junho de 2004 um recurso do jornal
jornais do estado, a Lúcio Flávio Pinto, jornalista      O Dia, do Rio de Janeiro, contra o pagamento de
que havia escrito uma matéria que denunciava o           indenização ao médico Carlos Alberto de Oliveira,
comprovado abuso de poder da família Maiorana.           autor de uma ação pela qual acusa a empresa de
A rede silenciou sobre o tema. Também não houve          danos morais. Os ministros consideraram que a
nenhuma citação sobre o processo que Jaime               Constituição de 1988 não “recepcionou” o artigo
Câmara, principal empresário de mídia de Goiás,          56 da Lei de Imprensa, que trata do prazo para
moveu contra o jornalista Jorge Kajuru por conta         propor ação de indenização por dano moral. Isso
das denúncias sobre o envolvimento do empresário         significa que, no entendimento dos ministros do
em um esquema montado pelo governo do estado             Supremo, a norma da lei é incompatível com o
para o Campeonato Goiano de Futebol.                     novo texto da Constituição, porque o prazo de
Especialmente por contar com o apoio da Unesco,          três meses se confrontaria com a parte que trata
a iniciativa motivou diversas manifestações              dos direitos individuais do cidadão (artigo 5º), es-
contrárias por parte da sociedade civil organizada,      pecialmente os direitos de resposta e de indeni-
denunciando a postura de defesa empresarial              zação por dano material, moral ou à imagem. Esse
assumida pela Rede.                                      exemplo mostra a carência de um alicerce legal
                                                         sólido para o entendimento da liberdade de im-
                                                         prensa no Brasil. Enquanto essa base jurídica não
               ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                              for satisfatoriamente resolvida, a tendência é de
    O país tem assistido a exemplos que revelam a        que permaneça um cenário instável, variando de
dificuldade em lidar com casos em que a liberda-         acordo com a interpretação dos juízes.
de de imprensa é utilizada para divulgação de                Nesse sentido, existe um substitutivo da Lei
denúncias supostamente caluniosas. Um recente            de Imprensa (Projeto de Lei 3.232/92) que está em
exemplo foi o caso “Lula - The New York Times”.          trâmite no Congresso Nacional. Os pontos princi-
Depois que o jornal publicou uma matéria do              pais previstos no projeto são: a obrigação de pu-
repórter Larry Rohter sobre os hábitos de consumo        blicar qualquer matéria paga, desde que não sig-
de álcool do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e      nifique afronta à pessoa humana ou à ordem de-
uma suposta preocupação nacional sobre o fato            mocrática; definição de responsabilidades, no caso
poder afetar a administração do governo brasileiro,      de processos, ao autor (se este não for vinculado
o presidente decidiu cancelar o visto do repórter        ao órgão) e solidariamente à empresa, ao autor e
americano. Um dos pontos mais graves desse epi-          ao editor, no caso de matéria assinada por funcio-
sódio é a falta de elementos para julgar um caso         nário da empresa jornalística. O projeto prevê tam-
desses. Grosso modo, o presidente Lula agiu como         bém que o autor possa se negar a assinar a maté-
juiz num caso em que ele era a vítima. Mais grave        ria se tiver sofrido modificações que o façam não
do que o visto ser cancelado ou não, é isso não          assumir o que está escrito. Fica garantido o direi-
ter sido feito pelo Judiciário, mas pelo Presidente      to de sigilo da fonte, o que não exclui as respon-
da República diretamente. No final, o jornalista e       sabilidades civis e penais e nem o ônus da prova.
o presidente entraram em um acordo de descul-            Regulamenta o direito de resposta, impedindo a
pas e o pedido de cancelamento foi suspenso. Tal         empresa de publicar qualquer outro texto falado


26
ou impresso em conjunto com a resposta que se        ções milionárias e acreditam que é preciso esta-
caracterize como tréplica (o que implica, no caso,   belecer valores máximos na lei para que não se
mais um direito de resposta). O capítulo mais        fortaleça no Brasil a “indústria de indenizações por
polêmico, no entanto, é o das sanções, que não       dano moral”, como eles dizem acontecer nos EUA.
estabelece valor máximo para multas e indeniza-      As empresas justificam ainda que uma nova Lei
ções. Não é possível prever quando haverá a apre-    de Imprensa significaria a possibilidade de serem
ciação do projeto, ainda que ele seja resultado da   punidas por acusações inverossímeis ou serem
compilação de um grande número de projetos em        obrigadas a conceder direito de resposta a qual-
tramitação no início da década de 90.                quer um. Da maneira como está definido hoje, o
   Esse debate sobre a constituição da nova Lei      direito de resposta pode ser publicado juntamen-
de Imprensa é conflituoso e sintomático. A parte     te a outra resposta do veículo (prática comum nos
do projeto que se refere à idéia de não limitação    meios impressos), o que configura uma tréplica e
máxima para multas e indenizações, por exemplo,      acaba desconfigurando a garantia do direito. Pelo
gerou uma forte campanha contra por parte dos        fato do mercado ser, na prática, desregulamentado,
empresários, que consideram que a ausência de        a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e
definições é uma censura implícita. Eles afirmam     Televisão (Abert) defende a simples revogação da
que as empresas não publicariam qualquer polê-       lei atual, ação que deixaria todas essas questões
mica com medo de serem acionadas por indeniza-       somente sob as esferas penal e cível.




                                                                                                     27
A 3 - Acesso e pronta disponibilidade de informações
públicas e governamentais, de modo abrangente, útil e rápido,
especialmente no que concerne ao desenvolvimento e
implementação de políticas e questões de interesse público, como
saúde, segurança etc.

A 3.1 - Legislação sobre liberdade da informação, com a mínima retenção por
parte de órgãos públicos e governamentais, e com acesso máximo por parte do
mais amplo público.

A 3.2 - A implementação de tais leis que tornem tal informação disponível de
maneira acessível economicamente e em tempo correto para todos.

A 3.3 - Esforços ativos por parte dos setores público e estatal para expandir a
abertura e a transparência, inclusive através de meios como:
      estruturas ou escritórios para reunir e divulgar informações de forma
apropriada;
      a publicação de objetivos e planejamentos de políticas e serviços públicos;
      proteção para funcionários públicos que revelem informação de e em prol
do interesse público;
      a transmissão das deliberações dos representantes eleitos e órgãos
públicos;
      transparência do processo decisório em questões de interesse público,
como decisões de gabinete.

A 3.4 - Abertura e transparência governamental em negociações e instituições
internacionais relacionadas à mídia e à esfera pública.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                  No Brasil, o direito à informação encontra-se
   É importante notar que a Constituição Federal         consagrado na Constituição Federal de 1988 por
acolheu tanto a liberdade pública de informar            meio dos incisos XIV e XXXIII do artigo 5º:
quanto o direito ao acesso à informação. Aponta,             XIV — é assegurado a todos o acesso à informa-
ainda, o fato de que o direito de acesso à informa-      ção e resguardado o sigilo da fonte, quando necessá-
ção é colocado, nesse documento, expressamente           rio ao exercício profissional;
como um direito coletivo, assegurado a todos e               XXXIII — todos têm direito a receber dos órgãos
todas. Outra questão fundamental prevista na             públicos informações de seu interesse particular, ou de
Constituição é o princípio da publicidade dos atos       interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo
administrativos, extensiva a toda organização da         da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aque-
administração pública. O artigo 37 aponta que “a         las cujo sigilo seja imprescindível à segurança da soci-
administração pública direta, indireta ou fundacional,   edade e do Estado.
de qualquer dos poderes da União, dos estados, do
Distrito Federal e dos municípios obedecerá aos             Também podem ser considerados instrumen-
princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade,    tos para a garantia do direito ao acesso à
publicidade”.                                            informação – e do direito à informação – a ação


28
civil pública (cuja disciplina consta da Lei 7.347/       órgãos e entidades de todos os níveis da federação
85), a ação popular (Lei 4.717/65) e o mandado            (União, estados, Distrito Federal e municípios), no
de segurança (Lei 1.533/51), que disciplinam as           âmbito dos poderes Executivo, Legislativo e
ações coletivas e individuais destinadas à                Judiciário, estão incumbidos de manter disponíveis
superação de situações de ilegalidade provocadas          em seus sites na Internet dados e informações ali
por autoridades públicas.                                 especificados. As informações contidas na
    Especialmente em relação à legislação                 homepage não são abertas ao público em geral e
infraconstitucional, há que se ressaltar a Lei 9.507/     para ter acesso a esses dados é necessário o pre-
97, que regula o direito de acesso à informação           enchimento de um formulário para a identifica-
constante de registro ou banco de dados de cará-          ção do órgão responsável, do nível de governo
ter público e o procedimento do habeas data, con-         (municípios e estados) e dos endereços eletrôni-
sistente na ação judicial cabível: I — para assegu-       cos na Internet (links) que permitirão tal acesso às
rar o conhecimento de informações relativas à             páginas específicas contendo os referidos dados e
pessoa do impetrante, constante de registro ou            informações.
banco de dados de entidades governamentais ou                 Outro instrumento virtual criado nesse senti-
de caráter público; II — para retificação de dados,       do é o Interlegis. Um programa desenvolvido pelo
quando não se puder fazê-lo por processo sigilo-          Congresso Nacional brasileiro, em parceria com o
so, judicial ou administrativo; III — para a anota-       Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID),
ção nos assentamentos do interessado, da con-             de integração do Poder Legislativo nos seus ní-
testação ou explicação sobre dado verdadeiro, mas         veis federal, estadual e municipal através de co-
justificável, e que esteja sob pendência judicial ou      munidade virtual. Dessa forma, os parlamentares
amigável.                                                 e casas legislativas cadastradas no portal podem
    Existe, ainda, a Lei 8.159/91, que estabelece         trocar informações e ter acesso a documentos e
as diretrizes da política nacional de arquivos pú-        notícias do Poder Legislativo. No entanto, o pú-
blicos e privados, assegurando a todos o direito          blico em geral somente tem acesso aos dados pu-
de acesso pleno a quaisquer documentos públi-             blicados no portal Interlegis.
cos. São considerados públicos “os conjuntos de               Implantado em janeiro de 1987, pela Secreta-
documentos produzidos e recebidos, no exercício de        ria do Tesouro Nacional, ligada ao Ministério da
suas atividades, por órgãos públicos de âmbito fede-      Fazenda, o Sistema Integrado de Administração
ral, estadual, do Distrito Federal e municipal em de-     Financeira (Siafi) é anunciado pelo governo como
corrência de suas funções administrativas, legislativas   um importante instrumento utilizado para regis-
e judiciárias” (art. 7o, caput). A tais documentos        tro, acompanhamento e controle da execução or-
assegura-se o direito de acesso pleno (art. 22), com      çamentária, financeira e patrimonial do governo
exceção daqueles de caráter sigiloso, “cuja divul-        federal. É um sistema informatizado que processa
gação ponha em risco a segurança da sociedade e do        e controla, por meio de terminais instalados em
Estado” ou exponha indevidamente a intimidade,            território nacional, a execução orçamentária,
a vida privada ou a imagem das pessoas (art. 23,          financeira, patrimonial e contábil dos órgãos da
caput e § 1o). A mesma lei atribui à legislação es-       Administração Pública Direta federal, das
tadual e municipal a gestão do acesso aos respec-         autarquias, fundações e empresas públicas fede-
tivos documentos, mas com a obrigação de aten-            rais e das sociedades de economia mista que esti-
derem aos dispositivos constitucionais e às nor-          verem contempladas no Orçamento Fiscal e/ou no
mas gerais de acesso nela previstas (art. 21).            Orçamento da Seguridade Social da União. Entre
    Na última década, algumas leis foram criadas          seus objetivos, o Siafi destina-se a permitir que a
pelo governo brasileiro para tentar por em práti-         contabilidade pública seja fonte segura de infor-
ca a efetividade do direito à informação de caráter       mações gerenciais destinadas a todos os níveis da
público. A Lei 9.755, de 16 de dezembro de 1998,          Administração Pública Federal; permitir o acom-
dispõe sobre a criação de homepage na internet            panhamento e a avaliação do uso dos recursos
pelo Tribunal de Contas da União                          públicos e proporcionar a transparência dos gas-
(www.contaspublicas.gov.br), para divulgação dos          tos do governo federal. A utilização do sistema é
dados e informações que especifica. A referida lei        feita exclusivamente por operadores vinculados à
considera que os dados e informações de que tra-          administração pública e o acesso às informações
ta o TCU devem ser divulgados pelos órgãos                sobre as despesas do governo federal é restrito. O
responsáveis em atendimento ao princípio da               público em geral não tem acesso direto às infor-
publicidade, consagrado no art. 37 da Constitui-          mações, somente através de consultas pelos sites
ção Federal. Segundo o art. 2º da lei, todos os           do Serviço Federal de Processamento de Dados


                                                                                                          29
(Serpro), da Receita Federal ou do próprio Siafi.     com informações até então restritas a
    Apesar de alguns esforços governamentais po-      parlamentares (incluindo as do Siafi). Técnicos do
sitivos, decretos presidenciais recentes foram cri-   Congresso e jornalistas terão acesso a esse siste-
ados no sentido contrário à livre obtenção de da-     ma. Contudo, segundo Cláudio Weber Abramo,
dos públicos. Um bom exemplo é o Decreto 4553/        diretor da Transparência Brasil, a implantação do
02, editado no final do mandato do ex-presidente      site é um avanço muito pequeno. “O acesso ainda
Fernando Henrique Cardoso, que limita o livre         é restrito a poucos, mesmo com a inclusão de
acesso a informações governamentais e altera os       jornalistas. A informação não chega à sociedade
prazos para divulgação de documentos do gover-        como um todo”, aponta.
no. Pela nova legislação, os documentos “reserva-         Segundo o relatório Caminhos da Transparên-
dos” podem permanecer fora do acesso público          cia, realizado pela Transparência Brasil sobre o
por 10 anos, renováveis por mais 10. Os docu-         acesso às informações públicas e governamentais,
mentos “confidenciais”, por 20 anos, prorrogáveis     em muitos casos de requisição de informações pelo
por igual período. Já os documentos “secretos”        público, é possível perceber um interesse maior
por 30 anos, renováveis por mais 30. Por fim, os      nas informações pessoais do que um uso maior e
documentos “ultra-secretos” serão indisponíveis       amplo do direito à informação. “Isso parece decor-
por 50 anos, podendo ser este período renovável       rer do contexto de origem dessas legislações, que pro-
indefinidamente, ficando, para sempre, fora do        curavam demarcar limites para o segredo governamen-
acesso público. Esta situação é tida como             tal pela garantia do direito à privacidade e do direito
inconstitucional, porque a Lei dos Arquivos (8.159/   de ‘saber’ das pessoas. No caso brasileiro, seria uma
91), constitucionalmente superior a um decreto        tentativa de controlar as agências de segurança do
presidencial, estabelece o prazo limite de 30 anos,   regime militar, preservadas nos acordos da transição
renováveis por um único igual período, e em ne-       conservadora. Todavia, este caráter reativo e restrito
nhum momento menciona que qualquer docu-              tende a mudar, permanecendo o habeas data como
mento pode ficar eternamente sob sigilo. Essa si-     uma garantia central para a cidadania”. O habeas
tuação dificulta o acesso de pesquisadores a do-      data aparece como um dos principais instrumen-
cumentos históricos, especialmente àqueles            tos jurídicos para obrigar legalmente os respon-
relacionados ao período da ditadura militar. No       sáveis a cederem informações requisitadas segun-
início de dezembro de 2004, o decreto foi revoga-     do a legislação em vigor. “Em muitos países latino-
do e substituído por uma medida provisória e um       americanos (por exemplo, Argentina, Brasil e Peru) e
decreto que reduzem os prazos de sigilo das dife-     do Leste Europeu (como Bulgária, Hungria e Repúbli-
rentes classificações. Se, por um lado, essas medi-   ca Tcheca), o direito de habeas data foi adotado prin-
das acabaram com a renovação indefinida da clas-      cipalmente pela necessidade de garantir aos indivídu-
sificação ultra-secreta, por outro, elas criaram um   os o acesso e a correção de informações pessoais ar-
conselho governamental, vinculado à Casa Civil        mazenadas nos arquivos dos serviços de segurança dos
da Presidência, que define se e quando renovar a      antigos regimes autoritários”, aponta o documento.
classificação de documentos públicos, instituindo     O fato é que a aplicação do sistema legal que
na prática a possibilidade de sigilo eterno decre-    assegura e regula o direito à informação no Brasil
tado pela Presidência, para documentos de qual-       encontra algumas resistências e dificuldades.
quer classificação, não apenas ultra-secretos.        Primeiramente, devido ao quase desconhecimen-
    Sobre a questão das negociações e instituições    to acerca do próprio conteúdo dessa legislação,
internacionais relacionadas à mídia e à esfera pú-    que é muito pouco divulgada. Em segundo lugar,
blica, prevista no indicador A3.4, não há base le-    surge a dificuldade de compreensão legal que o
gal específica atualmente em vigor.                   público leigo tem. E, por último, mas nem por
                                                      isso menos importante, estão os limites adminis-
                                                      trativos das instâncias governamentais. Segundo
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                         o mesmo relatório, “a inconsistência do direito à
   A realidade para aqueles que buscam o acesso       informação no Brasil resulta de um círculo vicioso em
a informações públicas revela algumas dificulda-      que a desorganização e a precariedade dos registros
des impostas pelo poder público. O caso do Siafi      arquivísticos, computacionais e outros, sob a guarda
mostra isso, com as informações sendo restritas a     dos diversos órgãos da administração pública, reforçam
parlamentares e gestores públicos. Há alguns si-      a opacidade governamental e impõem limites políti-
nais de maior abertura, embora tímidos. Em de-        cos e administrativos adicionais à incompletude da
zembro de 2004, o Senado inaugurou o portal Siga      legislação”. O relatório faz ainda um alerta, nor-
Brasil, que promete ter um amplo banco de dados       malmente não tão evidente, sobre essa dificulda-


30
de em se entender as informações públicas                      Em relação à negociação de questões inter-
disponibilizadas ao público, tal qual acontece no           nacionais relacionadas à mídia, o governo fede-
Brasil com o Siafi e o Interlegis: “Um aspecto im-          ral tem mantido uma postura pouco clara. Os
portante refere-se à opacidade informacional da selva       processos de tomada de decisão para questões
burocrática, que impossibilita ao cidadão chegar sem        como a Cúpula Mundial sobre a Sociedade da
maiores problemas às informações requisitadas. Em           Informação (CMSI), por exemplo, acontecem no
geral, ninguém fora do governo compreende o funcio-         âmbito do Ministério das Relações Exteriores,
namento e a complexidade da gestão das informações          embora haja uma comissão interministerial para
nos órgãos públicos. Por isso, é indispensável que as       tratar do assunto. A participação da sociedade
administrações coloquem à disposição do público os          civil é limitada, ainda que tenha havido convite
índices internos e os catálogos que informam o cidadão      a algumas instituições (sem nenhum critério cla-
sobre qual departamento é responsável por o que, qual       ro) para participar do processo de diálogo so-
departamento deve dispor de que tipo de informação          bre a Cúpula. Não se pode dizer que há um obs-
referente a certo assunto, para que o cidadão possa         curantismo por parte do governo, mas ao mes-
encaminhar seus pedidos de forma mais eficiente.” A         mo tempo não existe nenhuma busca por trans-
obstrução deliberada de funcionários também                 parência e pela definição de critérios para parti-
pode, segundo o relatório, ser considerada um               cipação e para as decisões.
grave entrave ao acesso informacional público. “Em
geral, os órgãos públicos temem discussões abertas com
a população e a sociedade civil organizada. Os servi-          PAPEL
                                                            O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES ATORES
dores públicos inibem a livre circulação de informa-            As principais entidades da sociedade civil or-
ções – por exemplo, a publicação de relatórios de           ganizada que têm debatido a questão são a
projetos ou programas – porque temem críticas e             Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo
obstrução a seus projetos (...) Porém é preciso salientar   (Abraji) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ).
que uma cultura aberta e transparente não surge em          Para o jornalista Fernando Rodrigues, da Abraji, o
ambientes nos quais não existe uma legislação clara         cidadão brasileiro precisa lutar para obter acesso
referente ao acesso à informação”.                          à informação pública. “É preciso chamar atenção da
    Segundo Cláudio Weber Abramo, secretário                sociedade para esse debate. Como não existe lei a res-
geral da Organização Transparência Brasil, algu-            peito, todos os cidadãos ficam à mercê de um ou ou-
mas ações do governo atual vão contra o direito             tro governante, mais ou menos liberal, que lhe forneça
às informações públicas porque as tratam como               as informações”, alertou. Um importante projeto
publicidade. Como exemplo do que ele considera              de lei, o PL 219/03, em tramitação na Câmara, do
um retrocesso em termos de disponibilização de              deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), é considerado
informação, o jornalista lembrou que, no gover-             bastante completo nessa área. Fernando Rodrigues
no Fernando Henrique Cardoso, os ministros eram             ainda chama atenção para o fato de autoridades
obrigados a informar a sua agenda de trabalho; o            locais decidirem sobre a liberação de informações
governo Lula revogou a decisão. Apesar disso, ele           de acordo com suas próprias conveniências. Ele
lembrou que o volume de informação que o Brasil             também admite, no entanto, que há saídas palia-
disponibiliza na Internet é bem maior do que o              tivas para resolver o problema, como o uso de
resto da América Latina. Abramo afirmou ainda               petições à Justiça – que servem principalmente a
que a precariedade dos jornais – como no caso               jornalistas, mas que dificilmente podem ser usa-
das pequenas publicações do interior, que geral-            das por cidadãos comuns devido à necessidade
mente são ligadas a grupos políticos ou                     de contratação de advogados.
empresariais – é um dos principais fatores que hoje             Há também outras organizações não gover-
dificultam o fluxo de informação.                           namentais que lidam com o tema. A Transparên-
    Um dos exemplos das dificuldades impostas               cia Brasil tem produzido relatórios que expõem
pelo próprio poder público no acesso a informa-             o quadro do acesso a dados e informações go-
ções é a ausência de uma listagem pública dos               vernamentais (ver o item anterior,
donos de emissoras de rádio e TV que têm con-               Implementação O Instituto de Estudos
                                                            Implementação).
cessões públicas. Em 2004, o Ministério das Co-             Sócioeconômicos (Inesc), que realiza periodica-
municações divulgou na Internet a lista com os              mente estudos de análise do orçamento e sobre
sócios das emissoras pela primeira vez na história          os indicadores socioeconômicos nacionais, tem
do país. No entanto, as pressões políticas fizeram,         sido uma das entidades que mais veementemen-
pouco tempo depois, o Ministério retirar as                 te defende uma maior abertura das informações
informações do ar.                                          públicas. Também a Ordem dos Advogados do


                                                                                                             31
Brasil (OAB) atua na defesa de ampliar o acesso.                  Algumas das atividades desse fórum permanente
   Existem ainda alguns órgãos públicos que têm                   são: levantamento de todas as leis federais, esta-
entre suas atribuições a operacionalização de gran-               duais e municipais e das regulamentações dos três
de volume de informações de interesse geral. O                    poderes que tratem do direito de acesso a infor-
Conselho Nacional de Arquivos (Conarq) é um                       mações públicas; levantamento de leis que conte-
órgão colegiado, vinculado ao Arquivo Nacional                    nham artigos relativos à transparência ou à publi-
da Casa Civil da Presidência da República, que tem                cidade, como a Lei de Licitações e a Lei de Res-
por finalidade definir a política nacional de arqui-              ponsabilidade Fiscal; levantamento das sentenças
vos públicos e privados, como órgão central de                    dos casos de recursos à Justiça; levantamento de
um Sistema Nacional de Arquivos, bem como exer-                   todos os projetos de lei em tramitação na Câmara
cer orientação normativa visando à gestão docu-                   dos Deputados, no Senado e nas Assembléias
mental e à proteção especial aos documentos de                    Legislativas que digam respeito ao direito de
arquivo. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin),             acesso a informações públicas; estudo das leis
órgão auxiliar à Presidência da República, tem                    existentes e dos projetos de lei em tramitação,
entre suas atribuições a responsabilidade de uma                  com o objetivo de traçar uma estratégia para
grande coleta de informações individuais, empre-                  modificá-los, apoiá-los ou apresentar outra pro-
sariais e públicas que funcionam como auxílio nas                 posta de Lei de Transparência; manter contato com
decisões do Presidente da República. Para tanto, a                o grupo de congressistas que esteve presente ao
Abin se utiliza de vários métodos obscuros, como                  seminário para debater o encaminhamento – e
escutas telefônicas, infiltração em reuniões e ma-                eventual unificação – das propostas sobre uma lei
nifestações. Legalmente, porém, a agência é proi-                 de direito de acesso. Durante o seminário foram
bida de fazer escuta telefônica, pois a Lei 9.296/                ressaltados alguns projetos já em tramitação no
96, que regulamenta o dispositivo constitucional,                 Congresso Nacional: o do já citado deputado
art. 5º, inciso XII, estabelece quais os órgãos                   Reginaldo Lopes (PT-MG); o projeto Transparência
competentes para executar, com autorização                        nas Contas Públicas, do senador João Capiberibe
judicial, a interceptação telefônica, e a ABIN não                (PSB-AP) e da deputada federal Janete Capiberibe
se enquadra nessa determinação legal.                             (PSB-AP), que tramita simultaneamente no Senado
                                                                  e na Câmara; e o da deputada Denise Frossard
                                                                  (PSDB-RJ), que obriga o governo a democratizar o
               ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                                       acesso ao Siafi. Uma das primeiras atividades pro-
    A partir de iniciativa da Abraji e com a partici-             postas para o Fórum de Direito de Acesso a Infor-
pação de representantes da OAB, Associação                        mações Públicas foi fazer um levantamento sobre
Brasileira de ONGs (Abong), Fenaj, Organização                    todos os itens legais que atentam contra a aber-
Transparência Brasil, ANJ e Projeto SOS Imprensa,                 tura prevista pela Constituição, mover uma Ação
foi realizado em Brasília nos dias 29 e 30 de se-                 Direta de Inconstitucionalidade para derrubar es-
tembro de 2003 o Seminário Internacional sobre                    ses itens e então encorajar os congressistas a subs-
Direito de Acesso a Informações Públicas. Uma das                 tituir esse vácuo legal por legislações mais afins
resoluções do seminário foi a proposta de consti-                 do direito de acesso.
tuição de um fórum permanente para discussão e                        O importante estudo feito pela Organização
encaminhamento de propostas relativas ao direi-                   Transparência Brasil salienta as dificuldades que
to de acesso a informações públicas e sobre te-                   ainda restam no campo da legislação referente ao
mas correlatos, como alterações na lei de arqui-                  acesso a informações públicas e governamentais
vos públicos. Esse fórum foi criado na reunião pro-               no Brasil: “Nos últimos dez anos, avançou-se mais na
movida pela Abraji no dia 25 de novembro de 2004,                 regulamentação do segredo governamental e dos pro-
em Brasília. O Fórum do Direito de Acesso a Infor-                cedimentos de segurança de informações (principal-
mações Públicas reúne 18 entidades da sociedade                   mente graças aos Decretos6 2.134/97 e 2.910/98) do
civil em torno da proposta de encorajar o gover-                  que na regulamentação do direito à informação e do
no a tomar medidas de abertura dos arquivos “da                   acesso aos registros governamentais. Por isso, é preciso
ditadura, da democracia e da monarquia”, como                     reconhecer que ainda temos um longo caminho pela
discutido em seu fórum de discussões na internet.                 frente se quisermos garantir o direito dos cidadãos à


6. O decreto 2.134, de 27.1.97 (Documentos Públicos Sigilosos) regulamenta o art. 23 da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991,
que dispõe sobre a categoria dos documentos públicos sigilosos e o acesso a eles e dá outras providências. Já o decreto 2.910 de
29.12.98 (Normas para Salvaguarda de Documentos, Materiais, Comunicações e Sistemas) estabelece normas para a salvaguarda
de documentos, materiais, áreas, comunicações e sistemas de informação de natureza sigilosa e dá outras providências.



32
informação no Brasil”.                                    mações públicas e encaminhar propostas a con-
    Ainda segundo o relatório, a apropriação de           gressistas interessados no assunto. A publicação
papéis historicamente públicos por algumas em-            de três fotografias antigas de um homem calvo
presas privadas tende a complicar um pouco o              em situação vexatória fez com que importantes
acesso às informações de interesse público: “A re-        entidades da sociedade civil, como o movimento
cente tendência à privatização de muitas funções          Tortura Nunca Mais e a OAB, reclamassem a aber-
públicas trouxe outras complicações. Enquanto             tura dos arquivos da ditadura. Como não há lei
antigamente as responsabilidades referentes à             clara sobre acesso a documentos, não é possível
prestação de contas (accountability) eram claramente      saber exatamente o que continua vedado ao aces-
delineadas e determinadas, hoje em dia muitas funções     so da população – sejam documentos da ditadura
da administração pública são exercidas por entidades,     ou de outros períodos. Uma nota do governo reti-
sobretudo empresas privadas, que não sentem               ficando a identidade do homem retratado (o pa-
necessidade de prestar contas ao público geral. Elas se   dre canadense Leopold D’Astous), porém, deixou
julgam meros clientes do governo. Dessa maneira, mui-     a entender que há muitos arquivos ainda desco-
tas informações são retidas sob o pretexto de se tratar   nhecidos. Gradualmente, foram surgindo informa-
de informações comerciais e, portanto, confidenciais”.    ções e condições políticas que levaram o governo
    Em outubro de 2004, a polêmica sobre as ima-          a admitir a existência de arquivos da ditadura e a
gens que supostamente mostrariam as últimas               alterar o Decreto 4.553/02, criando uma comissão
horas de vida do jornalista Vladimir Herzog, morto        presidencial de análise dos documentos. Ainda não
em 1975 no DOI-CODI (órgão de repressão da                é exatamente um aceno quanto a uma lei de direi-
ditadura militar), reabriu na sociedade e na              to de acesso – o debate ainda está muito centrado
imprensa o debate sobre a abertura dos arquivos           na abertura de documentos sobre abusos ocorri-
da ditadura militar. Foram realizados ao final de         dos no período da ditadura. Mas existe um “caldo
2004 dois encontros, promovidos pela Abraji, no           de cultura” que permite a gradual ampliação do
Rio e em Brasília, para debater o acesso a infor-         debate.




                                                                                                        33
A 4 - Acesso a informações empresariais, de modo abrangente
e rápido, quando relevantes para o interesse público.
A 4.1 - Legislação/regulamentação sobre quebra de sigilo corporativo, além das
informações financeiras básicas, de modo a incluir informação disponível das
corporações que terão influência sobre políticas públicas e o interesse público.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                              público leigo, fazendo com que a publicação não
                                                         passe, por vezes, de formalidade. Além disso, é
    A Lei 6.404, de 1976, que regula as companhi-        prática comum hoje no Brasil o uso de empresas
as e sociedades anônimas, prevê a publicação de          offshore para a realização de transações, deixan-
seus balanços anuais no Diário Oficial do estado         do-as sujeitas a legislações de paraísos fiscais ou
no qual têm sede e num jornal de grande                  simplesmente desreguladas.
circulação. Além disso, a lei prevê outras
obrigações de transparências, como no parágrafo
4º de seu artigo 157: “os administradores da             PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
                                                                              ATORES
companhia aberta são obrigados a comunicar imedi-
atamente à bolsa de valores e a divulgar pela imprensa       As Imprensas Oficiais têm aparecido como ato-
qualquer deliberação da assembléia-geral ou dos órgãos   res destacados no cenário de defesa da transpa-
de administração da companhia, ou fato relevante         rência       das     informações        corporativas.
ocorrido nos seus negócios, que possa influir, de modo   Recentemente, a Associação Brasileira de Impren-
ponderável, na decisão dos investidores do mercado       sas Oficiais se manifestou favoravelmente à apro-
de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela   vação do Projeto de Lei 3.741 (ver abaixo, em Ten-
companhia”.                                              dências Atuais e Futuras tal como está, reforçando
                                                                            Futuras)
    As sociedades limitadas, no entanto, estão fora      a importância das sociedades limitadas estarem
dessas regras, e essa tem sido uma estratégia para       também sujeitas a obrigação da publicação dos
fugir da obrigação de transparência. No entanto,         balanços.
o novo Código Civil brasileiro, em vigor desde               O Instituto Ethos de Responsabilidade Empre-
2003, consagra a figura da empresa como                  sarial reúne centenas de grandes empresas, bus-
irradiadora de direitos e obrigações, independen-        cando criar marcos e indicadores de responsabili-
temente de ser sociedade anônima ou limitada.            dade empresarial. No ano de 2003, seus associa-
    É importante notar que o Código de Defesa do         dos tiveram que responder às seguintes questões:
Consumidor (Lei 8.078/90), ao impor uma política             Com relação à elaboração de relatório sobre os
nacional das relações de consumo pautada pelos           aspectos econômicos, sociais e ambientais de suas
princípios da transparência e da harmonia,               atividades, a empresa:
determina aos fabricantes e fornecedores o dever             - Elabora sem regularidade definida relatório com
de garantir ao consumidor as informações                 informações sobre suas ações sociais e ambientais.
desejadas. Esse artifício configura-se como                  - Elabora um relatório anualmente, descrevendo
instrumento de acesso a informações empresari-           suas ações sociais e ambientais e incorporando aspectos
ais de interesse público. Também as novas práti-         quantitativos.
cas da chamada “governança corporativa” pare-                - Produz um balanço social que aborda aspectos
cem acrescentar elementos de transparência, em-          sociais, ambientais e econômicos de suas atividades,
bora careçam de base legal constituída.                  contendo exclusivamente resultados favoráveis e sendo
                                                         facilmente acessível.
                                                             - Produz um balanço social que integra as dimen-
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                            sões sociais, ambientais e econômicas de suas
                                                         atividades, elaborado com amplo envolvimento interno
   Como já dito, as grandes empresas limitadas           e de stakeholders externos, e facilmente acessível.
não têm a obrigação da publicação de seu balan-              - Não havíamos tratado antes deste assunto.
ço, o que torna extremamente árdua a tarefa de               - Não vemos aplicação disto em nossa empresa.
conseguir informações a seu respeito. Já no to-          (Justifique.)
cante às sociedades anônimas, a publicação é fei-            Além dessa questão, existem mais cinco outras
ta, mas muitas vezes é incompreensível para o            para as quais os empresários tiveram que respon-


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der sim ou não:                                             5. A empresa disponibiliza dados sobre aspectos
    1. Ao publicar informações sobre aspectos soci-     econômico-financeiros, sociais e ambientais de suas
ais e ambientais de seu desempenho, a empresa inclui    atividades na internet?
dados desfavoráveis e discute pendências?
    2. As informações sobre a situação econômico-
financeira das atividades da empresa são auditadas                 ATUAIS
                                                        TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
por terceiros?
    3. As informações sobre aspectos sociais e             O Projeto de Lei 3.741, encaminhado pelo
ambientais das atividades da empresa são auditadas      Executivo em 1997, busca estender a obrigação
por terceiros?                                          de publicação dos balanços às limitadas de gran-
    4. No processo de elaboração e/ou lançamento        de porte. O projeto prevê ainda a uniformização
do balanço social, a empresa envolve pelo menos três    das regras de elaboração de balanços de acordo
dos seguintes stakeholders: comunidade, público in-     com padrões nacionais e internacionais da
terno, consumidores e clientes, fornecedores, governo   contabilidade, tornando mais claras e
e sociedade em geral (por exemplo, por meio de orga-    compreensíveis as demonstrações financeiras das
nizações de defesa do meio ambiente, sindicatos,        empresas. No entanto, existem diversas emendas
organizações voltadas para a saúde pública ou defesa    propostas ao texto (que está em tramitação) que
dos direitos humanos etc.)?                             se aprovadas desfigurariam o seu objetivo
                                                        original.




                                                                                                       35
A 5 - Diversidade, pluralidade e acesso a mídias e
conteúdo, assegurando um amplo espectro de visões por
parte de todos os setores da sociedade, inclusive minorias
e grupos marginalizados, e a justa representação de todos
os grupos, inclusive mulheres, minorias e grupos étnicos.

A5.1- Legislação e medidas efetivas para impedir a concentração da propriedade
na mídia ou controles por parte de qualquer interesse setorial, indivíduo ou
entidade, incluindo:
      concentração da propriedade de um tipo de mídia em particular;
      propriedade cruzada entre mídias;
      propriedade cruzada da produção, disseminação de conteúdo e
componentes de infra-estrutura dos meios de comunicação;
      propriedade excessiva por parte de estrangeiros e empresas não-ligadas
ao setor de mídia.




BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                           de pessoas jurídicas e a abertura de um percentual
                                                      de até 30% para acionistas de capital não nacional.
    O inciso 5º do artigo 220 da Constituição esta-   "Art. 2º - A participação de estrangeiros ou de
belece que “os meios de comunicação social não        brasileiros naturalizados há menos de dez anos no
podem, direta o indiretamente, ser objeto de          capital social de empresas jornalísticas e de
monopólio ou oligopólio”. No entanto, não há lei      radiodifusão não poderá exceder a trinta por cento do
regulamentando este artigo. O que existe na le-       capital total e do capital votante dessas empresas e
gislação brasileira são limitações presentes em       somente se dará de forma indireta, por intermédio de
outras normas. O artigo 12 do Decreto Lei 236/        pessoa jurídica constituída sob as leis brasileiras e que
67, que alterou a Lei 4.117/62 (Código Brasileiro     tenha sede no País”, disciplina a Lei 10.610/02, que
de Telecomunicações), estabelece o limite de pro-     regulamentou a emenda.
priedade para cada entidade de: (a) quatro emis-         A abertura foi veementemente contestada por
soras de ondas médias e seis de freqüência modu-      grande parte da sociedade civil organizada e,
lada para radiodifusão de sons em nível local; três   como contrapartida, os parlamentares que a
emissoras de ondas médias e ondas tropicais em        aprovaram inseriram algumas chamadas
nível regional, sendo no máximo duas por cada         “garantias” para proteger a mídia nacional, como
estado; e duas emissoras de ondas médias de on-       a nova redação para o artigo 38 da Lei 4.117/62,
das curtas em nível nacional. (b) para radiodifu-     que passa a estabelecer que “os administradores ou
são de sons e imagens: dez emissoras em todo          gerentes que detenham poder de gestão e de
território nacional, podendo ser o máximo de cin-     representação civil e judicial serão brasileiros natos
co em VHF e duas por estado.                          ou naturalizados há mais de dez anos”, e que “a alte-
    Em relação ao controle da propriedade dos         ração dos objetivos sociais, a modificação do quadro
meios de comunicação por capital nacional, a Lei      diretivo, a alteração do controle societário das
4.117/62 estabeleceu que apenas brasileiros natos     empresas e a transferência da concessão, da permis-
ou naturalizados há pelo menos dez anos poderi-       são ou da autorização dependem, para sua validade,
am ser donos de uma concessão. Tal limitação se       de prévia anuência do órgão competente do Poder
manteve na Constituição Federal de 1988, mas a        Executivo”.
Emenda Constitucional 36, de 2002, alterou o             A restrição em relação a capital estrangeiro está
artigo 222 da Constituição permitindo a entrada       também nas normas que regulam a difusão de


36
sons e imagens por cabo no Brasil. A Lei 8.977/                  2001, pouco mais de 50% da audiência de TV aber-
95, que trata da cabodifusão no Brasil, estabele-                ta. Se somada à audiência da emissora SBT (Siste-
ceu que a concessão para distribuidoras de con-                  ma Brasileiro de Televisão), de quase 24%, nota-se
teúdo audiovisual via cabo só poderá ser dada a                  que apenas duas redes controlam 75% da audiên-
pessoa jurídica de direito privado que tenha “I -                cia de televisão aberta no Brasil. Em relação à dis-
sede no Brasil; II - pelo menos cinqüenta e um por               tribuição de verba publicitária, por exemplo, dados
cento do capital social, com direito a voto, pertencen-          do Projeto Inter-Meios9 mostram que a Rede Glo-
te a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez           bo, principal grupo de mídia do país, faturou, em
anos ou a sociedade sediada no País, cujo controle               2004, 79% do mercado publicitário brasileiro, con-
pertença a brasileiros natos ou naturalizados há mais            siderando os investimentos em TV aberta, o que
de dez anos". Entretanto, as regulamentações dos                 correspondeu naquele ano a R$ 8,2 bilhões de
sistemas de microondas (MMDS) e satélite (DTH)                   faturamento bruto. No mesmo ano, chegaram a
não se deram por meio de lei e não contêm                        R$ 13,5 bilhões as verbas publicitárias dos
restrição alguma à propriedade por estrangeiros.                 veículos que participam do Inter-Meios (que
    Para ambos os casos, é importante destacar que               representam cerca de 90% do faturamento total
tais limitações à presença de capital estrangeiro                da mídia brasileira).
são facilmente manipuladas, especialmente porque                     Os dados acima apresentados se referem ape-
a mesma emenda constitucional permite que as                     nas à concentração de propriedade horizontal (de
empresas se tornem sociedades anônimas (o que                    apenas uma mídia). O próprio exemplo do Grupo
antes era proibido). Isso faz com que haja espaço,               Globo demonstra como esta concentração se dá
por exemplo, para que empresas brasileiras co-                   também de forma vertical e cruzada. Hoje o gru-
muns detenham as emissoras na cota do “capital                   po possui emissoras de TV, jornais (que geraram
nacional”. A questão é que essas empresas podem                  de receita líquida, em 2002, de R$ 159,5 milhões),
também ter participação estrangeira, o que confi-                15 emissoras de rádio, participação nos grupos
gura o controle delas pelo capital estrangeiro.                  de televisão por assinatura Net e Sky, uma editora
                                                                 com 11 títulos de revistas, um portal eletrônico e
                                                                 duas gravadoras (Som Livre e RGE). No caso de
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                    sua atuação na cabodifusão, o grupo detém
                                                                 empresas que produzem conteúdo (como os canais
    Apesar do monopólio e do oligopólio serem                    SporTV, GNT, Multishow e GloboNews) e que o
proibidos pela Constituição Federal, a concentra-                distribuem (a operadora Net Brasil), além de
ção de propriedade dos meios de comunicação é                    participação acionária na empresa que controla
realidade no Brasil. Ela acontece atingindo                      toda a rede de cabos e infra-estrutura (Net Servi-
prioritariamente três esferas: a propriedade, a                  ços). Todo este complexo vem sendo usado tam-
audiência e a distribuição da verba publicitária.                bém pelo grupo para oferecer outros serviços,
    A maioria absoluta do sistema de mídia no Bra-               como Internet de banda larga (o novo serviço
sil é controlada por oito grupos (Globo, RBS, Abril,             Virtua).
Bandeirantes, SBT, Record, Folha, Estado). Destes,                   Outros exemplos podem ser tirados desde o
o Grupo Globo é o melhor exemplo do monopólio                    Norte (a TV e o jornal A crítica no Amazonas) até o
no país. Segundo dados apresentados pelo jorna-                  Sul do país (o grupo RBS é o segundo maior em
lista Samuel Possebom 7 em sua dissertação de                    faturamento do Brasil e possui a maior TV e o maior
mestrado, atualmente a Rede Globo chega a mais                   jornal da região, além de jornais menores, rádios
de 99,8% do território e da população brasileiros.               e um portal na internet). Na maioria dos estados,
São ao todo cinco emissoras próprias (com sede                   há grupos afiliados às principais cabeças-de-rede
nas cidades de São Paulo, Brasília, Rio de Janeiro,              que detêm emissoras de TV e rádio, jornal e por-
Belo Horizonte e Recife) e mais 108 emissoras afi-               tal de internet, como é o caso dos grupos Rede
liadas.                                                          Amazônica (região Norte), Edson Queiroz (Ceará)
    Em relação à audiência, dados divulgados pela                e Jaime Câmara (Goiás). Na grande maioria dos
Globopar8 revelaram que a TV Globo detinha, em                   casos, os grupos que controlam regionalmente a

7. POSSEBOM, Samuel Lamoglia. Globo e Abril diante de um novo paradigma comunicacional: a internet. Dissertação para
obtenção de título de mestrado no Programa de Pós-graduação da Universidade de Brasília, Brasília, 2002. Além do estudo, o
jornalista tem longa experiência no tema por conta do trabalho a frente de publicações especializadas sobre comunicação.
8. Holding do grupo Globo
9. O Projeto Inter-Meios é uma iniciativa do veículo Meio e Mensagem que atua no levantamento de dados referentes ao investi-
mento publicitário no país. Seu endereço na internet é www.projetointermeios.com.br



                                                                                                                           37
mídia estão diretamente ligados às oligarquias                    esteve sempre na pauta da sociedade civil
regionais. Este é um fenômeno que vem da for-                     organizada da área da comunicação. A partir da
mação do Brasil, com grupos familiares detendo                    década de 80, houve mobilizações que resultaram
o poder em determinadas regiões e o exercendo                     na criação da Frente Nacional por Políticas
em suas diferentes formas. A política foi a primei-               Democráticas de Comunicação e na articulação
ra e mais evidente. Os meios de comunicação são                   que apresentou as propostas da sociedade civil
outra dessas formas, reforçada com a expansão                     no processo de elaboração da Constituição Federal
das redes durante a década de 70.                                 em 88. Atualmente, existem inúmeras iniciativas,
    A legislação e a realidade brasileiras se apre-               mas que apresentam articulação frágil entre si.
sentam como dois elementos quase                                      Uma delas é o Fórum Nacional pela Democrati-
diametralmente opostos. Apesar da proibição do                    zação da Comunicação (FNDC), organização que
monopólio e da formação de redes, elas existem e                  reúne diversas entidades representativas. O FNDC
apresentam crescimento sempre centrado nas ca-                    já teve papel central como interlocutor da socie-
beças, que produzem o conteúdo e formulam as                      dade civil para os assuntos da área, especialmen-
bases de gestão. Ao mesmo tempo em que há o                       te na primeira metade dos anos 90. A atuação
princípio constitucional, não existe e nunca hou-                 destes atores na garantia de restrições ao mono-
ve uma política de controle da concentração de                    pólio teve sua maior efervescência, nos últimos
propriedade nos meios de comunicação. As cabe-                    anos, em 2002, quando foi aprovada a Lei 10.610/
ças produzem quase a totalidade do conteúdo                       02 (sobre capital estrangeiro, já citada anterior-
transmitido pelas retransmissoras, formando re-                   mente), e chegou a ser proposta uma nova
des com base em uma brecha da lei, mas mesmo                      legislação para a radiodifusão brasileira.
assim constituindo formação de monopólio indi-                        Há também iniciativas de enfrentamento direto
reto, o que contraria a constituição. O pesquisa-                 que concebem o combate ao monopólio, como o
dor Venício Artur de Lima10 explica:                              ato de fazer crescer a mídia alternativa e
    “Apesar do artigo 12 do Decreto Lei 236/67                    independente, caso do Centro de Mídia
estabelecer que ‘cada entidade só poderá ter con-                 Independente (www.midiaindependente.org) e
cessão ou permissão para executar serviço de ra-                  dos movimentos de rádios livres e comunitárias
diodifusão, em todo o país, dentro dos seguintes                  em todo o Brasil.
limites: (...) II - estações radiodifusoras de som e                  A manutenção da contradição entre a legisla-
imagem - 10 (dez) em todo o território nacional,                  ção e a realidade existe também pela forte organi-
sendo no máximo 5 (cinco) em VHF e 2 (duas) por                   zação e presença do empresariado de comunica-
estado; (...) § 7º - As empresas concessionárias ou               ção na definição das políticas do setor. Capitanea-
permissionárias de serviço de radiodifusão não                    do pela Associação Brasileira de Emissoras de Rá-
poderão estar subordinadas a outras entidades que                 dio e Televisão (Abert), que representa cerca de
se constituem com a finalidade de estabelecer di-                 duas mil das 3.232 emissoras de radiodifusão no
reção ou orientação única, através de cadeias ou                  país 11 , o setor continua forte, mas vem se
associações de qualquer espécie’ a norma legal se                 fragmentando e não atuando com a mesma
torna inócua porque, contrário a toda a evidên-                   unidade, comum nos anos anteriores. Outras
cia, o Ministério das Comunicações considera                      cabeças-de-rede, como Bandeirantes, SBT, RedeTV
‘entidade’ como significando ‘pessoa física’, não                 e Record, se desligaram da Abert e, após um
levando em conta o parentesco, e não considera                    período de indefinições, formaram a Associação
as ‘redes’ formadas com a ‘afiliação’ contratual de               Brasileira de Radiodifusores (Abra). O objetivo da
emissoras como constituindo subordinação ‘com                     nova entidade é representar as emissoras sem a
a finalidade de estabelecer direção ou orientação                 hegemonia da Rede Globo. Embora ocupe espaços
única’”.                                                          institucionais diversos, o empresariado sempre se
                                                                  unifica para manter a estratégia de promover e
                                                                  garantir a falta de políticas e regulação na área da
  PAPEL                ATORES
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                                     radiodifusão.
                                                                      Não tem havido por parte do Estado nenhuma
  A discussão sobre o monopólio dos meios de                      ação concreta no sentido de dirimir o problema
comunicação do Brasil já vem de longa data, e                     da concentração de propriedade, embora haja um


10. Professor aposentado da Universidade de Brasília e escritor de obras como “Mídia: Teoria e Política”, publicada pela Fundação
Perseu Abramo.
11. Segundo dados de seu sítio, www.abert.org.br



38
sistema de defesa da concorrência instalado, com     nas mãos de um só grupo. O processo ainda tem
três órgãos (Secretaria de Acompanhamento Eco-       que ser analisado pela Anatel e pelo Cade (Conse-
nômico, ligada ao Ministério da Fazenda, a Secre-    lho Administrativo de Defesa Econômica), que re-
taria de Direito Econômico, ligada ao Ministério     ceberam do Conselho de Comunicação Social (CCS)
da Justiça, e o Conselho Administrativo de Defesa    um relatório recomendando a não aceitação da
Econômica). Esses órgãos não têm, contudo, atu-      fusão.
ado no enfrentamento à concentração de proprie-         No mês de janeiro de 2005, o governo federal
dade, embora contem com todas as condições para      anunciou a intenção de elaborar durante o ano
isso.                                                uma Lei Geral de Comunicação de Massa. Ela seria
    Há também um outro empecilho ao fortaleci-       instrumento regulatório de toda a comunicação
mento da legislação para controle de proprieda-      eletrônica (rádio, TV aberta e TV paga) no Brasil,
de, advindo do fato de que há vários parlamenta-     incluindo mídias públicas, comunitárias e privadas.
res que são sócios de veículos de radiodifusão. No   No entanto, no decreto publicado em abril que
caso do Senado, estima-se que esse número che-       cria o Grupo de Trabalho Interministerial que
gue a 29 dos 81 senadores, embora seja difícil um    elaborará o projeto, constam como objeto da lei
dado preciso por conta da existência de registros    apenas os artigos 221 e 222 da Constituição, o
societários em nome de parentes. Assim, configu-     que significa que as limitações ao monopólio e ao
ra-se claro conflito de interesses, com os deputa-   oligopólio, presentes no artigo 220, podem ficar
dos e senadores legislando, muitas vezes, em cau-    de fora.
sa própria.                                             Também deverá ganhar corpo esse ano o pro-
                                                     cesso de digitalização da comunicação eletrônica,
                                                     que inclui TV e rádio, e apresenta possibilidades
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
           ATUAIS                                    de reorganização do espectro e de ampliação do
                                                     número de canais. O assunto será tratado com
   O ano de 2005 poderá trazer novos elementos       mais detalhes no indicador seguinte.
para esse quadro. Foi anunciada, no final de 2004,      Até o momento, contudo, não há, em nenhu-
a fusão da Sky com a DirecTV para operações na       ma dessas iniciativas, indícios de medidas que
América Latina, que, se concretizada, deixará 96%    venham incidir sobre o quadro de concentração
do mercado de TV por assinatura por satélite (DTH)   apontado anteriormente.




12. Sobre o CCS, ver item 6.3.



                                                                                                    39
A 5.2 - Um quadro legal que ampare a emergência de uma pluralidade de tipos
de canais e empresas em nível nacional e, quando apropriado, em níveis regionais
(internacional) e local: canais e empresas públicas, comerciais e comunitárias/
independentes, inclusive a alocação de modo transparente e igualitário do
espectro de radiofreqüências e outros bens públicos.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                 IMPLEMENTAÇÃO
                                                            IMPLEMENTAÇÃO

     Não há quadro legal que ampare a pluralidade               Há até hoje divergências entre teóricos e enti-
nos meios de comunicação social. Há um modelo               dades representativas do setor sobre o que seri-
de radiodifusão que supostamente deveria ser                am veículos públicos no país. Há um grupo de
constituído de forma complementar entre siste-              emissoras estatais, algumas com gestão mista (por
mas público, estatal e privado, mas que apresen-            meio de conselhos) que se reivindicam como
ta grandes contradições em seu marco regulatório            públicas, como a TV Cultura de São Paulo e a TV
e na aplicação das leis decorrentes deste. O artigo         Educativa do Rio Grande do Sul. Todas elas, entre-
220 da Constituição Federal afirma que "a mani-             tanto, dependem de verbas dos governos estadu-
festação do pensamento, a criação, a expressão e a          ais para funcionar. O sistema privado é tão
informação, sob qualquer forma, processo ou veículo,        consolidado que na disputa por estas concessões
não sofrerão qualquer restrição".                           há apenas empresas. Esta realidade é reforçada
     Um dos elementos para garantir a pluralidade,          pelo fator econômico presente na disputa, com o
o impedimento ao monopólio, já foi abordado no              sistema de leilões sendo utilizado para a defini-
indicador anterior (A 5.1). A área de radiodifusão          ção da entidade destinatária de canal ou
comunitária será abordada no item A 5.4. Resta-             freqüência, onde as condições técnicas e financeiras
nos uma pequena exposição sobre a legislação em             das pleiteantes aparecem como critério prioritário.
geral e as educativas. O artigo 223 da Constitui-               O incentivo, no entanto, não é somente à apro-
ção Federal estabelece que "compete ao Poder                priação das concessões por empresas, mas à ma-
Executivo outorgar e renovar concessão, permis-             nutenção destas à frente de cada um dos espaços
são e autorização para o serviço de radiodifusão            no espectro magnético. O inciso 3 do artigo 33 da
sonora e de sons e imagens, observado o princí-             Lei 4.117/62 estipula que “os prazos de concessão e
pio da complementaridade dos sistemas privado,              autorização serão de 10 anos para o serviço de
público e estatal", mas esta norma nunca foi regu-          radiodifusão sonora e de 15 anos para o de televisão,
lamentada, deixando o conceito de sistema públi-            podendo ser renovados por períodos sucessivos e iguais
co como uma expressão que não se concretiza.                se os concessionários houverem cumprido todas as
     Na Lei 4.117/62, está prevista a concessão de          obrigações legais e contratuais, mantido a mesma
emissoras educativas, que devem ser dadas prefe-            idoneidade técnica, financeira e moral, e atendido o
rencialmente a fundações de direito público.                interesse público”. A condição para a não renova-
Diferentemente das comerciais, as educativas                ção, colocada na mesma lei, é a desaprovação de
recebem permissões (e não concessões) do                    3/5 do Congresso Nacional por meio de votação
Executivo. O governo federal utilizou as emissoras          nominal, um critério que dificulta por demais
educativas para criar uma rede de emissoras esta-           qualquer mudança, já que, além de condicionar a
tais, com uma cabeça-de-rede (a TV Nacional, ligada         mudança a um quorum alto, obriga a
ao sistema de comunicação do governo, chamado               manifestação pública por parte dos parlamentares.
Radiobrás), e uma emissora por estado. O capítulo               Mesmo com todas estas amarras e facilidades
da mesma legislação ainda coloca como princípio             para os grandes grupos de mídia, o Executivo bra-
da programação das emissoras de rádio e televi-             sileiro, principalmente durante a gestão Fernando
são a produção audiovisual regionalizada: "art.             Henrique Cardoso, utilizou como moeda de troca
221. A produção e a programação das emissoras de            de favores políticos as retransmissoras (RTVs), que
rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios:       eram habilitadas para a produção de conteúdo mas
III - regionalização da produção cultural, artística e      dependiam apenas de uma permissão do Executi-
jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei".   vo. Em dezembro de 1996, pouco tempo antes da




40
votação da emenda que permitia a reeleição do                     cífico abordado neste capítulo, destaca-se a Asso-
Presidente da República no Congresso Nacional,                    ciação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas
foram distribuídas quase 400. Esta “facilidade” só                e Culturais (Abepec). Esta entidade reúne grande
foi proibida no Decreto 3.965, de 2001.                           parte das emissoras “educativas-estatais”13 do país
    Outro nó é a descentralização da produção de                  e de emissoras auto-denominadas “públicas”.
conteúdo nas diversas regiões do país. Apesar de                  Como já explicado anteriormente, o termo é evo-
estar prevista na Constituição Federal a                          cado por algumas destas (como a TV Cultura de
regionalização da produção artística, cultural e                  São Paulo e a TVE do Rio Grande do Sul) por haver
jornalística como princípio para a programação                    um modelo de gestão que, apesar de subordina-
das emissoras, o Projeto de Lei para regulamentar                 do ao Estado, tem como principal instância um
o artigo tramita no Congresso Federal há 14 anos,                 conselho com representantes da sociedade. A
e vem sendo alvo de diversos ataques de                           Abepec tem como grande mérito a organização
parlamentares ligados aos interesses do                           das emissoras para a formulação de diretrizes do
empresariado da área de comunicação (sobre esse                   que seria uma comunicação pública, que estão em
projeto, ver “Regionalização da produção                          constante debate e atualização e partem da carta
audiovisual”, a seguir). Outro ponto novamente                    de princípios de cunho humanista elaborada pela
contraditório em relação à Constituição Federal é                 entidade14.
o fato desta prever o sistema público de radiodi-                     Alguns atores da sociedade civil, como setores
fusão e não existir norma complementar alguma                     organizados dentro do campo sindical dos jorna-
que o regule.                                                     listas, vêm defendendo a inserção destes canais
    Há um elemento importante a ser menciona-                     de uso público na televisão aberta. O movimento
do. Um avanço foi obtido na lei que regulou a                     de audiovisual (capitaneado principalmente pelo
cabodifusão com a criação dos canais de uso pú-                   Congresso Brasileiro de Cinema, entidade que
blico: Universitário, Comunitário, TV Câmara, TV                  reúne produtores independentes, cineastas e
Senado. No entanto, a abertura destes canais, que                 trabalhadores do setor cinematográfico) tem se
dão voz a representações importantes da                           mobilizado de forma incisiva para garantir a apro-
sociedade e transparência a outros setores do                     vação do projeto que regulamenta a regionalização
Estado hoje sem espaço na televisão aberta brasi-                 da produção audiovisual (ver “Regionalização da
leira, ficou restrita a uma determinada faixa da                  produção audiovisual”, ainda neste capítulo).
população com poder aquisitivo para poder dis-
por de um serviço de televisão a cabo. Esses ca-
nais, de caráter extremamente relevante, estão                               ATUAIS
                                                                  TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
disponíveis para menos de cinco milhões de pes-
soas (3% da população), já que mesmo dentro do                       Digitalização da comunicação social eletrônica
sistema de TV por assinatura eles só constam das                     Apesar de ser de interesse dos empresários que
TVs a cabo, não sendo as TVs por satélites ou                     o sistema de mídia nacional não seja modificado,
MMDS obrigadas a retransmiti-los. Além deste                      a convergência tecnológica apresenta um cenário
problema, a alocação das emissoras mantidas com                   que pode gerar profundas mudanças no modelo
recursos públicos em um sistema de difusão pago                   das comunicações. No caso do Brasil, este proces-
configura bitributação para o cidadão brasileiro,                 so passa pela discussão sobre a digitalização da
que é obrigado a pagar se quiser ter acesso a essas               mídia eletrônica (TV e rádio). Mesmo no meio de
emissoras (TV Câmara, TV Senado, TVs das                          um fogo cruzado de pressões dos três maiores
assembléias legislativas estaduais e dos órgãos do                padrões do mundo (o norte-americano ATSC, o
Judiciário).                                                      europeu DVB e o japonês ISDB), o governo
                                                                  brasileiro optou por pesquisar a possibilidade de
                                                                  um “sistema” nacional (que pode, ou não, incluir
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
  PAPEL                ATORES                                     a confecção de um padrão de transmissão). Além
                                                                  da questão tecnológica, a discussão sobre o Siste-
    A briga pelo processo de democratização do                    ma Brasileiro de TV Digital (SBTV) passa por ou-
sistema de mídia nacional se apresenta em diver-                  tras esferas, como a política industrial inerente,
sas vertentes (já citadas no ponto anterior e tam-                as parcerias internacionais, as mudanças
bém a seguir no ponto A 5.4, que trata especifica-                regulatórias necessárias e os modelos de negóci-
mente dos veículos comunitários). No caso espe-                   os e de uso.
13. Utiliza-se este termo para designar aquelas que são educativas mas têm vinculação direta com o Estado.
14. Ver mais em www.abepec.org.br



                                                                                                                 41
Em relação a este último ponto (o modelo de        ministérios – tem como função estabelecer as di-
uso), o governo federal sinaliza que a prioridade      retrizes para a implementação da TV digital, acom-
do SBTVD é promover inclusão social, no sentido        panhar as pesquisas, tomar decisões sobre ques-
de estender serviços online e interatividade a uma     tões como o padrão tecnológico e supervisionar
vasta camada da população. O problema está no          o Grupo Gestor. O Grupo Gestor – formado por
fato de esta definição ainda estar colocada em ter-    sete ministérios, além do Instituto Nacional de
mos muitos genéricos.                                  Tecnologia da Informação (ITI) e Agência Nacional
    A mudança da TV digital traz a possibilidade       de Telecomunicações (Anatel) – deve executar as
de se efetivar um modelo de comunicação que            ações estabelecidas pelo Comitê de Desenvolvi-
caminhe no sentido da democratização, desde que        mento. Cabe ao Grupo Gestor definir prazos, pri-
haja um canal de retorno que permita a                 oridades de pesquisa e o montante de recursos a
transmissão de grande quantidade de dados sem          ser investido. Estão previstos investimentos de
altos custos. Com a possibilidade de compressão        cerca de 65 milhões de reais do Fundo de Pesquisa
dos dados transmitidos, é possível ter um maior        Tecnológica em Telecomunicações (Funttel). Cerca
número de canais dentro do espectro                    de 80 universidades foram habilitadas para
eletromagnético, o que abre espaço para que se         desenvolver o sistema brasileiro e 19 projetos
altere a distribuição de poder na radiodifusão         foram aprovados. As áreas de pesquisa são trans-
nacional. A implantação desse novo modelo              missão e recepção, codificação de canal e modula-
poderia criar um momento favorável para discutir       ção; camada de transporte; canal de interatividade;
a regulação das telecomunicações e a produção          codificação de sinais fonte; middleware; serviços e
de conteúdo no país, mas isso não tem acontecido       aplicações e conteúdo. O prazo para entrega dos
até o momento. Nada impede, por exemplo, que           resultados pelas universidades é dezembro de
essa compressão dos dados seja utilizada não para      2005, para que as decisões sobre a SBTVD sejam
a ampliação do número de canais (e conseqüente         tomadas no início de 2006.
democratização), mas seja cedida para as mesmas           O Comitê Consultivo tem como função ser um
emissoras atuais transmitirem em alta definição        espaço da sociedade civil e do setor privado para
ou em diferentes canais (como vários ângulos de        propor diretrizes, avaliar e dar mais transparência
um mesmo jogo de futebol).                             ao processo. Ele é formado por 23 instituições
    Há também outras questões estratégicas que         representantes do setor produtivo – telecomuni-
permanecem sem definição: (1) Haverá uma polí-         cações, eletroeletrônica, software –, de trabalha-
tica de estímulo e capacitação para a produção de      dores e da sociedade civil. Para fazer a compara-
conteúdo digital, especialmente para emissoras         ção entre os modelos, o Comitê pretende avaliar
não-comerciais? Haverá uma política de investi-        a questão econômica, a questão tecnológica e os
mentos para equipar efortalecer TVs educativas e       usos da TV digital. Cabe a ele também analisar o
universitárias? (2) Haverá um novo marco               marco regulatório e identificar necessidades de
regulatório que inclua as diversas plataformas         mudanças na legislação, adaptando-a à realidade
tecnológicas (TV aberta, TV por assinatura, radio-     digital da TV.
difusão sonora, operadoras de telefonia fixa e            Em relação às escolhas de padrão que ainda
móvel e Internet)? (3) Haverá garantias de que os      precisam ser feitas para a definição do modelo de
serviços interativos oferecidos sejam de utilidade     TV digital no Brasil, há duas opções distintas. Uma
pública (como governo eletrônico) e não sirvam         delas é a transmissão de conteúdo em alta defini-
apenas como ferramentas de consumo? (4) Será           ção (HDTV). Nesse caso, não há otimização do es-
garantido o equilíbrio de condições dos sistemas       pectro – cada canal que atualmente é ocupado por
público, estatal e privado quando houver a trans-      uma estação analógica passará a ser destinado a
ferência tecnológica? (5) Com um modelo nacio-         uma estação digital. Esse tem sido o modelo ado-
nal, haverá uma política de fomento à produção         tado, por exemplo, nos Estados Unidos. A outra
de sistemas, aparelhos e componentes para este         opção é a transmissão em qualidade standard
mercado? Em que termos serão negociados os             (SDTV) ou enhanced (EDTV). Cada canal atual po-
acordos internacionais e a transferência               derá ser transformado em até cinco, além de um
tecnológica com outros países?                         canal extra de retorno, para utilização de serviços
    Para definir o SBTVD, foram criadas três instân-   interativos. Essa opção tem sido a utilizada na
cias de formulação sobre o tema: Comitê de De-         maior parte da Europa e, ao que tudo indica, tam-
senvolvimento, Comitê Consultivo e Grupo Gestor.       bém deve ser a adotada no Brasil.
O Comitê de desenvolvimento – formado por 10



42
Digitalização no rádio                                    Engenharia de Televisão e Telecomunicações (SET)
    Embora esteja em uma etapa ainda embrioná-                   já realizaram estudos comparativos e optaram pelo
ria, a discussão sobre a digitalização do rádio tem              padrão Iboc. É cedo ainda para apontar qual dos
o mesmo foco do debate sobre o SBTVD: qual o                     padrões é melhor, mas é possível e necessário
padrão tecnológico a ser adotado. Órgãos do                      problematizar as motivações de cada grupo no
governo, universidades e entidades representantes                processo. É esperado que os radiodifusores defen-
do setor produtivo já estão estudando os padrões                 dam o padrão norte-americano, pois ele não mexe
existentes hoje, o norte-americano Iboc (In Band                 na disposição atual das concessões e é mais bara-
on Channel), o europeu Eureka e o japonês da ISDB-               to. A adoção do Eureka significaria um processo
Tsb. O primeiro trabalha com a transição para a                  de escolha de novas emissoras para a faixa que
difusão digitalizada dentro do espectro atual. O                 seria criada e geraria uma demanda de divulgação
segundo prevê a criação de uma nova faixa no                     do novo meio que é difícil de ser assumida por
espectro onde todas as emissoras transmitem de                   alguma das partes (empresários ou Estado).
apenas uma antena e possuem alcance igual. Já o
padrão japonês aproveita a sinergia com a TV                          Regionalização da produção audiovisual
digital, de forma a criar um novo universo de                        Em relação à regionalização do conteúdo vei-
comunicação.                                                     culado por radiodifusão de sons e imagens, há 14
    O rádio digital terá qualidade sonora melhor,                anos tramita no Congresso Nacional o Projeto de
principalmente na faixa de ondas médias (emis-                   Lei da deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ), hoje
soras AM), e possibilitará a transmissão, além do                identificado como PLC (Projeto de Lei da Câmara
som, de informações textuais e outros tipos de                   dos Deputados) 59/03, que regulamenta o inciso
dados. A recepção digital exige adaptação do equi-               III do artigo 221 da Constituição Federal. Inicial-
pamento transmissor e, portanto, investimento                    mente o PL propunha 30% de programação regio-
das emissoras de rádio. Considerando que, no Bra-                nal por dia entre as 7h e 24h. Depois das negoci-
sil, este veículo tem uma economia razoavelmen-                  ações durante a tramitação e de aprovação da
te frágil, já que compete com a televisão em volu-               matéria na Câmara, o projeto foi alterado profun-
me de verba publicitária, pesquisadores do tema                  damente, perdendo muito de seu espírito inicial.
não acreditam que a digitalização venha a acon-                      Segundo informações contidas no parecer da
tecer em pouco tempo no Brasil.                                  relatora Berenice Mendes sobre o PLC para o Con-
    Murilo César Ramos15 avalia que as vantagens                 selho de Comunicação Social16, o tempo de pro-
na qualidade da transmissão podem fazer com que                  dução regional da proposta atual foi reduzido de
o rádio digital seja mais interessante para trans-               30% da programação diária das redes para 22 ho-
missões na freqüência AM do que para a FM. Um                    ras semanais para emissoras que atendam áreas
dos fatores limitantes da AM é a baixa qualidade                 com mais de 1,5 milhão de domicílios com televi-
do som. Com a digitalização, será possível trans-                sores, 17 horas semanais para aquelas com menos
mitir em estéreo e com maior qualidade. Assim,                   de um 1,5 milhão e 10 horas semanais para as
esta faixa de freqüência – que tem como caracte-                 localidades com menos de 500 mil domicílios. "Ou
rística um alcance maior do que a FM – poderia                   seja, a exigência de 30% da programação diária
aumentar a penetração no público, transforman-                   regional foi reduzida para, de modo aproximado,
do seu modelo de negócio.                                        respectivamente 12%, 10% e 7% semanal", afirma
    Apesar da previsão de um processo demorado                   o parecer. O projeto irá agora para votação no
por especialistas e estudiosos, os empresários da                Senado Federal, ainda sob resistência dos empre-
comunicação já vêm se preparando para o deba-                    sários do ramo da comunicação social, que alegam
te. A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio                ser tal norma uma imposição.
e Televisão (Abert) e a Sociedade Brasileira de




15. Professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília e estudioso das políticas de comunicação no Brasil.
16. Órgão consultivo do Senado para assuntos relativos à área, que será analisado de forma mais aprofundada no indicador A6.



                                                                                                                           43
A 5.3 - Medidas efetivas para assegurar que canais e empresas públicas tenham
disponíveis financiamento e recursos adequados, especialmente em relação ao
noticiário e ao trato de assuntos atuais, de forma completamente independente
dos governos e não sujeita a interferências arbitrárias, e livre de regulamentações
desnecessariamente pesadas.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                        ingerência na linha editorial de emissoras em vá-
                                                                   rios estados, como em Minas Gerais (RedeMinas)
    Como mencionado anteriormente, não existe                      e no Mato Grosso do Sul (TVE MS).
de forma regulamentada a figura jurídica do que
seriam emissoras públicas. As que se auto-deno-                      PAPEL                ATORES
                                                                   O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
minam como tal são legalmente educativas liga-
das aos governos estaduais geridas por fundações                      A discussão sobre alternativas de financiamen-
de direito privado. A forma de financiamento é                     to das emissoras “públicas” tem acontecido den-
diferenciada e geralmente dentro do orçamento                      tro da Associação Brasileira de Emissoras Públicas,
de cada unidade da Federação, não existindo caso                   Educativas e Culturais (Abepec). É esta entidade
de vinculação direta a algum imposto ou outra                      que promove seminários e se constitui como
fonte de renda vinculada. As medidas efetivas para                 interlocutora destas emissoras em debates e
garantir o financiamento não existem; ao contrá-                   reivindicações institucionais como as expostas
rio, o que há são restrições às educativas, como                   abaixo. As próprias emissoras têm travado intensa
proibição do uso da publicidade como forma de                      disputa em seus estados com os executivos das
financiamento.                                                     unidades da federação, no sentido de aumentar
                                                                   sua receita, solicitação que até agora não alcançou
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                      sucesso nem mesmo no Estado de São Paulo, onde
                                                                   a TV Cultura tem tradição e reconhecimento.
    Esse cenário vem causando intenso debate den-
tro do setor de emissoras “públicas”. Vários semi-                 TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
                                                                              ATUAIS
nários e fóruns já foram realizados nos últimos
anos para discutir os rumos da radiodifusão pú-                        Foi realizado na cidade do Rio de Janeiro em
blica, com grande ênfase na questão do financia-                   junho de 2003 um seminário que discutiu os ru-
mento. A falta destas medidas se torna ainda mais                  mos das TVs públicas. Uma das pautas centrais foi
crítica diante do quadro de crise financeira que                   o problema do financiamento. Há setores dentro
vem tomando conta dessas emissoras. Uma das                        do movimento de TVs públicas que atuam para
saídas é a utilização da outras fontes de financia-                criar alternativas de financiamento que vão desde
mento, principalmente a publicidade, o que já                      a permissão e aumento da publicidade, passando
acontece em alguns casos. Como exemplo do                          pela prestação de serviços, até a adoção do mo-
sucateamento das emissoras, estima-se17 que, em                    delo inglês de contribuição direta da população.
2004, o montante de recursos oriundos de receita                   No entanto, apesar de ter sido constituída no Con-
própria18 da TV Cultura (maior emissora estatal/                   gresso Nacional uma Frente Nacional em Defesa
educativa do país) some R$ 38,4 milhões, mais de                   da TV Pública, ainda não há iniciativa conjunta
30% do orçamento do veículo previsto para o ano,                   sistematizada para propor normas que apontem
que pode chegar a de R$ 125 milhões. Uma alter-                    novas formas de financiamento.
nativa já proposta para o caso da TV Cultura foi a                     Desde 2004 vem sendo discutido dentro do
inclusão de uma taxa na conta de luz da popula-                    Banco Nacional para o Desenvolvimento Social
ção do estado. A iniciativa encontrou grande re-                   (BNDES) uma linha de financiamento para dívidas
jeição por se tratar de uma medida que atinge                      de curto prazo das empresas de comunicação, com-
igualmente pessoas em situações muito díspares                     pra de papel para a imprensa e aquisição de equi-
de renda.                                                          pamentos. A Abepec se movimentou e apresentou
    A falta de independência das emissoras                         pedido de linha específica para esse tipo de difusora,
educativas/estatais não se dá somente no âmbito                    solicitação para a qual o banco ainda não havia
do financiamento. Já foram feitas denúncias de                     dado resposta.

17. De acordo com informação publicada pelo jornalista Daniel Castro no jornal Folha de S. Paulo no dia 19 de abril de 2004.
18. Que incluem prestação de serviços, convênios, leis de incentivos fiscais e publicidade.


44
A 5.4 - Medidas efetivas que assegurem que empresas e canais comunitários e
sem fins lucrativos tenham recursos adequados, inclusive bens públicos como o
espectro de freqüências; estejam livres de interferências arbitrárias; sejam
transparentes, democráticos e participativos; e apóiem e tenham participação de
comunidades excluídas e marginalizadas.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                       tos que tenham sede na comunidade em questão.
                                                                  Tal instrução restringe extremamente os instrumen-
    A radiodifusão comunitária é regulada por duas                tos de geração de recursos das emissoras, impe-
leis no Brasil. A primeira é a Lei 9.612/98, que                  dindo seu crescimento e sustentabilidade.
dispõe sobre o serviço de radiodifusão de sons                        Há outros pontos que também merecem aten-
(rádio) comunitário e a segunda é a Lei 8.977/95                  ção, como a proibição da formação de redes, prá-
(que disciplina a atividade de cabodifusão no país),              tica disseminada nos meios comerciais e
que versa sobre a radiodifusão de sons e imagens                  educativos, e a definição para as rádios comunitá-
(televisão) tratando de alguns aspectos da TV co-                 rias de um só canal por município, que se localiza
munitária. A rigor, não há uma legislação para re-                em ponto na extremidade do dial. O Decreto
gular TVs comunitárias. O movimento de rádios                     2.615/98, que regulamentou a Lei 9.612/98, tem
comunitárias e livres tem posição bastante crítica                medidas mais restritivas ainda. Ele condiciona a
em relação à legislação que atinge a radiodifusão                 possibilidade de participação no conselho de
comunitária. O primeiro problema diz respeito às                  gestão do veículo à moradia dentro desta área de
punições previstas na legislação. O Código                        cobertura, além de definir quase 30 punições
Brasileiro de Telecomunicações estabelece, em seu                 extremamente rigorosas referentes às normas
artigo 70, pena de um a dois anos de detenção                     infringidas por uma emissora.
para a transmissão de conteúdo por meio do                            No bojo das discussões sobre a Lei 9.612, op-
espectro eletromagnético sem permissão. Já a Lei                  tou-se por retirar a radiodifusão de sons e ima-
Geral de Telecomunicações (9.472/97) estabelece,                  gens desta norma e restringi-la aos canais de
em seu artigo 183, pena de dois a quatro anos                     acesso público presentes na Lei 8.977/95, que
para quem “desenvolver clandestinamente                           regula os serviços de televisão a cabo. Foi definido
atividade de telecomunicação”.                                    que as operadoras do serviço de cabodifusão
    A Lei 9.612 materializa a concepção repressora                devem deixar um canal para fins da operação de
da legislação sobre o tema. Ela é extremamente                    radiodifusão de sons e imagens de caráter
limitada e comprometida com a manutenção da                       comunitário. Não houve nenhuma regulamenta-
hegemonia do sistema comercial na radiodifusão                    ção para a transmissão da TV comunitária em
brasileira19. A norma, em conjunto com o decreto                  sistema aberto, que poderia ser pensada pela
que a regulamenta, estabelece a potência de 25W                   utilização do UHF, que comporta 66 canais e não
para os transmissores das rádios e restringe a “co-               é aproveitado.
bertura” (área protegida da transmissão) a apenas
1 km de raio, definição restritiva, muito difícil de
ser cumprida até mesmo com transmissores fun-                     IMPLEMENTAÇÃO
                                                                  IMPLEMENTAÇÃO
cionando na potência baixa definida.
    A lei apresenta outros problemas centrais. Um                    No caso da radiodifusão comunitária, o pro-
deles é a relação desigual com as emissoras co-                   blema já está na própria legislação. A lei 9.612 foi
merciais estabelecida por meio da determinação                    construída com perfil restritivo, como já indica-
de que a interferência de uma rádio comunitária                   do, o que engendra uma aplicação rigorosa da le-
em uma comercial significa falta grave passível de                gislação, principalmente no que diz respeito à
fechamento, enquanto o inverso não constitui                      apreensão de todo e qualquer equipamento de
qualquer problema. Outro é a limitação dos mei-                   uma rádio fechada e à condenação dos seus ope-
os de sobrevivência estrutural e financeira da emis-              radores.
sora. A rádio não pode veicular publicidade, so-                     Há também uma armadilha no fato de que a
brando como instrumento apenas um apoio de-                       estrutura hoje disponível para a operação dos
nominado “cultural” e somente de estabelecimen-                   processos de pedidos de autorização (no âmbito


19. Ver alguns artigos no sítio da Rede Brasileira de Comunicação Cidadã, www.rbc.org.br/artigos.htm



                                                                                                                  45
do Ministério das Comunicações) não tem                ço). Além dela, ainda no âmbito nacional, existem
condição de encaminhá-los, incentivando a              outras entidades como: o Fórum Democracia na
ilegalidade. Ou seja, o Estado fecha as rádios sem     Comunicação, a Rede Brasil de Comunicação Cida-
discutir que grande parte delas pode estar “ilegal”    dã (RBC), a Associação Nacional das Rádios Comu-
pela própria morosidade do órgão responsável           nitárias Católicas (Ancarc) e a representação brasi-
pela análise dos processos. Hoje, existem quase        leira da Associação Mundial de Comunicação Co-
10 mil pedidos no Ministério das Comunicações,         munitária (Amarc). Na área de televisão comunitá-
que declarou publicamente ter condições de ex-         ria, constituiu-se recentemente uma entidade na-
pedir apenas 1.500 liberações por ano. Essa situ-      cional denominada Associação Brasileira de TVs
ação cria um contingente de rádios que podem           Comunitárias (Abracom).
passar mais de cinco anos na “ilegalidade” por             Esse quadro com variadas entidades foi
culpa do Executivo Federal e provavelmente se-         provocado por sucessivos desentendimentos po-
rão fechadas se forem descobertas pelo órgão res-      líticos dentro do movimento de radiodifusão co-
ponsável pela fiscalização, a Agência Nacional de      munitária. No último ano, as diferentes frentes do
Telecomunicações (Anatel). A gravidade da situa-       movimento retomaram o diálogo conjunto, em
ção se expressa na comparação do número de             virtude da possibilidade anunciada pelo governo
rádios legalizadas com o número de rádios fecha-       de uma Conferência Nacional de Radiodifusão Co-
das. Enquanto há cerca de 2.300 rádios20 já auto-      munitária (ver ainda neste capítulo).
rizadas desde o início do processo de legalização,         As rádios comunitárias vêm sendo usadas tam-
em 1998, segundo a Associação Mundial de Radi-         bém para potencializar a ação dos movimentos
odifusão Comunitária (Amarc), o número de rádi-        sociais. O caso mais exemplar é do Movimento
os fechadas pela fiscalização entre o início de 2002   dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que
e março de 2004 chegava a 8.474.                       possui uma rede de aproximadamente 30 rádios
    Em 2003, foi montada uma força tarefa para         espalhadas em seus assentamentos em todo o país.
agilizar a análise dos processos. Esta ação teve       Segundo informações da coordenação do
resultados positivos, mas não gerou a conseqüê-        movimento, as rádios do MST “são uma ferramenta
ncia mais necessária para a resolução do proble-       para fazer o debate com a sociedade e com a nossa
ma: a ampliação da estrutura responsável pelo trâ-     base sobre o modelo de desenvolvimento para o
mite dos processos. Outro ponto que atrapalha a        campo e também divulgar as conquistas da
dinamização dos processos é o fato de cada pedi-       reforma agrária”. Cada coletivo da rádio organiza
do de concessão ter de passar pelas comissões de       seus temas de trabalho de acordo com as linhas
Comunicação da Câmara dos Deputados e de Edu-          gerais do MST.
cação do Senado Federal. O trâmite dos processos           No campo empresarial, é importante destacar
incha a pauta das comissões e, ao mesmo tempo,         a Associação Brasileira de Empresas de Rádio e
é pouco célere por depender delas. Um dos nós          Televisão (Abert). A entidade representava até bem
da aplicação da já restritiva Lei 9.612 é a alocação   pouco tempo, como visto anteriormente, grande
de freqüências para as rádios comunitárias. Até        parte das empresas de comunicação do país. Ela
2004, ainda não havia sido definido um canal para      teve papel determinante na elaboração da Lei
as rádios comunitárias de São Paulo, município         9.612/98, assumindo a função de interlocutora tan-
com mais rádios no país. Portanto, além da legis-      to com o Executivo quanto com os deputados e
lação repressiva, há o problema de indefinições        senadores, apresentando as posições dos empre-
por parte do poder público acerca de regulamen-        sários que formam o sistema comercial, posições
tações específicas.                                    estas que, analisando o resultado, foram vitorio-
                                                       sas na discussão sobre a regulamentação da radi-
                                                       odifusão comunitária. A Abert tem trabalhado com
  PAPEL                 ATORES
O PAPEL DOS DIEFERENTES ATORES                         a denúncia das rádios que funcionam sem autori-
                                                       zação legal, chegando a encaminhar cerca de 50
    A situação precária da radiodifusão comunitá-      casos por mês à Anatel.
ria ainda é amplificada pela fragmentação das or-          No âmbito do Estado, o Ministério das Comu-
ganizações que atuam neste campo. Atualmente,          nicações, nas últimas gestões, tem tomado pou-
há uma entidade que se reivindica representante        cas medidas em relação à falta de celeridade no
das rádios comunitárias em nível nacional, a As-       andamento dos processos de abertura de rádios.
sociação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abra-      Foi criada, no entanto, uma força-tarefa por meio

20. Dados da Agência Nacional de Telecomunicações.


46
de um Grupo de Trabalho Interministerial para        ria. A presença da Internet, que se apresenta como
tentar encaminhar a questão. O prazo para esse       alternativa ao problema do limite físico do espec-
grupo encaminhar as sugestões de mudanças nos        tro eletromagnético, vem crescendo dentro das
processos e na legislação é agosto de 2005. Já a     rádios comunitárias tanto para a troca de infor-
Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel),       mações quanto para ser um meio de divulgação
vem, pelo contrário, sendo extremamente eficien-     para fora do seu raio de alcance. Ainda no seio
te no fechamento das rádios “ilegais”, processo      dessa discussão, a digitalização da comunicação
no qual conta com a ajuda da Polícia Federal, que    social eletrônica vem ganhando espaço no Brasil,
promove apreensões e fechamentos de rádios.          mas principalmente ainda no âmbito da televisão.
                                                         Em relação ao financiamento destes veículos,
                                                     tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de
           ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                          Lei 3.269/04, do deputado Edson Duarte (PV-BA),
                                                     que institui Fundo de Apoio à Radiodifusão Co-
    Há, atualmente, no Congresso Nacional, cerca     munitária. O fundo seria constituído de recursos
de 900 ações (propostas de emendas, substitutivos    do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações
etc.) que têm como objetivo algum tipo de altera-    (Fistel), de doações e dotações orçamentárias. Ele
ção na Lei 9.612. No entanto, não há perspectiva     teria como objetivo financiar a manutenção e aqui-
de sistematização de todas estas propostas de for-   sição de equipamentos; implantação e moderni-
ma a fomentar um debate mais amplo sobre esta        zação de sistemas de transmissão; construção,
norma e seu impacto na radiodifusão comunitá-        aparelhamento e reforma de estúdios e laborató-
ria. Há também o Projeto de Lei 2701/97, do          rios destinados à produção de programas e
deputado Fernando Ferro (PT-PE), que propõe a        vinhetas da emissora; programas de bolsas para
veiculação em sistema aberto dos canais              formação de profissionais e consultoria técnica
comunitários de televisão.                           especializada; e treinamento técnico.
    Do ponto de vista da organização da sociedade        O deputado Edson Duarte também apresentou
civil, é importante ressaltar as discussões acerca   um projeto de lei que revoga o artigo 183 da Lei
da construção de uma Conferência Nacional de Co-     Geral de Telecomunicações (9.472/97).
municação Comunitária. A proposta ainda está         Indevidamente, o artigo é usado pela Anatel e
sendo debatida por apenas parte das entidades        Polícia Federal nas ações de repressão às rádios
que compõem o movimento de rádios comunitárias       comunitárias. Cerca de mil pessoas já foram
e está sendo articulada em parceria com o Banco      indiciadas em inquérito policial por causa desse
do Brasil, como órgão financiador. Os objetivos      dispositivo. Na opinião de alguns juristas, o arti-
deste fórum ainda não foram definidos e não há       go 183 não se aplica às emissoras comunitárias
clareza sobre o que pode acontecer em relação a      por ser serviço de radiodifusão, e não de teleco-
ele.                                                 municações. "Existe, porém, uma vontade políti-
    Assim como no resto do mundo, o processo de      ca de reprimir um direito sagrado do povo, que é
convergência tecnológica está na pauta dos ato-      o de se comunicar. Temos aqui uma agressão à
res envolvidos na área de radiodifusão comunitá-     liberdade de expressão", diz o deputado.




                                                                                                    47
A 5.5 - Obrigações regulatórias aplicáveis sobre empresas e canais comerciais,
inclusive difusores, quando apropriado, para assegurar o cumprimento dos
requisitos da prestação de serviço público.




BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                              TV; III- a fiscalização do serviço, em todo o território
                                                         nacional; IV - a resolução, em primeira instância, das
   Há pouquíssimo ou quase nada estabelecido             dúvidas e conflitos que surgirem em decorrência da
no que se refere a disposições nas normas que            interpretação desta Lei e de sua regulamentação. V -
definam as obrigações para assegurar o                   os critérios legais que coíbam os abusos de poder
cumprimento dos requisitos da prestação de               econômico no serviço de TV a Cabo ; VI - o
serviço público. O público, na legislação brasileira,    desenvolvimento do serviço de TV a Cabo em regime
aparece muito mais como premissa genérica do             de livre concorrência; VII - o estabelecimento de
que como conceito que se materialize nas tais            diretrizes para a prestação do serviço de TV a Cabo
obrigações. Desta forma, a análise sobre a               estimulem e incentivem o desenvolvimento da indústria
veiculação de conteúdo de interesse público passa        cinematográfica nacional e da produção de filmes,
a ser pouco objetiva e depende muito dos                 desenhos animados, vídeo e multimídia no País”.
instrumentos de análise e controle dos meios de              No entanto, não há, para o sistema aberto,
comunicação (que serão melhor abordados no               nenhum mecanismo de controle ou qualquer ór-
atributo A6), que também são praticamente                gão a que o cidadão possa se remeter para apon-
inexistentes.                                            tar irregularidades. No caso da TV a cabo, previu-
   Se analisadas as finalidades dos meios, regula-       se em lei que todas as regulamentações e posteri-
das na prática através do estabelecimento de por-        ores mudanças teriam antes que ser submetidas
centagem em relação à totalidade da programa-            ao parecer consultivo do Conselho de Comunica-
ção, vemos que a própria legislação aponta para a        ção Social (analisado no atributo A6). Isso não
não realização da prestação de serviço público. O        garante, todavia, nenhum espaço para o aponta-
Decreto 52.795/63, que regulamentou o Código             mento de irregularidades.
Brasileiro de Telecomunicações, coloca a possibi-            Como única alternativa para denúncias públi-
lidade de publicidade na programação em um               cas está o Ministério Público, tornado indepen-
percentual cinco vezes maior do que a exigência          dente do sistema judiciário em 1988, que acolhe
de conteúdo educativo e noticioso. “Art. 28 - As         as denúncias dos cidadãos e trabalha pela promo-
concessionárias - permissionárias de serviços de         toria dos direitos.
radiodifusão, além de outros que o Governo julgue
convenientes aos interesses nacionais, estão sujeitas
aos seguintes preceitos e obrigações: 12 - na            IMPLEMENTAÇÃO
                                                         IMPLEMENTAÇÃO
organização da programação: c) destinar um mínimo
de 5% (cinco por cento) do horário de sua programação       O contra-senso da legislação citada (sobre a
diária à transmissão de serviço noticioso; d) limitar    relação entre publicidade permitida e programação
ao máximo de 25% (vinte e cinco por cento) do horário    educacional e noticiosa exigida) é ainda mais
da sua programação diária o tempo destinado à            explorado pelas grandes emissoras. O
publicidade comercial; e) reservar 5 (cinco) horas       merchandising já é prática comum em todas as
semanais para a transmissão de programas                 emissoras comerciais e está em quase todos os
educacionais”.                                           programas de entretenimento (novelas, shows de
   A lei que regula o sistema de TV a cabo (8.977/       auditório etc.), não tendo sido computado como
95) prevê a normatização ou determinação pelo            publicidade para efeito do controle estabelecido
Poder Executivo dos seguintes elementos: “I - os         pela lei. Já os programas educacionais são
parâmetros técnicos de qualidade e desempenho da         transmitidos sempre em horários de pouca
execução e exploração do serviço; II - os requisitos     audiência, como a madrugada e o início do dia.
para a integração, efetiva ou potencial, ao Sistema         Um dos poucos recursos para protestar contra
Nacional de Telecomunicações, do serviço de TV a Cabo    o conteúdo de baixa qualidade é o Ministério Pú-
e das redes capacitadas para o transporte de sinais de   blico, órgão do sistema de Justiça e segurança



48
pública formado pela Procuradoria Geral da Repú-                  luta pela garantia do cumprimento do serviço
blica e por escritórios estaduais. O Ministério Pú-               público é a campanha “Quem financia a baixaria é
blico recebe denúncias que, conforme sua validade                 contra a cidadania” (www.eticanatv.org.br), uma
jurídica, são encaminhadas via ação civil pública                 iniciativa da Comissão de Direitos Humanos da
aos tribunais. Por meio dele, várias ações de exa-                Câmara dos Deputados. A campanha funciona por
geros e mau uso do espaço de veiculação em ca-                    meio de uma articulação de entidades (que já está
nais de emissoras já foram movidas contra as                      em 17 estados) e de uma coordenação que recebe
empresas de mídia. É o caso da falsa entrevista                   e sistematiza denúncias de abusos na programação
com um grupo pertencente à organização crimi-                     veiculada, divulgando periodicamente “rankings
nosa denominada PCC (Primeiro Comando da Ca-                      da baixaria” e atuando junto aos anunciantes para
pital) forjada pelo programa de entretenimento                    propor a retirada de apoio aos programas
“Programa do Gugu”, onde a farsa foi descoberta.                  considerados abusivos. Com dois anos de
O programa foi punido com suspensão temporá-                      funcionamento, a campanha já conseguiu criar um
ria de exibição e o apresentador, multado. Outra                  debate público sobre a qualidade da programação.
iniciativa é a reação do MP em apoio à campanha                       A campanha tem pressionado o parlamento
“Quem financia a baixaria é contra a cidadania”                   para a aprovação de Projeto de Lei 1.600/03 de
(que será abordada mais à frente) de propor acordos               autoria do coordenador da iniciativa, o deputado
com as emissoras para que estas retirem do ar                     Orlando Fantazzini (PT-SP), que institui um códi-
programas policiais de cunho apelativo. No                        go de ética para a programação televisiva, com
entanto, estes casos são raros devido à precarie-                 princípios como isenção, exatidão e respeito aos
dade da legislação que os embasaria.                              direitos humanos. Apesar da campanha ser uma
    Um dos avanços no cumprimento do serviço                      iniciativa que tem conseguido minimamente
público dos meios vem sendo a nova política da                    capilarizar o debate sobre o controle público dos
Radiobrás, empresa estatal de comunicação do                      meios, ela constrói seus parâmetros a partir de
Executivo. Na gestão atual do governo federal, sob                denúncias do público que não dependem de crité-
a presidência do jornalista e pesquisador Eugênio                 rio algum, muitas vezes se baseando numa inter-
Bucci, a Radiobrás e seus veículos têm desenvol-                  pretação moral subjetiva.
vido uma comunicação que vem se aproximando                           A Radiobrás, empresa ligada à Secretaria de
mais do caráter público. Embora faça uma                          Comunicação e Gestão Estratégica do Governo
comunicação estatal, o processo de “publicização”                 Federal (Secom), opera cinco estações de rádio,
da Radiobrás tem se manifestado tanto no con-                     dois canais de televisão, uma agência de notícias,
teúdo editorial quanto na formulação deste, que                   uma radioagência e um serviço radiofônico via
em alguns casos tem se utilizado de conselhos                     satélite. Sua agência e sua radioagência, que tra-
para dar maior permeabilidade à sociedade na                      balham no sistema copyleft (o conteúdo pode ser
definição das pautas. Em diversos momentos, a                     reproduzido com a citação da fonte) atingem um
empresa pratica um jornalismo não vinculado ao                    número muito grande21 de veículos, principalmen-
Estado, apresentado olhares críticos e                            te no interior do país. Assim como ela, as já cita-
contrapontos em relação às versões do governo.                    das emissoras estatais-educativas reunidas na
A TV Nacional, emissora estatal aberta, apresen-                  Associação Brasileira de Emissoras Públicas,
tou, em 2005, nova programação baseada na                         Educativas e Culturais (Abepec) também vêm
veiculação do conteúdo produzido nas emissoras                    atuando para garantir a prestação de serviço
estatais-educativas de todos os estados, priman-                  público.
do pela diversidade. Mas mesmo dentro do                              No campo da comunicação universitária, des-
sistema de emissoras estatais-educativas se                       de 2000, as emissoras ligadas a estas instituições
materializa o poder político e cultural de São Paulo,             se organizam por meio da Associação Brasileira
representado na TV Cultura como cabeça-de-rede                    de Televisão Universitária (ABTU). Segundo dados
das emissoras deste tipo.                                         da entidade, existem 49 canais22 controlados por
                                                                  instituições de ensino superior e mais de 100
                                                                  universidades produzindo algum tipo de conteú-
  PAPEL                ATORES
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                                     do em vídeo. Embora seja possível comemorar o
                                                                  rápido crescimento do setor de TVs universitárias,
   Uma ação que vem mostrando resultados na                       é importante registrar a crítica que já é feita há
21. Não há dados que comprovem o número exato de veículos que usam o conteúdo produzido pela Radiobrás.
22. Estes canais não são apenas os previstos na Lei da Cabodifusão. Há casos de canais de TV aberta, como a TV Universitária de
Recife (PE).



                                                                                                                            49
anos principalmente pela Executiva Nacional dos        regulação no projeto a ser encaminhado ao Con-
Estudantes de Comunicação Social (Enecos) de que       gresso, mantendo apenas a idéia de uma agên-
estas TVs têm realizado um tipo de comunicação         cia de fomento. Foi anunciada, então, a propos-
mais institucional do que pública.                     ta de que o processo de regulação seja tratado
    No âmbito do Judiciário, a atuação do Ministé-     numa Lei Geral da Comunicação de Massa, que
rio Público tem sido articulada principalmente em      cobriria não apenas a produção de conteúdo
torno das Procuradorias Federal e Regionais dos        audiovisual, mas todas as etapas relacionadas à
Direitos do Cidadão (PFDC e PRDCs). Está sendo         produção, distribuição e infra-estrutura de toda
criado um grupo dentro deste órgão no intuito de       a comunicação de massa no país. O projeto ori-
unificar a atuação do MP nos casos de abusos nos       ginal da Lei do Audiovisual não fazia menção à
meios de comunicação. Este grupo já está               radiodifusão sonora e à televisão pública e aca-
estabelecendo diálogo com emissoras com o              bava mantendo a separação entre conteúdo, dis-
objetivo de tirar programas policiais do ar.           tribuição e estrutura.
                                                           O debate da Lei do Audiovisual evidenciou a
                                                       força dos empresários (não somente os
           ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS FUTURAS                              radiodifusores, mas também os exibidores), que
                                                       intensificaram as críticas com o objetivo de dimi-
   O Ministério da Cultura apresentou, em 2004,        nuir toda a taxação e punição para os abusos eco-
um projeto de lei para o Audiovisual. A proposta       nômicos. Esta pressão já teve resultado, provo-
tem o objetivo de fazer a regulação do conteúdo        cando alterações na proposta do governo federal,
independente do meio de comunicação, além de           como a diminuição da taxação sobre a publicida-
estipular taxas sobre cópias de produções              de de 4% para 3% e sobre filmes com mais de 300
estrangeiras e anunciantes de publicidade, com         cópias de R$ 600 mil para R$ 50 mil, além da
intuito de criar um fundo para o desenvolvimento       alteração do valor máximo das multas, que che-
de todo o setor. Ela define um sistema de              gou à redução do teto para uma das infrações de
regulação que é operado por um conselho com            R$ 5 milhões para R$ 100 mil.
participação da sociedade civil, do setor produtivo,       Do outro lado, as entidades progressistas da
da Agência Nacional do Audiovisual (Ancinav) e         sociedade civil têm manifestado apoio à propos-
órgãos do Estado (Ministérios da Cultura e das         ta com abaixo-assinados e dentro do Conselho
Comunicações). O projeto vem sendo alvo de             Superior de Cinema, espaço institucional onde
intensos debates, com o empresariado criticando        esta vem sendo analisada pelo conjunto da soci-
qualquer regulação de um lado e o movimento de         edade representado no órgão. A divisão nas vi-
audiovisual defendendo regras e incentivos à           sões sobre o tema está inclusive causando uma
produção do outro.                                     reorganização nas entidades, como é o caso do
   O processo demonstra o Ministério da Cultura        Congresso Brasileiro de Cinema (CBC), que
como órgão do governo que mais se aproxima da          vivenciou a saída das organizações ligadas aos
defesa da concepção da comunicação como direito        exibidores e empresários. Essas organizações se
e bem público e, conseqüentemente, como alvo           uniram para criar o Fórum do Audiovisual e do
de políticas públicas e regulação.                     Cinema (FAC), uma nova entidade que congrega
   No entanto, no início de 2005, o governo            agentes conservadores do setor.
anunciou a intenção de não incluir o processo de




50
A 5.6 - Medidas efetivas para assegurar acessibilidade, até mesmo econômica, às
mídias relevantes (inclusive jornais e televisão) e conteúdos, especialmente por
parte de grupos culturais e lingüísticos marginalizados. Por exemplo, regimes de
impostos diferenciados, difusão livre em TV aberta, obrigar os operadores de
rede a aceitar os canais (must-carry) etc.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                              PAPEL                ATORES
                                                       O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES

    Não há garantia nenhuma na legislação brasi-           As TVs Câmara e Senado foram criadas a partir
leira de acesso plural da população a mídias rele-     da aprovação da Lei da Cabodifusão e desde en-
vantes.                                                tão estão em atividade. No plano nacional, elas
    A única lei que contém elementos nesse senti-      têm conseguido desenvolver relativa independên-
do é a 8.977/95 (cabodifusão), que estabeleceu a       cia das influências políticas do parlamento, e
obrigatoriedade das operadoras de TV a cabo de,        construído uma linha editorial mais próxima da
na sua área de prestação de serviço, reservarem        reflexão e da problematização das pautas do
seis canais básicos de utilização gratuita: 1) canal   parlamento.
comunitário aberto para utilização livre por enti-         Como já dito, o Ministério da Cultura tem as-
dades governamentais e sem fins lucrativos; 2)         sumido papel importante na disputa interna do
Senado; 3) Câmara Federal; 4) canal do Legislativo     governo federal sobre as políticas de comunica-
municipal/estadual (para ser compartilhado entre       ção. Com um olhar voltado para a compreensão
as duas assembléias); 5) canal universitário; e 6)     da comunicação e da cultura como direitos, ele
canal educativo-cultural, para ser utilizado pelos     tem desenvolvido ações e proposto normas (como
órgãos do governo que tratam de educação e cul-        os Pontos de Cultura e a Lei do Audiovisual) com-
tura em âmbito municipal, estadual e federal. Pos-     prometidas com a efetivação desses conceitos. A
teriormente, foi acrescentado o canal da Justiça.      iniciativa da criação da Agência Nacional do Ci-
                                                       nema e do Audiovisual (Ancinav) era muito im-
                                                       portante, mesmo com as concessões que o Mi-
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                          nistério vinha fazendo para os empresários du-
                                                       rante a formatação da proposta que iria ao Con-
   Em relação aos canais de caráter público que        gresso Nacional (antes da decisão do governo de
cada distribuidora de serviços de TV a cabo deve       transformá-la em simples agência de fomento).
veicular, há ainda muitos espaços ociosos em to-
dos eles. No entanto, não existem estudos ou pes-
quisas que apresentem um quadro nacional das                      ATUAIS
                                                       TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
emissoras e que avaliem o aproveitamento destes
canais, já que as operadoras colocam obstáculos            Em relação ao governo federal, há hoje dois
ou se recusam a transmiti-los. Destes canais, os       projetos que trabalham com a lógica da necessi-
dois ligados ao parlamento (TV Câmara e TV             dade de garantir à população de baixa renda e/ou
Senado) vêm desempenhando papel importante             marginalizada acesso a mídias relevantes. Um
de socialização do processo legislativo para a         deles é uma proposta do Ministério da Integração
população. As sessões em plenário são filmadas e       Nacional, em parceria com a Radiobrás, de insta-
transmitidas ao vivo, bem como reunião de              lação de sete rádios na região do Alto Solimões
comissões temáticas das duas casas. Além disso,        (na Amazônia), onde a ocorrência de meios de
os canais realizam um trabalho de desmistificação      comunicação é extremamente baixa. A iniciativa
do legislativo para a população, explicando a          não trabalha somente com a idéia de acesso à in-
legislação e seus impactos. Todavia, é importante      formação, mas também à produção dela. Ela pre-
lembrar que estes canais ficam restritos apenas à      vê a gestão e a elaboração do conteúdo destas
audiência das operadoras de TV a cabo, sem falar       rádios com participação da comunidade por meio
no problema da bitributação, já analisado              do sistema de conselhos e tem como objetivo cons-
anteriormente.                                         tituir uma real rede de rádios públicas na região.
                                                           Outro projeto é chamado Pontos de Cultura. A
                                                       iniciativa do Ministério da Cultura visa instalar



                                                                                                     51
centros de produção de conteúdo em todo o país                    so aos meios de comunicação e informação pos-
por meio do fornecimento de estruturas e equipa-                  suem hoje foco mais centrado nas Tecnologias
mentos como computadores, câmeras, gravado-                       da Informação e da Comunicação (que serão abor-
res e editores. Inicialmente, 65 pontos estão em                  dadas no pilar D) e não nas mídias escritas e que
processo de implantação através de parcerias com                  recebem radiodifusão de sons e imagens. No en-
entidades da sociedade civil (podem chegar a 100).                tanto, o projeto Casa Brasil, se concretizado e
Dentro do governo federal, estuda-se um projeto                   consolidado dentro do governo federal, pode
que amplia o Ponto de Cultura e os telecentros23                  apontar para a criação de centrais comunitárias
que estão em implantação em projetos de diver-                    de comunicação, com produção de conteúdo para
sos órgãos do Estado24 e cria Casas Brasil. Estes                 ser veiculado por estruturas de telecomunicações,
espaços congregariam um telecentro, um Ponto                      radiodifusão, imprensa e exibição direta. Ainda
de Cultura, pontos de bancarização e de presença                  assim, ele corre o risco de esbarrar no tratamen-
do governo federal. Este projeto será melhor ex-                  to dado às rádios comunitárias já descrito e ana-
plicado e analisado no Pilar D.                                   lisado no item A5.4.
    As políticas e medidas de promoção do aces-




23. Espaços públicos de acesso comunitário à internet
24. Hoje no governo, como será abordado no Pilar D, existe uma série de iniciativas de instalação de telecentros em projetos
que vão desde empresas estatais (como a Petrobrás e o Banco do Brasil) até os próprios ministérios.


52
A5.7. Medidas efetivas, de acordo com a necessidade, para enfrentar a
representação inadequada ou torpe de mulheres, grupos étnicos, grupos mais
pobres e marginalizados por parte da mídia.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                             buna do Norte no dia 29 de abril, apresenta o rosto
                                                        de uma mulher espancada com a chamada “Mecâ-
    A Lei 7.716/89, em seu artigo 20º, estipula pena    nica, funilaria e pintura Via Costeira. Tá na cara
de um a três anos para quem “praticar, induzir ou       que precisa”.
incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor,        No dia 14 de junho de 2003, o Ministério Pú-
etnia, religião ou procedência nacional”.               blico do Rio Grande do Norte emitiu um termo
    O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA -       de ajustamento de conduta que obrigou a con-
Lei 8.069/90) define em seu artigo 247 como in-         cessionária Via Costeira e a agência Lúmina a pro-
fração administrativa, passível de pena de três a       moverem um evento sobre a violência contra a
vinte salários, o ato de “divulgar, total ou parcial-   mulher, cabendo à concessionária cobrir a parte
mente, sem autorização devida, por qualquer meio de     financeira, particularmente a locação do auditó-
comunicação, nome, ato ou documento de procedi-         rio e o pagamento do material de divulgação,
mento policial, administrativo ou judicial relativo à   produzido pela Lúmina. Além disso, o procura-
criança ou adolescente a que se atribua ato             dor de Justiça Eduardo Cavalcanti, que elaborou
infracional”. Da mesma forma, o Estatuto do Idoso       o termo, determinou que este fosse publicado
(Lei 10.741/03) define, em seu artigo 105, como         em um espaço correspondente a um quarto de
crime “exibir ou veicular, por qualquer meio de         página do jornal que veiculou a mensagem pu-
comunicação, informações ou imagens depreciativas       blicitária, sob responsabilidade da Via Costeira,
ou injuriosas à pessoa do idoso” , podendo o            e no Diário Oficial do Estado. A repercussão na-
condenado pegar até três anos de pena.                  cional e internacional do caso foi tão grande que
                                                        motivou um cidadão da Alemanha a escrever uma
                                                        carta à matriz da Volkswagen pedindo um pro-
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                           nunciamento sobre o comportamento da sua con-
                                                        cessionária em Natal.
    Durante a pesquisa, foi notada a escassez de            Há outros exemplos como esse de sentenças
material sobre a efetividade dessas leis. A maioria     oriundas de denúncias feitas por movimentos so-
dos instrumentos legais que visam ao combate            ciais que trabalham contra a discriminação de gê-
ou à diminuição da representação distorcida de          nero, raça ou identidade sexual. Recentemente, a
grupos marginalizados tem apresentado poucos            Justiça concedeu direito de resposta coletivo aos
resultados práticos. Além disso, nestes poucos          praticantes de religiões afro-brasileiras, vítimas de
instrumentos, não há uma preocupação explícita          preconceito em programas da TV Record e Rede
com a contribuição dos meios de comunicação para        Mulher. A ação civil pública que originou a
a discriminação dos grupos sociais protegidos por       condenação havia sido interposta pela
cada instrumento.                                       Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão de
    O maior movimento de denúncia e combate             São Paulo em novembro de 2004.
aos preconceitos e violações dos direitos de seg-
mentos marginalizados da sociedade dissemina-
dos pela mídia é a já citada campanha “Quem fi-           PAPEL                ATORES
                                                        O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
nancia a baixaria é contra a baixaria”. Diversas
ações civis têm acionado a Justiça brasileira com          Os principais atores contra a representação ina-
relação a casos de disseminação de preconceitos         dequada têm sido os movimentos sociais ligados
e discriminação de etnia, cor, gênero, religião e       a estas categorias, como o Instituto Patrícia Galvão,
outros tipos.                                           a Marcha Mundial de Mulheres, o Movimento Ne-
    Um exemplo é a condenação por parte do Mi-          gro Unificado e a Associação Brasileira de Gays,
nistério Público do Rio Grande do Norte, no pri-        Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros. Suas denún-
meiro semestre de 2003, da concessionária Via           cias têm colocado na pauta a discussão sobre a
Costeira e da agência de publicidade Lúmina por         forma discriminatória como a mídia, principalmen-
utilizarem a banalização da violência contra a mu-      te os programas de entretenimento e as peças
lher para vender serviços oferecidos pela empresa       publicitárias, vem tratando os marginalizados. Em
automotiva. O anúncio, publicado no jornal Tri-         2003, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem


                                                                                                         53
Terra (MST) adensou o debate com a iniciativa de    punido na forma das leis específicas”.
uma jornada pela Democratização da Mídia, que           O projeto de lei que trata da criação do Estatu-
teve no mês de novembro atos em grandes cidades     to da Igualdade Racial (PLS 213/03) em seu artigo
do país, mas acabou não tendo continuidade.         4º, parágrafo VIII, prevê que "VII – implementação
   No campo da comunicação, destaca-se a já ci-     de programas de ação afirmativa destinados ao
tada campanha pela ética na TV. Há uma série de     enfrentamento das desigualdades raciais nas esferas
organizações, principalmente ONGs, que já de-       da educação, cultura, esporte e lazer, saúde, trabalho,
senvolveram ações no monitoramento da mídia         mídia, terras de quilombos, acesso à justiça,
em relação ao tratamento de marginalizados. É       financiamentos públicos, contratação pública de
o caso da Agência de Notícias dos Direitos da       serviços e obras e outras”. Na mídia, o projeto propõe
Infância (Andi), que desenvolve periodicamente      cotas de, no mínimo, 20% para atores afro-
pesquisas sobre o tratamento dado pelos gran-       descendentes em programas de televisão e peças
des meios à cobertura de questões envolvendo        publicitárias.
crianças e adolescentes.                                A melhor perspectiva de ampliação das denún-
                                                    cias de conteúdos discriminatórios veiculados em
                                                    meios de comunicação é através da campanha
           ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                         “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”.
                                                    Os rankings periodicamente divulgados e pauta-
    O Projeto de Lei que propõe o Estatuto da       dos na própria mídia têm gerado um debate pú-
Mulher (PL 1.399/03) assegura, em seu artigo 4º     blico, ainda que tímido, sobre os programas e a
que “nenhuma mulher será submetida a tortura nem    discriminação em questão. A atuação do Ministé-
a tratamento desumano ou degradante, discrimina-    rio Público, também já citada, é outro elemento
ção, exploração, violência, crueldade e opressão,   importante para esta luta.




54
A 5.8 - Apoio a medidas nas instituições e fóruns multilaterais que assegurem a
proteção e o apoio a mídias nacionais, inclusive, por exemplo, o direito a
discriminar em favor empresas e canais locais, e para regular conteúdo
originário de fora.



   O principal fórum internacional na área da Co-     para operar essa formulação.
municação é a Cúpula Mundial sobre a Sociedade           O Brasil (Estado e sociedade civil) se prepara
da Informação (CMSI). A posição do governo federal    também para a intervenção no processo interna-
vem sendo elaborada em três eixos: gestão do          cional de debate sobre a diversidade cultural, que
conhecimento e software livre, governança na          tem como horizonte próximo a aprovação de uma
Internet e solidariedade digital. No primeiro, no     convenção sobre o tema no âmbito da Unesco
Brasil é hegemônica a posição de defesa do            (Organização das Nações Unidas para a Educação,
software livre e do compartilhamento do conheci-      a Ciência e a Cultura) em outubro de 2005.
mento como condição para o desenvolvimento               As posições do Brasil durante a reunião
social dos países, principalmente os periféricos. O   intergovernamental de fevereiro de 2005 privile-
governo faz dura crítica às regras de propriedade     giaram, de maneira geral, os aspectos culturais
intelectual que só beneficiam a produção de co-       em relação aos econômicos e mereceram elogios
nhecimento que está basicamente nos países ricos      de representantes de organizações não governa-
e que instituem uma lógica de subordinação do         mentais que estiveram presentes. O fato é bastan-
conhecimento.                                         te positivo porque, até o momento, o governo
   No segundo eixo, tem mais força a posição de       brasileiro era acusado de ter uma postura dúbia a
levar a gestão mundial da Internet para um orga-      respeito da Convenção.
nismo multilateral como a União Internacional de         Por um lado, o Ministério da Cultura é visto
Telecomunicações (UIT) (ou a criação de um novo       como defensor de um texto mais avançado e com
órgão específico no interior da Organização das       instrumentos concretos que garantam a implan-
Nações Unidas). A idéia é tirar o domínio da          tação de políticas de diversidade cultural. De ou-
definição das políticas da Internet Corporation for   tro lado, os Ministérios da Fazenda, Indústria e
Assigned Names and Numbers (ICANN), entidade          Comércio e Agricultura tendem a priorizar a atua-
privada sediada nos EUA.                              ção brasileira na Organização Mundial do
   No terceiro eixo, o Governo trabalha com a         Comércio (OMC) e garantir que a cultura se adeqüe
proposição de fundos de solidariedade digital para    às regras do comércio internacional. Também a
incluir digitalmente os países mais pobres de         Globo, exportadora de audiovisual e compradora
forma a garantir sua independência tecnológica        de diversos programas norte-americanos, tem
ou incentivá-la por meio da produção de               funcionado como instrumento de pressão contra
conhecimento baseado em software livre e na           uma posição mais avançada do Brasil.
capacitação de programadores e desenvolvedores




                                                                                                    55
A5.9. Medidas efetivas para impedir que a propaganda exerça uma influência
negativa sobre a esfera pública, por exemplo com a identificação ostensiva,
limitação do volume de propaganda e de conteúdo político ou religioso. Os gastos
públicos em propaganda também podem ser usados para apoiar a esfera pública.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                 público e/ou social. A base legal da Constituição
                                                            não tem funcionado como instrumento de defesa
    Em diversos artigos, a Constituição Federal             do público em relação aos abusos da publicidade
coloca a proibição de peças publicitárias que exer-         comercial. O casuísmo é muitas vezes utilizado
çam influência negativa na esfera pública. O artigo         para adequar ou contornar os preceitos legais
5º, inciso XLI, afirma que “a lei punirá qualquer dis-      diante da indústria da publicidade e seus parceiros.
criminação atentatória dos direitos e liberdades fun-       Exemplo disso foi a Medida Provisória editada pelo
damentais”. O artigo 220, § 3º, inciso II, diz ser          governo (em abril de 2003, por ocasião do Grande
papel do Estado Brasileiro “estabelecer os meios            Prêmio de Fórmula 1 realizado em São Paulo) que
legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade    adiou para 2005 a entrada em vigor da lei federal
de se defenderem de programas ou programações de            que proíbe a propaganda de cigarros em eventos
rádio e televisão que contrariem o disposto no art.         esportivos.
221, bem como da propaganda de produtos, práticas
e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio
ambiente”.                                                    PAPEL                ATORES
                                                            O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
    O artigo 220, § 4º, estabelece que “a propagan-
da comercial de tabaco, bebidas alcoólicas,                     Os atores da luta contra as influências prejudi-
agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita         ciais que a propaganda pode exercer na sociedade
a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo   são os mesmos relatados anteriormente que con-
anterior, e conterá, sempre que necessário, advertên-       testam o tratamento discriminatório dado aos mar-
cia sobre os malefícios decorrentes de seu uso”. O artigo   ginalizados pela mídia. A propaganda é uma face
227 afirma ser “dever da família, da sociedade e do         do preconceito manifesto na programação dos
Estado assegurar à criança e ao adolescente, com            meios de comunicação.
absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à
alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito,               ATUAIS
                                                            TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
à liberdade e à convivência familiar e comunitária,
além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,        Há uma movimentação no interior da campa-
discriminação, exploração, violência, crueldade e           nha “Quem financia a baixaria é contra a cidada-
opressão”.                                                  nia” para incluir a publicidade nas análises, dada
                                                            sua influência na sociedade. No Congresso Nacio-
                                                            nal tramita o Projeto de Lei 5.921/01, de autoria
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                               do deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR),
                                                            que proíbe a propaganda de produtos infantis. Já
   A publicidade de cigarros foi limitada a displays        foi aprovada na Comissão de Defesa do Consumi-
nos pontos de venda, tendo sido proibidos os                dor e segue a tramitação na Câmara. A proposta
anúncios em rádios, jornais e TV. Para bebidas e            visa estabelecer o impedimento já existente em
medicamentos, foi instituída a obrigatoriedade da           outros países. Na Suécia, foi proibida qualquer pro-
veiculação de advertências em relação ao risco para         paganda dirigida ao público infantil ou mesmo
saúde.                                                      protagonizada por crianças. Em Portugal, está
   Em função da autonomia plena do Conselho                 sendo realizado estudo a respeito. Quando
Nacional de Auto-regulamentação Publicitária                presidiu a União Européia, a Suécia propôs esta
(Conar)25, a publicidade comercial não é objeto,            proibição para todo o bloco, mas teve a proposta
na prática, de nenhum dispositivo de controle               rejeitada.



25. Ver item 6.4


56
Tema transversal: O setor cinematográfico

    Existe uma temática em relação a este indica-                 ra técnica, específicos da área audiovisual, sendo
dor (A5) que entendemos ser transversal e não estar               vedada, entretanto, a aquisição, reforma ou cons-
totalmente contemplada pelo recorte dos nove                      trução de imóveis para tais fins cinematográficos.
sub-indicadores definidos, que é a situação do                    No entanto, as duas leis estão baseadas na idéia
setor cinematográfico no país.                                    de renúncia fiscal, que pode chegar a 124%. Os
    O setor cinematográfico brasileiro vem se re-                 investidores escolhem, entre as dezenas de proje-
cuperando depois de um período crítico no início                  tos certificados pelo Ministério da Cultura, aquele
dos anos 90, durante o governo Fernando Collor                    em que querem investir, e deduzem o valor inte-
de Melo, quando foram extintos incentivos fiscais                 gral (ou mais, no caso dos 124% citados acima) de
para a área cultural bem como os órgãos que fi-                   seu imposto de renda. Assim, a lei, na prática,
nanciavam a produção, distribuição e exibição de                  permite que as empresas guiem as políticas cultu-
filmes nacionais, como o Ministério da Cultura, a                 rais que são feitas inteiramente com recursos pú-
Fundação do Cinema Brasileiro, o Conselho                         blicos, e ainda se beneficiem da publicidade de-
Nacional de Cinema (Concine) e a Embrafilme. Os                   las.
mecanismos que rearticularam tais processos foram                     A criação de escritórios regionais da Ancine pelo
frutos da luta posterior dos cineastas. Hoje a                    país está prevista na Medida Provisória 2228-1,
regulação e a definição de políticas para setor estão             mas existem dificuldades operacionais para isto.
sob a responsabilidade da Agência Nacional de                     A descentralização da Ancine com a criação dos
Cinema (Ancine), instituída pela na Medida Provi-                 escritórios regionais cria expectativa na fiscaliza-
sória 2.228-1, de 6 de setembro de 2001. Suas                     ção da legislação dos mercados regionais e na
principais tarefas junto ao Ministério da Cultura                 transparência das atividades da agência junto à
(MinC) são a análise, a aprovação e o acompanha-                  sociedade civil.
mento dos projetos cinematográficos, relativos aos                    O conjunto desses instrumentos constitui a
benefícios das Leis 8.313/91 e 8.685/93.                          política brasileira na área, sinalizando uma consi-
    Criado pela Medida Provisória 2.228-1, o                      derável presença estatal, incentivando direta (por
Conselho Superior de Cinema (CSC) é um órgão                      empresas estatais) ou indiretamente (por
deliberativo e consultivo ligado à Casa Civil da                  incentivos fiscais a instituições privadas) tais obras.
Presidência da República. Ele é formado por nove                      Seguindo o padrão brasileiro das leis de
ministros de Estado, seis especialistas do setor (e               incentivo à cultura, até agora as leis de cinema
seus suplentes) e três representantes da socieda-                 trabalharam exclusivamente sobre a produção, não
de civil (e seus suplentes). Entre suas atribuições               sobre a distribuição. “Hoje, no Brasil, 80% do que
está formular a política nacional do cinema. Tra-                 é veiculado nas salas de cinema são filmes
ta-se de um interlocutor qualificado, pois congre-                produzidos nos Estados Unidos. Na TV, esse índice
ga Estado e entidades civis para analisar as políti-              chega a 90%. A TV atinge 41,5 milhões de
cas públicas de audiovisual.                                      domicílios. Exatamente o veículo que permitiria
    A Lei de Incentivo à Cultura, ou Lei Rouanet                  o acesso da população ao cinema nacional
(Lei 8.313/91), institui o Programa Nacional de                   restringe mais do que as próprias salas de cinema.
Apoio à Cultura (Pronac), cuja finalidade é a                     Existe aqui apenas uma sala de cinema para cada
captação e canalização de recursos para os diversos               110 mil brasileiros. Essas salas de cinema estão
setores culturais, para facilitar o acesso, produção              concentradas em apenas 7% dos municípios e o
e difusão pública das fontes da cultura. Já a Lei do              filme brasileiro é exibido, no máximo, em 1% de
Audiovisual (Lei 8.685/93) cria mecanismos espe-                  nossas cidades. O mercado brasileiro de vídeo e
cíficos de incentivo fiscal para a atividade                      DVD, significativo para o cinema americano, é
audiovisual. Permite que os investimentos reali-                  quase inexistente para as produções nacionais”26.
zados na produção de obras audiovisuais cinema-                   Nessa conjuntura, se destaca o atual papel dos
tográficas brasileiras de produção independente                   festivais que ocorrem no Brasil, como substituto
sejam deduzidos do imposto de renda, e que se-                    do mercado, pois é uma das raras oportunidades
jam viabilizados, pelos mesmos incentivos fiscais,                de se ver filmes brasileiros. Se por um lado talis
projetos de exibição, distribuição e infra-estrutu-               filmes atingem, de uma só vez, um número

26. Ideli Salvatti, senadora (PT-SC), em artigo publicado em O Globo em 30/08/2004.



                                                                                                                    57
considerável de pessoas, esta vitrine não tem uma
seqüência comercial em grande parte dos casos.
   Outro fator desarticulador de espaços para fil-
mes brasileiros é o desaparecimento de salas de
exibição em cidades do interior, onde o cinema
nacional tinha mais público (sendo substituído
pela TV). Além disso, também influencia para essa
desarticulação a subseqüente construção de
cinemas multiplex, que são geralmente vincula-
dos a grandes redes de distribuidores de cinema e
a grandes shoppings centers. A perspectiva de
transformar o setor cinematográfico,
descentralizando a produção e distribuição, está
na disputa pela aprovação do projeto do Ministério
da Cultura que cria a Ancinav, já analisado neste
estudo.




58
A 6 - Participação efetiva por parte de todos os elementos da
sociedade civil na preparação, implementação e avaliação de
estruturas e políticas de governança da mídia.
A 6.1 - Consultas públicas abertas e extensivas e participação no
desenvolvimento de políticas para a mídia, inclusive em instituições e fóruns inter-
governamentais.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                 mente: III – propor a realização de consultas públicas,
                                                            visando propiciar a efetiva participação dos diversos
    O Decreto 2.338/97, que aprova o Regulamento            segmentos da sociedade na proposição de políticas,
da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel),           diretrizes, objetivos e metas referentes aos serviços de
afirma, em seu artigo 16, que “à Agência compete            radiodifusão, seus ancilares e auxiliares”.
adotar as medidas necessárias para o atendimento do
interesse público e para o desenvolvimento das
telecomunicações brasileiras, e especialmente: (...) III    IMPLEMENTAÇÃO
                                                            IMPLEMENTAÇÃO
– elaborar e propor ao Presidente da República, por
intermédio do Ministro de Estado das Comunicações,              Em nível nacional, é comum a realização de
a adoção das medidas (...) submetendo previamente a         consultas públicas, para sugestões e comentários
consulta pública às relativas aos incisos I a III”. O       acerca de normas, projetos técnicos e projetos de
mesmo decreto ainda estipula em seu artigo 67               lei, através da internet. Estas consultas são reali-
que “as minutas de atos normativos serão submeti-           zadas tanto pelos órgãos do Poder Executivo
das a consulta pública, formalizada por publicação no       quanto por agências reguladoras (como a Anatel
Diário Oficial da União, devendo as críticas e sugestões    e a Agência Nacional de Cinema). No entanto, este
merecer exame e permanecer à disposição do público          instrumento é muito limitado, pois é apenas um
na Biblioteca, nos termos do Regimento Interno”.            levantamento de posições da sociedade sem
    O Regimento Interno27, em seu artigo 3º, ca-            qualquer garantia de que estas se façam ouvidas.
racteriza a consulta pública como “procedimento             As propostas em consulta recebem comentários e
administrativo que submete documento ou assunto [e          contribuições, mas esta forma de suposto diálogo
também atos normativos, como explicita o artigo 47          tem tido mais serventia para justificar um discurso
do referido documento] a comentários e sugestões do         de participação social que na verdade não se
público em geral”, sendo responsabilidade do                efetiva. A limitação já se exprime na forma em que
Conselho Relator encaminhar as sugestões colhidas           é feito, por meio da internet, ser viço de
ao Conselho Diretor, que julgará a medida ou ato            comunicação a que menos de 15% da população
em instância final. O parágrafo único do artigo 49          dispõe de acesso.
obriga o Conselho Diretor a, antes de editar a                  Há também o instrumento das audiências pú-
resolução, analisar as sugestões encaminhadas,              blicas, seminários e eventos similares. Porém, eles
“devendo expor em documento próprio as razões para          geralmente funcionam como a consulta, com po-
a adoção ou não das medidas, que será arquivado na          der limitado de intervenção da sociedade, ocor-
Biblioteca, ficando à disposição de todos os                rem em espaços restritos (fisicamente), com divul-
interessados”.                                              gação pequena (voltada unicamente aos principais
    O Regimento Interno do Ministério das Comu-             atores políticos do setor), e quase sempre aconte-
nicações28, em seu artigo 237, define como incum-           cem apenas na capital federal. Em geral, são con-
bência do Secretário de Serviços de Comunicação             vocados pelo legislativo no momento do debate
Eletrônica “planejar, dirigir, coordenar, orientar, acom-   sobre propostas em tramitação nas casas (Câmara
panhar e avaliar a execução das atividades das              dos Deputados e Senado Federal).
unidades que integram sua Secretaria e, especifica-


27. Anexo da Resolução Anatel 270/01
28. Anexo à Portaria 313, de 23/06/03



                                                                                                               59
PAPEL                ATORES
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                                       ATUAIS
                                                         TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS

    Em sua maioria, os movimentos sociais e as              A reflexão acerca da criação de instrumentos
organizações civis do campo da comunicação não           que reforcem o sentido “público” das políticas para
possuem propostas estratégicas nem discutem              a área da comunicação ganhou novamente a pau-
regularmente a respeito da existência de instru-         ta da sociedade com as propostas de Lei do
mentos de participação na formulação e avaliação         Audiovisual, do Conselho Federal de Jornalismo e
de políticas da área de comunicação. Há uma for-         do Sistema Brasileiro de Televisão Digital, já
mulação encontrada notadamente no programa               tratadas anteriormente. Com o debate pautado
do Fórum Nacional pela Democratização da                 sobre a cultura, a informação e a difusão destes
Comunicação (FNDC), que trata de controle públi-         como elementos estratégicos, as discussões
co e de espaços e instrumentos para que isso ocor-       reacenderam a divergência entre, de um lado, os
ra. Porém, não há iniciativas concretas (com exce-       movimentos sociais e as entidades de classe e
ção da luta pela instalação do Conselho de Comu-         comprometidas com o direito à comunicação e,
nicação Social, que será tratada no item A 6.3) nem      de outro lado, o empresariado de comunicação.
reivindicações por espaços e instrumentos que            Enquanto os representantes do empresariado
tenham ganhado a pauta dos movimentos sociais            usam seus veículos para defender seu modelo de
e do Estado. Geralmente, os movimentos sociais           mercado desregulado e concentrador, os
e as entidades atuam em questões pontuais e              movimentos sociais pedem espaços de debate
participam destes espaços com suas contribuições,        mais abertos e participativos.
mas sem a garantia de que suas opiniões                     Essas pressões produziram resultado, mesmo
provocarão mudanças efetivas ou serão, pelo              que limitado, em algumas destas pautas. No caso
menos, levadas em consideração.                          da proposta de Lei do Audiovisual, como já foi
    O ouvidor da Anatel, em palestra proferida no        apontado, o Ministério da Cultura colocou o
Conselho de Comunicação Social do Congresso,             projeto em consulta pública na Internet (lembran-
lembrou que as contribuições feitas às consultas         do do caráter excludente deste meio), mas não se
públicas realizadas pela agência são originárias         limitou a isso, realizando audiências em vários
em grande medida dos “setores econômicos” da             pólos de produção audiovisual para debater com
comunicação. No entanto, a participação nas              a sociedade, além de promover ampla discussão
consultas não é o meio principal de atuação desses       no Conselho Superior de Cinema, instância do
setores, e sim o lobby no Congresso Nacional e           Executivo com representação da sociedade civil
nas esferas políticas em que determinada pauta           organizada da área do audiovisual.
está sendo encaminhada. Dois exemplos são a                 A discussão acerca do Sistema Brasileiro de Te-
atuação das grandes empresas de telefonia junto          levisão Digital vinha sendo feita basicamente em
ao ministro da Fazenda brasileiro, Antônio Palocci,      âmbito estatal, antes na esfera da Anatel e não do
em 2003, para evitar que o então ministro das            Ministério das Comunicações. Várias entidades
Comunicações, Miro Teixeira, suspendesse o               protestaram reivindicando a ampliação do debate
reajuste das tarifas de telefonia por parte da Anatel;   por meio da criação de espaços institucionais
e as constantes demonstrações, visitas e reuniões        participativos e ações como a realização de
feitas por representantes dos modelos de TV digital      audiências públicas nas Assembléias Legislativas
dos EUA (ATSC), da Europa (DVB) e do Japão (ISDB)        de todas as unidades da Federação. Foi criado um
junto a dirigentes do Executivo envolvidos na            Comitê Consultivo que, embora limitado – como
definição do Sistema Brasileiro de Televisão Digi-       todos os instrumentos consultivos (como já
tal.                                                     explicitado acima) –, passou a ser um espaço onde
                                                         o Executivo tem de prestar contas sobre o processo
                                                         e tem de ouvir as entidades do setor.




29. www.fndc.org.br/doc_historico/data/programa.doc
30. www.senado.gov.br/web/comissoes/ccs/palestra.asp


60
A6.2. Meios efetivos e dinâmicos que façam com que preocupações e
reclamações públicas sejam ouvidas e atendidas, de acordo com as políticas de
mídia.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                        res, normalmente semestrais, com grande densi-
                                                                   dade; participa de debates públicos; sugere pro-
   A Lei Geral das Telecomunicações (9.472/97)                     cedimentos e cobra medidas do Conselho Diretor
prevê como parte da estrutura da Agência Nacio-                    para que os objetivos da Agência sejam atingidos.
nal de Telecomunicações (Anatel) uma ouvidoria                     A Anatel possui ainda um serviço de atendimento
que tem como função dar mais transparência ao                      por telefone gratuito que se coloca como canal de
órgão e aproximar a agência da sociedade. A                        acesso da população à agência. Só em 2004
mesma norma estipula que o ouvidor será indicado                   começou a ter efeito a fiscalização da Anatel, que
pelo Presidente da República para um mandato                       apertou o cerco contra as operadoras móveis. A
de dois anos.                                                      Agência tem publicado um ranking das
   Ele tem acesso a todos os assuntos e conta com                  operadoras com mais reclamações e daquelas que
o apoio administrativo que lhe for necessário,                     mais dão encaminhamento às reclamações
“competindo-lhe produzir, semestralmente ou                        recebidas. Em 2005, a Anatel anunciou a intenção
quando oportuno, apreciações críticas sobre a atu-                 de praticar o mesmo rigor em relação às
ação da Agência, encaminhando-as ao Conselho                       operadoras de telefonia fixa. Contudo, este direito
Diretor, ao Conselho Consultivo, ao Ministério das                 do usuário muitas vezes serve para legitimar a
Comunicações, a outros órgãos do Poder Executi-                    política da Anatel, como o número 0800 33 2001,
vo e ao Congresso Nacional, fazendo publicá-las                    pelo qual o cidadão pode denunciar rádios não
para conhecimento geral” . A norma garante tam-                    legalizadas (apontadas como “clandestinas”)32.
bém ao ouvidor independência e estabilidade no                        O Comitê de Defesa dos Usuários de Serviços
cargo, não o submetendo hierarquicamente a ne-                     de Telecomunicações ainda não se consolidou de
nhuma das instâncias da agência.                                   fato. A última reunião ocorreu em dezembro de
   A resolução 107/99 da ANATEL cria o Comitê                      2000. Depois disso, ficou cerca de dois anos es-
de Defesa dos Usuários de Serviços de Telecomu-                    quecido pela direção da Anatel e somente após
nicações, uma instância da agência que visa re-                    cobrança do ouvidor foi colocado em processo de
presentar os interesses dos usuários, especialmen-                 reativação, estado em que se encontra até hoje.
te nas modalidades Serviço de Telefone Fixo                        Existe ainda um projeto de lei (PL 110/95), de au-
Comutado (STFC) e Serviço Móvel Pessoal (SMP), e                   toria do senador Pedro Simon (PMDB-RS), que pro-
tem como finalidade “assessorar e subsidiar o Con-                 põe a criação de um serviço de ouvidoria (deno-
selho Diretor da Anatel no exercício de suas com-                  minado “serviço de atendimento ao público”) nas
petências legais em matéria de controle, prevenção                 emissoras de rádio e TV do país. Entretanto, o PL
e repressão das infrações dos direitos dos usuári-                 foi arquivado em 1999. Atualmente, a Folha de
os de Serviços de Telecomunicações”.                               S.Paulo é um dos poucos veículos que conta com
   É papel do comitê apresentar ao Conselho Di-                    um ombudsman, com mandato fixo, estabilidade
retor diretrizes para a avaliação, controle e acom-                no emprego e independência em relação à linha
panhamento dos serviços por parte dos usuários,                    editorial do jornal.
além de medidas e métodos de resoluções de pro-
blemas, insatisfações e denúncias. Ele é compos-
to de membros da Anatel e de representantes de                       PAPEL                ATORES
                                                                   O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
usuários dos serviços fiscalizados pela agência.
                                                                      Nos últimos anos, houve um enfraquecimento
                                                                   da atuação da sociedade civil na área de
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                      telecomunicações, que após a privatização ficou
                                                                   principalmente a cargo do movimento sindical, no
   A Ouvidoria da Anatel, ainda que seja restrita                  caso a Federação dos Trabalhadores em Empresas
ao âmbito das telecomunicações, tem se mostra-                     de Telecomunicações (Fittel). É relativa a análise
do bastante atuante. Apresenta relatórios regula-                  sobre um possível abrandamento da atuação da

31. Lei 9.472/97, artigo 45
32. O papel da Anatel na repressão às rádios livres e comunitárias não-legalizadas já foi abordado no item A5.



                                                                                                                  61
Fittel em relação ao governo federal, mas é possí-
vel dizer que suas relações com o Executivo ga-
nharam força na gestão de Luiz Inácio Lula da Sil-
va, quando a federação indicou o primeiro Secre-
tário-Executivo do Ministério das Comunicações,
José Guimarães Palácios, e o presidente da Anatel
naquele exercício, Pedro Jaime Ziller, além do pró-
prio ouvidor da agência, Aristóteles dos Santos.


           ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS

   Todas as iniciativas que vão no sentido de efe-
tivar as reivindicações dos movimentos sociais,
sejam da área de comunicação ou não, já foram
relatadas em outros atributos e indicadores. Eles
passam pela campanha “Quem financia a baixaria
é contra a cidadania”, pela reivindicação de um
Conselho de Comunicação Social (CCS) com poder
de definição de políticas e pelos processos
decisórios da área de comunicação.




62
A6.3. Mecanismos permanentes para participação independente e direta do
público na revisão e implementação de políticas em curso, de modo
descentralizado quando apropriado – por exemplo, através de conselhos públicos
e conferências públicas periódicas, que contem com ampla participação da
sociedade civil.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                      mídia nacional foi rapidamente colocada como pri-
                                                                 oridade na pauta do parlamento, por conta da cri-
    A Constituição Federal, em seu artigo 224, pre-              se financeira que assolou as empresas de comuni-
vê que o Congresso Nacional instituirá, “como seu                cação de capital nacional. Em poucos meses, foi
órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Soci-                  aprovada na Câmara e no Senado.
al”. Sua regulamentação aconteceu por meio da                        A instalação do CCS foi uma contrapartida
Lei 8.389/91, que definiu como suas atribuições a                exigida pelos partidos de oposição para que estes
realização de estudos, pareceres, recomendações                  aceitassem a aprovação da PEC. Esta negociação
solicitadas pelo Congresso Nacional a respeito de                também incluiu a composição do Conselho. Ao fi-
temas como: “a) liberdade de manifestação do                     nal, sua formatação foi muito ruim para os inte-
pensamento, da criação, da expressão e da informa-               resses da sociedade civil organizada, com a eleição
ção; (...) d) produção e programação das emissoras de            de um ex-advogado do jornal O Estado de S. Paulo,
rádio e televisão; e) monopólio ou oligopólio dos meios          o empresário da RBS Jayme Sirotsky e notáveis que
de comunicação social; (...) g) promoção da cultura              não representavam ninguém senão eles mesmos
nacional e regional, e estímulo à produção indepen-              nas vagas da sociedade civil. No final de 2004,
dente e à regionalização da produção cultural, artística         foram indicados os nomes para a segunda gestão
e jornalística; (...) j) propriedade de empresa                  do CCS. A composição ficou ainda pior para a
jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e                sociedade civil, com as vagas desse campo sendo
imagens”, entre outros. Ele é composto de repre-                 ocupadas por empresários da comunicação,
sentantes dos trabalhadores, empresários e de                    setores ligados à Igreja Católica, um advogado de
membros da sociedade civil, que têm mandatos                     militância reconhecidamente conservadora e um
de dois anos, com direito à recondução.                          ex-jornalista com ligações históricas com grupos
    Existem também experiências de conselhos de                  de mídia privada.
abrangência não nacional no Brasil, cada um de-                      Hoje, decorridos dois anos de sua existência, o
les com atribuições diferentes. Há conselhos em                  Conselho de Comunicação Social sofre inúmeros
atividade no Estado de Alagoas e em alguns                       questionamentos, inclusive internos, por parte de
municípios, como Porto Alegre (RS), Goiânia (GO)                 alguns conselheiros. As principais críticas se diri-
e São Gonçalo (RJ).                                              gem às limitações regimentais do órgão. Sendo
                                                                 meramente uma instância consultiva, nada garante
                                                                 que as posições do Conselho sejam acatadas pelo
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                    parlamento. Além disso, a composição do órgão é
                                                                 restrita (4 representantes do empresariado, 4 re-
    Apesar de ter sido incluído na Constituição Fe-              presentantes dos trabalhadores e 5 da sociedade
deral de 1988, a materialização efetiva do Conse-                civil), ficando longe de representar minimamente
lho de Comunicação Social só ocorreu catorze anos                a diversidade cultural e política dos segmentos
depois, em junho de 2002, quando foram nomea-                    da sociedade brasileira e até mesmo do campo da
dos e empossados os conselheiros titulares e su-                 comunicação.
plentes para a primeira gestão. É importante res-                    O único benefício percebido pela maioria dos
saltar que o CCS só foi instalado como fruto de                  atores políticos que analisam o CCS é a inserção
barganha política33. No final de 2001, após passar               dos debates da área na esfera do Estado. O Conse-
mais de cinco anos parada no Congresso Nacio-                    lho opera através de reuniões presenciais ordiná-
nal, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC)                   rias, sessões extras, audiências públicas e
que permitia a entrada de capital estrangeiro na                 congêneres. A regra geral das reuniões é a polari-


33. As teses que mostram as posições em relação a este processo pelos atores podem ser vistas no sítio do Fórum Nacional pela
Democratização da Comunicação, www.fndc.org.br/IX_plenaria/data/Lista_de_Teses.html



                                                                                                                         63
zação do debate entre os representantes do            neste sentido existem nos estados do Acre, Minas
empresariado da mídia e a “bancada” das catego-       Gerais (cuja Constituição Estadual prevê o órgão,
rias de trabalhadores presentes no Conselho.          desde 1989), Pará, Paraíba, Paraná, Piauí, Rio de
                                                      Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo (através dos
                                                      movimentos de direitos humanos) e Roraima.
  PAPEL                ATORES
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                            Em Porto Alegre também ocorreu uma Confe-
                                                      rência Municipal de Comunicação, onde foram
   Os atores que atuam nesse campo são os mes-        deliberadas propostas que, caso fossem acatadas
mos citados nos indicadores anteriores: FNDC (es-     e implementadas pelo poder público local (como
pecialmente Federação Nacional dos Jornalistas e      o aperfeiçoamento do Conselho Municipal de Co-
Federação Interestadual de Trabalhadores em Rá-       municação), poderiam alterar bastante o quadro
dio e Televisão) e Congresso Brasileiro de Cinema,    da comunicação local.
no campo da sociedade civil. Pelo empresariado,          Em 2004, teve início também um movimento
a Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e      em busca da realização da primeira edição de uma
Televisão (Abert) e a Associação Brasileira de        Conferência Nacional das Comunicações. Em outros
Radiodifusores (Abra) e outras entidades patronais.   campos, como Meio Ambiente, Direitos Humanos
                                                      etc., conferências nacionais, precedidas de etapas
                                                      estaduais e municipais, vem acontecendo, com
           ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                           mais intensidade, desde 2003. Apesar de inúmeros
                                                      problemas verificados em vários momentos do
   Sabe-se que estão aumentando, por parte da         processo, as conferências têm servido para
sociedade, em várias localidades do país, as ações    mobilizar e organizar a sociedade, assim como
de pressão em prol da criação de conselhos muni-      capilarizar as discussões relacionadas às políticas
cipais e estaduais de comunicação. Movimentos         públicas de cada setor.




64
A6.4. Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados
pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                           IMPLEMENTAÇÃO
                                                      IMPLEMENTAÇÃO

    Como mecanismo de auto-governança, existe             Em julho de 2004, foi realizada a eleição dos
o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGIBr),        integrantes do CGIBr. A composição do Comitê visa
criado pela Portaria Interministerial 147, de 31/     contemplar diversos setores da comunidade bra-
05/95, e alterado por inúmeras normas até a atual     sileira intrinsecamente relacionada à internet:
forma, dada pelo Decreto 4.829/03. Originalmen-       quatro representantes do setor empresarial (pro-
te, o Comitê foi vinculado aos Ministérios das        vedores de acesso, conteúdo, infra-estrutura, in-
Comunicações (MC) e de Ciência e Tecnologia           dústria de telemática e usuários empresariais) e
(MCT), mas com o último decreto ele assumiu per-      seus respectivos suplentes; quatro representantes
sonalidade jurídica própria. Sua função é coorde-     do terceiro setor e seus respectivos suplentes e
nar e implementar todas as atividades necessári-      três representantes da comunidade científica e
as à gestão eficiente e qualificada dos serviços de   tecnológica e seus respectivos suplentes. Além de
Internet. Isso significa operar desde a atribuição    dez membros indicados pelo Poder Público.
de endereços IP e registro de nomes de domínios           Já o Conar trabalha sob demanda, ou seja, só
até a recomendação de padrões e procedimentos         atua quando há formulação de denúncia sobre
técnicos para o desenvolvimento do setor, entre       "quebra da ética publicitária", formulada por seus
muitas outras tarefas.                                associados, por seus integrantes ou por outros
    Ele é formado por representantes do Poder         atores da sociedade. Ao longo de 24 anos de
Público (Ministérios, Executivos Estaduais, Anatel    funcionamento, julgou mais de 4 mil casos. Em
e Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientí-        2003, instaurou 368 processos.
fico e Tecnológico); de empresários (provedores           Apesar disso, é explícito, hoje, o abismo entre
de conteúdo e infra-estrutura, indústrias de ele-     a "ética publicitária" e a realidade da propaganda
trônicos e empresas usuárias); do terceiro setor e    comercial. Diariamente é possível constatar os
um de notório saber no tema. A eleição das cadei-     abusos cometidos através da difusão de estereóti-
ras do terceiro setor é feita de forma democrática    pos que estimulam a discriminação e o preconcei-
entre as entidades que atendam às exigências da       to dos mais variados tipos, atentando assim con-
legislação e que se cadastrem em determinado          tra os direitos humanos, especialmente de seg-
prazo antes da eleição.                               mentos marginalizados e minorizados. O fato de
    O CGIBr é a primeira experiência mundial de       o Conar ser uma entidade de "pares julgando pares"
um órgão nacional de governança da internet a         torna sua eficácia questionável.
ter representantes eleitos.
    Na área da publicidade, foi instituído em 1980
o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação              PAPEL                ATORES
                                                      O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
Publicitária (Conar). Ele é a organização que enca-
minha e opera o Código de Auto-Regulamentação             Embora o Brasil seja um dos países que teve
Publicitária, uma resposta das entidades e empre-     crescimento mais rápido em relação ao número
sas da área a uma lei que estava sendo elaborada      de usuários conectados à rede mundial de com-
pelo governo federal no final da década de 70,        putadores, o debate sobre a governança na
durante a ditadura militar, que instituía uma cen-    Internet ainda caminha a passos lentos dentro das
sura prévia para a publicidade. A finalidade do       entidades e organizações que historicamente dis-
Conar, de acordo com o artigo 5º de seu Estatuto      cutem a comunicação. Na parte da sociedade ci-
Social, é “zelar pela comunicação comercial, sob      vil, a entidade com maior conhecimento na área é
todas as formas de propaganda, fazendo obser-         a Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits),
var as normas do Código Brasileiro de Auto-Regu-      que possui um dos membros da sociedade civil
lamentação Publicitária, que prevalecerão sobre       no CGIBr. Outro ator que se destaca na sociedade
quaisquer outras”.                                    civil é o Projeto Software Livre Brasil, que elegeu




                                                                                                     65
um dos conselheiros e tem grande força internaci-                ATUAIS
                                                      TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
onal, já tendo realizado uma série de fóruns no
Brasil, mais especificamente na cidade de Porto            O Comitê Gestor da Internet no Brasil tem um
Alegre, e conseguindo pautar setores do governo       árduo desafio pela frente. O primeiro é ganhar le-
brasileiro para a questão do software livre, como     gitimidade e navegar em um terreno sem
o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação      precendentes no país (o de uma instituição de
(ITI). O ITI tem sido uma das principais vozes no     auto-governança); o segundo é de conseguir or-
debate interno do governo federal, defendendo o       ganizar as políticas de gestão da internet no Bra-
uso do conhecimento compartilhado e, em rela-         sil; o terceiro é o de se posicionar em relação aos
ção à internet, trabalhando para construir a visão    processos internacionais. Estão na pauta do co-
no CGIBr da defesa em âmbito internacional da         mitê, em âmbito interno, o debate sobre a políti-
proposta de transferir a gestão da rede mundial       ca de universalização dos serviços de telecomuni-
para um organismo ligado à ONU.                       cações com recursos do Fundo de Universalização
    O Conar é formado por um Conselho Superior        dos Serviços de Telecomunicações (Fust), criado
e um Conselho de Ética, que julga os casos e pos-     para financiar este processo, e o Serviço de
sui 132 conselheiros. Ele trabalha com violações      Comunicação Digital, proposta feita pelo governo
como propaganda comparativa, responsabilidade         federal para utilização desses recursos. Em âmbito
social, ferimento do direito autoral, apresentação    externo, a discussão sobre a governança na rede,
inverídica do produto, omissão de frase de adver-     sobre a qual o Brasil tem construído posição já
tência e falta de adequação às leis. O Conar pos-     explicitada neste estudo de defender a gestão da
sui grande legitimidade dentro do setor publici-      internet por um organismo ou fórum ligado à ONU,
tário pela sua composição, que reúne as maiores       garantindo um processo transparente, multilateral
agências do país, e pela sua gênese, pois foi uma     e com participantes dos diversos setores (multi-
saída para evitar a intervenção da ditadura militar   stakeholder).
no conteúdo das propagandas veiculadas no final
da década de 70.




66
Pilar B
Retomando o uso do conhecimento
e do domínio público
    No Brasil, qualquer análise sobre as possibili-      É indispensável, portanto, considerar a reali-
dades de acesso ao conhecimento deve conside-         dade socioeconômica do país não somente para
rar a extrema desigualdade da estrutura social e      avaliar as atuais regras que regem o uso do co-
econômica nacional. Parcela significativa da po-      nhecimento, como também para considerar as
pulação não tem acesso a bens materiais que re-       ações dos poderes públicos e dos diversos atores
produzem o conhecimento gerado pelos diferen-         da sociedade civil. Como veremos, o atual forma-
tes segmentos da sociedade, no Brasil e no mun-       to das leis que regem a propriedade intelectual
do. As reflexões sobre um regime que propicie a       no Brasil – assim como no restante do mundo –
circulação da informação e da cultura no país de-     não é o mais apropriado para o estímulo da
vem considerar que, enquanto não for radicalmen-      criatividade e para o desenvolvimento cultural,
te superado esse quadro de desigualdades, não         social e econômico dos indivíduos e dos grupos
será possível alcançar um regime equilibrado de       sociais.
partilha e acesso igualitário às obras e criações.




                                                                                                   67
B1: Um regime equilibrado de partilha do conhecimento
que assegure que o conhecimento gerado ou disseminado por
empresas, canais e setores de comunicação esteja disponível para
todos de modo igualitário e acessível financeiramente, e que
encoraje a criatividade da forma mais ampla possível por toda a
sociedade.
B1.1 Uma estratégia nacional e uma orientação política com relação a criação,
disseminação e uso do conhecimento (especialmente copyright e incluindo
materiais e softwares educacionais publicados e transmitidos) cujos objetivos
explícitos sejam enriquecer o domínio público, satisfazer as várias necessidades
por conhecimento, e encorajar a criatividade de todos os setores da sociedade.
Isto pode ser expresso em termos de posições e políticas sobre Direitos de
Propriedade Intelectual (IPR), em uma ‘sociedade da informação’ ou uma
“economia do conhecimento”, em mídia e outras áreas, tanto nacionalmente
como em organizações, acordos e tratados internacionais.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                      Para a construção de um regime equilibrado
                                                              de partilha do conhecimento, o direito garantido
Constituição Federal                                          no artigo 5º da Constituição Federal – de
Art. 5º. Todos são iguais perante a lei sem distinção         exploração comercial das obras pelos autores ou
   de qualquer natureza, garantindo-se aos brasilei-          por aqueles cujo direito foi cedido pelo autor –
   ros e aos estrangeiros residentes no país a                deve ser balanceado com outros direitos humanos
   inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igual-   igualmente positivados na Constituição, como o
   dade, à segurança e à propriedade, nos termos
                                                              direito à educação e à cultura. Como todo direito,
   seguintes:
                                                              o direito autoral não é absoluto. As legislações
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de           complementares sobre direito autoral – para que
  utilização, publicação ou reprodução de suas obras,         não haja abuso deste direito – ao serem formuladas
  transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei            e debatidas (especialmente nas questões relativas
  fixa;                                                       aos limites do direito autoral), devem considerar
                                                              a existência de outros direitos, em especial os con-
XXVIII - são assegurados nos termos da lei:                   tidos no Capítulo III da Constituição:
a) a proteção às participações individuais em obras           Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Es-
   coletivas e à reprodução de imagens e voz huma-               tado e da família, será promovida e incentivada com
   nas, inclusive nas atividades desportivas;                    a colaboração da sociedade, visando ao pleno de-
                                                                 senvolvimento da pessoa, seu preparo para o exer-
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econô-            cício da cidadania e sua qualificação para o traba-
   mico das obras que criarem ou de que participa-               lho.
   rem aos criadores, aos intérpretes, e às respecti-
   vas representações sindicais e associativas;               Art.215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício
                                                                 dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura
XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos in-              nacional, e apoiará e incentivará a valorização e
  dustriais privilégios temporários para sua utiliza-            difusão das manifestações culturais.
  ção, bem como proteção às criações industriais, à
  propriedade das marcas, aos nomes de empresas
                                                                 O Brasil no ordenamento jurídico internacional
  e a outros signos distintivos, tendo em vista o inte-
  resse social e o desenvolvimento tecnológico e eco-
                                                                 No plano internacional, o Brasil é signatário
  nômico do país;                                             das principais convenções e tratados sobre pro-
                                                              priedade intelectual. Entre os acordos sobre direi-


68
tos autorais e conexos estão a Convenção de Ber-                  9.610/98, a principal sobre direito autoral no Bra-
na relativa à Proteção das Obras Literárias e Artís-              sil, procurou responder às transformações impos-
ticas, de 1886; a Convenção sobre Direito de Au-                  tas pelo desenvolvimento das novas tecnologias
tor; a Convenção Internacional de Roma para a                     e às possibilidades de armazenamento e reprodu-
Proteção aos Artistas Intérpretes ou Executantes,                 ção de cópias de produções artísticas em suportes
aos Produtores de Fonogramas e aos Organismos                     digitais. A intenção dos legisladores foi, claramen-
de Radiodifusão, de 1961; a Convenção de Gene-                    te, a de conciliar a legislação brasileira com as
bra para a Proteção de Produtores de Fonogramas                   normas estabelecidas no Acordo TRIPS.
Contra a Reprodução não Autorizada de seus                            Em alguns casos, apesar de o TRIPS não exi-
Fonogramas, de 1971; e o Tratado sobre o Regis-                   gir proteção extrema, a legislação brasileira, de
tro Internacional de Obras Audiovisuais (Tratado                  forma equívoca – tendo em vista o estágio de
Sobre Registro de Filmes), de 1989.                               desenvolvimento deste país ao tempo da criação
    No âmbito da Organização dos Estados                          da legislação pertinente – concedeu direitos mais
Americanos (OEA), o Brasil ratificou a Convenção                  amplos aos detentores de propriedade intelectu-
Interamericana sobre os Direitos de Autor em                      al, numa clara pressão exercida pela indústria es-
Obras Literárias, Científicas e Artísticas.                       trangeira.
    O Brasil também ratificou, em 1995, o Acordo                      Logo após o TRIPS, vale ressaltar, o Brasil tam-
sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Inte-                  bém aprovou a Lei de Propriedade Industrial3, em
lectual Relacionados ao Comércio (TRIPS1), que                    1996, e, em 1997, a Lei de Cultivares4. Somadas à
integra o Acordo Constitutivo da Organização                      lei sobre direito autoral e à que versa sobre os
Mundial do Comércio (OMC), assinado pelo Bra-                     programas de computador (Lei 9.609/98), consti-
sil em 19942. O Acordo TRIPS, apesar de ter en-                   tuem as principais regras jurídicas que adequa-
trado em vigor em 1995, tornou-se eficaz no Brasil                ram o ordenamento brasileiro ao TRIPS.
apenas no início do ano 2000. Após longos                             A Lei de Direitos Autorais de 1998 define os
lobbies dos EUA – com a colaboração da Europa                     direitos morais dos autores (artigos 24 a 27), como
e do Japão – o tema da propriedade intelectual                    o direito ou prerrogativa que tem aquele que criou
passou a ser tratado eminentemente como um                        uma obra intelectual de defendê-la como atributo
bem econômico.                                                    de sua própria personalidade. Todavia, vale res-
    Nesse sentido, o TRIPS significou uma grande                  saltar que o TRIPS, por tratar-se de um acordo com
vitória dos países industrializados e detentores                  fins comerciais, não obriga os países signatários a
da maior parcela de direitos de propriedade in-                   preverem estes direitos em seus ordenamentos
telectual. Em termos práticos, o TRIPS trouxe dois                jurídicos internos. Tal entendimento provém da
resultados:                                                       tradição anglo-saxã, liderada pelos EUA e basea-
    a) um amplo e forte patamar mínimo de pro-                    da no common law, em que os direitos são funda-
teção a diversos direitos de propriedade inte-                    mentados nos costumes e na tradição, e não em
lectual;                                                          leis codificadas. Segundo esta concepção, não exis-
    b) uma direta responsabilidade legal para ma-                 te proteção aos direitos morais. Por outro lado, a
nutenção e promoção dos direitos de proprieda-                    existência de um direito eminentemente econô-
de intelectual a ser observada por todos os mem-                  mico, chamado de “direito de cópia”, ou
bros signatários do TRIPS, já que passou a ser                    “copyright”, constituiu-se num dos pilares do ca-
possível aplicar sanções a países que não respei-                 pitalismo, ao transformar conhecimento em mer-
tem o disposto no acordo.                                         cadoria.
                                                                      Nos artigos 28 a 45, a Lei de Direitos Autorais
    Lei 9.610/98: adequação ao Acordo TRIPS                       define os chamados direitos patrimoniais do au-
    Em 1998, foi aprovada no Congresso Nacional                   tor, garantindo ao titular ou ao cessionário do di-
e sancionada pelo presidente da República, à épo-                 reito autoral o monopólio da exploração material
ca Fernando Henrique Cardoso, a Lei 9.610, que                    das obras (art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo
alterou, atualizou e consolidou a legislação ante-                de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou
rior sobre direitos autorais, datada de 1973. A Lei               científica), conferindo ao autor da obra intelectual

1. Na maioria dos países de língua latina o TRIPS (Trade Related Aspects of Intellectual Property Rights) é conhecido como ADPIC.
Entretanto, por ser comumente empregado no Brasil, usaremos neste relatório a sigla em inglês.
2. O TRIPS passou a se aplicado no Brasil a partir do Decreto Legislativo 30, de 15/12/1994 e do Decreto Federal 1.355, de 30/12/
1994.
3. Lei 9.279/96. Também faz parte da legislação sobre propriedade industrial o Decreto 2.553/98.
4. Lei 9.456/97


                                                                                                                             69
a prerrogativa de auferir vantagens pecuniárias                  qualquer meio ou processo, de obra intelectual,
com a utilização da obra e ser remunerado por                    interpretação, execução ou fonograma, sem auto-
sua exploração econômica. Tal exploração pode                    rização expressa do autor, do artista intérprete ou
ser realizada pelo próprio autor ou por pessoa                   executante, do produtor, conforme o caso, ou de
                                                                 quem os represente:
autorizada por ele(a), conforme ficar estipulado
                                                               Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e mul-
em contratos nos quais artistas cedem os direitos                ta.
a terceiros (artigos 49 a 67).
    Há que se destacar, também, a existência dos               § 2º Na mesma pena do § 1º incorre quem, com o
“direitos conexos” (artigos 89 a 96), ou seja, a lei              intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende,
assume que o produtor do fonograma, do livro                      expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire,
ou da obra audiovisual, por exemplo, detém algu-                  oculta, tem em depósito, original ou cópia de obra
ma interferência no resultado autoral das obras                   intelectual ou fonograma reproduzido com viola-
que promove. Neste caso, o direito autoral se con-                ção do direito de autor, do direito de artista intér-
funde, quase que em definitivo, com a lógica da                   prete ou executante ou do direito do produtor de
                                                                  fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de
produção industrial. Confusão esta que só aumenta
                                                                  obra intelectual ou fonograma, sem a expressa
por ser o Brasil o único país que possui apenas                   autorização dos titulares dos direitos ou de quem
um órgão para arrecadar tanto os direitos auto-                   os represente.
rais quanto os direitos conexos.
    Por fim, a lei versa sobre as sanções civis aos            § 3º Se a violação consistir no oferecimento ao públi-
violadores dos direitos autorais (artigos 102 a                   co, mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou
110), que serão, também, objeto do Código Civil                   qualquer outro sistema que permita ao usuário re-
(artigos 186 e 927).                                              alizar a seleção da obra ou produção para recebê-
    A Lei 5.988 de 1973 – anterior à atual – quando               la em um tempo e lugar previamente determina-
da promulgação da atual Lei de Direitos Autorais                  dos por quem formula a demanda, com intuito de
                                                                  lucro, direto ou indireto, sem autorização expres-
(Lei 9.610), não foi completamente revogada.
                                                                  sa, conforme o caso, do autor, do artista intérprete
Manteve-se o artigo 17 (§ 1º e 2º), que possibilita               ou executante, do produtor de fonograma, ou de
o registro das obras pelos autores em instituições                quem os represente:
mantidas pelo Estado brasileiro, como a Biblioteca             Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e mul-
Nacional, a Escola de Música e a Escola de Belas                  ta.
Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o
Instituto Nacional do Cinema e o Conselho Federal              § 4º O disposto nos §§ 1º, 2º e 3º não se aplica quando
de Engenharia, Arquitetura e Agronomia. As regras                 se tratar de exceção ou limitação ao direito de autor
para o registro são estabelecidas por cada uma                    ou os que lhe são conexos, em conformidade com
dessas entidades.                                                 o previsto na Lei nº. 9.610, de 19 de fevereiro de
                                                                  1998, nem a cópia de obra intelectual ou
                                                                  fonograma, em um só exemplar, para uso privado
     Lei 10.695/03 (Lei Anti-pirataria)                           do copista, sem intuito de lucro direto ou indireto.
    A Lei 10.695 de 2003, mais conhecida como
Lei Anti-Pirataria, alterou o Código Penal e o Códi-               No parágrafo 3º, evidencia-se a intenção dos
go de Processo Penal, elevando as penas e os ti-               legisladores de incluir a prática de contrafação pela
pos penais para os violadores de direitos auto-                internet, assim como das ligações clandestinas de
rais. A pena mínima para a prática de contrafação              TV a cabo5, tipificando como crime o oferecimen-
com o intuito de lucro, a partir de 2003, passou               to de arquivos digitalizados a terceiros.
de um para dois anos.                                              Já o último parágrafo, apesar de estabelecer
                                                               que não incorre nas penas dos parágrafos
   Código Penal                                                anteriores a prática sem fins lucrativos, dá margem
Art. 184 - Violar direitos de autor e os que lhe são
                                                               para que as reproduções para uso próprio sejam
   conexos:
Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou
                                                               enquadradas pelo caput do artigo, que prevê a pena
   multa.                                                      de três meses a um ano de detenção. Esta
                                                               interpretação é freqüentemente utilizada nos
§ 1º Se a violação consistir em reprodução total ou            tribunais pelos advogados da indústria do direito
   parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por       de autor.


5. Conhecidas popularmente como “gatos”, as ligações clandestinas de TV a cabo são prática comum tanto em favelas como em
condomínios de classe média.



70
Nesse sentido, deve-se questionar com veemên-                  pela revolução digital – de apropriação da infor-
cia o fato da legislação estabelecer, mesmo em                     mação pela lógica da mercadoria.
casos de reprodução sem fins lucrativos de                             Ao longo do século XX, o centro do capitalis-
fonogramas, videogramas e obras literárias, uma                    mo passou da produção industrial para o sistema
relação com a esfera do Direito Penal, com penas                   financeiro. A racionalidade deste novo modelo de
restritivas de liberdade. Pelo princípio da interven-              acumulação capitalista pressupõe que as leis que
ção mínima, não se deve encarcerar um ser huma-                    protegem a propriedade estendam-se para além
no por um ano, ou mesmo três meses, pela viola-                    do produto e passem a incorporar os processos
ção de um direito autoral.                                         de criação, ou seja, passem a proteger o conheci-
    Além disso, a Lei Anti-pirataria alterou o Códi-               mento empregado nestes processos8. Este (o co-
go de Processo Penal, facilitando a busca e apre-                  nhecimento), por sua vez, revela-se a nova base
ensão dos materiais reproduzidos ilegalmente,                      do capitalismo e, para garantir o lucro dos deten-
assim como os equipamentos utilizados para                         tores da informação, foi preciso impor barreiras
viabilizar as reproduções. Da mesma forma, a nova                  ao acesso deste bem e torná-lo um bem escasso.
redação do Código de Processo Penal atribuiu aos                       As conseqüências mais visíveis desse processo,
titulares de direito de autor a condição de fiéis                  além da convergência tecnológica, são a progres-
depositários de todos os bens apreendidos. Por                     siva concentração da propriedade e a emergência
fim, as alterações deram ao Judiciário o poder de                  de um reduzido número de corporações
determinar a destruição dos bens ilicitamente pro-                 transnacionais de comunicação, assim como a fe-
duzidos ou reproduzidos e às associações de titu-                  roz pressão da indústria do direito autoral sobre
lares de direitos de autor a possibilidade de funci-               os governos nacionais. As recentes fusões das
onar como assistente da acusação nos crimes pre-                   corporações de comunicação são sintoma desse
vistos no artigo 184 do Código Penal, quando pra-                  processo. Ao mesmo tempo em que se concen-
ticado em detrimento de qualquer de seus associ-                   tram os grupos com capital para financiar a pro-
ados6.                                                             dução de informação e cultura, cresce a necessi-
                                                                   dade de controle da circulação dessa produção
                                                                   para garantir que o fluxo desses bens seja exclusi-
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                      vamente marcado por uma relação capitalista e
                       ATORES
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                                      que os lucros auferidos por essas companhias se-
           ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                                        jam cada vez maiores9. O fato da propriedade in-
                                                                   telectual, e mais especificamente do direito auto-
     O regime de partilha do conhecimento                          ral, passar a ser regido por um acordo de negoci-
    A intenção dos legisladores, em 1998, foi con-                 ações comerciais multilaterais da Organização
ciliar o ordenamento jurídico do período anterior                  Mundial do Comércio (OMC) é símbolo dessa
às normas estabelecidas no Acordo TRIPS. Ao mes-                   transformação. Vincular o tema da propriedade
mo tempo em que procura dar proteção ao direi-                     intelectual ao comércio internacional foi, de fato,
to moral dos autores, a lei brasileira também visa                 uma necessidade imposta para garantir a
garantir a integralidade do direito autoral                        exploração comercial dos bens materiais e
patrimonial e a respectiva proteção às reprodu-                    simbólicos produzidos nos países desenvolvidos
ções não autorizadas das obras. Na prática, pro-                   e exportados para os países em desenvolvimento,
curam preservar o modelo desenvolvido no sécu-                     assim como os bens produzidos nos países em
lo XX, com as indústrias audiovisual, fonográfica                  desenvolvimento cujos direitos de exploração per-
e editorial mantendo o monopólio da difusão da                     tencem a companhias transnacionais.
cultura e do conhecimento. A substituição da Con-                      A universalização do neoliberalismo nas últi-
venção de Paris7 pelo TRIPS demonstra que entra-                   mas décadas requereu, contraditoriamente, que
mos numa nova fase – especialmente radicalizada                    os Estados se tornassem guardiões dessa relação


6. Para ver o texto completo da Lei 10.695/03, ver legislação consolidada em www.planalto.gov.br
7. A Convenção Internacional para a proteção do Direito do Autor, revista em Paris a 24 de julho de 1971 foi ratificada no Brasil
pela Lei 76.905 de 24/12/75.
8. Um outro fator importante para o incremento da lógica da propriedade intelectual foi o crescimento exponencial do “trabalho
morto”, de caráter repetitivo, realizado pelo maquinário (cada vez mais sofisticado). Assim, o valor acrescido na mercadoria cada
vez mais se deslocou para o campo do trabalho imaterial.
9. A própria natureza intrínseca da informação tende a “facilitar” a sua reprodução. A informação tem custo de reprodução zero
(ainda mais com a digitalização de seu suporte material) e não sofre (ao contrário de todas as demais mercadorias) a depreciação
natural do tempo (entropia).



                                                                                                                              71
comercial e passassem a regular a circulação da                   de impostos relacionados à venda de cópias não
informação e da cultura para atender a interesses                 autorizadas13. Porém, o alto índice de pirataria,
privados. A legislação autoral brasileira, ao prote-              combinação do pequeno poder aquisitivo da po-
ger mais o direito daqueles que exercem a ativi-                  pulação e da ausência histórica de políticas de
dade industrial de reprodução do suporte materi-                  democratização do acesso aos bens culturais, aca-
al onde a obra está contida (direitos conexos) do                 ba por criar – e isso não se pode negar – uma
que o criador propriamente, evidencia que o co-                   indústria ilegal que possui vínculos estreitos com
nhecimento, ou a cultura, transformou-se em mer-                  o crime organizado. Tal relação tende a legitimar
cadoria, passível de uma única forma de regulação:                o discurso repressor da indústria do direito autoral
a que tenha como objetivo garantir o lucro da in-                 e dificulta o debate público sobre a necessidade
dústria do direito autoral. Dessa forma, protege-                 da reformulação do marco regulatório.
se não a criação, mas apenas a distribuição de um                     A lista dos 20 CDs e DVDs mais vendidos no
produto.                                                          Brasil em 2004 mostra a predominância de
    O sistema de proteção da propriedade intelec-                 cantores e cantoras nacionais no gosto do
tual vigente, portanto, transforma os direitos do                 consumidor. Os únicos nomes internacionais
autor em “direitos da indústria” e, conseqüente-                  presentes entre os CDs são o grupo U2 e a
mente, o alto custo da aquisição de obras em di-                  coletânea “Malhação Internacional 2004”. Entre
ferentes suportes, num país com as características                os DVDs, 16 dos 20 títulos são de artistas
do Brasil, torna inviável seu consumo pela maio-                  nacionais. Quem lucra com isso, no entanto, não
ria da população. As baixas vendagens das obras/                  é o Brasil. As majors internacionais Universal, BMG,
produtos, em função do alto preço e do baixo                      Sony, EMI e Warner são responsáveis por 14 dos
poder aquisitivo da população, acabam por servir                  20 CDs mais vendidos. No campo dos DVDs, o
como justificativa para o aumento dos preços                      quadro se repete, com 15 entre os 20 mais
dessas mercadorias para que o lucro por unidade                   vendidos sendo das transnacionais.
compense o pequeno poder aquisitivo da maioria                        Paralelamente, a ausência de um modelo de
dos indivíduos. Os altos preços desestimulam                      negócio que se adapte às condições
ainda mais os consumidores, que vêem nos                          socioeconômicas brasileiras, aliadas às transfor-
produtos pirateados10 uma possibilidade legítima                  mações tecnológicas atuais, tem criado as condi-
de ter acesso à informação e à cultura.                           ções para que, cada vez mais, compositores e in-
                                                                  térpretes abandonem as grandes gravadoras para
    Segmento Musical                                              se tornarem "independentes", voltando a contro-
   Essa realidade é evidente na indústria                         lar a publicação e comercialização das edições de
fonográfica, onde os produtos piratas respondem                   seus trabalhos. Dessa forma, ao mesmo tempo em
por 63%11 das vendagens e têm sido, segundo exe-                  que não cedem seus direitos a terceiros, criam
cutivos das grandes companhias, um dos diver-                     condições de reformalização das relações comer-
sos fatores de desestruturação das principais gra-                ciais que hoje aparecem como antagônicas aos
vadoras12. Contudo, os diferentes números apre-                   direitos autorais14.
sentados pelas empresas, entidades de gestão de                       É preciso reafirmar que a indústria do direito
direitos autorais e órgãos de combate à pirataria                 autoral do segmento musical tem contribuído
não possibilitam estimar com precisão os “prejuí-                 decisivamente para o desvirtuamento das funções
zos” reais da indústria fonográfica e a sonegação                 públicas dos veículos de radiodifusão. As grandes

10. Termo bastante difundido no Brasil, a “pirataria” refere-se à reprodução não autorizada de produtos protegidos pelo direito
autoral com a clara finalidade de geração de lucro. Normalmente, esses produtos são reproduzidos em grande escala e depois
repassados para o comércio informal.
11. Fonte: Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD)
12. Os CDs de música piratas são vendidos, em média, por um preço cinco vezes menor. É imprecisa, entretanto, a afirmação de
que a pirataria é a única ou principal causa das dificuldades atuais das majors. Porém, tal interferência existe e não pode ser
desconsiderada. O relatório anual da ABPD, que congrega as cinco maiores gravadoras estrangeiras, ou majors (EMI, Sony, BMG,
Universal e Warner), aponta uma queda de 17% em valores e de 25% no que diz respeito a unidades vendidas em 2003 em relação
a 2002.
13. Isso se justifica porque a compra de um CD não autorizado não pode ser computada como uma possível compra de um CD
“legal”, exatamente porque o que viabiliza o acesso aos produtos pela população é seu preço mais baixo. Fosse o valor dos
produtos ilegais semelhante ao praticado pela indústria, aí sim se poderia estabelecer uma relação direta entre um CD “pirata”
comprado e um CD “legal” não comprado.
14. Nesse sentido, o aumento do número de selos independentes – e de artistas de renome que a eles aderem – também pode,
em certa medida, ser considerado uma das causas da queda nas vendas das majors.
15. No Brasil, a despeito do crescente número de selos independentes, as cinco maiores gravadoras permanecem as majors.



72
gravadoras15 utilizam-se ininterruptamente de um                 coibir a cópia de produtos não licenciados, as gran-
instrumento popularmente conhecido como                          des empresas de softwares de código fechado fi-
“jabaculê”, ou “jabá”. Na prática, trata-se da com-              nanciam intensas campanhas publicitárias em rá-
pra pelas gravadoras de espaço nos veículos de                   dio, televisão, salas de cinema, internet e periódi-
radiodifusão para a inserção dos artistas cujos di-              cos diários e semanais.
reitos de exploração das obras foram a ela cedi-                    Tais campanhas, que promovem a relação sim-
dos. No rádio, em especial nos grandes e médios                  bólica entre o usuário de cópias ilegais e o crime
centros urbanos, é o “jabá” que determina a gra-                 organizado, somadas às multas aplicadas a um
de de programação da maioria das rádios comer-                   número significativo de empresas que utilizavam
ciais (e que possuem maior audiência). Na televi-                softwares copiados ilegalmente, reduziram sensi-
são, a realidade não difere: parcela significativa               velmente a porcentagem de softwares piratas nos
dos programas musicais e “de auditório” determi-                 computadores brasileiros. De 1994 a 2002, o ín-
na os artistas que farão parte da programação em                 dice de softwares copiados sem autorização no
função das verbas que recebem das majors.                        Brasil passou de 77% para 55%. Devido ao cresci-
    Atualmente, apesar de as grandes corporações                 mento de número de computadores no mesmo
do setor musical serem responsáveis por apenas                   período, tal redução, porém, não significou um
16% dos discos de música brasileira lançados, seus               decréscimo em números absolutos de computa-
“produtos” ocupam 97% da radiodifusão pública16.                 dores com softwares copiados ilegalmente18.
Por certo, o principal papel cumprido pelas
multinacionais tem sido o de impedir que o pú-                       Livros e bibliotecas públicas
blico tenha acesso à maior parcela do se produz                      No caso das fotocópias de livros, em especial
musicalmente no país. Mais do que um meio imo-                   no uso relacionado à educação, houve, a partir de
ral e ilegal de promover as vendas, o jabá conver-               1998, uma pressão crescente das organizações de
teu-se numa forma intolerável de censura à pro-                  editores, em especial da Associação Brasileira de
dução/distribuição cultural nacional, comprome-                  Direitos Reprográficos (ABDR), para que os cen-
tendo a radiodifusão como um espaço de autênti-                  tros de fotocópias de universidades passassem a
ca troca cultural.                                               ser fiscalizados e impedissem a cópia de obras
    O dispêndio das gravadoras com a compra ile-                 acadêmicas e literárias.
gal de espaço no rádio e na televisão pode ser                       O objetivo das pressões era reduzir as repro-
considerado, em conjunto com altos preços dos                    duções completas ou de grandes trechos de livros.
produtos, uma das principais causas da progressi-                A influência coercitiva, na prática, dilui-se com o
va desestruturação financeira das majors no Brasil               tempo. Diante da impossibilidade de aquisição de
e foi, assumidamente, a causa da falência da                     livros pela maioria dos estudantes e da dificuldade
principal tentativa recente de criação de uma                    na definição de “pequenos trechos”, como consta
grande gravadora de capital nacional17.                          na Lei 9.610, os centros de fotocópia continuam a
                                                                 ser a principal fonte de material educacional im-
    Programas de computador                                      presso19. Segundo pesquisa, estima-se que entre
   As cópias não autorizadas de softwares propri-                20 e 28 bilhões de páginas sejam copiadas por
etários (cujos valores no mercado informal podem                 ano nas universidades, ou seja, se o cálculo for
ser até 50 vezes mais baixos do que a licença de                 feito a partir do número de páginas, para cada
uso de um software proprietário) respondem por                   livro vendido, quatro são copiados20. Porém, como
mais da metade do mercado brasileiro de progra-                  não há uma definição possível para “pequenos tre-
mas de computador. Para preservar seus lucros e                  chos”, como consta na Lei 9.610/98, é impossível
16. Fonte: pesquisa de Sérgio Rubens de Araújo Torres, disponível em www.horadopovo.com.br/2004/julho/16-07-2004/pag8a.htm
17. A Abril Music, que pertencia ao Grupo Abril, encerrou suas atividades em 2002. Alguns de seus executivos admitiram
publicamente que a empresa não estava suportando financeiramente o custeio das “verbas de promoção”, novo rótulo para a
prática do jabá.
18. Fonte: Associação Brasileira de Empresas de Software (Abes)
19. Há, entretanto, a continuidade de uma série de ações repressivas. Em todo o país, segundo a ABDR, mais de 90 ações foram
promovidas só em 2004. Exemplos de outras ações já realizadas são: em outubro de 2002, foram apreendidas em copiadoras na
UERJ cópias de 140 obras. Em outubro de 2003, uma ação policial no campus da UFRJ resultou na apreensão de 300 cópias de
obras. Em abril de 2003, mais de 200 cópias de livros foram apreendidas na UNB. Em novembro de 2003, na cidade de Goiânia,
foram apreendias 350 livros em copiadoras.
20. Fonte: RIBEIRO, Ana Cláudia da Silva Paiva. Academia e Pirataria - O livro na Universidade. UFRJ, 2002. Segundo a ABDR, a
cópia de livros propicia perdas anuais de R$ 400 milhões às editoras. Entretanto, assim como no setor musical, não é possível
considerar que uma cópia de livro corresponderia à compra de outro. O baixo custo da cópia é que proporciona o acesso ao
conteúdo pelos estudantes. Fosse a cópia impossível, assim como na música, a maioria não teria condições de comprar os livros.



                                                                                                                           73
dizer quantas dessas cópias seriam “ilegais” se-




                                                                                                                                     FONTE: ABDR
                                                                         VENDAS SUBSETOR CIENTIFICOS
gundo o ordenamento jurídico atual.                                     TECNICOS E PROFISSIONAIS VERSUS
    De fato, não há, pelo menos de maneira gene-                          MATRICULAS ENSINO SUPERIOR
ralizada, um entendimento por parte de
professores, pesquisadores e alunos de que a cópia                3.500.000
                                                                  3.000.000                                   Cientificos,Tecnicos
de livros constitui-se ato ilícito. Os docentes,                  2.500.000                                   e Profissionais em
                                                                  2.000.000                                   R$ 1000
inclusive, estimulam a prática com as chamadas                    1.500.000                                   Matriculas no
“pastas de professor”, em que os docentes                         1.000.000                                   Ensino Superior
                                                                    500.000
selecionam textos de diversas procedências para                         -
compor a bibliografia de uma determinada




                                                                              8

                                                                                    9

                                                                                           0

                                                                                                  1

                                                                                                         2
                                                                             9

                                                                                     9

                                                                                            0

                                                                                                   0

                                                                                                          0
                                                                          19

                                                                                  19

                                                                                         20

                                                                                                20

                                                                                                       20
disciplina e deixam nas copiadoras de suas
unidades de ensino.
    A busca pelo controle das fotocópias nas esco-                   A tabela acima, que relaciona a venda de livros
las e universidades, em parte, se explica pela soma              acadêmicos/universitários e a evolução das
do restrito hábito de leitura e da dificuldade na                matrículas no ensino superior, ajuda a dimensionar
aquisição de livros pela maioria da população.                   essa relação. Enquanto cresceram as matrículas,
Entre os membros da classe A, 50% têm o hábito                   diminuíram as vendas. Por certo, o principal motor
de ler; na B, 37%; na C, 27%, e na classe D, 21%. As             da expansão do ensino superior foi o crescimento
porcentagens são igualmente proporcionais ao                     das instituições privadas de ensino que,
nível de escolaridade: grau superior, 55%; ensino                contraditoriamente, têm como principal público
médio, 29%; 5ª a 8ª séries, 15%; 1ª a 4ª séries,                 estudantes de baixa renda. Portanto, há uma
10%21. O “desinteresse” pela leitura está ligado,                evidente relação entre a aquisição de livros e o
portanto, não somente a razões econômicas, mas                   poder aquisitivo dos estudantes que, de 1998 a
também culturais/educacionais, visto que não po-                 2002, foi especialmente afetado pela crise econô-
demos atribuir o pouco hábito de leitura exclusi-                mica que atingiu o país24.
vamente à impossibilidade de aquisição de livros.                    As bibliotecas públicas, que poderiam demo-
Como mostram os números, as classes A e B tam-                   cratizar o acesso ao conhecimento, não atingem
bém não lêem como suas equivalentes em outros                    parcela significativa da população. Segundo da-
paises do mundo, como a Argentina e o México.                    dos do Instituto Brasileiro de Geografia e
    Segundo aponta pesquisa recente, apenas 26                   Estatística (IBGE), 20% dos municípios brasileiros
milhões dos brasileiros leram ao menos um livro                  não possuem bibliotecas públicas. Mesmo entre
nos últimos três meses, o que corresponde a 30%                  aqueles municípios que têm o equipamento, 69%
da população adulta alfabetizada. O mercado con-                 possuem apenas uma biblioteca.
sumidor é ainda menor: 17,2 milhões de pessoas                       Ainda em relação à democratização do conhe-
alfabetizadas acima de 14 anos compraram pelo                    cimento na área educacional, é importante desta-
menos um livro no ano de 2000 22. Somente                        car que o Estado brasileiro despende anualmente
metade (53%) dos brasileiros alfabetizados possui                aproximadamente R$ 580 milhões na compra de
mais de dez livros em casa.                                      livros didáticos para a distribuição aos alunos da
    A concentração do poder aquisitivo, sintoma                  rede pública. Os custos dos 124 milhões de volu-
de uma sociedade desigual como a brasileira, re-                 mes comprados por ano incluem o pagamento de
flete também a desigualdade do poder de compra                   royalties aos autores (aproximadamente 10% dos
de livros. No Brasil, 16% da população concentram                preços de venda dos livros25). Caso seja necessá-
73% dos livros adquiridos por pessoas físicas. Em                rio adquirir mais unidades dos mesmos livros, o
seis estados das regiões Sul e Sudeste concentram-               Estado brasileiro deve arcar novamente não so-
se mais da metade dos compradores (58%). Segun-                  mente com os royalties – já que os conteúdos dos
do revela a mesma pesquisa23, metade dos livros                  livros não passam a fazer parte do domínio públi-
lidos atualmente não são comprados. Ou seja, são                 co e não podem ser reproduzidos livremente, mes-
emprestados ou doados.                                           mo que resguardos os direitos morais dos auto-

21. Fonte: Câmara Brasil do Livro.
22. Idem.
23. Fonte: Pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro 2002
24. Segundo dados do IBGE, a renda média do brasileiro caiu 25% de 1997 a 2002.
25. Fonte: ABDR e Associação Brasileira de Escritores(ABE)
26. Fonte: Ministério da Educação - www.mec.gov.br
                                    www.mec.gov
                                        .mec.gov.br
27. Idem.


74
res – mas deve proceder nova compra sob mes-            me de direitos autorais idealizado pelos legisla-
mas regras de mercado26. Em função disso, a com-        dores seja colocado em prática. Inversamente, a
pra governamental de livros didáticos é responsá-       busca pela efetivação do regime proposto pela
vel pelo lucro de parcela significativa de editoras     legislação acaba por criar mais obstáculos ao de-
e resulta em pressões permanentes dessas empre-         senvolvimento da sociedade brasileira, na medi-
sas sobre as comissões avaliadoras dos livros, res-     da em que restringe a livre circulação de informa-
ponsáveis pela escolha dos livros.                      ções.
    É preciso especial atenção a essa questão, prin-
cipalmente pelo fato do governo brasileiro ser o            O direito autoral na multimídia
maior comprador de livros do Brasil e do mundo,             Segundo apontam autores mais recentes, as Leis
tendo adquirido, em 2002, 162,2 milhões de              9.610/98 e 9.609/98, apesar de ambientar a legis-
exemplares para seus programas de ensino                lação brasileira ao TRIPS, já podem ser considera-
básico 27.                                              das defasadas em relação à atual realidade
    Em relação a copias de obras em suporte de          tecnológica, pois transferem para as obras digi-
papel, especialistas e juristas brasileiros com atu-    tais os mesmo princípios das obras analógicas. Tal
ação no campo do direito autoral – e que não ad-        raciocínio aplica-se especialmente às criações em
vogam para empresas ou associações gestoras de          multimídia, onde duas ou mais formas
direitos autorais – são unânimes em afirmar que,        digitalizadas de expressão artística são transmiti-
no Brasil, é fundamental forjar uma definição am-       das através de um software.
pla do conceito de “uso pessoal”, para que a cir-           Ao contrário da Europa e dos EUA, o Brasil ain-
culação do conhecimento produzido não seja              da não possui qualquer lei específica sobre a ma-
obstruída pelas necessidades de mercado impos-          téria. A concepção individualista que impera na
tas pelas editoras.                                     regulamentação do direito de autor nas obras
    As restrições previstas na legislação brasileira,   analógicas pode tornar-se um entrave à criação
que só autoriza cópia de “pequenos trechos”, “em        no ambiente digital, na medida em que o criador
um só exemplar”, “para uso privado do copista”,         da obra multimídia deve necessariamente obter
quando referidas ao mundo digital, tornam a si-         permissão dos autores das obras que vão compor
tuação ainda mais complexa. Considerando que a          o multimídia. Na medida em que não pode utilizar
Lei 9.610/98 controla, dentre outros elementos,         componentes de obras de terceiros (característica
os direitos de “cópia”, o direito autoral, como co-     fundamental do multimídia) para a criação dessa
locado no ordenamento brasileiro, passa a ser           nova obra, o autor encontra um sério obstáculo
hegemônico no ambiente digital. Em termos prá-          ao desenvolvimento dos produtos. Como conse-
ticos, representa barreiras muito altas de acesso à     qüência, o criador da obra multimídia, em parcela
informação, ao conhecimento e, portanto, à              significativa dos casos, acaba optando entre vio-
efetivação de direitos humanos, em especial o di-       lar o direito autoral (utilizando o material sem
reito à educação e à cultura.                           autorização), desistir do projeto ou utilizar somen-
    Impõe-se, assim, um ciclo vicioso. A ausência       te material próprio ou de domínio público, limi-
de condições materiais impossibilita que o regi-        tando a concepção original da obra.




                                                                                                        75
B 2: Medidas práticas para implementar esse regime.

B 2.1 - Políticas públicas e ações para encorajar e possibilitar a mais ampla e
difusa geração e comunicação do conhecimento, que podem incluir:
-     modos de celebrar bons trabalhos por parte de profissionais e do público;
-     incentivos públicos para pesquisa e criação local/nacional do conhecimento
em áreas de reconhecida necessidade;
-     instrumentos públicos para facilitar o acesso ao conhecimento, inclusive
uma política de disseminação de conteúdo de interesse público;
-     apoio público para software livre e de código aberto – por exemplo
através de uma política pública de provisão – e para o desenvolvimento de
especialistas nacionais;
-     currículos escolares que encorajem métodos críticos e questionadores de
aprendizado;
-     apoio prático ao desenvolvimento de abordagens voltadas ao
desenvolvimento e amistosas à comunidade para a partilha do conhecimento,
como copyleft, General Public License (GPL) etc.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL
                                                                      Apesar de facultativa aos titulares do direito –
   A Lei 9.609/98, publicada simultaneamente à                    os empregadores, conforme estabelece o artigo
Lei de Direitos Autorais (9.610), dispõe sobre a                  4º – a regulamentação sobre o registro dos
proteção da propriedade intelectual de programas                  programas foi estabelecida pelo Decreto
de computador e sua comercialização no país.                      Presidencial 2.556, também de 1998.
                                                                      Ao tratar o software com o mesmo status que
Art. 2º. O regime de proteção à propriedade intelec-              a obra literária, a legislação brasileira não só ga-
   tual de programa de computador é o conferido às                rante sua proteção pela Lei 9.610/98 como tam-
   obras literárias pela legislação de direitos autorais          bém propicia o entendimento de que a criação do
   e conexos vigente no País.                                     software é exclusivamente individual (ou de um
                                                                  grupo de pessoas) e, portanto, passível de prote-
§ 1º Não se aplicam ao programa de computador as
   disposições relativas aos direitos morais,
                                                                  ção28. Não há na principal lei brasileira sobre o
   ressalvado, a qualquer tempo, o direito do autor               assunto qualquer menção expressa à possibilida-
   de reivindicar a paternidade do programa de                    de de criação colaborativa de softwares, como é o
   computador e o direito do autor de opor-se a                   caso do software livre. Tal entendimento estende-
   alterações não-autorizadas, quando estas                       se a toda produção científico-tecnológica atual
   impliquem deformação, mutilação ou outra                       que, de fato, pode ser considerada de caráter co-
   modificação do programa de computador, que                     letivo, mas que é tratada na legislação como fruto
   prejudiquem a sua honra ou a sua reputação.                    exclusivo de elaboração individual.
                                                                      Os softwares, por ficção jurídica, apesar de se-
§ 2º Fica assegurada a tutela dos direitos relativos a
                                                                  rem tratados como obras literárias, em princípio
   programa de computador pelo prazo de 50 anos,
   contados a partir de 1º de janeiro do ano subse-
                                                                  não precisam ser registrados para obter proteção
   qüente ao da sua publicação ou, na ausência des-               legal. Todavia, para que a proteção possa “produzir
   ta, da sua criação.                                            efeitos em relação a terceiros”29, ou seja, para que

28. Por outro lado, toda a política de fomento aos softwares nacionais, desenvolvida pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e
pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, trata os programas de computador como produtos industriais e, por
isso, coletivos.
29. Lei 9.609/98, Art. 11º


76
os direitos possam ser exercidos contra alguém                  pessoas, encaminhou ao Ministério da Justiça re-
que porventura venha a violar os direitos do titu-              latório em que propõe a adoção de uma série de
lar, o software precisa ser registrados no Instituto            medidas para combater a pirataria no Brasil. A mais
Nacional de Propriedade Industrial (Inpi).                      importante das propostas é a criação do Plano
                                                                Nacional de Combate à Pirataria, que articularia
                                                                diversos setores do governo para diminuir a eva-
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                   são fiscal e os “delitos” contra a propriedade inte-
  PAPEL                ATORES
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                                   lectual.
           ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                                         As recomendações do relatório da CPI, a per-
                                                                manente pressão da indústria do direito autoral e
    Pressões da Indústria do direito autoral                    a crescente prática de contrafação motivaram a
    A ineficácia das políticas governamentais para              criação, em 2004, do Conselho Nacional de
impedir a pirataria tem sido motivo de sucessivas               Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade
pressões internacionais sobre o Brasil, especial-               Intelectual. Trata-se de um órgão colegiado
mente do governo norte-americano e das organi-                  consultivo vinculado ao Ministério da Justiça e que
zações que representam a indústria de direitos de               tem como função justamente elaborar as diretrizes
autor nos Estados Unidos e possuem escritórios                  para a formulação e proposição do Plano Nacional
no Brasil. Em junho de 2004, por exemplo, os Es-                de Combate à Pirataria. O conselho,
tados Unidos anunciaram que o Brasil poderia                    principalmente pelas pressões que motivaram sua
perder o acesso a um regime especial de tarifas                 criação, tende a tornar-se um espaço institucional
caso não apresentasse “melhoras” na proteção à                  ocupado majoritariamente por representantes dos
propriedade intelectual. Um mês antes, em 20 de                 interesses das grandes corporações.
maio, a International Intellectual Property Alliance                Outro sinal evidente das movimentações da
enviou correspondência oficial ao Escritório de                 indústria está no desenvolvimento e uso de
Representação Comercial dos EUA indicando que                   tecnologias restritivas. No final de 2002, a grava-
o Brasil não “cumpria suas obrigações” no que se                dora EMI lançou os primeiros CDs musicais com
referia à proteção da propriedade intelectual.                  um dispositivo "antipirataria" desenvolvido pela
    Para responder às pressões da indústria de                  Microsoft, que impede que um CD musical, legiti-
direito autoral nacional e internacional, o Congres-            mamente adquirido, seja copiado para o compu-
so Nacional aprovou em 2003 a Lei 10.695, mais                  tador do consumidor e, conseqüentemente, gra-
conhecida como Lei Anti-pirataria, aumentando as                vado em outro CD ou transmitido pela internet.
punições para a prática de contrafação. Os sete                 Como assume a própria Philips, detentora da
mil processos por “pirataria audiovisual” abertos               tecnologia dos Compact Discs, os novos discos
no Brasil, entretanto, resultaram em apenas 16                  antipirataria não poderiam ser chamados de CDs,
condenações e nenhuma prisão30. A relação nu-                   porque eles usam técnicas de gravação diferentes
mérica revela que uma realidade socialmente                     do CD comum, reduzindo a qualidade do som e a
injusta como a do Brasil gera dificuldades no meio              durabilidade das mídias33.
jurídico em determinar a linha divisória entre o                    Contudo, a adoção de mecanismos que impe-
legal e o legítimo. Mais ainda, evidencia que não               dem a cópia de um CD musical – como bem frisam
há qualquer ambiente para a punição de usuários                 as provocações encaminhadas por advogados ao
de cópias reproduzidas para uso pessoal sem pa-                 Ministério Público – é uma ação que extrapola os
gamento de royalties.                                           direitos patrimoniais do autor e afronta o atual
    Também em 2003, o Congresso Nacional ins-                   ordenamento jurídico brasileiro. Por impedir o li-
talou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI)                 vre acesso à informação e à cultura, inalienáveis e
da Pirataria31 com o objetivo de investigar e pro-              indisponíveis direitos de todos os indivíduos, a
cessar os grandes capitalistas das falsificações e              EMI e as outras majors travam atualmente uma
cópias ilegais32. A CPI, que finalizou seus trabalhos           disputa nos tribunais para legitimar a nova
em junho de 2004 e sugeriu o indiciamento de 80                 ecnologia, ainda não generalizada no país34.


30. Fonte: Associação de Defesa da Propriedade Intelectual (Adepi)
31. www.camara.gov.br
32. Os pequenos comerciantes de produtos ilegais são, por enquanto, poupados das ações policiais. Quando flagrados, costuma-
se somente apreender os produtos, apesar da legislação também criminalizar os comerciantes de produtos copiados ilegalmente.
33. Fonte: Consultor Jurídico – www.conjur.uol.com.br
34. Nos EUA, os maiores selos de música do mundo estão sendo processados por inúmeros consumidores por causa de CDs anti-
pirataria, projetados para evitar a troca ilegal de músicas pela internet.



                                                                                                                        77
A gestão coletiva no setor musical                            plo, inviabilizar o desenvolvimento de atividades
    Na outra ponta do direito autoral estão entida-               econômicas no mesmo e em outros segmentos,
des representativas dos autores, que estabelecem                  assim como impedir o funcionamento de espaços
regras para o recolhimento da arrecadação e dis-                  públicos culturais e de entretenimento que não
tribuição dos royalties. A Lei 9.610/98 estabelece                tenham fins lucrativos.
em seu artigo 97 que “para o exercício e defesa de                   A mesma política de arrecadação proposta pela
seus direitos, podem os autores e os titulares de                 legislação não diferencia os “tipos” de mídia, como
direitos conexos associar-se sem o intuito de lucro”              as rádios comunitárias. Em sua maioria, tais veí-
e mantém o Escritório Central de Arrecadação e                    culos não têm qualquer mecanismo de geração
Distribuição (Ecad)35, criação da lei de 1973. O                  de renda (dada, em grande parte, a legislação re-
órgão é o responsável por coordenar a fiscaliza-                  pressiva para o setor), não podendo arcar com
ção, arrecadação e distribuição dos valores prove-                custos relativos ao pagamento de royalties. Atual-
nientes das execuções de obras musicais, repas-                   mente, devido à evidente penúria financeira das
sando 82% dos valores relativos à arrecadação para                rádios, a pressão do Ecad sobre os veículos comu-
associações de músicos que, por sua vez, repas-                   nitários diminuiu. Porém, tal fato é mais uma evi-
sam os valores, descontados mais 6%, aos compo-                   dência da necessidade do desenvolvimento de uma
sitores a elas filiados.                                          legislação de direitos autorais que diferencie não
    No segmento musical, as práticas do Ecad são                  só os tipos de mídia como também os espaços de
contestadas por músicos e produtores. Entre as                    execução pública das obras musicais.
questões mais relevantes estão a ausência de cri-
térios na cobrança de usuários, o cerceamento à                       A gestão dos direitos autorais dos autores de
realização de eventos populares sem fins lucrati-                 livros, artes visuais e teatro
vos, os mecanismos pouco claros de distribuição                       Não há, no Brasil, a gestão coletiva dos direi-
de royalties e a apropriação de valores relativos ao              tos dos autores de livros. O repasse dos royalties
recolhimento sobre composições cujos autores não                  provenientes da exploração comercial das obras é
são filiados a associações.                                       feito diretamente pelas editoras aos autores. En-
    Há, além disso, uma falsa liberdade associativa.              tretanto, diversas entidades procuram organizar
Segundo a legislação (artigos 98 e 99 da Lei                      os autores de livros. Entre elas estão a Associação
9.610), o compositor pode optar entre fazer a ar-                 Brasileira de Escritores (ABE), entidade nacional
recadação por si ou mediante associação, não                      para a “defesa dos direitos autorais e demais
havendo, portanto, obrigatoriedade de associação.                 direitos dos escritores”, e Associação Brasileira dos
Entretanto, caso o compositor não se associe a                    Autores de Livros Educativos (Abrale).
uma entidade filiada, o Ecad recolhe os royalties                     Na área de teatro/artes cênicas, os direitos au-
relativos à exibição pública de suas obras, mas                   torais podem ser recolhidos pela Sociedade
não repassa ao autor36.                                           Brasileira de Autores Teatrais (SBAT), entidade
    No Brasil, diferentemente de países como a                    fundada em 1917 e que atualmente se encontra
França, a Inglaterra e os EUA, não há qualquer                    bastante desarticulada.
controle governamental sobre as entidades                             Em 2004, foi criada a Associação Brasileira dos
gestoras coletivas de direitos autorais37, seja o                 Direitos de Autores Visuais (AUTVIS), a primeira
Ecad, sejam as associações. Tal falta de controle,                com finalidade de administrar os direitos autorais
muitas vezes, faz com que a prerrogativa do mo-                   dos criadores visuais e possibilitar o intercâmbio
nopólio de gestão dos direitos autorais seja                      mundial das obras por meio das sociedades
exercida abusivamente. A cobrança de altos valores                internacionais de administração de direitos
para a execução de obras musicais pode, por exem-                 autorais38.




35. Lei 9.610/98 - Art. 99. As associações manterão um único escritório central para a arrecadação e distribuição, em comum, dos
direitos relativos à execução pública das obras musicais e lítero-musicais e de fonogramas, inclusive por meio da radiodifusão e
transmissão por qualquer modalidade, e da exibição de obras audiovisuais
36. Diversos compositores e produtores de eventos musicais relatam experiências em que foram obrigados a arcar com os custos
impostos pelo Ecad, mesmo com os autores não sendo filiados a nenhuma associação. Procurado, o Ecad não quis se pronunciar
sobre a questão.
37. Fonte: Ministério da Cultura – www.cultura.gov.br
38. Para saber mais sobre a atuação das entidades consultar: www.abe.org.br, www.abrale.org,br, www.autvis.org.br e
www.sbat.org.br


78
B 2.2 - Uma interpretação ativa e a implementação, por parte de órgãos públicos e
estatais, das leis e acordos nacionais e internacionais sobre copyright e patentes
relevantes, favorecendo uma partilha equilibrada do conhecimento, ou seja:
-      apoio para o ‘uso justo’ de material sobre copyright, freqüentemente
barrado por termos de licenciamento não negociáveis para material digital, como
publicações especializadas;
-      reconhecimento e proteção dos ‘direitos morais’ dos autores;
-      restrições sobre o gerenciamento de direitos digitais, encriptação e
mecanismos anti-burladores que inibam o uso justo de informação eletrônica;
-      esforços para formatar a propriedade intelectual de acordo com condições
nacionais, o que freqüentemente irá contra tendências nos acordos
internacionais;
-      esforços para formatar a propriedade intelectual em produtos digitais que
promovam novos modelos de negócios, baseados na partilha do conhecimento, e
que coíbam medidas (como o patenteamento de software) que mantenham
monopólios ou oligopólios e inibam a inovação;
-      esforços para assegurar que expressões de folclore não sejam registradas
e exploradas por terceiras partes (incluindo o problema do ‘autor identificável’),
ou seja, pela incorporação da proteção folclórica na legislação nacional (casos de
Bolívia, 1968, e Quênia, 1975).

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                            público nem sequer pode ter acesso à obra, por
                                                       estar fora de catálogo ou esgotada.
     Limitações do direito de autor                        Mesmo nos EUA, a legislação prevê o chamado
    No artigo 46, a Lei de Direitos Autorais (9.610/   “fair use”, que poderia ser traduzido como “uso
98) estabelece as limitações aos direitos autorais.    justo”. Na prática, o "fair use", por se inscrever como
Define que não constitui ofensa ao autor a “re-        um princípio e não detalhar as formas permitidas
produção, em um só exemplar de pequenos tre-           de sua utilização, abre espaço, na tradição da
chos, para uso privado do copista, desde que seja      common law, para a criação de jurisprudências tra-
feita por este, sem intuito de lucro”. Este trecho     tando de novos usos. No caso da educação, por
da legislação, por sua imprecisão ao definir “pe-      exemplo, é legítimo o uso de obra protegida por
quenos trechos” de obras artísticas, literárias e      copyright se utilizada para o ensino (inclusive
científicas, e por ter relação direta na efetivação    múltiplas cópias para uso em sala de aula).
dos direitos à educação e à cultura, ambos garan-          Além disso, não são passíveis de proteção as
tias constitucionais e direitos fundamentais, é um     “idéias, procedimentos normativos, sistemas, mé-
dos mais controversos e importantes artigos da         todos, projetos ou conceitos matemáticos como
lei. Entretanto, essa definição, que autoriza a có-    tais”, assim como os “esquemas, planos ou regras
pia de "pequenos trechos", "em um só exemplar",        para realizar atos mentais, jogos ou negócios”, os
"para uso privado do copista", como apontam di-        “formulários em branco para serem preenchidos
versos estudos de legislação comparada, pode ser       por qualquer tipo de informação, científica ou não,
considerada uma das mais restritas do mundo.           e suas instruções”, os “textos de tratados ou con-
    Na Alemanha, por exemplo, é possível se fazer      venções, leis, decretos, regulamentos, decisões
cópia integral, para uso privado e pessoal, se a       judiciais e demais atos oficiais”, as “informações
edição de uma obra literária estiver esgotada há       de uso comum tais como calendários, agendas,
pelo menos dois anos. Como justificativa, a com-       cadastros ou legendas”, os “nomes e títulos isola-
preensão de que não há qualquer sentido a exis-        dos” e o “aproveitamento industrial ou comercial
tência de um direito exclusivo, por exemplo, se o      das idéias contidas nas obras”39.

39. Lei 9.610/98 – incisos I à VII do artigo 8º



                                                                                                         79
Proteção ao conhecimento dos povos tradicionais                        A mudança de postura do governo brasileiro
   A Constituição Federal também procura asse-                     nas questões relativas à propriedade intelectual
gurar a defesa das expressões dos povos tradicio-                  colocou em movimento o debate sobre o fluxo e
nais e do folclore brasileiro, impondo ao Estado a                 o uso do conhecimento na sociedade da informa-
responsabilidade de garantir os direitos relativos                 ção. Porém, conclusões sobre a eficácia da estra-
à cultura, seja em relação à preservação, seja em                  tégia governamental atual e os rumos do direito
relação à produção e à difusão:                                    autoral no Brasil tendem a ser imprecisas. As aná-
                                                                   lises devem considerar que tal processo está atu-
Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício             almente em curso e pode ser interrompido em
   dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura            curto prazo de tempo. Além disso, é importante
   nacional, e apoiará e incentivará a valorização e               ressaltar a existência de contradições internas na
   difusão das manifestações culturais.                            gestão das políticas de governo, reflexo das di-
                                                                   vergências político-ideológicas dos membros da
§ 1º O Estado protegerá as manifestações das cultu-
   ras populares, indígenas e afro-brasileiras, e das
                                                                   administração federal e principal explicação para
   de outros grupos participantes do processo                      as diferenças entre o discurso de seus membros e
   civilizatório nacional.                                         a prática da máquina estatal. De qualquer forma,
                                                                   podemos afirmar que o atual sentido do discurso
   Não há, contudo, qualquer legislação específi-                  governamental aponta para a possibilidade de uma
ca que regulamente esses princípios constitucio-                   disputa conceitual sobre o regime de direitos au-
nais, a não ser a instituição do registro de bens                  torais no Brasil.
culturais de natureza imaterial e a criação do Pla-                    Se é correto afirmar que há avanços, deve-se
no Nacional do Patrimônio Imaterial40 que, como                    registrar, porém, que o ímpeto brasileiro na defe-
veremos, nunca se tornou realidade.                                sa de um regime de partilha do conhecimento mais
                                                                   justo no plano internacional não encontra a mes-
                                                                   ma força no plano interno. Muitas vezes, o discur-
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                      so ou a divulgação de uma determinada vontade
                                                                   política não corresponde necessariamente a uma
    Com a desativação do Conselho Nacional de                      realização concreta.
Direito Autoral, em 1990, a formulação de uma
política para área do direito autoral foi abandona-                    A atuação brasileira no plano internacional
da pelo governo brasileiro. Os oito anos da admi-                      O governo brasileiro, especialmente a partir de
nistração de Fernando Henrique Cardoso (1995-                      2003, tem defendido nos fóruns internacionais41
2002) consolidaram a hegemonia neoliberal no                       um regime de partilha do conhecimento que pri-
país e com ela germinou o entendimento de que                      vilegie o desenvolvimento de tecnologias e recur-
o Estado não seria responsável pela mediação das                   sos humanos locais, buscando regras claras na cir-
questões relacionadas à área autoral e que os con-                 culação de produtos audiovisuais que permitam a
flitos daí derivados deveriam ser resolvidos medi-                 sobrevivência das identidades, artistas, cientistas
ante acordos contratuais diretos entre autores e                   e produtores nacionais.
usuários. Ou seja, que deveriam ser regidas exclu-                     Nas negociações da Área de Livre Comércio das
sivamente pelas regras de mercado.                                 Américas (Alca), a diplomacia brasileira tem reite-
    A partir de 2003, o governo brasileiro redefiniu               rado sua disposição em abandonar por completo
algumas premissas que regiam os trabalhos so-                      o capítulo que versa sobre propriedade
bre a questão da propriedade intelectual. A                        intelectual42. Entre outras providências, o governo
redefinição dos aspectos relacionados à tutela                     brasileiro posiciona-se contra a ampliação dos pro-
administrativa dos direitos autorais, com atribui-                 cedimentos criminais nas violações da propriedade
ção de novas competências, começou a ocupar                        intelectual, assim como também rechaça as novas
relativo espaço na agenda governamental e o Es-                    – e restritivas – definições dos termos “uso
tado passou a reivindicar algum protagonismo na                    honesto”, “uso pessoal”, e do “acesso para
formulação de estratégias de desenvolvimento                       propósitos educacionais” propostas pelos norte-
relacionadas à propriedade intelectual.                            americanos. Esse mesmo capítulo propõe que

40. Decreto 3.511/00
41. É preciso deixar claro que a postura do governo brasileiro nos fóruns internacionais reflete-se de maneira bastante tímida no
plano interno. São, portanto, iniciativas que devem ser analisadas separadamente. Tal constatação, entretanto, não desmerece os
méritos da postura adotada internacionalmente.
42. Para saber mais sobre a Alca e sua relação com a comunicação ver IP Justice – www.ipjustice.org


80
todas as disputas sobre domínios de internet sejam                   Na reunião anual da OMPI, em setembro e
resolvidas pela Internet Corporation for Assigned                outubro de 2004, o governo brasileiro, em
Names and Numbers (Icann), uma associação privada                conjunto com os governos argentino e boliviano,
com sede nos EUA e vínculos com o governo norte-                 apresentou um documento sugerindo a negocia-
americano, hoje responsável pela governança da                   ção de um tratado para promover o acesso dos
internet.                                                        países em desenvolvimento ao conhecimento e à
    Nas recentes rodadas da Organização Mundial                  tecnologia, assim como a adoção de mecanismos
da Propriedade Intelectual (OMPI), em que alguns                 colaborativos de compartilhamento de informação
países têm insistido na introdução de um tratado                 para estimular a inovação. O documento também
para expandir o direito sui generis europeu sobre                propunha uma emenda à constituição da OMPI,
bancos de dados para o mundo, o Brasil, com o                    salientando a necessidade de se considerar os
apoio da Índia, Rússia, China e associações civis                interesses dos países menos desenvolvidos na
internacionais tem insistido que a proposta não                  elaboração das normas internacionais de
pode prosperar. Por este novo “direito”, tudo                    propriedade intelectual, bem como a participação
aquilo que é inserido em um banco de dados,                      de ONGs e da sociedade civil nos fóruns de discus-
mesmo que faça parte do domínio público, passa                   são, como representantes do interesse público.
a ser de propriedade do criador do banco de dados.                   A firme posição brasileira em relação à Alca e à
    O Brasil também tem recusado o estabelecimen-                OMPI contrasta com as negociações do Mercosul
to de compromissos adicionais ao Acordo TRIPS                    – lideradas pelo Brasil – com a União Européia,
na Organização Mundial do Comércio (OMC),                        em que o governo brasileiro negocia regras mais
conhecidos como TRIPS-plus. Se a recusa de al-                   brandas – e ainda pouco claras – no mercado
guns governos, entre eles o brasileiro, tem difi-                brasileiro para o setor audiovisual europeu como
cultado o estabelecimento multilateral do TRIPS-                 moeda de troca para uma possível abertura da
plus, tal prática tem ocorrido por meio de acordos               Europa aos produtos agrícolas do Mercosul45.
de comércio bilaterais e regionais, em particular
os feitos pelos Estados Unidos.
    Além disso, o Brasil não assinou o tratado da                  PAPEL                ATORES
                                                                 O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
OMPI de Direitos Autorais43, de 1996, que propõe                            ATUAIS
                                                                 TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
medidas tecnológicas para obras protegidas pelo
direito autoral (que os EUA adotaram por meio do                      O incentivo à difusão do software livre
Digital Millennium Copyright Act e pelos mecanis-                    Um dos esforços mais claros do governo brasi-
mos de Digital Rights Management e anti-                         leiro em relação à partilha do conhecimento está
circunvention). Segundo a proposta, o atual sistema              relacionado à implementação de políticas de in-
de compra de um exemplar de um livro, de um CD                   centivo à adoção e produção de softwares livres.
de música ou de um DVD seria substituído pelo                    Segundo o governo federal, o desenvolvimento
modelo já adotado no software, de licença de uso.                de softwares tem como objetivo a redução do
A legislação também tem implicações sobre a                      pagamento de direitos autorais e o envio de divi-
legalidade da troca de arquivos em redes e vai                   sas para o exterior – por ano, US$ 1 bilhão é
obrigar provedores de acesso a retirar conteúdo                  remetido como pagamento de royalties 46 –; o
do ar caso sejam solicitados a isso por alguém                   desenvolvimento da inteligência coletiva do país
que alegue ter tido seus direitos autorais violados.             e a criação de uma indústria nacional de tecnologia
Na Bélgica, por exemplo, em recentes casos                       da informação, com a promoção de novos mode-
envolvendo a troca de arquivos P2P (peer-to-peer)44,             los de negócios; e a viabilização dos programas
servidores de acesso foram obrigados a cortar a                  de inclusão digital, já que o orçamento público
conexão dos usuários acusados de trocar arquivos                 não seria suficiente para os projetos caso fossem
através desta tecnologia. Além disso, os titulares               utilizados sistemas proprietários.
de direitos autorais poderão intimar os provedores                   Alguns estados brasileiros já haviam buscado
de acesso para obter informações pessoais sobre                  implementar políticas de incentivo ao software
usuários suspeitos, transformando pessoas comuns                 livre. O Rio Grande do Sul, caso mais emblemático,
em potenciais criminosos.                                        aprovou uma lei estadual em 2002 tornando pre-

43. Em inglês, o tratado é conhecido como WIPO Copyright Treaty
44 Conexões ponto-a-ponto, diretamente entre usuários.
44.
45. Tal orientação explica-se pela forte presença de representantes do agro-negócio dentro do governo brasileiro, que possuem
grande interesse na abertura do mercado europeu aos produtos agrícolas do Brasil.
46. Fonte: Ministério da Ciência e Tecnologia



                                                                                                                          81
ferencial a adoção de softwares livres nas reparti-              operacionais de código aberto. A Secretaria Geral
ções públicas. A lei foi contestada na Justiça pela              da Presidência e a Radiobrás também estão em
Microsoft, e o Supremo Tribunal Federal conce-                   fase de migração.
deu liminar impedindo que ela entrasse em vigor47.                   Outras iniciativas importantes promovidas pelo
O governo federal, em 2003, optou por utilizar os                ITI foram a realização de encontros de capacitação
precedentes da legislação atual (como a necessi-                 em software livre e a confecção de diferentes pu-
dade de promover o desenvolvimento nacional e                    blicações que incluem amostras de plataformas de
de gerir os recursos públicos de maneira respon-                 código aberto. Tais produtos procuram apresen-
sável) para implementar as políticas de incentivo                tar o software livre aos cidadãos e reverter a im-
ao software livre. Tal estratégia tem sido                       pressão generalizada de que os softwares não pro-
reproduzida por diferentes governos estaduais e                  prietários são incompatíveis com os arquivos ge-
municipais. Como resultado, o Brasil acabou se                   rados nos softwares da Microsoft.
tornando o país pioneiro a ter uma política pública                  Simultaneamente, tramita na Comissão de Ci-
voltada ao software livre que buscasse superar o                 ência e Tecnologia, Comunicação e Informática da
impasse jurídico surgido a partir da impossibili-                Câmara dos Deputados um projeto de lei (PL 3.280/
dade contratual de tradução da licença GNU-GPL48                 04) do deputado Luiz Couto (PT-PB) que determina
(caracterizada por assegurar o direito de executar,              a utilização de software livre em todas as escolas
estudar, aperfeiçoar e modificar o programa, as-                 públicas do país.
sim como de redistribuir cópias do mesmo).
    Em 2003, o Executivo federal criou o Comitê                      As iniciativas do Ministério da Cultura
Técnico de Implementação do Software Livre, ór-                      O Ministério da Cultura (MinC) é fonte das ou-
gão composto por diversos ministérios e coorde-                  tras principais iniciativas relacionadas à proprie-
nado pelo Instituto Nacional de Tecnologia da                    dade intelectual desenvolvidas pelo Executivo. Em
Informação (ITI). O fato de o ITI ser ligado à Casa              maio de 2004, o Ministério lançou o Programa de
Civil da Presidência da República pode, em parte,                Informação e Difusão de Direitos Autorais, cujos
ser considerado um sintoma importante do                         objetivos principais são facilitar o acesso e
engajamento do governo federal com a                             intercâmbio de informação em matéria de
implementação do software livre. Na prática, tal                 propriedade intelectual, condição primeira para se
engajamento consiste no incentivo à adoção de                    criar uma massa crítica sobre como este sistema
sistemas abertos pelo poder público, empresas e                  está consolidado; criar mecanismos legais que
cidadãos, à formação de recursos humanos, à                      facilitem o acesso da maioria da população às
disponibilização de verbas públicas para pesquisa                obras intelectuais protegidas, de forma compatível
em universidades e instituições e à concessão de                 com o estágio de desenvolvimento econômico e
crédito para a formação e desenvolvimento de                     social do país; fomentar a cultura da propriedade
micro e pequenas empresas de softwares.                          intelectual, em particular o ensino da propriedade
    Entretanto, dos quatro pontos apresentados,                  intelectual nas universidades e outros centros de
somente o primeiro (e somente em relação ao                      educação (o Concurso Nacional de Monografias
poder público) e o segundo (formação de recursos                 sobre Direitos Autorais, em curso atualmente,
humanos) apresentavam resultados concretos (ou                   procura responder a esse objetivo); produzir
pelo menos iniciativas concretas) até o fechamento               eventos divulgadores dos princípios fundamentais
deste relatório49.                                               da propriedade intelectual e publicações
    Atualmente, seis ministérios (Minas e Energia,               especializadas para distribuição gratuita junto ao
Comunicações, Ciência e Tecnologia, Cidades, Edu-                sistema de bibliotecas públicas.
cação e Cultura) estão migrando para sistemas


47. A alegação da companhia, aceita pelo Tribunal, foi a de que nenhuma legislação pode regulamentar os tipos de produto a
serem comprados pelo poder público.
48. Fonte: www.softwarelivre.gov.br: dia 2 de dezembro de 2003, foi anunciado, durante a II Rodada de Compartilhamento de
Software Livre, a criação das licenças CC-GNU GPL e CC-GNU LGPL, (Licença Pública Geral GNU - Creative Commons e Licença
Pública Geral Menor do GNU - Creative Commons), unindo assim as entidades Free Software Foundation (www.fsf.org) e a Creative
Commons (http://creativecommons.org). A união inédita das duas licenças e entidades deveu-se à iniciativa do governo brasileiro
em adotar o uso e o desenvolvimento de software livre. "Trata-se de um momento histórico. As licenças CC-GNU GPL e CC-GNU
LGPL são produtos genuinamente brasileiros. O Brasil ensina assim a todos nós uma lição importante e útil", comentou Lawrence
Lessig, professor de Direito da Universidade de Standford e presidente da Creative Commons.
49. Para saber mais sobre a disponibilização de verbas públicas para pesquisa e a concessão de crédito para a formação e desen-
volvimento das micro e pequenas empresas, consultar o Pilar D deste relatório.


82
O incentivo ao Creative Commons                               ras repassem 1% do valor de venda para a criação
    Em junho de 2004, o governo federal oficiali-                 de um Fundo Pró-Leitura.
zou apoio ao Creative Commons50. A estratégia                         O Ministério da Cultura (MinC) planeja também
revela que, diante da maneira pela qual a revolu-                 implantar 1,3 mil bibliotecas públicas até 2006.
ção digital afeta a realidade de todos os bens in-                O número representa o total de municípios brasi-
telectuais, é preciso disponibilizar licenças jurídi-             leiros que não possuem bibliotecas públicas. Por
cas que permitam o acesso às obras pelo público                   meio do Projeto Fome de Livro, coordenado pela
sob condições mais flexíveis.                                     Fundação Biblioteca Nacional, o governo federal
    Na prática, além da criação de um instrumento                 vai celebrar convênios com prefeituras e entida-
legal, busca-se a sensibilização dos titulares do                 des da sociedade civil para garantir que todos os
direito autoral (os autores) para a necessidade de                municípios – mesmo aqueles com menos de cinco
circulação das criações. Substancialmente, procu-                 mil habitantes –, possuam pelo menos uma
ra-se um incremento do significado da função so-                  biblioteca pública. Apesar das formas de
cial do direito de autor e a criação de instrumen-                implantação do projeto ainda permanecerem em
tos legais para possibilitar a realização dessa “nova             discussão no âmbito do MinC, os responsáveis
cultura”.                                                         pelo projeto sustentam que a meta será cumprida.
    O Creative Commons não contradiz a legisla-
ção existente e conviverá em harmonia com a le-                       Povos tradicionais
gislação que regula os direitos autorais no Brasil.                   O patrimônio cultural dos povos tradicionais,
Entretanto, as ações que buscarão incentivar os                   como danças, músicas, narrativas, grafismos e ar-
autores a colocar suas obras sob o novo formato                   tesanato, apesar de possuir garantia constitucio-
de licença de uso, apesar das declarações públicas                nal, ainda não virou objeto de legislação específi-
do ministro da Cultura, ainda não se concretiza-                  ca. Entidades indígenas, principalmente nos
ram.                                                              últimos anos, têm defendido que este conheci-
    Outra proposta em gestação é o projeto Canto                  mento faça parte dos mecanismos de proteção da
Livre, que prevê a criação de um novo modelo de                   propriedade intelectual, para que o patrimônio dos
licenciamento musical para troca de músicas na                    povos tradicionais não seja fruto da exploração
internet. A iniciativa envolve o Ministério da Cul-               econômica predatória. A busca das entidades, em
tura, a Fundação Getúlio Vargas (FGV), o Grupo                    especial do Instituto Indígena Brasileiro da
CESAR (Centro de Estudos Avançados do Recife), a                  Propriedade Intelectual (Inbrapi), não é cercear o
Universidade de Stanford e o Berkman Center (da                   acesso ao patrimônio intelectual indígena e dos
Universidade de Havard), entre outros. Atualmen-                  povos tradicionais, mas garantir a integridade mo-
te, a FGV está desenvolvendo o software do proje-                 ral dos povos e reconhecimento por sua produção
to com recursos do Fundo Setorial de Tecnologia                   imaterial.
da Informação51.                                                      A discussão sobre a proteção às manifestações
                                                                  e expressões dos povos tradicionais e do folclore
     Desoneração de livros e implantação de bibli-                brasileiro tem crescido dentro do Ministério da
otecas públicas                                                   Cultura, mas ainda é tímida sua inserção na agen-
    Em novembro de 2004, o governo federal en-                    da governamental. Dois grandes eventos promo-
viou para aprovação no Congresso Nacional um                      vidos pelo governo em 2004 discutiram formatos
projeto para regulamentar a lei que instituiu a Po-               de legislação que garantam e zelem pelos direi-
lítica Nacional do Livro (Lei 10.753/03), com o                   tos coletivos relativos aos saberes e modos de fa-
objetivo de desonerar a produção de livros. Com                   zer das culturas populares. A implementação do
a medida, que deve ser aprovada pelo Legislativo,                 Programa Nacional de Patrimônio Imaterial, insti-
os livros de toda natureza deixam de pagar con-                   tuído em 2000, mas que nunca saiu do papel, tem
tribuições como o PIS, Pasep e Cofins. Tais impos-                sido objeto de pressão de entidades da sociedade
tos representam juntos uma carga de 9,25% sobre                   civil e esteve presente nos debates promovidos
o faturamento das editoras. A expectativa, segun-                 pelo Ministério da Cultura.
do editoras e governo, é de que haja uma redução                      Estas iniciativas, porém, não se traduzem em
de 10% sobre o preço do livro para o consumidor                   esforços do governo para a aprovação do Projeto
em um prazo de até quatro anos. Além disso, o                     de Lei 2.057/91, que dispõe especificamente sobre
projeto enviado ao Congresso prevê que as edito-                  os direitos autorais coletivos e tem como objetivo

50. Para saber mais sobre o Creative Commons no Brasil acesse www.direitorio.fgv.br/cts
51. Fonte: Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), empresa pública vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia



                                                                                                                         83
preservar a cultura indígena e evitar sua                          tendia, segundo as suas primeiras versões, alterar
apropriação por terceiros. Entretanto, o mesmo                     alguns dispositivos da Lei 9.610/98.
projeto, cuja aprovação é reivindicada pela Inbrapi,                   Uma das mudanças mais importantes ligadas
procura garantir os direitos de exploração econô-                  à questão do direito autoral era a transferência de
mica dos bens culturais dos povos tradicionais nos                 responsabilidade sobre a regulamentação da ar-
moldes da Lei 9.610/98. Nesse sentido, evitar a                    recadação de direitos autorais sobre obras
apropriação por terceiros, questão urgente e ne-                   audiovisuais. Pela proposta, a regulamentação fi-
cessária, tende a criar mecanismos igualmente                      caria a cargo da Agência Nacional Cinema e do
perversos que cerceiam o acesso aos bens                           Audiovisual (Ancinav), e não mais sujeita ao Escri-
imateriais dos povos tradicionais, seja para o co-                 tório Central de Arrecadação (Ecad).
nhecimento público, seja para releituras criativas                     Além disso, a proposta de Lei Geral de
das obras. Assim como nos outros campos do co-                     Audiovisual definia que os bens culturais produ-
nhecimento e da cultura, deve-se procurar formas                   zidos com recursos públicos tornar-se-iam passí-
de proteção ao patrimônio imaterial que sejam                      veis de uso após oito anos, sem autorização do
eficazes, mas que evitem transformar tal conheci-                  titular do direito, por canais públicos e estatais
mento em mercadoria, mesmo que coletiva.                           de radiodifusão, assim como em estabelecimen-
                                                                   tos públicos de ensino.
   Lei Geral do Audiovisual                                            Essas propostas foram suprimidas quando a
   A proposta de Lei Geral do Audiovisual52, atu-                  abrangência da Ancinav foi consideravelmente re-
almente em discussão pelo governo brasileiro, pre-                 duzida nas últimas versões tornadas públicas.




52. Para consultar as minutas do projeto e as contribuições da sociedade civil ver www.cultura.gov.br



84
B 3: Todos os trabalhos financiados e produzidos de forma
pública se tornam parte do domínio público.
B 3.1 - Políticas públicas e medidas práticas para assegurar que todo o
conhecimento apoiado por fundos públicos se torne imediatamente parte do
domínio público.

B 3.2 - (Ver A.3.3) O volume de informação mantida por órgãos públicos deve
ser colocado sob domínio público.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                      nhecimento – cultural e científico – produzido com
                                                                 o apoio de recursos públicos, se torne parte do
    Domínio público                                              domínio público. A já citada proposta da Lei Geral
    Do ponto de vista legal, hoje só existem três                do Audiovisual, se aprovada, viria a se tornar o
circunstâncias pelas quais determinado conheci-                  único instrumento legal com essa perspectiva e,
mento se torna de domínio público:                               mesmo assim, garantiria um uso limitado das
    • Vencimento dos prazos de proteção aos di-                  obras audiovisuais financiadas por verbas públi-
reitos patrimoniais (estendidos para até 70 anos                 cas somente após oito anos de sua primeira
após a morte do autor); no caso das obras                        veiculação.
audiovisuais, o prazo de proteção é de 70 anos                       A única menção sobre este tema na legislação
contados após o 1º de janeiro seguinte ao lança-                 brasileira atual refere-se à propriedade estatal (e
mento da obra53; e, no caso de obras fotográficas,               não ao domínio público) das obras produzidas com
a partir de 1º de janeiro do ano seguinte à publi-               verbas públicas e vai na direção contrária à
cação;                                                           abertura. Nesse sentido, a Lei 9.610, em seu artigo
    • Falecimento do autor, sem deixar herdeiro                  6º, afirma que “não serão de domínio da União,
reconhecido;                                                     dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípi-
    • Autoria desconhecida, ressalvado quando se                 os as obras por eles subvencionadas”.
tratar de conhecimento popular, folclórico ou na-                    As instituições de fomento à pesquisa mais
tivo (de forma a proteger os povos tradicionais).                importantes no Brasil, o Conselho Nacional de
                                                                 Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
    Usos alternativos têm de ser autorizados54 pelo              e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
autor, de maneira explícita – caso contrário, a lei              São Paulo (Fapesp), não mantêm esforços organi-
assume que “todos os direitos estão reservados”                  zados para compartilhar o conhecimento produ-
e qualquer uso (como cópia e adaptação sem ex-                   zido com seus recursos. Ao contrário, ambas as
pressa autorização do titular do direto, por exem-               instituições mantêm departamentos que auxiliam
plo) decorre em infração do direito autoral, res-                os pesquisadores a registrarem seus inventos e
salvados os poucos, e restritos, casos previstos em              obras para garantir sua exploração comercial.
lei que permitem o uso lícito sem expressa autori-                   Entretanto, alguns aspectos das políticas de
zação do titular.                                                financiamento de pesquisas são de caráter essen-
                                                                 cialmente público e têm como fundamento a pro-
                                                                 dução de conhecimento que auxilie o poder público
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                    a efetivar direitos humanos. Um bom exemplo
                                                                 dessas linhas de financiamento são as pesquisas
   Não há, no Brasil, qualquer dispositivo legal                 que visam ao aprimoramento da produção de cis-
que garanta, ou pelo menos incentive, que o co-                  ternas, tecnologia de baixo custo que propicia o


53. Para que uma criação se torne de domínio público no Brasil, portanto, são necessários 20 anos a mais do que impõe o TRIPS,
que estabelece que o tempo mínimo de proteção dos direitos do autor é de 50 anos. Na legislação aprovada em 1973, que
antecedeu a Lei 9.610/98, o Brasil também garantia os direitos patrimoniais por 70 anos, 20 a mais do que prevê a Convenção de
Berna.
54. Como veremos, algumas licenças como a GNU e a Creative Commons procuram flexibilizar as regras da Lei 9.610/98.



                                                                                                                           85
armazenamento de água no semi-árido brasilei-                    triz de governo atual, que aponte para que o co-
ro. Na área da Comunicação, o incentivo ao de-                   nhecimento financiado por órgãos públicos seja
senvolvimento do software livre é a mais clara                   colocado sob domínio público. Contudo, é possí-
iniciativa nesse sentido. Porém, o pequeno aporte                vel afirmar que há uma tendência do poder públi-
de recursos para a pesquisa acadêmica e científica               co em disponibilizar para consulta56 e reprodução
pelos sucessivos governos55, por melhores que se-                (resguardada a citação da fonte), as informações
jam as intenções dos gestores das verbas, preju-                 mantidas sob seu domínio. O pequeno número
dica a promoção em grande escala desse perfil de                 de pessoas incluídas digitalmente é, por certo,
financiamento.                                                   uma limitação a essa intenção de tornar acessí-
    Portanto, não há uma tradição, nem uma dire-                 veis essas informações ao conjunto da população.



B 3.3 - Canais e empresas públicas devem colocar seus arquivos sob domínio
público.

    Comunicação pública                                          diatamente sob domínio público. Há, entretanto,
   Os serviços públicos de comunicação no Brasil                 mesmo entre os defensores de políticas mais fle-
têm políticas distintas em relação ao uso de seus                xíveis de direitos autorais, uma tendência em
arquivos. A Fundação Padre Anchieta, entidade de                 apontar que a melhor solução seria a de assegu-
direito privado mantenedora da TV Cultura, maior                 rar que o conhecimento mantido por verbas pú-
televisão de caráter público do país, não                        blicas fosse disponibilizado em regimes que pos-
disponibiliza a totalidade de seus documentos ao                 sibilitem a maior liberdade de acesso, como os
público e a maior parcela da programação é pro-                  registros inspirados no Creative Commons.
tegida por direitos autorais “convencionais”. Além                   Tal argumento sustenta-se na idéia de que um
disso, para ter acesso a cópias de programas é                   sistema que obrigasse que o conhecimento pro-
preciso pagar taxas que visam, além de cobrir o                  duzido com apoio de verbas publicas se tornasse
custo das cópias, financiar a manutenção da emis-                de domínio público stricto sensu poderia tornar o
sora.                                                            regime de propriedade intelectual desequilibrado,
   Já a Radiobrás, vinculada ao governo federal,                 desestimulando a criatividade e a produção de
mantém, historicamente, todo seu conteúdo                        conhecimento. Isso ocorreria, inclusive, na área
disponibilizado para uso do público e para repro-                cultural, onde boa parte das produções são
dução em outros veículos de comunicação, tendo                   mantidas com verbas públicas, direta e indireta-
como única exigência a citação da fonte. Da mes-                 mente, pelos mecanismos de renúncia fiscal. Por-
ma maneira procedem as agências, rádios e tele-                  tanto, a questão da colocação em domínio públi-
visões dos poderes Legislativo e Judiciário nacio-               co de todo o conhecimento produzido com verba
nais, e as mídias estatais regionais e locais, como              pública deve estar subordinada à adoção de regis-
as televisões dos Legislativos estaduais e munici-               tros inspirados em iniciativas como a do Creative
pais.                                                            Commons e do GNU-GPL, a fim de evitar que
   É importante ressaltar que juristas e pesquisa-               empresas privadas e/ou governos de outros países
dores sobre propriedade intelectual divergem so-                 se apropriem, na forma de propriedade intelectual,
bre a necessidade de colocar todas as “categori-                 deste conhecimento.
as” de conhecimento financiadas pelo Estado ime-




55. Fontes oficiais afirmam que o Brasil investe atualmente 1,05% do PIB em pesquisa. Desse montante, segundo a Fapesp, 63%
têm origem estatal (o que corresponde a 0,66% do PIB). Entretanto, outras fontes ligadas ao próprio governo contestam esses
números, afirmando que parcela significativa desses valores é “contingenciada”, ou seja, consta nos orçamentos, mas não é de
fato executada.
56. Sobre acesso a informações públicas e governamentais, consultar o Pilar A deste relatório.



86
B4: Participação efetiva da sociedade civil no processo de
governança, inclusive em sua formulação, preparação,
regulação, implementação e revisão, além de apoio para
participação em nível internacional.

B4.1 Um processo participativo de desenvolvimento de políticas, que inclua
participação significativa da sociedade civil e os recursos necessários para que
todos os parceiros dêem contribuições efetivas.

B4.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações públicas com relação a
governança e políticas sejam ouvidas e atendidas.

B4.3 Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e
implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando
apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais.

B4.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e
utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo .

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                      interlocução com a sociedade civil. Desde 2003, o
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                    Ministério da Cultura vem promovendo encontros
                                                                 temáticos sobre direitos autorais e diversidade
    A participação da sociedade civil na formula-                cultural para colher sugestões e apresentar suas
ção, implementação e revisão dos mecanismos de                   propostas à sociedade. Da mesma forma, o gover-
partilha do conhecimento em espaços                              no federal tem apoiado materialmente a realiza-
institucionais praticamente inexiste57. Tampouco                 ção de eventos capitaneados por organizações ci-
há mecanismos de participação permanente na                      vis. Foi exatamente num destes encontros, o 5º
revisão e implementação das políticas e leis em                  Fórum Internacional de Software Livre de Porto
curso, nacional e internacionalmente. A decisão                  Alegre, que o governo anunciou seu apoio ao
do governo brasileiro de incorporar observadores                 Creative Commons.
da sociedade civil na delegação que foi a Genebra                    O Instituto Nacional de Tecnologia da
participar da primeira fase da Cúpula Mundial                    Informação (ITI) tem promovido consultas públicas
sobre a Sociedade da Informação foi positiva, mas,               para a confecção de materiais relacionados à
pela forma como foi conduzida, a abertura não se                 difusão do software livre. As consultas, porém, são
traduziu numa efetiva participação da sociedade                  realizadas pela internet e, mais uma vez, esbarram
civil. Foram realizadas poucas reuniões, sem uma                 no acesso restrito da população brasileira às novas
real abertura do governo para construir sua posição              tecnologias.
a partir desse diálogo. Essa participação não se
refletiu, necessariamente, na incorporação de po-
sições da sociedade por parte do governo.                          PAPEL                ATORES
                                                                 O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
                                                                            ATUAIS
                                                                 TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
Abertura circunstancial de espaços de interlocução
   Todavia, a recente postura de setores do go-                     A disponibilidade para o diálogo demonstra-
verno brasileiro abriu canais de diálogo e                       da pelo governo que tomou posse em 2003, en-

57. Uma honrosa exceção é o Comitê Gestor da Internet no Brasil, criado pelo Decreto 4.829/03. Para saber mais, consultar os
atributos A6, C5 e D4 deste relatório.
58. Exceto, e mais uma vez demonstrando as contradições internas do governo, pela criação do já citado Conselho Nacional de
Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual, que reduz o tema à sua expressão penal.



                                                                                                                           87
tretanto, não se traduz na institucionalização de      propriedade intelectual.
espaços de formulação e deliberação dos aspec-             Se muitos artistas (músicos e escritores, princi-
tos relacionados à propriedade intelectual no Bra-     palmente) permanecem como porta-vozes da in-
sil58. Nessa perspectiva, o esforço governamen-        dústria do direito autoral, cobrando da popula-
tal corre sérios riscos de ser perdido se as forças    ção atitudes dentro da “legalidade”, um número
políticas presentes no governo forem substituí-        cada vez maior deles defende não só a livre circu-
das por outras, com setores menos favoráveis à         lação de suas obras pela internet como procura
participação civil.                                    encontrar meios para a produção de seus traba-
    É preciso reforçar que as entidades gestoras de    lhos que não criem relação com a indústria do di-
direitos autorais e, especialmente, a industria,       reito do autor, principalmente no segmento musi-
permanecem atuando no campo político. Tal              cal. Nesse sentido, há que se ter como central o
atuação é marcada por lobbies permanentes no           papel dos criadores. Somente uma valorização da
Congresso Nacional e pela constante presença de        função social das obras por parte daqueles que
peças publicitárias na grande mídia que difundem       cedem os direitos patrimoniais de suas criações a
o discurso do combate à pirataria e buscam             terceiros é que pode tornar mais favorável a cor-
criminalizar o usuário de cópias não autorizadas.      relação de forças nas disputas sobre um regime
    Do outro lado, se o estudo da propriedade in-      mais flexível de partilha do conhecimento.
telectual é um dos temas centrais sobre o impac-           Por fim, vale ressaltar que as ações do ITI e do
to da revolução da internet na sociedade, há de se     Ministério da Cultura, atualmente em curso – leia-
destacar que ainda não há no conjunto da socie-        se Software Livre e Creative Commons – são hoje
dade a percepção de que a legislação e as políti-      uma política estatal, mas surgiram e foram for-
cas públicas relativas aos direitos autorais (que se   muladas pela sociedade civil nacional e internaci-
insere no tema da propriedade intelectual) são         onal. Foi ela – a sociedade civil – que construiu as
fundamentais para o desenvolvimento social e           comunidades de desenvolvimento e compartilha-
econômico do país. Sem medo de errar, podemos          mento, mostrando ser possível uma nova forma
afirmar que ainda prevalece na sociedade a idéia       de organização e produção econômica que bus-
de que a questão mais importante a ser resolvida       que o desenvolvimento das nações a partir da cir-
nesse tema é a pirataria.                              culação do conhecimento. Foi também a socieda-
    Entretanto, e isso é importante frisar, crescem    de civil que desenvolveu as licenças que permi-
os espaços de debate sobre propriedade intelec-        tem a flexibilização dos direitos autorais. Portan-
tual, possibilitando o amadurecimento de uma           to, a apropriação dessas políticas pelo Estado só
articulação da sociedade civil para a construção       é possível porque são sustentadas pela sociedade
de um regime de partilha de conhecimento mais          civil. Sem o apoio efetivo da sociedade brasileira,
justo. Um dos quatro temas escolhidos para a atu-      iniciativas dessa natureza tendem a ser esmagadas
ação da CRIS Brasil – Articulação Nacional pelo        pelos lobbies da indústria do direito autoral.
Direito à Comunicação é justamente o da




88
Pilar C
Liberdades civis e direitos políticos
na Sociedade da Informação
    A existência de uma zona de transição com                      política pela desregulamentação do mercado como
limites incertos entre o que é vida privada e o que                forma de abertura e estímulo à competição. O
é vida pública faz com que o conflito entre a                      governo Lula não interferiu, até agora, de maneira
liberdade de informação e o direito à privacidade                  mais sensível nessa área. A única exceção é a
seja o principal mote estudado sob este pilar. É                   reorganização do Comitê Gestor da Internet no
possível depreender, a partir do quadro descrito a                 Brasil, que passou a ter caráter mais democrático
seguir, que não existe marco regulatório                           (com eleição direta pelos pares) e plural (com
consolidado na área – resultado tanto da                           representação da sociedade civil), assumindo um
obsolescência da legislação quanto de uma opção                    papel mais ativo na gestão da rede no país.




C1: Privacidade de informação e proteção de dados,
atendendo ao direito de saber, acessar, corrigir e controlar o uso de
toda informação pessoal mantida em forma digital por outrem.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                        “quando necessário ao exercício profissional”.
                                                                       A Lei de Imprensa (5.250/67) também garante
   Toda a legislação sobre este atributo parte do                  liberdades civis (além da liberdade de expressão,
artigo 5º da Constituição de 1988, referente às                    já tratada nesta pesquisa sob o Pilar A), ao
garantias civis. De maneira geral, o inciso X desse                determinar que “é livre a manifestação do pensamento
artigo descreve o direito à privacidade de                         e a procura, o recebimento e a difusão de informações
informação, ao determinar como “invioláveis a in-                  ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de
timidade, a vida privada, a honra e a imagem das                   censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos
pessoas, assegurado o direito à indenização pelo                   abusos que cometer”. Porém, a mesma legislação,
dano material ou moral decorrente de sua                           redigida durante o período da ditadura militar,
violação”.                                                         apresenta tópicos que chegam próximos de
   No que tange ao acesso à informação, é impor-                   legitimar práticas de censura. Por exemplo, o
tante destacar o inciso XIV, que se refere especial-               parágrafo 1° do artigo 1° define que “não será
mente ao jornalismo e que assegura a todos o                       tolerada a propaganda de (...) processos de
acesso à informação e resguarda o sigilo da fonte,                 subversão da ordem política e social”1.




1. Na prática, o Judiciário não tem aplicado a Lei de Imprensa, dada a sua natureza discricionária. Mas a simples existência de uma
legislação do período da ditadura militar para a regulamentação do funcionamento da imprensa segue sendo um problema.




                                                                                                                              89
C 1.1 - Leis que assegurem que dados pessoais são mantidos pelo mínimo
período necessário, bem como utilizados apenas para os propósitos autorizados
expressamente pela pessoa a qual se referem. Isto inclui dados pessoais
fornecidos a serviços (saúde, finanças, compras etc.), atividades de segurança
pública ou privada, material de vigilância em vídeo, informações inclusas em fichas
de identificação (em eventos ou pedidos de emprego), e dados de funcionários
mantidos por empregadores.



BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL
                                                         LXXII - conceder-se-á hábeas-data:
    O artigo 5º da Constituição garante ao cidadão       a) para assegurar o conhecimento de informações
ou pessoa jurídica o pleno acesso a informações             relativas à pessoa do impetrante, constantes de
de seu interesse e a gratuidade da emissão de tais          registros ou bancos de dados de entidades
                                                            governamentais ou de caráter público;
informações, inclusive em relação a certidões.
                                                         b) para a retificação de dados, quando não se prefira
    De outro lado, no que diz respeito a prazos             fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou adminis-
para atendimento, a Lei 9.051/95 dispõe sobre a             trativo;
expedição de certidões para a defesa de direitos
ou esclarecimentos de situações, estabelecendo 15            Apesar da redação referente ao setor público, a
dias como prazo improrrogável.                           lei que define o hábeas-data (Lei 9507/97), inclui
    É interessante notar que este dispositivo é va-      uma abertura que lhe permite valer sobre bancos
lido inclusive para a Agência Brasileira de              de dados privados, ao definir que “considera-se de
Informações (Abin – o serviço secreto do governo         caráter público todo registro ou banco de dados
federal). Se um cidadão quiser saber se existem          contendo informações que sejam ou que possam ser
informações a seu respeito no banco de dados da          transmitidas a terceiros ou que não sejam de uso
Abin pode requerê-las, pois a Constituição de            privativo do órgão ou entidade produtora ou
1988, em seu artigo 5º, inciso XXXIII, prevê a           depositária das informações”.
obtenção, em órgãos públicos, de certidões de                Sempre que dada empresa repassa informações
registros pessoais, constantes em banco de dados,        de sua posse, mesmo que de forma autorizada,
para a defesa de direitos e esclarecimentos de           referentes a uma ou mais pessoas, configura-se a
situações de interesse próprio. Em cumprimento           transmissão e, portanto, o caráter público dessas
à legislação que regula a matéria, têm sido              informações. Note-se que tal transmissão, obvia-
atendidas solicitações dessa natureza, desde que,        mente, só poderia ser feita mediante autorização
para isso, o interessado envie um requerimento           dessas pessoas. Caso contrário, já se figura a vio-
dirigido ao Ministro-Chefe do Gabinete de                lação da privacidade de informação.
Segurança Institucional da Presidência da República          Nenhum desses incisos, entretanto, é claro so-
com dados pessoais (nome, filiação, identidade,          bre as particularidades do uso da informação como
CPF), anexando cópia da identidade. Esses                tratada no quadro de referência genérico deste
documentos podem ser enviados para o endereço            relatório. Não se fala explicitamente de tempo de
da sede da Abin, em Brasília, e o modelo do              conservação, usos ou retransmissão. Nem
Requerimento de Informações Pessoais está                tampouco este instrumento jurídico prevê sanções
disponibilizado na página da agência na internet.        por mau uso ou a remoção da informação.
    O direito descrito no inciso XXXIII, citado acima,       Neste ponto, a Política Nacional de Arquivos
é regulamentado através de instrumentos jurídi-          (Lei 8.159/91) é a que se mais aproxima de uma
cos que visam à preservação da pessoa. A preser-         especificação do assunto:
vação de informações pessoais é comparada à pre-
servação física da pessoa, através do instrumento        Art. 2º - Consideram-se arquivos, para os fins desta
jurídico do hábeas-data (análogo ao habeas                  Lei, os conjuntos de documentos produzidos e re-
corpus), previsto na Constituição Federal, que ga-          cebidos por órgãos públicos, instituições de cará-
rante à pessoa física ou jurídica o direito de acessar      ter público e entidades privadas, em decorrência
e corrigir qualquer informação referente a si de            do exercício de atividades específicas, bem como
posse de terceiros.                                         por pessoa física, qualquer que seja o suporte da


90
informação ou a natureza dos documentos.                     Também na Lei 8.159, da Política Nacional de
                                                           Arquivos, o texto é bastante específico quanto ao
Art. 3º - Considera-se gestão de documentos o con-         direito de todos ao acesso à informação de posse
   junto de procedimentos e operações técnicas refe-       de órgãos públicos. Define-se ali, contudo, uma
   rentes à sua produção, tramitação, uso, avaliação
                                                           ressalva em relação “àquelas cujo sigilo seja im-
   e arquivamento em fase corrente e intermediária,
   visando a sua eliminação ou recolhimento para
                                                           prescindível à segurança da sociedade e do Esta-
   guarda permanente.                                      do, bem como à inviolabilidade da intimidade, da
                                                           vida privada, da honra e da imagem das pessoas”.
   Nesta lei, vale ainda destacar o artigo 23:                 Os arquivos públicos estão claramente defini-
                                                           dos nessa lei, com critérios de classificação da
Art. 23 - Decreto fixará as categorias de sigilo que       informação, de acordo com acesso e necessidade
   deverão ser obedecidas pelos órgãos públicos na         de conservação, por exemplo. Já no caso de
   classificação dos documentos por eles produzidos.       arquivos privados, a Política de Arquivos legisla
§ 1º - Os documentos cuja divulgação ponha em risco        ao tratar de informação declarada “de interesse
   a segurança da sociedade e do Estado, bem como          público e social”, passando a vigorar sobre estes
   aqueles necessários ao resguardo da inviolabilidade     uma regulação comparável àquela do arquivo pú-
   da intimidade, da vida privada, da honra e da ima-      blico.
   gem das pessoas são originariamente sigilosos.
                                                               Os arquivos privados são tratados especifica-
§ 2º - O acesso aos documentos sigilosos referentes
   à segurança da sociedade e do Estado será restrito
                                                           mente sob o Código de Proteção e Defesa do
   por um prazo máximo de 30 (trinta) anos, a contar       Consumidor (Lei 8.078/90). O código define que o
   da data de sua produção, podendo esse prazo ser         consumidor “terá acesso às informações existentes
   prorrogado, por uma única vez, por igual período.       em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e
§ 3º - O acesso aos documentos sigilosos referentes        de consumo arquivados sobre ele, bem como
   à honra e à imagem das pessoas será restrito por        sobre as suas respectivas fontes”. A lei prevê ainda
   um prazo máximo de 100 (cem) anos, a contar da          o direito de exigir imediata correção no caso de
   data de sua produção.                                   encontrar-se inexatidão nos dados. Também é
                                                           relevante a definição prevista de que “os bancos
   No apagar das luzes do governo Fernando                 de dados e cadastros relativos a consumidores, os
Henrique Cardoso, foi editado o Decreto 4.553,             serviços de proteção ao crédito e congêneres são
de 27 de dezembro de 2002, que buscava regula-             considerados entidades de caráter público”.
mentar o artigo acima da Lei 8.159/91. Nele, fica-             Portanto, fica definido que quaisquer bancos
va definido que determinados documentos, con-              de dados privados que contenham informações
siderados “ultra-secretos”, poderiam permanecer            pessoais, colhidas com fins comerciais – seja um
assim indefinidamente (“sigilo eterno”).                   serviço ou uma compra de fato –, ganham caráter
   Posteriormente, o governo Lula publicou o               público, e são objeto de hábeas-data.
Decreto 5.301, de 9 de dezembro de 2004, que                   O Código de Proteção e Defesa do Consumidor
modificou o Decreto 4.553 e redefiniu a regula-            ainda é complementado pela Portaria SDE nº 5,
mentação para o artigo 23 da Lei 8.159/91. O               de 27 de agosto de 2002, da Secretaria de Direito
Decreto retoma os prazos anteriores, mas abre              Econômico do Ministério da Justiça, que define
uma possibilidade para a manutenção do “sigilo             como abusiva, nos contratos de fornecimento de
eterno”.                                                   produtos e serviços, a cláusula que “autorize o
                                                           envio do nome do consumidor, e/ou seus garantes,
Art. 5º A autoridade competente para classificar o         a bancos de dados e cadastros de consumidores,
   documento público no mais alto grau de sigilo po-
                                                           sem comprovada notificação prévia”. A portaria
   derá, após vencido o prazo ou sua prorrogação,
   previstos no § 2º do art. 23 da Lei nº 8.159, de 8 de
                                                           também considera abusiva cláusula que “imponha
   janeiro de 1991, provocar, de modo justificado, a       ao consumidor, nos contratos de adesão, a obri-
   manifestação da Comissão de Averiguação e Aná-          gação de manifestar-se contra a transferência, one-
   lise de Informações Sigilosas para que avalie, pre-     rosa ou não, para terceiros, dos dados cadastrais
   viamente a qualquer divulgação, se o acesso ao          confiados ao fornecedor”.
   documento acarretará dano à segurança da socie-
   dade e do Estado.




                                                                                                           91
C 1.2 - Garantia do cumprimento de tais leis de modo acessível financeiramente,
transparente e pró-ativo, e com o direito de revisão quando direitos tiverem sido
violados.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                           A atuação da sociedade civil neste campo é bas-
                                                      tante limitada. Dada a natureza corretiva do
   No que se refere a todas as garantias civis, é     hábeas-data e o acesso mais restrito a um
dever do Ministério Público sua preservação, bem      advogado e mesmo ao MP, grande parte da
como das liberdades individuais e coletivas. O MP     população fica excluída do acesso a estes direitos.
não age apenas de maneira corretiva mediante          Resta a opção de acionar o sistema de proteção ao
ação, mas pode pró-agir em assuntos que lhe fo-       consumidor, por meio da Procuradoria de Defesa
rem pertinentes. “O MP tanto pode agir por sua        do Consumidor (Procon), que existem em âmbito
própria iniciativa, sempre que considerar que os      estadual e municipal. Os Procons têm uma atuação
interesses da sociedade estejam ameaçados, quan-      ampla e muitas vezes eficiente, mas nem por isso
to pode ser acionado por qualquer cidadão que         chegam a ser pró-ativos no que tange à privacidade
considerar que algum direito ou princípio jurídi-     de informações.
co esteja sob ameaça” (página do MPF,                    Há também a Delegacia de Meios Eletrônicos,
www.mpf.gov.br).                                      uma divisão da Polícia Civil especializada na in-
   Além disso, mesmo considerando-se a indepen-       vestigação dos delitos cometidos especificamen-
dência do MP, estabelecida pela Constituição de       te através das tecnologias de informação e
1988, trata-se de uma parte do sistema de Justiça.    comunicação (TICs).


C 1.3 - Existência de uma cultura ampla e difundida de auto-regulação e códigos
de conduta em termos de privacidade e proteção de dados, entre atores da
sociedade civil, do governo e do setor privado.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                           traz a informação sobre conteúdo com copyright,
                                                      e quase todo site que coleta algum tipo de infor-
    Não existe, hoje, código de conduta consolida-    mação inclui sua política de privacidade.
do entre provedores de acesso, provedores de              Estes componentes são sinais de que, apesar
infra-estrutura e os diferentes atores que utilizam   de não haver auto-regulação no sentido clássico,
a internet. Existem, sim, componentes comuns às       existe certa cultura comum, com princípios próxi-
mais diversas políticas de privacidade, impostos      mos – muitas vezes baseados, ou mesmo vincula-
principalmente por tendências internacionais. Por     dos, a referências externas, como leis norte-ame-
exemplo, a grande maioria dos sites informativos      ricanas e européias.



IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                         informação. Na prática, fica em aberto a
C1.1, C1.2 E C1.3                                     possibilidade da guarda permanente de qualquer
                                                      informação, por parte tanto de empresas quanto
   Há uma base legal relativamente frouxa acerca      de órgãos públicos.
da gestão da informação. A regulamentação do              Não existe, portanto, uma regulamentação ge-
Código de Proteção e Defesa do Consumidor             ral que discipline a coleta de informações. Existe,
equiparou os dados mantidos por entidades             atualmente, uma tendência entre grandes empre-
privadas com aqueles mantidos por entidades           sas, ao colher dados na internet, de colocar em
públicas, expandindo o acesso e o controle que o      evidência sua política de privacidade, explicitando
indivíduo pode ter sobre suas informações pessoais    se repassam ou não os dados sem autorização.
mantidas por terceiros. Essa regulamentação,              O instrumento jurídico do hábeas-data é uma
entretanto, não preenche alguns requesitos, entre     ferramenta válida para resguardar a privacidade
eles a informação sobre o tempo de manutenção         de informação, mas é uma ferramenta corretiva,
e regras claras para a eventual eliminação dessa      não uma regra disciplinar da gestão da informa-


92
ção. E também não prevê a definitiva remoção da            De um lado, existem os usos já considerados
informação sob guarda das empresas.                     criminosos: estelionatos e fraudes, utilizando se-
    Estes dispositivos constitucionais foram regu-      nhas e números de cartões de crédito roubados.
lamentados e, portanto, especificados em sua apli-      De outro, a sofisticação da propaganda criou uma
cação. É importante citar que nem todos os as-          nova técnica: a modelagem de comportamento dos
pectos necessários à garantia da privacidade de         consumidores, que faz uso de questionários e
informações estão aqui cobertos – especificamen-        ferramentas estatísticas para direcionar
te, o tempo durante o qual uma informação pode          propagandas e outros tipos de ações de marketing.
ser mantida, seja por ente público ou privado,          Este tipo de modelagem consegue prever, com boa
restrições quanto à venda e duplicação de bancos        margem de sucesso, o comportamento dos
de dados etc.                                           usuários – ou clientes – de determinada empresa
    A aplicabilidade das leis em vigor fica especial-   ou serviço. Isso permite às empresas direcionar
mente a cargo do Ministério Público, conforme           propagandas ou ações de marketing específicas.
citado sob o item C 1.2.                                   Alimentam estes bancos de dados, inclusive,
                                                        informações pessoais de ex-usuários destes siste-
                                                        mas. Não é prática comum a eliminação das infor-
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                           mações após o término da contratação dos servi-
C1.1, C1.2 E C1.3                                       ços, e esses dados acabam por continuar “sendo
                                                        úteis” para as empresas.
    O Estado brasileiro já instituiu uma série de          O cruzamento de informações – e a conseqüen-
grupos de trabalho, alguns inclusive em nível           te montagem de modelos e perfis – é uma ativi-
interministerial, para tratar do assunto privacida-     dade de inteligência que chegou ao setor privado
de (em 1996, por exemplo). Não houve, entretan-         há relativamente pouco tempo. Nenhuma legisla-
to, lei, regulamentação ou decreto que atuasse          ção regulamenta, hoje, o cruzamento de dados,
como base legal ampla para a área, além do Códi-        que já parece abusivo em sua definição. Esse uso
go de Proteção e Defesa do Consumidor.                  mercantil, na prática, não tem encontrado limites.
    Entidades como o Instituto de Defesa do
Consumidor (Idec) procuram desenvolver uma                  Sigilo perpétuo
maior conscientização das pessoas, de forma a              O mecanismo de “sigilo eterno” contido no
cercear práticas de marketing agressivas, como          Decreto 5.301 é um sério obstáculo ao esclareci-
cartões não-solicitados e propaganda direcionada.       mento público, especialmente em um país como
    Diversos atores têm se manifestado em favor         o Brasil, que passou por mais de 20 anos de dita-
da abertura dos arquivos da ditadura militar, que       dura militar. Coincidentemente, este tipo de sigi-
têm sido mantidos em segredo pelo governo bra-          lo ganhou notoriedade pública com a publicação,
sileiro. Entre eles estão o grupo Tortura Nunca         pelo jornal Correio Braziliense, de fotos que se su-
Mais, o Centro Santo Dias de Direitos Humanos,          punha serem do jornalista Vladimir Herzog, tor-
o Fórum de ex-Presos Políticos e a Pastoral Operá-      turado e morto em 1975. A Abin e outras fontes
ria Nacional.                                           confirmaram, mais tarde, tratar-se de fotos do
    Além isso, o Congresso Nacional cuida da aná-       padre canadense Leopold D’Astous.
lise de uma série de projetos de lei que procuram          Fotos como essas e outros documentos relaci-
tratar mais especificamente da privacidade com          onados, entretanto, ainda são segredo militar, e
relação às TICs. Veja mais no item “Tendências          poderiam muitas vezes ajudar a esclarecer o caso
Atuais e Futuras”, abaixo.                              de mortos e desaparecidos políticos. Contudo,
                                                        existe um receio, por parte dos militares
                                                        especialmente, de que a abertura desse tipo de
             ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                             arquivo possa exacerbar tensões que haviam sido
C1.1, C1.2 E C1.3                                       “resolvidas” pela anistia, em 1979.
                                                           Uma forte crítica feita ao atual governo – o pró-
                   perfis
    Privacidade e per fis de consumo                    prio presidente e muitos ministros foram presos
   Este pilar, na forma como tem sido tratado em        políticos – é a de que não houve uma política para
termos de políticas públicas, focou-se em um viés       revelar fatos relacionados à ditadura militar.
de direito do consumidor – portanto, assumindo          Diferentemente de países vizinhos, como Argen-
que as informações pessoais, na prática, se             tina e Chile, que também sofreram com ditaduras,
transformaram-se em mercadorias, que têm preço          mas onde está havendo um processo de investi-
certo – e alto, em geral.                               gação e cassação de anistias.


                                                                                                        93
Ministério Público                                   ações, não diretamente relacionadas ao serviço
    Ocorre hoje uma forte discussão a cerca do           que motivou a coleta original da informação.
Ministério Público. A principal polêmica fica em             Segundo a proposta, dados pessoais devem ser
torno da autonomia do órgão, que se tornou in-           recolhidos para finalidade determinadas, explíci-
dependente do Judiciário a partir da Constituição        tas e legítimas, não podendo ser posteriormente
de 1988. De um lado, críticos consideram que a           tratados de forma incompatível com essas finali-
atuação do MP precisa de um mínimo de restri-            dades. Além disso, a proposta prevê a proibição
ção, pois tem acabado por se prestar a usos políti-      do tratamento de dados pessoais referentes a con-
co-partidários. O caso Waldomiro Diniz é usado           vicções filosóficas ou políticas, filiação partidária
como exemplo, onde um Subprocurador da Repú-             ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem ra-
blica (José Roberto Santoro) “municiaria” a oposi-       cial ou étnica, bem como o tratamento de dados
ção (PSDB) com documentos para desestabilizar o          relativos à saúde, à intimidade e à vida sexual,
governo. De outro lado, o PSDB criticou inúmeras         incluindo os dados genéticos.
vezes o Procurador da República Luiz Francisco               Nesta proposta, o deputado procura ir além da
Fernandes de Souza por agir a favor do Partido           legislação atual e se aproximar de modelos euro-
dos Trabalhadores (PT). Ainda assim, os defenso-         peus, como na Alemanha e na Inglaterra, onde já
res do papel atual do MP garantem que a plena            existem leis específicas sobre o tráfego de infor-
autonomia é essencial para o Estado de Direito.          mações, especificamente na internet. Este projeto,
    Está em tramitação no Senado o PL 65/99, apre-       que se encontra desde 2002 sob exame na Comis-
sentado pela Presidência da República, que “proíbe       são de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara
magistrados, membros do Ministério Público,              dos Deputados, vai ao encontro das idéias
integrantes do Tribunal de Contas, bem como autori-      discutidas no quadro de referência genérico deste
dades policiais e administrativas de revelarem ou        relatório, e sua transformação em lei representaria
permitirem, indevidamente, que cheguem ao                um significativo avanço no trato das informações
conhecimento de terceiro ou aos meios de comunica-       pessoais no Brasil de hoje.
ção fatos ou informações de que tenha ciência em razão       O Projeto de Lei do Senado 95/03, proposto
do cargo e que violem o sigilo legal, a intimidade, a    pelo senador Valmir Amaral (PMDB-DF), procura
vida privada, a imagem e a honra das pessoas (...)”.     garantir a privacidade de informação da pessoa
                                                         física na internet. No projeto, entende-se por
    Projetos de Lei                                      informação pessoal “aquela, de qualquer natureza,
   Entre as propostas de lei que tratam de assun-        pertinente à pessoa, tais como seus hábitos, seus
tos correlatos, além do PL 65/99, citado acima,          interesses, sua identificação, seus endereços físicos
destaca-se o PL 6.981/02, do deputado Orlando            e virtuais e seus meios financeiros”. Muito similar
Fantazzini (PT-SP), que ”estabelece normas para a        é o PL 3.360, de 2000, do deputado Nelson Proença
proteção e tratamento dos dados pessoais e dá            (PPS-RS), que está na Comissão de Ciência e
outras providências”. Primeiramente, ele define o        Tecnologia da Câmara desde abril de 2003.
que é “tratamento de dados pessoais”, abrangen-              Existe ainda o PL 123/03, proposto pelo depu-
do todos os usos e campos hoje possíveis. Com            tado Newton Lima (PTB-SP). Mais estreito no
isso, seja o recolhimento de informação através          escopo, este apenas veda a retransmissão ou ces-
de robots, o preenchimento de um formulário ou           são de informações pessoais. Este texto aguarda
a transmissão através de rádio, IP ou meio físico,       parecer do relator na Comissão de Constituição e
todos os mecanismos estão cobertos de maneira            Justiça da Câmara desde 2004.
abrangente. O projeto também proíbe a                        Estes últimos projetos de lei citados se encon-
interconexão de dados, entendida como o “relaci-         tram englobados na proposta do deputado
onamento dos dados de um sistema com dados               Fantazzini, ainda que de maneira bem mais
armazenados ou conservados com os dados de               simplificada. A vantagem do PL do deputado
um outro sistema, mantido por outro ou outros            Fantazzini com relação aos demais é sua melhor
responsáveis, contendo semelhantes ou diferen-           definição das áreas abrangidas e das respectivas
tes finalidades”.                                        responsabilidades. O interessante dessas propos-
   Esta particularidade ganha destaque, visto que        tas, em separado do Código de Proteção e Defesa
uma das grandes possibilidades que empresas              do Consumidor e suas regulamentações, é que elas
vêem nos seus cadastros de clientes se encontra          consubstanciam a noção de que não é a relação
no desenvolvimento de perfis, de modo a prever           comercial que estabelece as condições de
comportamentos e definir públicos-alvos para de-         tratamento dos dados, mas sim a inerência do
terminadas campanhas de marketing ou outras              direito constitucional da privacidade.


94
C 2: O direito à privacidade na comunicação é um direito
humano e é essencial para o desenvolvimento humano auto-
determinado, em atividades tanto cívicas, políticas, sociais e
econômicas como culturais
C 2.1 - Leis e regulações que assegurem o direito à privacidade na comunicação,
seja através da internet, telefonia ou outros meios eletrônicos, com exceções
apenas em circunstâncias extremas e claramente definidas, e que valham em
ambientes privados, públicos e comerciais.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                         quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:

   No Estado brasileiro, toda comunicação                              I - não houver indícios razoáveis da autoria ou
interpessoal tem a privacidade protegida, como                      participação em infração penal;
expresso no inciso XII do artigo 5º da Constituição                    II - a prova puder ser feita por outros meios
Federal, que determina ser “inviolável o sigilo da                  disponíveis;
correspondência e das comunicações telegráficas,                       III - o fato investigado constituir infração penal
de dados e das comunicações telefônicas, salvo,                     punida, no máximo, com pena de detenção.
no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses
e na forma que a lei estabelecer para fins de                          A partir do momento em que se autoriza a es-
investigação criminal ou instrução processual                       cuta, o Ministério Público pode acompanhar a ação
penal”.                                                             da autoridade policial.
   Da mesma forma, a Lei Geral das Telecomuni-                         É importante citar que, ainda que o correio ele-
cações (9.427/97) define em seu artigo 3º o direito                 trônico possa ser entendido como “fluxo de co-
“à inviolabilidade e ao segredo de sua comunica-                    municações em sistemas de informática”, ainda
ção, salvo nas hipóteses e condições constitucio-                   não há definição jurídica plena sobre este meio.
nal e legalmente previstas”.                                        “A natureza jurídica da mensagem eletrônica não
   Uma das hipóteses de violação está na Lei do                     se encontra definida e por esse motivo reside uma
Grampo (9.296/96). Ela define as condições para                     tendência a equipará-la à correspondência, que
interceptação de comunicações telefônicas, de sis-                  recebe proteção da inviolabilidade do sigilo”2.
temas de informática e telemática, para prova em                       No entanto, há diferenças técnicas que confor-
investigação criminal e em instrução processual                     mam diferentes tratamentos para correspondên-
penal. De acordo com o artigo 2º, não será admi-                    cia por correio ou por e-mail, e que devem ser
tida a interceptação de comunicações telefônicas                    levadas em conta na legislação3.




2. FERREIRA, Ana Amelia Menna Barreto de Castro, na página www.camara-e.net
3. As características que diferenciam o e-mail da correspondência postal por natureza se encontram nos protocolos de
transmissão de e-mail (IMAP, POP3 para armazenagem, SMTP para transmissão, etc.), que não garantem, por si, o sigilo da
mensagem. Uma analogia válida seria dizer que enviar um e-mail é como enviar um cartão postal; o conteúdo está à mostra, não
pode ser ocultado dos mecanismos que o transportarão do remetente ao destinatário. A única alternativa viável para garantir este
sigilo, hoje, é o uso de softwares de criptografia – existem milhares de sistemas de criptografia, muitos inclusive em uso por
parte de agências de inteligência, outros para fins comerciais. A Infra-Estrutura de Chaves Públicas (ICP-Brasil) é, hoje, o sistema
de chaves criptográficas em uso por órgãos oficiais, como a Presidência da República e a Receita Federal.
Outra diferença com relação à correspondência postal é que a transmissão e recepção de e-mails não é atividade mediada por
concessão ou empresa pública. Provedores de acesso ou empresas têm seus próprios servidores de mensagens, compatíveis
entre si, mas com gerenciamento e controles diferentes e independentes.


                                                                                                                                95
C 2.2 - Garantia do cumprimento de tais leis de modo transparente, não-
partidário e pró-ativo, inclusive contra violações praticadas pelos Estados, e com o
direito de revisão quando direitos tiverem sido violados.
BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                           políticas. O Ministério Público, especificamente a
                                                      Procuradoria dos Direitos do Cidadão, tem o de-
    O grampo, especificamente telefônico, é uma       ver de apurar os abusos e fiscalizar o bom cumpri-
das grandes polêmicas da sociedade brasileira. De     mento das leis brasileiras. Segundo o artigo 127
tempos em tempos, vazam para a imprensa o con-        da Constituição, “o Ministério Público - MP é uma
teúdo de gravações telefônicas ou surgem denún-       instituição permanente, essencial função jurisdicional
cias de grampos realizados sem autorização judi-      do Estado, que tem como atribuição a defesa da ordem
cial.                                                 jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais
    Aqui, fica evidente a fraqueza do Estado brasi-   e individuais indisponíveis”.
leiro quando se trata da fiscalização das próprias


C 2.3 - Leis para controlar SPAM (mensagens comerciais de correio eletrônico
não solicitadas) e impedi-lo de inibir a capacidade geral de interação na internet.

    Não existe, hoje, legislação em efeito sobre o    midor, que são garantidos pelo inciso XXXII do
SPAM. Existem, sim, diversos projetos de lei em       artigo 5º da Constituição, e pelo Código de
tramitação no Congresso Nacional, que pretendem       Proteção e Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90).
regular – ou ao menos prever sanções – neste se-         Em janeiro de 2005, o Comitê Gestor da Internet
tor.                                                  no Brasil criou um grupo de trabalho para tratar
    Enquanto o Brasil é o quarto maior produtor       do tema. O objetivo inicial não é o de propor uma
mundial de SPAMs, os Estados Unidos, primeiro         legislação específica para o assunto, mas de cons-
do ranking, aprovaram em dezembro de 2003 a           truir um pacto de conduta que envolva diversos
CAN-SPAM, lei que tem por intenção controlar o        setores envolvidos, como provedores de acesso e
SPAM. É importante salientar que esta legislação      fornecedores de infra-estrutura de transmissão de
ainda não teve efeito sensível.                       dados (como as empresas de telecomunicações,
    Na falta de legislação específica, os SPAMs são   por exemplo).
encarados como violação dos direitos do consu-



IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                               Certificação Digital
C 2.1, C 2.2 E C 2.3                                      A certificação é o processo usado para garantir
                                                      a autenticidade e/ou a privacidade de uma mensa-
    A privacidade nos meios eletrônicos não é con-    gem ou documento eletrônico. No caso da auten-
solidada no tratamento da informação por parte        ticidade, esta é garantida através de assinatura
de agentes privados. Empresas monitoram cons-         digital; já a privacidade é garantida através de
tantemente os e-mails que criam para seus funci-      criptografia.
onários. Algumas vezes, o propósito é coibir prá-         A certificação digital é a ferramenta mais utili-
ticas como acesso a pornografia ou manter a pro-      zada atualmente para contrabalançar um aspecto
dutividade no escritório, mas existem casos de        histórico da internet: o anonimato. Através dos
interceptação de mensagens que levaram a demis-       processos de autenticação e criptografia, é possí-
sões por causas trabalhistas – por exemplo, um        vel dar validade jurídica a um documento, ao
caso em que houve perseguição a funcionários          mesmo tempo em que o mesmo continua privati-
devido a troca de mensagens organizando greve.        vo de poucas pessoas.
    No caso das comunicações que circulam pela
internet, especialmente e-mail, a ferramenta mais        Como funciona
utilizada para garantir privacidade nas comunica-        O processo consagrado no Brasil e na internet
ções é a certificação digital – e seu recurso de      em geral é o da dupla de chaves pública e priva-
criptografia.                                         da. Todo usuário, seja pessoa física ou jurídica, ao


96
conseguir a certificação digital, recebe dois códi-                Vale a observação de que esta não é a única
gos: um que deve ser mantido de posse da pessoa                    estrutura válida do ponto de vista jurídico no Bra-
e outro que pode ser divulgado livremente.                         sil, visto que qualquer acordo entre partes, vali-
    Estas “chaves” são criadas através de operações                dado em contrato, permite o uso de diferentes
matemáticas complexas, e são utilizadas para                       estruturas de certificação.
criptografar ou assinar uma mensagem ou docu-                          A ICP-Brasil é mantida pelo ITI, que é a Autori-
mento. São ligadas uma a outra, mas não é possí-                   dade Certificadora Raiz da ICP-Brasil. Em outras
vel deduzir uma a partir da outra4. Vale destacar                  palavras, é a partir das chaves do ITI que todas as
que a criptografia garante a privacidade, não a                    outras chaves da estrutura serão criadas. Esta li-
autenticidade, assim como a assinatura garante a                   gação garante a “legitimidade” das chaves, dado
autenticidade, não a privacidade. São operações                    que a ICP-Brasil é avalizada por uma infra-estrutu-
distintas e, caso necessárias, podem (e devem) ser                 ra oficial (o ITI é uma autarquia ligada à Casa Civil
feitas uma por vez.                                                da Presidência da República), bem como uma
                                                                   política mínima comum de uso das chaves.
    Usos e aplicações                                                  A ICP-Brasil é gerida pelo Comitê Gestor da ICP-
    A certificação digital está crescendo no momen-                Brasil, composto por sete representantes de mi-
to. Toda vez que um usuário acessa um site de um                   nistérios (Casa Civil, Fazenda, Justiça, Desenvolvi-
banco ou de compras – ou seja, sempre que se                       mento e Comércio Exterior, Planejamento, Ciência
estabelece o chamado “ambiente seguro” –, já há                    e Tecnologia, e Segurança Institucional) e cinco
um tipo de certificado digital sendo utilizado, de                 representantes da sociedade civil, todos indicados
forma licenciada pelos bancos para seus softwares                  pelo Presidente da República. A coordenação deste
de internet banking. Da mesma forma, órgãos como                   comitê fica a cargo do representante da Casa Civil.
a Receita Federal já aceitam operações em que os                       Atualmente, a ICP-Brasil já é utilizada pela Pre-
usuários se identifiquem utilizando certificação                   sidência da República, pelo Sistema de Pagamen-
digital – os chamados e-CPF e e-CNPJ, verdadeiras                  tos Brasileiro (SPB) e pela Receita Federal, além de
carteiras de identidade digitais que utilizam                      bancos e outras entidades.
certificação digital para garantir a autenticidade e
a privacidade de comunicação entre seus usuários.                      O programa João de Barro
    “A assinatura digital é uma das condições ne-                      Toda a ICP-Brasil utiliza, hoje, tecnologia de
cessárias para assegurar os direitos básicos de ci-                certificação digital importada. Ou seja, a cada par
dadania vinculados ao mundo virtual, como pri-                     de chaves pública/privada criado, seja pelo ITI ou
vacidade, sigilo e confiabilidade das informações                  pelas outras Autoridades de Certificação (AC) e
que trafegam no ciberespaço”, comenta Sérgio                       Autoridades de Registro (AR), é necessário o paga-
Amadeu, presidente do Instituto Nacional de                        mento de royalties. O programa João de Barro,
Tecnologia da Informação (ITI).                                    composto pela Marinha Brasileira (MB) e pelo ITI
    Vale destacar que o principal estímulo ao uso                  visa criar uma tecnologia nacional alternativa, que
dos e-CPF e e-CNPJ é de natureza econômica. Sem                    substituirá aquela atualmente utilizada na ICP-Bra-
utilizá-los, bancos têm sofrido fraudes, lojas sofrem              sil, com a vantagem adicional de ser auditável.
inadimplência e roubos de identidade têm ocorri-                       De acordo com Paulo Sérgio Pagliusi, da Mari-
do com freqüência cada vez maior.                                  nha Brasileira, o programa visa à “construção e
                                                                   nacionalização de uma plataforma criptográfica
    ICP-Brasil                                                     aberta e auditável para a AC-Raiz da ICP-Brasil”.
    A ICP-Brasil, ou Infra-Estrutura de Chaves Pú-                 Ele explica: “A metodologia utilizada no Progra-
blicas brasileira, é o sistema de certificação digi-               ma ‘João-de-Barro’ prevê o desenvolvimento de
tal oficial do país, responsável pelo e-CPF e e-CNPJ.              sistemas baseados em software livre, com códi-


4. O sistema funciona da seguinte maneira: suponha os usuários João e Maria. João possui seu par de chaves, assim como Maria, e
ambos querem trocar mensagens privadas, com a certeza de que ninguém poderá compreender o conteúdo, mesmo que a mesma
seja interceptada. Os dois enviam um para o outro suas chaves públicas. De posse dela, por exemplo, João cria uma mensagem
para Maria e, antes de enviá-la, criptografa a mesma utilizando a chave pública de Maria. Agora, a única chave capaz de decodificar
a mensagem é a chave privada de Maria, que é de posse exclusiva dela. Dessa maneira, fica garantido que apenas Maria vai
conseguir ler aquela mensagem. Da mesma forma, para Maria mandar uma mensagem privada para João, é preciso usar a chave
pública dele. Mesmo que esta mensagem seja interceptada, ela será ilegível sem a chave privada de João. Agora, caso João e
Maria queiram trocar mensagens com 100% de certeza de que são eles mesmos os autores, o procedimento é o seguinte: ao
enviar uma mensagem para João, Maria assina digitalmente a mensagem usando sua chave privada. Esta assinatura só pode ser
reconhecida com a chave pública do remetente.



                                                                                                                              97
go-fonte aberto, para serem integrados na plata-       privado, da comunidade científica e outros gru-
forma criptográfica. É mandatório o uso de ambi-       pos interessados. Cabe a ele “elaborar projetos e
entes abertos (como o sistema Linux), evitando-        recomendações que, levadas aos órgãos compe-
se, assim, o desenvolvimento de softwares vincu-       tentes, resultam em aperfeiçoamento de normas
lados a ambientes fechados ou proprietários (‘cai-     e da legislação, na adoção de padrões técnicos etc.,
xas-pretas’). Além disto, todos os sistemas desen-     além de manifestar-se sobre as proposições do
volvidos em software poderão ter seus códigos-         público em geral”.
fonte publicados na internet, para a disseminação         Apesar do foco especificamente comercial, este
dos conhecimentos e busca de críticas e suges-         grupo deve ter impacto significativo sobre as for-
tões da sociedade acadêmico-científica”. Essa ca-      mas de funcionamento da internet de maneira
racterística da plataforma em software livre e         geral.
auditável foi determinada pelo Comitê Gestor da
ICP-Brasil.                                            TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
                                                                     ATUAIS
   O projeto teve início em novembro de 2003,          C 2.1, C 2.2 E C 2.3
com a assinatura do convênio entre ITI e a Mari-
nha Brasileira, e deve durar três anos. A expectati-       SPAM
                                                           SPAM
va é de que a nova tecnologia tenha uma vida útil         O SPAM tem sido o principal alvo de todas as
de cerca de dez anos.                                  propostas de lei e regulamentações, no que tange
                                                       à comunicação eletrônica – tanto pelo seu poten-
    Roubo de identidade e afins                        cial de problema técnico (“congestionando” a
   Tem ocorrido, com freqüência cada vez maior,        internet, por assim dizer), quanto pela quebra da
o chamado “roubo de identidade”, expressão cu-         confiança da rede como ambiente seguro para
nhada nos EUA e que identifica o roubo e uso           transações comerciais – não só no Brasil, mas glo-
indevido de informações pessoais, sejam núme-          balmente. Questiona-se, entretanto, a eficácia das
ros de documentos, senhas pessoais, cartões de         legislações já em vigor, como a americana CAN-
crédito etc.                                           SPAM, de dezembro de 2003. O volume de SPAM,
   Existem duas técnicas: uma delas é a invasão        inclusive nos EUA, continua a crescer. Um exem-
de bancos de dados de grandes empresas. A outra        plo de proposta de regulamentação é o Projeto de
é o chamado phishing, na qual o usuário é induzi-      Lei do Senado 21/04, proposto pelo senador
do a inserir seus dados pessoais em sites falsos de    Duciomar Costa (PTB-PA), que incide apenas sobre
empresas reconhecidas.                                 as mensagens eletrônicas comerciais. Existe
                                                       também o PL 2.186/03, do deputado Ronaldo
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                          Vasconcelos (PTB-MG). Ambas as propostas usam
C 2.1, C 2.2 E C 2.3                                   a sistemática OPT-OUT, na qual o destinatário da
                                                       mensagem é quem deve solicitar o não-
   Existe um crescente movimento de busca pela         recebimento de mensagens posteriores, uma
regulamentação do tráfego de informações na            prática pregada nos EUA e que não tem surtido
internet – ao menos no que tange ao SPAM. Enti-        efeito.
dades como o Grupo Brasil AntiSPAM                        Há ainda outros projetos de lei acerca do tema,
(www.brasilantispam.org) e o Movimento                 como o PL 2.423/03, que dispõe sobre
Brasileiro     de     Combate       ao     SPAM        procedimentos de invasão de computadores e
(www.antispam.org.br), formadas principalmente         envio de mensagem eletrônica não solicitada; o
por provedores de acesso e outras entidades            PL 279/03, que dispõe sobre a prestação dos
interessadas no comércio eletrônico, procuram          serviços de correio eletrônico; o PL 7.093/02, que
coibir esse tipo de mensagem em benefício das          dispõe sobre a correspondência eletrônica
comerciais autorizadas e controladas. O SPAM vai       comercial; e o PL 6.210/02, que limita o envio de
contra o interesse destas empresas, tanto por          mensagem eletrônica não solicitada.
aumentar a desconfiança com o meio eletrônico
quanto por representar significativo incremento            Arapongagem
no tráfego de dados entre as diversas redes que           O governo federal está preparando a minuta
integram a internet.                                   de um novo projeto de lei que supere a Lei do
   O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e        Grampo (9.296/96), e que impeça, entre outras
Comércio Exterior instalou, em 2004, o Comitê          coisas, a divulgação de qualquer informação
Executivo de Comércio Eletrônico (http://              captada de modo ilegal, seja por uma escuta ou
ce.mdic.gov.br), com representação do setor            interceptação de comunicações.


98
C 3: Ausência de censura eletrônica. O direito de transmitir
informação eletrônica sem censura ou controle por parte de
agentes do Estado, judiciais, comerciais, empregadores ou outrem.

C 3.1 - Leis de proteção contra censura na internet ou outros meios de
publicação eletrônica, seja através de filtros, sites prescritos, sanções contra
provedores de acesso ou conteúdo e a responsabilização dos provedores por
conteúdo hospedado.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                              censura é reafirmada no capítulo sobre Comuni-
                                                         cação.
    Ainda o artigo 5º da Constituição diz que “é
livre a manifestação do pensamento, sendo veda-              Art. 220 - A manifestação do pensamento, a
do o anonimato”. Cabe a observação de que a              criação, a expressão e a informação, sob qualquer
internet, em geral, é um ambiente de anonimato           forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer
por definição. Os usuários não são, geralmente,          restrição, observado o disposto nesta Constituição.
obrigados a se identificar de acordo com registros
oficiais, como RG ou CPF, muito menos ao assinar            §1° - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa
documentos, textos ou transmissões feitas na             constituir embaraço à plena liberdade de informação
internet.                                                jornalística em qualquer veículo de comunicação
    Também o mesmo artigo diz que é livre a ex-          social, observado o disposto no art. 5°, IV, V, X, XIII e
pressão da atividade intelectual, artística, científi-   XIV;
ca e de comunicação, independentemente de cen-              §2° - É vedada toda e qualquer censura de nature-
sura ou licença. Mais à frente, a não-existência de      za política, ideológica e artística.




C 3.2 - Leis ou regulações, inclusive auto-regulação por parte da indústria, que
inclua obrigações para que operadores comerciais de publicações e difusão
eletrônicas (provedores de acesso, mecanismos de busca, provedores de banda
[infra-estrutura de internet, empresa de telefonia, internet a cabo ou via satélite])
ajam como operadores de rede (common carriers) para material juridicamente
legal.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                 Contudo, nenhum dos dois dispositivos foi re-
                                                         gulamentado posteriormente e ambos seguem
    A Lei Geral de Telecomunicações (9.472/97) faz       sem serem aplicados.
menção à prática do unbundling (obrigação de                Não há qualquer outro mecanismo que obri-
concessionários de serviços públicos a ceder, ou         gue provedores de acesso ou de infra-estrutura a
partilhar, o uso de sua infra-estrutura instalada de     oferecerem condições de transmissão para conteú-
modo a estimular a competição). Também a Lei             do que, na prática, não seja comercial. Sendo tra-
da TV a Cabo (8.977/95) estipula que as redes            tado do ponto de vista comercial, portanto, os
físicas das operadoras de cabo, uma vez em               provedores podem negar a prestar determinado
funcionamento, têm caráter público e podem ser           serviço, mesmo que seja de disponibilização de
usadas para finalidades públicas (como, por exem-        material judicialmente legal.
plo, a criação de uma intranet pública).




                                                                                                             99
C 3.3 - Garantia do cumprimento de tais leis de modo acessível financeiramente,
transparente e pró-ativo, e com o direito de revisão quando direitos tiverem sido
violados.
BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                        detalhado sob o atributo C5), que tem o potencial
                                                                   de influenciar positivamente esta área na criação
  Embora não haja legislação específica, cabe citar                de canais de interlocução e resolução de disputas,
o Comitê Gestor da Internet no Brasil (mais                        para garantir a liberdade de expressão na internet.

IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                                      é o acesso a tais tecnologias (ver Pilar D).
C 3.1, C 3.2 E C 3.3
                                                                   O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
   Hoje é a cobrada uma taxa de interconexão para                  C 3.1, C 3.2 E C 3.3
conectar um provedor de acesso ao backbone da
internet 5 . Essa é uma forma de estimular a                          A convergência tecnológica apresenta um ce-
competição, pois poupa o investimento altíssimo                    nário complexo, em constante mutação, que faz
da criação de uma infra-estrutura de cabos telefô-                 das teles e dos provedores de TV por assinatura
nicos, por exemplo, para as empresas-espelho de                    concorrentes em permanente disputa. No Brasil,
telefonia fixa6.                                                   o setor de telecomunicações encontra marco
   Apesar da Constituição prever a liberdade de                    regulatório mais definido entre os três citados, mas
expressão e manifestação do pensamento, o fato                     por enquanto não existe restrição à produção de
de a internet depender de provedores privados faz                  conteúdo por parte dessas empresas, o que tem
com que não haja garantia de hospedagem ou                         provocado disputas acirradas entre esses atores,
transmissão de qualquer conteúdo.                                  já que, de sua parte, as TVs por assinatura têm
   No tocante à comunicação de massa, não existe                   que seguir regras estabelecidas. Como conseqüê-
a visão de que provedores de acesso e infra-                       ncia disso, na reformulação do Comitê Gestor da
estrutura deveriam abrir canais que facilitassem a                 Internet no Brasil, os provedores do setor de TV
participação de grupos de diferentes formas de                     por assinatura e os provedores do setor das teles
expressão. O último movimento nesse sentido foi                    disputaram a vaga entre os provedores de infra-
a Lei da TV a Cabo, que criou os canais de utilização              estrutura. O eleito é do setor de telecomunicações,
gratuita, como os comunitários, universitários e                   tendo ficado o representante do setor da TV por
dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.                   assinatura com a suplência.
   Estes canais muitas vezes não são ocupados
pela sociedade civil, por falta de condições técnicas                            ATUAIS
                                                                   TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
e/ou financeiras. Existem inclusive casos de ligação               C 3.1, C 3.2 E C 3.3
entre canais “comunitários” e a grande mídia.
   No caso da internet, diferentes grupos têm se                      O governo anunciou no início de 2005 a inten-
apropriado da rede como espaço para livre expres-                  ção de elaborar uma Lei Geral de Comunicação de
são. Esse uso, atualmente, não é organizado, o                     Massa, visando à regulamentação de todos os ser-
que pode ser entendido como um bom sinal, já                       viços ligados ao tema, incluindo infra-estrutura,
que significa, em princípio, ausência de restrições,               distribuição e produção de conteúdo. Não está cla-
ao menos em âmbito nacional7. É importante ci-                     ro ainda se a internet será incluída na Lei, mas
tar que no Brasil, como país em que há um qua-                     certamente ela será afetada pela regulamentação
dro de enorme exclusão social, usar TICs como                      geral, já que a convergência tecnológica estabele-
meio de expressão requer um passo anterior, que                    ce “comunicações” como um campo híbrido.

5. São as chamadas “teles fixas” que possuem a infra-estrutura de conexão da “última milha” que chega às casas dos assinantes
residenciais e das pequenas empresas (as grandes empresas dispõem de várias opções de conexão). Os provedores são obrigados
a pagar pelo uso desta infra-estrutura, mas o problema é que as teles fixas possuem seus próprios provedores, que terminam por
auferir condições vantajosas do uso das redes, caracterizando concorrência desleal.
6. Para racionalizar o tráfego de dados na internet, está sendo proposto o PTT-Metro, projeto do Comitê Gestor da Internet no
Brasil que promove e cria a infra-estrutura necessária (Ponto de Troca de Tráfego - PTT) para a interconexão direta entre as redes
("Autonomous Systems" - ASs) que compõem a internet brasileira. Dessa forma, racionalizam-se custos, uma vez que os balanços
de tráfego são resolvidos direta e localmente e não através de redes de terceiros, muitas vezes fisicamente distantes.
7. Existem diversas restrições, mas todas de caráter internacional, como o Carnivore, o Echelon e a própria estrutura de nomes,
números IPs e roteamento da internet.


100
C 4. Liberdade de associação no meio eletrônico, para
participar de protestos públicos ou debates online.
C4.1Leis que salvaguardem contra vigilância em vídeo excessiva e seu possível
efeito intimidante sobre a liberdade de associação.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                                   ATORES
                                                         PAPEL DOS DIFERENTES ATORES

   O artigo 5º da Constituição prevê:                       Não há atores que tratem diretamente dessa
                                                         questão, embora as entidades da sociedade civil
XVII - é plena a liberdade de associação para fins       que tratem do tema da internet (ver Pilar D) tam-
  lícitos, vedada a de caráter paramilitar;              bém lidem com esse ponto.
XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a
  de cooperativas independem de autorização, sen-
  do vedada a interferência estatal em seu
                                                                    ATUAIS
                                                         TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
  funcionamento.
                                                                         Vigilância não-autorizada
                                                              Grampos e Vigilância não -autorizada
  Não há nenhuma legislação específica em
                                                             Como citado anteriormente sob o atributo C2,
âmbito nacional sobre liberdade de associação no
                                                         o uso de grampos, gravações em vídeo vazadas e
meio eletrônico.
                                                         outras formas de controle são uma polêmica per-
                                                         manente no Brasil.
                                                             São preocupantes, entretanto, proposições
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO
                                                         como o PL 700/03, do deputado Pompeo de Mattos
                                                         (PDT-RS), que obriga estabelecimentos comerciais
   A vigilância não é disciplinada de forma algu-
                                                         como shoppings a instalarem sistemas de
ma, seja ela excessiva ou branda. Não há provisão
                                                         vigilância por vídeo, mas não prevê formas de
legal no Brasil que defina o que é legal, e o que é
                                                         utilização deste material. Obrigatório ou não, a
abuso, quem são os responsáveis e quais seus
                                                         implantação desse tipo de recurso precisa ser dis-
deveres.
                                                         ciplinada, definindo tempo de guarda, acessibili-
   Assim, não há como dizer que não haja coibi-
                                                         dade por parte do público, legalidade e responsa-
ção de práticas associativas devido aos sistemas
                                                         bilidade por uso e alteração. Não há, na lei brasi-
de vigilância, quer em vídeo, quer em qualquer
                                                         leira, regra que cumpra essa função.
outra mídia.




                                                                                                      101
C 5. Participação efetiva da sociedade civil no processo
de governança, incluindo sua formulação, projeto, regulação,
implementação e avaliação.
C 5.1 - Um processo participativo de desenvolvimento de políticas, que inclua
participação significativa da sociedade civil e os recursos necessários para que
todos os parceiros dêem contribuições efetivas.

C 5.2 - Meios ativos e dinâmicos para que preocupações públicas com relação a
governança e políticas sejam ouvidas e atendidas.

C 5.3 - Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e
implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando
apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais.

C 5.4 - Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e
utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo (ver C1.3).

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                               V - articular as ações relativas à proposição de nor-
                                                             mas e procedimentos relativos à regulamentação
   No que tange à internet, todo o campo deline-             das atividades inerentes à Internet;
ado por estes indicadores devem ser vistos do             VI - ser representado nos fóruns técnicos nacionais e
                                                             internacionais relativos à Internet;
ponto de vista do Comitê Gestor da Internet no
                                                          VII - adotar os procedimentos administrativos e
Brasil, existente desde 1995, mas reformulado pelo           operacionais necessários para que a gestão da
Decreto 4.829/03. O comitê passou a ter as                   Internet no Brasil se dê segundo os padrões inter-
seguintes atribuições:                                       nacionais aceitos pelos órgãos de cúpula da Internet,
                                                             podendo, para tanto, celebrar acordo, convênio,
Art. 1o Fica criado o Comitê Gestor da Internet no           ajuste ou instrumento congênere;
    Brasil - CGIbr, que terá as seguintes atribuições:    VIII - deliberar sobre quaisquer questões a ele enca-
I - estabelecer diretrizes estratégicas relacionadas ao      minhadas, relativamente aos serviços de Internet
    uso e desenvolvimento da Internet no Brasil;             no País.
II - estabelecer diretrizes para a organização das re-
    lações entre o Governo e a sociedade, na execução         O CGIBr é composto por 21 membros, sendo
    do registro de Nomes de Domínio, na alocação de       oito representantes de ministérios e órgãos
    Endereço IP (Internet Protocol) e na administração
                                                          federais, um representante do Fórum Nacional de
    pertinente ao Domínio de Primeiro Nível (ccTLD -
    country code Top Level Domain), ".br", no interes-
                                                          Secretários Estaduais, um técnico especialista em
    se do desenvolvimento da Internet no País;            assuntos relacionados à internet, quatro represen-
III - propor programas de pesquisa e desenvolvimen-       tantes do setor empresarial, três representantes
    to relacionados à Internet, que permitam a manu-      do terceiro setor e três representantes da comuni-
    tenção do nível de qualidade técnica e inovação no    dade científica e tecnológica.
    uso, bem como estimular a sua disseminação em             Os representantes do empresariado, do tercei-
    todo o território nacional, buscando oportunidades    ro setor e da comunidade científica e tecnológica
    constantes de agregação de valor aos bens e ser-      foram escolhidos mediante um processo eleito-
    viços a ela vinculados;                               ral, no qual entidades votavam abertamente para
IV - promover estudos e recomendar procedimentos,
                                                          selecionar os conselheiros. Não há conhecimento
    normas e padrões técnicos e operacionais, para a
    segurança das redes e serviços de Internet, bem
                                                          de qualquer entidade do tipo, no mundo, que
    assim para a sua crescente e adequada utilização      adote tal prática.
    pela sociedade;



102
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                             • coordenar a atribuição de endereços Internet, o
                                                             registro de nomes de domínios, e a interconexão
    A primeira eleição para o órgão ocorreu em               de espinhas dorsais;
julho de 2004. Os representantes da sociedade             • coletar, organizar e disseminar informações sobre
                                                             os serviços Internet
civil eleitos vêm de setores progressistas, o que
                                                          (Site do CG-Br)
pode possibilitar a presença de vozes pelo direito
à comunicação no CGIBr.                                      Até o momento, a abertura à participação da
                                                          sociedade civil no comitê tem possibilitado o
                                                          diálogo mais próximo em relação às questões da
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES                             internet no Brasil. No entanto, ainda se dá um
                                                          tratamento eminentemente técnico a questões que
   O papel do CGIBR é descrito da seguinte forma:         são, de fato, políticas.
O Comitê Gestor da Internet do Brasil foi criado a par-
  tir da necessidade de coordenar e integrar todas
  as iniciativas de serviços Internet no país e com o
                                                                     ATUAIS
                                                          TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
  objetivo de assegurar qualidade e eficiência dos
  serviços ofertados, assegurar justa e livre compe-          A reformulação do CGiBr mudou a lógica do
  tição entre provedores e garantir a manutenção de       setor, mas ainda é necessário ver quais serão a
  adequados padrões de conduta de usuários e pro-         conseqüências práticas dessa mudança. O CGiBr é
  vedores.                                                um novo ator e, ao mesmo tempo, uma nova are-
                                                          na de disputa – não só entre a representação dos
O Comitê Gestor tem como atribuições principais:          empresários, mas entre os interesses dos diferen-
• fomentar o desenvolvimento de serviços Internet         tes atores ali representados. É importante notar
  no Brasil;
                                                          que a mudança no CGiBr inseriu a sociedade civil
• recomendar padrões e procedimentos técnicos e
  operacionais para a Internet no Brasil;
                                                          em um debate até então reservado para especia-
                                                          listas, empresários e o governo.




                                                                                                       103
104
Pilar D
Assegurando acesso eqüitativo e
a preços razoáveis a TICs
   O acesso a tecnologias de informação e comu-          outro –, os programas de universalização se dão
nicação (TICs) no Brasil ainda é separado de forma       de maneira isolada e os projetos que combinam
estanque entre acesso às telecomunicações (no sen-       as duas questões ainda estão no papel. Assim,
tido clássico, de telefonia) e acesso à internet (bus-   neste capítulo, trataremos sempre desse debate
ca da inclusão digital). Apesar do processo de con-      levando em conta tal realidade.
vergência tecnológica – e do fato de um influir no



D1: Acesso a TICs, inclusive à telefonia, à internet e a
outros serviços, de modo econômico, igualitário e
apropriado para todo o povo e suas comunidades.

D 1.1 - Um quadro legal e regulatório que favoreça fortemente a extensão de
modo universal dos serviços e do acesso a TICs como a prioridade para este
setor.

D 1.2 - Medidas políticas, convencionais e inovadoras, que vão além das
abordagens mercadológicas e corporativas, para incluir, por exemplo, redes
comunitárias, subsídios cruzados efetivos por parte de usuários mais ricos com
fins de universalização do serviço, e assim por diante. Serão então considerados:
-      infra-estrutura fixa e telefonia;
-      telefonia móvel, inclusive em termos de custos;
-      telecentros comunitários;
-      licenciamento de provedores de acesso, portais de internet e medidas de
apoio à internet;
-      links de satélite Vsat e de dados.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                                  Telefonia
                                                             Telefonia
D 1.1 E D1.2                                                O Brasil passou por uma mudança na legisla-
                                                         ção e regulação do setor de telecomunicações a
   A discussão do acesso às TICs no Brasil passa         partir do ano de 1995. Naquele momento, por
essencialmente por dois vieses: o primeiro, as con-      meio da Emenda Constitucional nº8, que
dições para o acesso, como indivíduo, às redes de        modificou o artigo 21 da Constituição Federal,
comunicações, incluindo telefonia e internet, e aos      quebrou-se o monopólio estatal nas
equipamentos para utilização e desfrute da rede.         telecomunicações e previu-se a constituição de um
O segundo, as políticas de apoio ao acesso uni-          órgão regulador para as telecomunicações. Mais
versal, tanto às redes de telecomunicações como          do que isso, a mudança já não previa como
de dados.                                                competência do Estado a exploração dos serviços
                                                         de telecomunicações.


                                                                                                    105
Após a alteração do artigo 21, o governo bra-                   e Intelig. Tivemos, também, a implantação das
sileiro aprovou a Lei Geral de Telecomunicações1                    espelinhos, atuando em áreas menores. Este mo-
(Lei 9.472), em 16 de julho de 1997, que autori-                    delo fracassou na sua intenção de criar concorrên-
zou o governo federal, na época dirigido pelo                       cia nas áreas de concessão, e as empresas espelho
presidente Fernando Henrique Cardoso, a iniciar                     têm se voltado essencialmente para o mercado
o programa de privatização (veja mais no item                       corporativo.
“Implementação”). A função da União já não se-                          A Lei Geral previa funções importantes para o
ria mais a de controlar, mas sim a de organizar a                   poder público:
exploração do setor. Essa organização passava a
estar na mão de uma agência reguladora, fora                        Art. 2º O Poder Público tem o dever de:
do Ministério das Comunicações, que ficou com
função de regular e propor políticas para a radi-                   I - garantir, a toda a população, o acesso às teleco-
odifusão.                                                               municações, a tarifas e preços razoáveis, em con-
                                                                        dições adequadas;
    Com isso abriu-se espaço para a privatização
                                                                    II - estimular a expansão do uso de redes e serviços
de todo o sistema Telebrás, que incluía uma ope-                        de telecomunicações pelos serviços de interesse
radora nacional, a Embratel, e diversos operado-                        público em benefício da população brasileira;
res regionais, divididos por estados, além do Cen-                  III - adotar medidas que promovam a competição e a
tro de Pesquisa e Desenvolvimento (CPqD) da                             diversidade dos serviços, incrementem sua oferta
Telebrás, transformado em fundação privada. Essa                        e propiciem padrões de qualidade compatíveis com
operação foi consumada em julho de 1998. Ao                             a exigência dos usuários;
contrário da maioria dos países europeus, a                         IV - fortalecer o papel regulador do Estado;
privatização brasileira significou a opção do país                  V - criar oportunidades de investimento e estimular o
em não controlar diretamente nenhuma porção                             desenvolvimento tecnológico e industrial, em am-
                                                                        biente competitivo;
das telecomunicações. Foi permitida ainda a en-
                                                                    VI - criar condições para que o desenvolvimento do
trada de 100% de capital estrangeiro no setor. O                        setor seja harmônico com as metas de desenvolvi-
Brasil foi dividido em três áreas, com concessões                       mento social do País.
para exploração comercial leiloadas para três gru-
pos: Brasil Telecom, de propriedade do                                 Além disso, determinava os direitos dos usuá-
Opportunity (que administra recursos do                             rios de serviços de telecomunicações em seu arti-
Citibank), da Telecom Itália e de vários fundos de                  go 3º, incluindo questões como “acesso aos ser-
pensão de estatais; Telefonica de España; e                         viços de telecomunicações, com padrões de quali-
Telemar (capital nacional nas mãos de fundos de                     dade e regularidade adequados à sua natureza,
pensão de estatais, Carlos Jereissati, Opportunity                  em qualquer ponto do território nacional” e “a
e mais uma série de empresas). Além disso, a                        inviolabilidade e ao segredo de sua comunicação,
operadora nacional, incluindo toda a rede de fi-                    salvo nas hipóteses e condições constitucional e
bras óticas da Embratel, foi para as mãos da                        legalmente previstas”.
empresa norte-americana WorldCom, depois MCI.                          A lei prevê, em seu artigo 5º, a observação, na
Em 2004, a Embratel foi adquirida pela mexica-                      disciplina das relações econômicas, da redução das
na Telmex. Além dessas quatro operações, oito                       desigualdades regionais e sociais, entre outros.
operadoras regionais de telefonia celular foram                     Nos artigos 6º e 7º, busca-se preservar a livre con-
leiloadas. Também tivemos a privatização da es-                     corrência, explicitando-se que haverá o controle
tadual CRT pelo governo do Rio Grande do Sul e                      do Conselho Administrativo de Defesa Econômica
da municipal Ceterp pelo ex-prefeito de Ribeirão                    (Cade) para prezar pela livre competição e evitar
Preto, Antonio Palocci, hoje ministro da Fazen-                     concentração econômica nos processos de fusão
da. Restou até hoje como estatal apenas a muni-                     ou incorporação de empresas.
cipal Sercomtel, que atua em Londrina.                                 Dentro do programa de desestatização das te-
    Tanto no caso da telefonia fixa como no da                      lecomunicações, a Lei Geral das Telecomunicações
móvel, previu-se a entrada de empresas espelho                      (LGT) previa (artigo 17º, inciso V) que as empresas
depois de um ano, e a futura abertura completa                      concessionárias vencedoras dos leilões deveriam
do mercado para a livre concorrência. As empresas                   seguir “metas de progressiva universalização”,
espelho são: GVT (de propriedade de fundos de                       acompanhadas e fiscalizadas posteriormente pela
venture capital), Vésper (comprada pela Embratel)                   Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

1. Leia a redação original da Lei Geral de Telecomunicações e sua posterior alteração (www.anatel.gov.br/biblioteca/Leis/LeiGeral/
leigeral.asp)


106
Cerca de dois meses antes da privatização do                         de 100 habitantes deverá ter, ao menos, um tele-
monopólio brasileiro, que aconteceu em junho de                      fone público.
1998, o governo aprovou o Decreto 2.592, que                             - O número de telefones públicos deverá
aprovava o Plano Geral de Metas para                                 triplicar, nos próximos cinco anos, passando de
Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comu-                     pouco mais de 500 mil para cerca de 1,5 milhão.
tado Prestado no Regime Público (PGMU)2. A reda-                         -    A partir do próximo ano se iniciará a compe-
ção do PGMU define universalização no artigo 1º:                     tição entre as empresas; os usuários passarão a escolher
                                                                     a companhia telefônica que lhes ofereça menores preços
Art. 1º Para efeito deste Plano, entende-se por                      com serviços cada vez melhores.
   universalização o direito de acesso de toda pes-                      -    Em até cinco anos, todo pedido de instalação
   soa ou instituição, independentemente de sua lo-                  de telefone terá que será atendido em, máximo, duas
   calização e condição sócio-econômica, ao Serviço                  semanas.
   Telefônico Fixo Comutado destinado ao uso do
                                                                         -    A partir de 1999, nas localidades com rede
   público em geral, prestado no regime público, con-
   forme definição do art. 1° do Plano Geral de Ou-
                                                                     telefônica, todo bairro, quadra, conjunto residencial e
   torgas, aprovado pelo Decreto nº 2.534, de 2 de                   áreas com população de baixo poder aquisitivo terá
   abril de 1998, bem como a utilização desse servi-                 que ter, pelo menos, três telefones públicos para cada
   ço de telecomunicações em serviços essenciais de                  grupo de mil habitantes.
   interesse público, nos termos do art. 79 da Lei nº                    -    Em menos de dois anos, as instituições de
   9.472, de 16 de julho de 1997, e mediante o pa-                   ensino e de saúde serão atendidas em uma semana,
   gamento de tarifas estabelecidas na regulamen-                    com linhas telefônicas que lhes permitam ter acesso à
   tação específica.                                                 Internet.
                                                                         -    Em menos de dois anos, as empresas de
    O detalhamento dos mecanismos de aumento                         telefonia deverão ter, à disposição de deficientes
de tarifas ficou fora deste plano de metas. Ele tra-                 auditivos e da fala, centros de atendimento para
tou especificamente dos percentuais mínimos obri-                    intermediar suas comunicações telefônicas.
gatórios de instalação de acessos individuais e                          -    Em menos de dois anos, não será necessário
terminais públicos para os anos seguintes, cujos                     andar mais de 800 metros para encontrar um telefone
custos relacionados ao cumprimento das metas                         público; Em 2003, essa distância será de, no máximo,
seriam suportados pelas concessionárias (exceto                      300 metros.
em localidades onde o custo para o cumprimento
das metas fosse superior ao retorno financeiro da                        As sanções previstas podem ser uma advertên-
“exploração eficiente do serviço”). Segundo a LGT,                   cia, multa de até R$ 50 milhões ou até mesmo a
a Anatel destinaria, nesses casos, verbas da União,                  cassação da concessão.
estados, municípios ou de um fundo específico                            A própria LGT, aprovada dentro da concepção
para essa finalidade.                                                concorrencial pelo governo do então presidente
    O Programa de Recuperação e Ampliação do                         Fernando Henrique Cardoso, prevê a criação de
Sistema de Telecomunicações e do Sistema Postal                      um fundo específico para garantir a universalização
(Paste), na edição de 1997 (a primeira versão foi                    do serviço de telecomunicações para áreas não-
anunciada ao final de 1985) previa:                                  lucrativas. Cerca de dois anos depois da
    -    Nos próximos cinco anos, o número de linhas                 privatização do setor, o governo então criou, pela
telefônicas fixas deverá ser aumentado dos atuais 17                 Lei 9.998/00, o Fundo de Universalização dos Ser-
milhões para 40 milhões.                                             viços de Telecomunicações (Fust)3, cuja receita
    - Até 2005, toda localidade brasileira com                       provém essencialmente de 1% sobre a receita
mais de 300 habitantes deverá, obrigatoriamen-                       operacional bruta da prestação de serviços em
te, ter rede telefônica. E toda localidade com mais                  telecomunicações, menos os impostos4. Esse mo-

2. Leia a íntegra do decreto que aprova o Plano Geral de Metas para Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comutado
Prestado no Regime Público (Pgmu), de 15/08/1998 (www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2592.htm)
3. Leia a íntegra da lei que institui o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações
(www.mc.gov.br/fust/l_9998_17082000.htm)
4. Art. 6º Constituem receitas do Fundo:
I - dotações designadas na lei orçamentária anual da União e seus créditos adicionais;
II - cinqüenta por cento dos recursos a que se referem as alíneas c, d, e e j do art. 2º da Lei nº 5.070, de 7 de julho de 1966, com a
redação dada pelo art. 51 da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, até o limite máximo anual de setecentos milhões de reais;
III - preço público cobrado pela Agência Nacional de Telecomunicações, como condição para a transferência de concessão, de permissão
ou de autorização de serviço de telecomunicações ou de uso de radiofreqüência, a ser pago pela cessionária, na forma de quantia certa,
em uma ou várias parcelas, ou de parcelas anuais, nos termos da regulamentação editada pela Agência;



                                                                                                                               107
delo exclui claramente a responsabilidade das                           Está previsto para 2006 o primeiro ano de im-
operadoras de telefonia em garantir inclusão a                       plantação do serviço, que inicialmente será pres-
grandes parcelas da população.                                       tado em regime público, condicionado à obriga-
    A aplicação dos recursos do Fust contemplaria,                   ção do cumprimento de metas. O plano divide o
entre outros objetivos: atendimento às localidades                   país em 11 áreas, destinadas a apenas uma con-
com menos de cem habitantes, complementação                          cessionária. Os candidatos mais visíveis são as
para atendimento de comunidades pobres,                              prestadoras de Serviço de Comunicação
instalação de acessos individuais em escolas,                        Multimídia, de TV por assinatura/cabo e provedo-
bibliotecas e hospitais e implantação da telefonia                   res de informática estaduais. A partir de 2009, essa
rural. Além desses, está previsto o uso do Fust                      estrutura poderia ser utilizada pelas empresas para
para "complementação de metas estabelecidas no                       exploração privada.
Plano Geral de Metas de Universalização para                            O plano do SCD prevê a utilização, pela
atendimento de comunidades de baixo poder                            prestadora, das redes da concorrente, sendo fir-
aquisitivo", o que evidencia a inversão de atribui-                  mado, portanto, na lógica de desagregação das
ções esperada de um serviço cuja concessão é                         redes (unbundling).
pública. A própria lei prevê que as concessionárias
não cumprirão as metas estabelecidas e traz para                         Internet e inclusão digital
o Estado a atribuição de cumpri-las.                                    À parte as questões do Fust, que pode ser usa-
    O Fust foi criado com a intenção de cumprir a                    do para busca de universalização do acesso à
função exercida pelo subsídio cruzado que existia                    internet, não existe base legal específica para o
antes da privatização do sistema Telebrás. No Bra-                   campo da inclusão digital. Isso não impede que
sil, grande parte dos usuários não usa mais do                       haja programas em vias de implementação, inclu-
que os pulsos mínimos já previstos na assinatura                     sive com dotação orçamentária própria, o que ve-
mensal, em virtude do alto preço fixo cobrado por                    remos nos itens seguintes.
essa assinatura. Sob controle da Telebrás, menos
de 10% dos municípios geravam receitas maiores
do que as despesas de manutenção, o que ensejava                     IMPLEMENTAÇÃO
                                                                     IMPLEMENTAÇÃO
uma política de subsídio cruzado.                                    D1.1 E D1.2
    Somente no início de 2004 surgiu uma pro-
posta do governo brasileiro para utilização do                           Telefonia
                                                                         Telefonia
Fust, que já acumulou mais de R$ 3 bilhões (mais                        A alteração do artigo 21 da Constituição gerou
de US$ 1 bilhão). A sua aplicação se daria pelo                      uma separação entre telecomunicações e radiodi-
Serviço de Comunicações Digitais (SCD), cujo                         fusão. Na época, essa foi a estratégia do governo
projeto ainda pode sofrer alterações após a con-                     para poder abrir o mercado da telefonia sem ter
sulta pública realizada em 2004 e o pedido de                        que mexer no complicado quadro da radiodifusão
vistas do Ministério das Comunicações. O plano                       no país. Isso, no entanto, gerou uma situação em
funcionará, na verdade, para permitir o acesso a                     que setores que não podem ser entendidos
redes digitais, incluindo acesso à internet, a cerca                 separadamente passaram a estar sujeitos a
de 260 mil escolas de ensino médio, bem como                         regulações distintas. Enquanto a Lei Geral das
em instituições de ensino fundamental e                              Teles passou a regular o setor das telecomunica-
profissionalizante (públicas ou privadas), além de                   ções, a radiodifusão continuava a ser controlada
ambulatórios, postos de saúde, hospitais, biblio-                    pelo que restou do Código Brasileiro de
tecas e órgãos de segurança pública, instituições                    Telecomunicações (Lei 4.117/62). As conseqüênci-
de assistência a deficientes, deficientes carentes e                 as têm influenciado os dois setores. Por um lado,
regiões remotas e de fronteiras. Não existe previs-                  a radiodifusão é uma área sem regulação
to um conselho do Fust. Mantidas as condições                        consistente de limitações de propriedade e de toda
previstas, a sociedade civil não deve participar da                  a parte de controle e gestão; por outro, a área de
aplicação desses recursos, exceto através de                         telecomunicações não é legislada quanto à pro-
entidades de deficientes ou bibliotecas.                             dução de conteúdo.

IV - contribuição de um por cento sobre a receita operacional bruta, decorrente de prestação de serviços de telecomunicações nos
regimes público e privado, excluindo-se o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços
de Transportes Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações - ICMS, o Programa de Integração Social - PIS e a Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social - Cofins;
V - doações;
VI - outras que lhe vierem a ser destinadas.


108
O processo de privatização das telecomunica-                        Projeto ambicioso conduzido durante o gover-
ções não priorizou, como veremos, o maior aces-                     no Fernando Henrique Cardoso, o Programa Soci-
so à população a preços razoáveis: os ganhos fi-                    edade da Informação (PSI) tinha como objetivo “in-
nanceiros do governo brasileiro com o processo                      tegrar, coordenar e fomentar ações para a utiliza-
são questionáveis, o Estado não manteve uma                         ção de tecnologias de informação e comunicação,
presença mínima estratégica no setor e as tarifas                   de forma a contribuir para a inclusão social de
subiram mais do que a inflação. Com relação a                       todos os brasileiros na nova sociedade e, ao mes-
este último, o aumento das tarifas da telefonia                     mo tempo, contribuir para que a economia do país
fixa foi de 611,03% nos últimos dez anos. Em 1994,                  tenha condições de competir no mercado global”.
a assinatura residencial custava R$ 0,69. Hoje ela                      Coordenado por Tadao Takahashi, o programa
custa na cidade de São Paulo R$ 34,29. Um                           foi desenvolvido pelo Ministério da Ciência e
aumento de quase 5.000%, bem maior que a                            Tecnologia e lançado em 15 de dezembro de 1999
inflação no período, de 145,01%5. Apenas entre                      (pelo Decreto 3.294/99). O PSI contou inicialmente
1995 e 1997, no processo de preparação para as                      com a participação de cerca de 150 especialistas,
privatizações, a assinatura subiu 2.172%.                           que se distribuíram em debates sobre os Grupos
    Os argumentos do governo federal para a                         Temáticos que compõem o programa.
privatização eram que, além da possibilidade de                         Utilizando-se de uma metodologia internacio-
arrecadar recursos para um Estado endividado e                      nal, já aplicada em outros países – entre os quais
com metas econômicas acordadas com o Fundo                          Portugal –, o programa Sociedade da Informação
Monetário Internacional (FMI), o processo                           iniciava-se com a publicação do Livro Verde (base
aumentaria a oferta de serviços e, com a                            teórica) e avançaria para a elaboração do Livro
concorrência decorrente da fragmentação do                          Branco (operacional), no qual as metas – inclusive
sistema Telebrás, os preços seriam mais acessíveis.                 orçamentárias – seriam estabelecidas. No plane-
A parte da LGT relativa ao processo de                              jamento original, essa etapa deveria ter se cum-
desestatização (artigo 186) citava os objetivos                     prido em 2001.
primordiais do governo mencionados no artigo                            O Livro Verde começou a ser distribuído à soci-
2º (ver acima): garantir acesso a todos por preços                  edade em setembro de 2000. No horizonte dos
razoáveis, estimular a expansão do número de                        organizadores do PSI estava a perspectiva de cons-
redes e serviços de telecomunicações e adotar                       trução de um projeto que articulasse todas as ini-
medidas que promovam a competição e a diversi-                      ciativas do campo de Sociedade da Informação e
dade dos serviços.                                                  Nova Economia, no qual todos os atores – setor
    Se analisarmos o que determinava o documen-                     privado, governo, sociedade civil e universidade
to Paste e o Plano Geral de Metas para a                            – estivessem contemplados. De acordo com o pla-
Universalização (PGMU), (citados em “Base                           nejamento original, a etapa de consolidação do
Constitucional e Legal”), veremos que parte das                     projeto estava prevista para ocorrer no segundo
metas não tem sido cumprida. Já no final de 2004,                   semestre de 2003.
o Tribunal de Contas da União (TCU) exigiu da                           A troca de governo ocorrida em 2003 resultou
Anatel um plano de reformulação de todos os                         no fim do Programa Sociedade da Informação, sem
processos de fiscalização das obrigações de                         que mais informações fossem divulgadas pela nova
universalização de telefonia fixa, a ser preparado                  gestão do Ministério da Ciência e Tecnologia.
no prazo de 180 dias. Segundo o TCU, a agência
vinha fazendo as análises por amostra, o que                           A política de inclusão digital
geraria estimativas não confiáveis. Isso explicaria,                   Não há como tratar das políticas públicas de
por exemplo, as diferenças de avaliação que o                       inclusão digital no Brasil sem fazer algumas op-
próprio Conselho Consultivo já apontava em                          ções. Principalmente no que se refere ao “como
relação às avaliações promovidas pela própria                       fazer”. Desde meados da década de 90, foram
Anatel. Além disso, no início de 2005, estavam                      muitas as experiências que procuraram conter esse
em consulta pública os indicadores de qualidade                     novo modelo de exclusão, agora digital, nascido
para telefonia fixa.                                                no seio da Sociedade da Informação. Desde
                                                                    projetos que procuravam facilitar a aquisição de
    Internet e inclusão digital                                     computadores, passando pela possibilidade de as
    Programa Sociedade da Informação                                empresas de telefonia garantirem o acesso disca-

5. A tarifa de telefonia fixa foi a que mais subiu nos últimos dez anos (611,03%), seguida pelos aluguéis (544,1%). A inflação no
período acumulou alta de 145,01% entre julho de 1994, início do Plano Real, e junho de 2004. (Globo Online, 05/07/2004).



                                                                                                                              109
do à internet com pulso único (i00), até chegar-             de 400 mil pessoas, em regiões de baixíssimo Ín-
mos ao modelo mais amplo e democrático de in-                dice de Desenvolvimento Urbano (IDH) – periferi-
cluir digitalmente: o telecentro comunitário.                as e favelas da capital paulista.
    Um telecentro comunitário é um espaço que                   Uma pesquisa de amostragem realizada em dez
permite a apropriação social das tecnologias da              telecentros pela Rede de Informações do Terceiro
informação e da comunicação pela população                   Setor (Rits), que abrangeu um universo de 46.134
mais carente. Portanto, não oferece apenas                   usuários cadastrados, mostra que o programa tem
conectividade à rede mundial de computadores,                ampla aceitação da sociedade e promoveu, para
mas também atua para promover a transforma-                  cerca de 70% dos ouvidos, mudanças considerá-
ção social, posto que se insere (alterando) as di-           veis em suas vidas. O que se traduz no fato de
nâmicas de organização local e de ação comunitá-             que para um quarto da população estudada, a ida
ria. Nesse sentido, busca oferecer cursos de                 ao telecentro é uma prática diária. O porcentual
capacitação, mecanismos que permitam aos usu-                de pessoas que passaram a ter um e-mail após
ários a geração de conteúdos próprios e técnicas             freqüentarem o telecentro é de 68,83%.
que facilitem a apropriação da tecnologia pela                  O número de usuários/as que têm até 19 anos
população. Destaca-se no Brasil a opção feita pela           de idade é muito próximo deste valor, um total de
maioria das iniciativas de inclusão digital de uso           66,83%. Pessoas de terceira idade não aparecem
do software livre, com diversas vantagens em re-             com relevância na estatística: o número de
lação à adoção de softwares proprietários. A mais            respondentes acima de 60 anos fica abaixo de um
imediata é o não pagamento de licenças às em-                ponto percentual. O número de homens e
presas proprietárias. Mas há outras. Ao utilizar             mulheres usuários é praticamente o mesmo. “Com
software livre, o usuário se familiariza com a lógi-         relação à escolaridade, a maioria (47,32%) das
ca dos programas, e não com uma formatação es-               pessoas está cursando ou completou o Ensino
pecífica. Além disso, ao permitir a verificação e a          Médio, o que é justificado em função da faixa etária
modificação do código fonte, o modelo pode ga-               predominante na amostra. Apesar de 31,68% das
rantir que homens e mulheres tornem-se, além de              pessoas estarem na faixa etária de 20 a 49 anos,
usuários, programadores; mais do que isso, que               apenas 5,47% do universo total pesquisado têm
trabalhem sob a lógica colaborativa.                         nível superior e 16,06% se declaram ocupadas –
    A experiência pioneira nesse sentido foi o pro-          categoria que inclui atividade no mercado de
grama Sampa.org, realizado pelo Instituto                    trabalho formal e/ou informal. Se formos definir
Florestan Fernandes (IFF), ligado ao Partido dos             um perfil majoritário no grupo pesquisado,
Trabalhadores (PT) a partir de abril de 2000. No             estamos falando de homens adolescentes,
entanto, o programa, que serviu como piloto para             estudantes, cursando o ensino médio. O perfil
a ampla rede de telecentros que seria futuramente            minoritário é composto por mulheres de terceira
construída pela prefeitura paulistana, utilizava             idade, aposentadas”, aponta a pesquisa.
softwares proprietários.                                        Esse modelo de inclusão digital – em que o
    Há também que se destacar o trabalho desen-              acesso ao computador ocorre em espaços comu-
volvido pela prefeitura do PT na capital do Rio              nitários – não é contemplado pelo Mapa da Exclu-
Grande do Sul, com o projeto Telecentros de Porto            são Digital, elaborado pelo Comitê para a Demo-
Alegre. Em outubro de 2003, havia na capital                 cratização da Informática (CDI) e o Centro de Polí-
gaúcha 15 telecentros, com cerca de 12                       ticas Sociais (CPS/Ibre/FGV), com apoio da Sun
computadores cada. A opção foi a utilização do               Microsystems e da Usaid. Baseado em sua maior
dual boot: o usuário tem a opção de escolher, assim          parte em levantamentos realizados pelo Instituto
que iniciada a máquina, se pretende utilizar o               Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),
sistema operacional proprietário (Windows) ou o              principalmente a Pesquisa Nacional por Amostra
livre (GNU/Linux).                                           de Domicílios (PNAD), o mapa apresenta dados
    No entanto, o principal projeto de política pú-          nacionais sobre a exclusão digital levando em
blica de inclusão digital realizado no Brasil até            conta o volume da população que possui
hoje é o Projeto Telecentros, da Prefeitura de São           computador em suas residências.
Paulo, construído a partir de 2001, com o                       Isso significa que os 400 mil usuários de
lançamento do Telecentro da Cidade Tiradentes                telecentros comunitários da capital paulista e o
(extrema Zona Leste de São Paulo). Hoje, o                   sem número de usuários de cybercafés e LAN houses
programa possui 138 unidades6 e beneficia cerca              não foram computados pelo mapa entre os

6. Fonte: Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits)


110
“incluídos digitalmente”. Segundo o estudo (da-        sores foram capacitados, além de 10.087 técni-
dos de 2001), 16 milhões de brasileiros possuem        cos de suporte e 2.169 professores que atuam
acesso doméstico ao computador. Subtraindo o           como multiplicadores. Segundo o MEC, de 1997
total da população brasileira (cerca de 170 milhões)   a 2002, o programa atingiu seis milhões de alu-
o volume de excluídos digitais chega a 153 milhões     nos. O problema do Proinfo é que ele não está
de brasileiros. Esse estudo, que pretende ser o        preparado para lidar com ambientes escolares.
mais abrangente do país, portanto, possui              Assim, os computadores que poderiam se trans-
problemas sérios de concepção e por isso não será      formar em telecentros comunitários nas própri-
mais utilizado neste levantamento. É importante        as escolas terminam sendo apenas laboratórios
destacar que, a partir de 2005, a PNAD, do IBGE,       de informática.
órgão oficial de pesquisas no Brasil, passará a con-
tar com 20 perguntas específicas para definir o           Pontos de Cultura (Ministério da Cultura)
conceito de inclusão digital. E ainda que se trate        Os pontos fazem parte do Programa Nacional
da PNAD, os dados colhidos não dirão respeito          de Cultura, Educação e Cidadania – Cultura Viva.
exclusivamente ao acesso residencial.                  Esses pontos serão criados em espaços já
    No âmbito federal, não há políticas de inclu-      existentes, públicos ou privados. O ministério irá
são digital que se destaquem como consolidadas.        repassar R$ 155 mil para cada um deles, distribu-
O que há é a profusão de diferentes projetos, em       ídos em cinco semestres. A cada seis meses, terão
diferentes espaços do governo, com diferentes          R$ 30 mil para colocar suas propostas em prática
características. Muitos desses projetos obtiveram      e no último semestre de 2006, R$ 35 mil. Cada
algum tipo de resultado, os quais enumeraremos         ponto será equipado com um estúdio digital para
e comentaremos sob o item “Tendências Atuais e         gravação de CDs, um computador que funcionará
Futuras”. No último ano, iniciou-se o esforço de       com software livre e uma câmera para gravações
levar à frente uma política integrada de inclusão      audiovisuais. O Ministério da Cultura e o
digital.                                               Ministério das Comunicações assinaram em março
    Iniciativas por parte de diferentes órgãos co-     de 2005 uma parceria entre os Pontos de Cultura
meçam a articular uma coordenação conjunta. A          e o Gesac (ver abaixo), de modo a viabilizar o acesso
estrutura do Governo Eletrônico brasileiro é cons-     à internet em localidades remotas.
tituída por oito comitês técnicos, sendo um deles
o Comitê Técnico de Inclusão Digital, coordenado           Gesac (MiniCom/Ministério da Educação)
pela Secretaria de Logística e Tecnologia da Infor-        O Programa Governo Eletrônico - Serviço de
mação do Ministério do Planejamento (SLTI/MPOG).       Atendimento ao Cidadão (Gesac), do governo
    Trata-se de uma estrutura política-administra-     federal, conta com 3.200 unidades instaladas,
tiva que não está amparada por um marco                tendo como pontos de acesso especialmente
regulatório que defina qual setor do governo fe-       escolas públicas. Toda a conexão é feita por
deral é o responsável pela política pública de in-     satélite, possibilitando o alcance a regiões não
clusão digital. Mesmo com este esforço inicial,        cabeadas. São beneficiadas prioritariamente as
atualmente ainda persiste o cenário de diversas        comunidades que apresentam baixo Índice de
iniciativas diferentes, com metodologias diferen-      Desenvolvimento Humano (IDH) e que estão
tes e que chegarão a resultados diferentes quanto      localizadas em regiões onde as redes de
ao que é, ou não, inclusão digital.                    telecomunicações tradicionais não oferecem acesso
    Algumas iniciativas em curso em âmbito fede-       local à internet em banda larga.
ral:                                                       De acordo com a Secretaria de Educação à
                                                       Distância do Ministério da Educação, das 178 mil
   Programa Nacional de Informática na Educação -      escolas públicas existentes no país, 20% possuem
Proinfo (Ministério da Educação)                       computadores e apenas 10% possuem conexão
   O Proinfo foi criado em 1997. De acordo com         com a internet. No ano passado, das antenas
o ministério, até 2002, ano de encerramento do         instaladas pelo Gesac, 2.400 foram ligadas em
governo Fernando Henrique Cardoso, o total in-         escolas públicas.
vestido chegou a R$ 206 milhões. O número de               Em 2004, os usuários do programa passaram
computadores instalados no programa ficou bem          a ter acesso a oito novos serviços. Os usuários
abaixo das metas estabelecidas pelo próprio go-        ganharam ainda o direito de possuir o seu próprio
verno: apenas 51% dos 105 mil que se esperava          e-mail e as comunidades, condições para criar sua
atingir. Em relação à capacitação: nas 4.629 es-       página na internet.
colas atendidas pelo programa, 137.911 profes-             O programa havia sido planejado no governo


                                                                                                      111
anterior a partir da noção de totens de acesso,                     dinação hierárquica, bem como mandato fixo e
sem compreender necessariamente a noção de                          estabilidade de seus dirigentes”, além de defini-
telecentros comunitários. Na revisão do progra-                     ção no artigo 19º que institui a prevalência da
ma, o atual governo decidiu adotar essa noção,                      Anatel sobre qualquer outro órgão de defesa do
com gestão democrática e acesso público,                            consumidor8. Estes dispositivos deverão mudar a
instalando uma antena e cerca de dez                                partir da confecção de um marco regulatório úni-
computadores em cada ponto. Também a largura                        co para todas as agências reguladoras, que está
de banda aumentou, possibilitando plena                             sendo preparado pela Casa Civil (ver em
capacidade de transmissão e recepção de dados                       “Tendências Atuais e Futuras”).
por parte dos usuários. Para 2005, está prevista a                      A Anatel, como agência reguladora não subor-
instalação de mais 1.200 telecentros Gesac.                         dinada a nenhum ministério, assume o papel prin-
                                                                    cipal na regulação e fiscalização do setor. É ela
   Rede Floresta (Eletronorte/ITI)                                  quem regula o setor, fiscalizando metas de
   Projeto de inclusão digital para a Amazônia.                     universalização e concedendo ou não reajustes nas
Perspectiva de construção de 20 unidades. Até                       tarifas das empresas que obtiveram as concessões
agora, foram inaugurados quatro telecentros na                      de exploração do setor após a privatização do
região Norte. Nos moldes do projeto de telecentros                  sistema Telebrás, antigo monopólio estatal nas te-
da Prefeitura de São Paulo.                                         lecomunicações (veja mais no item
                                                                    “Implementação”). O Ministério das Comunicações
   CorreiosNeT (Correios)                                           transferiu ainda, por contrato, a tarefa de também
   Pontos de acesso nas agências dos Correios,                      regular o setor de radiodifusão, aumentando as
com a proposta de que cada cidadão possa ter um                     atribuições da agência.
endereço de e-mail.                                                     Na Lei Geral das Telecomunicações, o artigo 19º
                                                                    define que compete à Anatel “adotar as medidas
   Programa de Inclusão Digital de Pescadores (Se-                  necessárias para o atendimento do interesse pú-
cretaria Nacional de Aqüicultura e Pesca)                           blico e para o desenvolvimento das telecomuni-
                                                                    cações brasileiras, atuando com independência,
   Telecentros de Informações e Negócios (Ministério                imparcialidade, legalidade, impessoalidade e pu-
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior)                  blicidade”. O Decreto 2.338 especificou, entre
                                                                    outras, as seguintes competências:
  PAPEL                ATORES
O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
D 1.1 E D1.2                                                        Art. 16º (...)
                                                                    I - implementar, em sua esfera de atribuições, a polí-
    Telefonia
    Telefonia                                                           tica nacional de telecomunicações fixada na Lei e
   A Anatel, assim como o Conselho Administrati-                        nos decretos a que se refere o art. 18 da Lei no.
                                                                        9.472, de 1997;
vo de Defesa Econômica (Cade), tem seus conse-
                                                                    (...)
lheiros nomeados pelo governo, sem direito à voto                   IV - rever, periodicamente, os planos geral de outor-
ou veto da sociedade civil. O artigo 8º cria a Anatel                   gas e de metas para universalização dos serviços
como “entidade integrante da Administração Pú-                          prestados no regime público, submetendo-os, por
blica Federal indireta, submetida a regime                              intermédio do Ministro de Estado das Comunica-
autárquico especial e vinculada ao Ministério das                       ções, ao Presidente da República, para aprovação;
Comunicações”. O Decreto 2.3387, assinado pelo                      V - exercer o poder normativo relativamente às tele-
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em                              comunicações;
outubro de 1997, aprova o regulamento da Agên-                      VI - editar atos de outorga e extinção do direito de
cia e, no primeiro parágrafo do artigo 1º, diz que                      exploração de serviço no regime público;
                                                                    VII - celebrar e gerenciar contratos de concessão e
a autarquia especial terá “independência adminis-
trativa, autonomia financeira, ausência de subor-


7. Leia íntegra do decreto presidencial que aprova o regulamento da Anatel em 1997
www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2338.htm
8. Art. 19. A Agência articulará sua atuação com a do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, organizado pelo Decreto nº. 2.181,
de 20 de março de 1997, visando à eficácia da proteção e defesa do consumidor dos serviços de telecomunicações, observado o disposto
nas Leis nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990, e nº. 9.472, de 1997.
Parágrafo único. A competência da Agência prevalecerá sobre a de outras entidades ou órgãos destinados à defesa dos interesses e
direitos do consumidor, que atuarão de modo supletivo, cabendo-lhe com exclusividade a aplicação das sanções do art. 56, incisos VI,
VII, IX, X e XI da Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990.


112
fiscalizar a prestação do serviço no regime público,   a Fittel lembra que, mesmo com a expansão dos
    aplicando sanções e realizando intervenções;           terminais instalados no país, houve redução do
VIII - controlar, acompanhar e proceder à revisão de       número de pulsos utilizados e o tempo de cada
    tarifas dos serviços prestados no regime público,      ligação também caiu.
    podendo fixá-las nas condições previstas na Lei nº
                                                               No mesmo contexto econômico, o Instituto de
    9.472, de 1997, bem como homologar reajustes;
(...)
                                                           Defesa do Consumidor (Idec) apóia o projeto do
XIX - atuar na defesa e proteção dos direitos dos          deputado Marcelo Texeira (PMDB-CE), que prevê a
    usuários, reprimindo as infrações e compondo ou        extinção da assinatura básica do telefone.
    arbitrando conflitos de interesses, observado o            Do lado do empresariado, as operadoras se
    art. 19.                                               reuniram na Associação Brasileira de Prestadoras
                                                           de Serviço Telefônico Fixo Comutado. Em 2004, a
    Os recursos provenientes das taxas de fiscali-         entidade já cobrou do Ministério das Comunica-
zação e funcionamento da Anatel, além dos pro-             ções uma posição mais forte contra os projetos
venientes do acompanhamento das concessões,                que pretendem cancelar a cobrança da assinatura
serão destinados para o Fundo de Fiscalização das          mensal. Existem também associações de empre-
Telecomunicações (Fistel), criado em 19669 para            sários em outros setores, como a Neotec para o
fiscalizar o setor e redirecionado pela LGT para           MMDS (que, com o wimax, passam a ser operado-
suprir os recursos da agência. Esse mecanismo              ras de telecomunicações, também), a Associação
concede à Anatel independência financeira de qual-         Brasileira de Indústria Elétrica e Eletrònica (Abinee),
quer ministério ou outro órgão governamental.              para o hardware, e a Associação Nacional das
    O comando da Anatel é exercido pelo Conse-             Operadoras Celulares (Acel).
lho Diretor, composto de cinco membros com
mandato de cinco anos. A escolha dos conselhei-                Internet e inclusão digital
ros resulta da nomeação direta do Presidente da                A sociedade civil brasileira desempenhou pa-
República, conforme artigo 23 da LGT. Também               pel fundamental na formulação e implementa-
cabe exclusivamente ao Presidente a nomeação do            ção das políticas públicas de inclusão digital.
presidente deste conselho, que tem por função              Entre essas entidades, está a Rede de Informa-
comandar administrativamente a agência e presi-            ções para o Terceiro Setor (Rits) e o Instituto Bra-
dir as sessões com os demais conselheiros. Há tam-         sileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase),
bém na Anatel um Conselho Consultivo, que aca-             entidade pioneira no que se refere à internet bra-
ba recebendo mais empresários do setor do que              sileira. Além dela, há um sem fim de ONGs que,
representantes da sociedade civil (ver mais sobre          durante os anos 90 e, principalmente, no início
o Conselho Consultivo no indicador D4).                    desta década, passaram a desenvolver atividades
    Em relação aos atores da sociedade civil que           de inclusão digital.
interferem no debate, o principal na área de                   Outro ator de destaque é o PT, que em duas de
telecomunicações é a Federação Interestadual dos           suas principais administrações municipais nos
Trabalhadores de Telecomunicações (Fittel). A sua          últimos anos (São Paulo e Rio Grande do Sul)
proximidade com o atual governo fez com que o              assimilou as principais políticas públicas
indicado, em 2003, para a presidência da Anatel,           formuladas pela sociedade civil e as amplificou
tenha sido Pedro Ziller, ex-dirigente da federação.        consideravelmente (ver mais em “Implementa-
    A sociedade civil e o movimento sindical da            ção”).
área das telecomunicações têm se mobilizado des-               É preciso, no entanto, apontar algumas dife-
de a época das privatizações para enfrentar o au-          renciações. Se a concepção de telecentro com a
mento abusivo dos preços, a ocorrência massiva             qual se trabalha aqui depender da adoção de
de problemas técnicos e a necessidade da                   softwares e sistemas operacionais livres, o núme-
universalização. A Fittel questiona a ausência de          ro de atores de destaque nos últimos anos reduz-
participação popular nas decisões dos critérios das        se drasticamente.
concessões públicas e, sobretudo, quanto ao                    Se foram importantes para a consolidação de
acompanhamento da agência reguladora do setor,             um modelo de inclusão digital no país, entidades
a Anatel. A federação critica ainda o atual preço          bem intencionadas da sociedade civil também têm
das tarifas telefônicas no país e a legislação que         servido como abrigo para projetos apoiados por
permite o reajuste regular dos preços. Diante disso,       fabricantes de softwares. Esses projetos servem


9. Lei 5.070, de 16 de julho de 1966.



                                                                                                            113
aos interesses de monopólios internacionais ao        valor adicionado, como, por exemplo, a internet.
realizar a formação de consumidores para software         Ainda que tenha sido apresentada a questão
proprietário. Recentemente, por exemplo, iniciou-     do SCD como caminho para a utilização das ver-
se um projeto conduzido pelas ONGs Sampa.org          bas do Fust, o Ministério das Comunicações tem
e Cemina para a instalação de 18 telecentros no       defendido uma mudança na lei, de forma a trans-
país, financiados pela Microsoft. O programa          ferir ao governo a gestão dos recursos do fundo,
custará R$ 145 mil e a Microsoft abriu mão do         hoje a cargo da Anatel, garantindo ao Executivo a
pagamento das licenças de uso de seus softwares.      necessária liberdade para implantar uma política
   Destaca-se também o Comitê para Democra-           de inclusão digital.
tização da Informática (CDI) que atua montando
Escolas de Informática e Cidadania (EICs) em par-          Internet e inclusão digital
ceria com associações e entidades locais. O CDI            O governo e o Estado brasileiro não possuem,
está representado em comitês regionais em 35          nesse momento, uma política unificada de inclu-
cidades em 20 estados brasileiros. Hoje, a Rede       são digital. O desafio de garantir o acesso à
CDI inclui 863 EICs, contando com 1.726 educa-        internet aos milhões de brasileiros sem-computa-
dores, mais de 635 mil educandos formados,            dor, no entanto, vem sendo enfrentado em diver-
mais de 4,3 mil computadores instalados e 1.036       sas frentes, ainda que carentes de coordenação. A
voluntários. O programa também conta com o            prova dessa assertiva é o próprio movimento de
apoio da Microsoft.                                   setores do governo para garantir a formulação de
                                                      uma política para a inclusão digital.
                                                           Há um forte movimento dentro do governo
              ATUAIS
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                           para a construção de uma política para o setor.
D 1.1 E D 1.2                                         Uma prova disso é o documento “Programa
                                                      Brasileiro de Inclusão Digital e Estratégia de
    Telefonia
    Telefonia                                         Governo”, em sua versão preliminar de 26 de julho
    Os trabalhadores em telecomunicações ainda        de 2004. Esse trabalho é resultado de uma síntese
pressionam o governo e a Anatel a renegociar a        de outros seis documentos produzidos no âmbito
concessão das operadoras de telefonia, reajustan-     do governo federal, por ministérios e autarquias
do valores e obrigações. Todas as outorgas conce-     que desenvolvem atividades de combate à exclusão
didas na época das privatizações findam em 2005       digital:
e precisam ser renovadas para 2006. Esta é a opor-         1) Política Estratégica de Governo Federal para
tunidade, segundo a Fittel, para alterar regras do    a Inclusão Digital (Ministério do Planejamento)
contrato entre iniciativa privada e governo.               2) Sugestões para a qualificação das iniciativas
    Além do Serviço de Comunicações Digitais          de Inclusão Digital (Instituto Nacional de
(SCD), o governo federal acena com a idéia de         Tecnologia da Informação)
utilizar os recursos do Fust para criar um novo            3) Construindo um mapa conceitual para um
serviço de telefonia fixa para as pessoas de baixa    projeto nacional de infoinclusão (Ministério da
renda. A principal vantagem do serviço estaria        Educação)
justamente no preço acessível da assinatura básica.        4) Programa Casa Brasil (Banco do Brasil)
Existe, contudo, uma decisão do Tribunal de                5) Inclusão Digital e Estratégia de Governo
Contas da União (TCU) que não é clara sobre a         (Ministério das Comunicações)
possibilidade de se criar um novo serviço que              6) Ata da 1ª reunião de integração dos proje-
utilizasse, em sua implantação e manutenção, os       tos de Inclusão Digital do Governo Federal, de 16
recursos do Fust. Além disso, os recursos do fundo    de julho de 2004
vêm sendo contingenciados pelo governo para fins           Esse esforço converge para o projeto Casa Bra-
de superávit primário.                                sil.
    Sobre o projeto do SCD, foi realizada uma
consulta pública pela Anatel. Embora haja avanços         Projeto Casa Brasil
no que tange a conciliação de pacotes de outorgas         É carro chefe do Programa Brasileiro de Inclusão
envolvendo regiões lucrativas e não lucrativas, a     Digital. Trata-se, na teoria, de um programa de
proposta do SCD contraria a própria LGT quando        articulação dos serviços e informações oferecidos
prevê que as operadoras poderão fornecer a rede       pelo governo em meio digital. Cada Casa Brasil,
e o acesso nas localidades em que não houver pro-     no geral, terá:
vedores. Isso é proibido pela LGT, que impede as          1. Telecentro
operadoras de serem fornecedoras de serviços de           2. Rádio Comunitária


114
3. Espaço Multimídia                                           apenas 90 unidades.
    4. Centro de reparo de computadores                                Além disso, há mais três ações previstas para
    Será, de acordo com o documento “um ponto                      2005 dentro do PBID.
de convergência para as ações do governo de in-                        - aumento de escolas públicas ligadas na
clusão digital, inclusão social, no mercado de tra-                internet. Atualmente, das 173 mil escolas do en-
balho, desenvolvimento da cidadania, desenvol-                     sino fundamental, apenas 20 mil possuem com-
vimento local e regional sustentável, geração de                   putadores.
emprego e renda e a disseminação do software                           - massificação do acesso à internet em todo o
livre”.                                                            país, com ações do governo que permitam me-
                                                                   lhorar a infra-estrutura de telecomunicações no
    Programa Brasileiro de Inclusão Digital                        país.
    Para a execução do PBID, serão criadas novas                       - Centro de Reciclagem de Computadores (CRC).
estruturas de coordenação. Uma delas, a Coorde-                    O governo federal descarta aproximadamente 200
nação Nacional do Programa de Inclusão Digital,                    mil computadores por ano. A proposta é direcionar
sob responsabilidade da Casa Civil da Presidência                  todos os computadores para vários centros de
da República. Também serão criadas, em nível local,                reciclagem de computadores e esses centros
unidades de gestão, “com base nas diretrizes de                    recolocarem esses computadores para uso da
participação comunitária, sustentabilidade, acom-                  inclusão digital.
panhamento e avaliação”.                                               Também o grupo Internet Acess for Everyone
     A política do governo para o setor prevê cinco                (Acesso à Internet para Todos), que reúne empresas
ações diferenciadas, que combinam a idéia de aces-                 do ramo de informática como a BMC Software,
so em espaços públicos e acesso domiciliar. A ava-                 Global Learning Venture, Philipe Eletronics, Dell e
liação do governo é de que essa política deve estar                Intel, escolheu o Brasil para desenvolver uma
focada especialmente nas classes D e E. Para a clas-               espécie de "ecossistema" de inclusão digital para
se C, o governo identifica o preço do computador                   famílias que possuem renda inferior a três salários
como o maior empecilho para o acesso às                            mínimos.
tecnologias.                                                           A meta prevista no Plano Plurianual 2004-2007
    Para atingir esse público, o governo pretende                  é de chegar a sete mil telecentros no Brasil, até o
tirar do papel este ano o programa PC Conectado,                   final do período. De acordo com o boletim Em
que vai permitir a aquisição de computadores para                  Questão, produzido pela Secretaria de Comunica-
famílias que ganham acima de cinco salários mí-                    ção e Gestão Estratégica do governo federal, “a
nimos. Segundo Rogério Santanna, secretário de                     partir de 2006, está prevista a abertura de três
Logística e Tecnologia da Informação do Ministé-                   mil novos telecentros a cada doze meses, o que
rio do Planejamento, a proposta é chegar a um PC                   incluirá nove milhões de brasileiros das classes D
que custe aproximadamente R$ 50 por mês e que                      e E no mundo digital anualmente”. A perspectiva
possa ser pago em um período de 24 meses, com                      do programa é dobrar, em 2007, o número de
juros mais baixos e com subsídio governamental                     internautas no Brasil (o programa utiliza como
no montante dos impostos envolvidos. Seria uma                     dado o Mapa da Exclusão Digital e estima que hoje
máquina em torno de R$ 1,2 mil para o                              haja 16 milhões de brasileiros incluídos
consumidor dessa classe.                                           digitalmente10).
    Outra meta do governo seria construir mil                          Vale destacar que todas essas questões apre-
unidades das Casas Brasil em 2005, e para isso                     sentadas estão, por enquanto, apenas no papel.
foram aprovados R$ 224 milhões no orçamen-                         Apesar da declarada intenção, que também se re-
to. No entanto, após o corte da equipe do Mi-                      flete na alocação de recursos no orçamento da
nistério da Fazenda, sobraram apenas R$ 24                         União, ainda não há nada que garanta que esses
milhões, que serão suficientes para construir                      planos se consolidem na prática.




10. Como foi afirmado anteriormente, esse mapa de exclusão digital leva em conta apenas o acesso residencial, portanto é
questionável do ponto de vista quantitativo, por não incluir os números dos telecentros de acesso público, dos locais de trabalho,
ou mesmo de LAN houses e cybercafes.



                                                                                                                            115
D 1.3 - Apoio ao desenvolvimento de indústrias locais ao longo dos setores
relacionados a TICs, tais como incentivos específicos, períodos de transição para a
criação de companhias locais etc.

BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                            IMPLEMENTAÇÃO
                                                       IMPLEMENTAÇÃO

   Na Constituição Federal, o artigo 219 afirma            Os descontos tributários previstos para os pro-
que o “mercado interno integra o patrimônio na-        dutos fabricados na Zona Franca de Manaus ge-
cional e será incentivado de modo a viabilizar o       ram um quadro de atração de empresas estran-
desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o          geiras que promovem a montagem dos produtos
bem-estar da população e a autonomia tecnológica       por lá, mas que desenvolvem toda sua tecnologia
do País, nos termos da lei federal”.                   em seus países de origem. Ainda que haja fabri-
   Há vinte anos, ainda durante o regime militar       cantes nacionais de produtos e componentes ele-
brasileiro, foi lançado o Plano Nacional de            trônicos, de modo geral, ao Brasil é reservado o
Informática pela Lei 7.232/84. A legislação atribuía   papel de mão-de-obra montadora na cadeia pro-
ao governo a responsabilidade de orientar,             dutiva, estando o desenvolvimento dos produtos
coordenar e estimular atividades de informática,       locados nos países de origem das transnacionais.
seja na participação em conjunto ou substituição       Uma das políticas propostas pelo presidente
à própria iniciativa privada ou na intervenção para    Fernando Collor, consolidada na Lei 8.387, de
assegurar proteção à produção nacional. A política     1991, foi a substituição dos índices de nacionali-
prevê a “proibição de situações monopolísticas,        zação pelo Processo Produtivo Básico, que permi-
de direito ou de fato”.                                te à indústria de eletro-eletrônicos importar CKD
   A Lei 8.387, de 30 de dezembro de 1991, con-        (kits desmontados) e/ou SKD (kits semi-desmon-
cede descontos tributários (IPI e IR) para os pro-     tados) para usufruir de descontos na Zona Franca
dutos produzidos na Zona Franca de Manaus, in-         de Manaus e apenas montar os itens aqui.
cluindo bens para informática. Essa lei inverteu a         Em relação à política industrial no setor de
prioridade do país no setor. Se o Plano Nacional       software, a Agência de Promoção de Exportações
de Informática visava produzir ciência e tecnologia    do Brasil (Apex), órgão vinculado ao Ministério do
no país, a lei de 1991 acaba com isso, e propõe        Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior,
que empresas estrangeiras venham montar seus           em conjunto com a Sociedade para a Promoção
produtos em território nacional.                       da Excelência de Software Brasileiro (Softex), vão
   Em 2004, o governo anunciou sua política in-        investir cerca de R$ 11,8 milhões no Projeto
dustrial, na qual aponta como opções estratégi-        Setorial Integrado para Exportação de Software e
cas softwares, semi condutores, fármacos e             serviços correlatos. A meta é exportar US$ 16 mi-
medicamentos e bens de capital. Especialmente o        lhões em um ano.
setor de softwares, mas também o de                        A Apex e a Softex selecionaram setores de atu-
semicondutores, tem influência direta no campo         ação, como gestão eletrônica de documentos e
da comunicação.                                        automação bancária, telecomunicações, governo
   Nos documentos que definem a política in-           eletrônico, internet, saúde, gestão empresarial e
dustrial, estão previstos quatro focos: inovação       segurança. Hoje qualquer empresa pode procurar
e desenvolvimento tecnológico; inserção exter-         a Softex e passar por uma avaliação para partici-
na; modernização industrial e capacidade e es-         par do projeto, que envolve a capacitação, a gera-
cala produtiva.                                        ção de contatos qualificados e prospecção de mer-
   Para o campo da telefonia, no processo de           cados.
privatização não houve nenhum estímulo à ma-
nutenção de uma operadora nacional, ainda
que renovada. Diferentemente da Europa, não              PAPEL                ATORES
                                                       O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
há no Brasil uma companhia equivalente à
France Telecom, British Telecom, Telefonica de            Da parte do governo, os principais atores para
Espanha etc.                                           o desenvolvimento de indústrias locais são o Mi-
                                                       nistério do Desenvolvimento, Indústria e Comér-
                                                       cio Exterior e o Instituto de Pesquisa Econômica
                                                       Aplicada (Ipea), ligado ao Ministério do Planeja-


116
mento, ambos responsáveis pelo desenvolvimen-          das universidades) trabalha em design de compo-
to da política industrial. Os dois atores citados, a   nentes. A capacitação nessa área possibilitaria o
Apex e a Softex, têm, por sua vez, trabalhado          desenvolvimento de componentes como os SOCs
juntos pelo fortalecimento de uma política para        (system-on-chip), por exemplo, que integram vários
softwares. Além deles, também atuam sobre a            sistemas num único chip, e, segundo o próprio
questão o Ministério da Ciência e Tecnologia e o       governo “tendem a ser um ponto crítico em novas
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico            áreas, como a TV digital”. Nesse campo, o foco da
e Social (BNDES).                                      política industrial é tanto atração de investimento
   A coordenação e operacionalização da política       quanto desenvolvimento de competências e
industrial será exercida por grupos de trabalho de     formação de pessoal qualificado.
natureza interministerial, que se reportarão a             Em relação a softwares, o Brasil tem hoje o
colegiado de ministros. Segundo o documento do         sétimo maior mercado do mundo, com vendas de
governo “esses grupos vão acompanhar e                 US$ 7,7 bilhões em 2001. Dados do governo
monitorar mercados, empresas, setores, cadeias,        federal apontam que as importações equivalem a
arranjos produtivos, redes de empresas e firmas        US$ 1 bilhão e as exportações estão em torno de
no cumprimento dos compromissos assumidos no           US$ 100 milhões. O setor de software é uma das
âmbito dos programas”.                                 áreas prioritárias da política industrial do gover-
                                                       no brasileiro. O ministério tem como meta expor-
                                                       tar US$ 2 bilhões em 2007. As cifras indicam a
TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS                            intenção de crescimento da participação do Brasil
                                                       nesse setor, mas não chegam a alcançar as de
    Em relação a tendências, é possível apresentar     países como Israel, Irlanda e Índia. Esta última
a expectativa em relação à inclusão de                 chega a contabilizar, segundo dados do próprio
semicondutores e softwares como prioridades para       governo, receitas da ordem de US$ 8 bilhões com
a política industrial. Os semicondutores são           a venda de licenças, produtos embarcados e
componentes essenciais na composição de                serviços para o exterior.
aparelhos eletrônicos, especialmente os                    Segundo o documento de política industrial,
relacionados à informática. Nos anos 70, o país        a ausência de uma estratégia industrial focada, a
contava com um laboratório de classe mundial, e        falta de uma imagem do software brasileiro re-
estava entre os países líderes na pesquisa e           conhecida no mercado internacional e dificulda-
desenvolvimento de circuitos integrados. No final      des de financiamento são algumas das barreiras
dos anos 80, havia 23 empresas no Brasil; hoje,        à aquisição de competitividade da indústria no
esse número está limitado a quatro. Quase todas        plano internacional, conforme recente estudo
elas trabalham no encapsulamento (ou back-end),        comparativo entre os mercados brasileiro, india-
a parte de menos valor agregado. Não há foundries      no e chinês.
(fabricantes de chips), e apenas a Motorola (fora




                                                                                                    117
D1.4 Estatísticas e indicadores que demonstrem que o efeito cumulativo das
       políticas implementadas está realmente reduzindo a exclusão em termos de
       acesso, disponibilidade, acessibilidade econômica, acessibilidade e uso, e na
       promoção do bem-estar público.


        Internet                                                    público, o acesso dos locais de trabalho etc. Mes-
           Dados da Agência Nacional de Telecomunica-               mo assim, ajudam a identificar o quadro da reali-
       ções (Anatel), de 2002, mostram que:                         dade brasileira. De acordo com a PNAD 2003 do
                                                                    IBGE, 15,3% dos domicílios brasileiros têm com-
          - 6,7% dos pulsos do serviço de tarifas fixas             putadores. 11,4% dos domicílios têm acesso à
       comutadas são utilizados para conexão a prove-               internet. Esse número vem crescendo numa pro-
       dores de internet. A Anatel justifica esse dado pelo         porção próxima a 10% ao ano. O IBOPE Net Ratings,
       fato de que o serviço telefônico fixo comutado               principal instituto de pesquisas brasileiro, avali-
       (STFC) permite o acesso à internet por meio de               ando os usuários residenciais de internet, anun-
       pulso único (ou seja, o internauta navega na                 ciou que o número de usuários domiciliares cres-
       internet por tempo indeterminado e paga apenas               ceu cerca de 20% em 2004 e chegou a 5,3 milhões,
       um pulso telefônico)                                         de um total de 18,6 milhões com acesso à internet.
          - No Brasil, existem cerca de 1.241 provedores            Assim, os usuários de banda larga representam
       de acesso à internet.                                        cerca de 28,5% dos usuários domiciliares.
          - Eles estão distribuídos em apenas 360 muni-                 Já no tocante aos indicadores de políticas pú-
       cípios. Com isso, apenas 845 municípios (cerca de            blicas, faltam dados que permitam avaliar o im-
       15% do total de cidades do país) conseguem que               pacto das políticas de inclusão digital tanto das
       seus habitantes se conectem à internet pagando               prefeituras quanto do governo federal.
       pulso local.                                                     No caso da internet, além da exclusão econô-
          - 58% desses provedores concentram-se na re-              mica, outros fatores contribuem para o baixo
       gião Sudeste, a mais rica e industrializada. Entre           índice de acesso. São questões culturais (como a
       os demais, 19% estão na região Sul; 11%, no                  usabilidade de computadores) e educacionais
       Nordeste; 7%, no Centro-oeste; e 5%, no Norte.               (como o grau de instrução), entre outras.
          - Ainda assim, a concentração populacional
       garante que 62% da população brasileira sejam                    Telefonia
                                                                        Telefonia
       “cobertos” por provedores de internet.                          Impacto no orçamento familiar
          Os dados de acesso residencial à internet não                O acesso aos serviços de telecomunicações está
       devem ser tomados como base da análise da in-                diretamente ligado aos preços oferecidos e à ca-
       clusão digital, por excluir os centros de acesso             pacidade de consumo da população.


                                     Despesa* média mensal familiar do brasileiro (R$)
                           Classificação por rendimento mensal familiar em salários mínimos**
Tipo                Até      Entre      Entre     Entre     Entre      Entre     Entre     Entre     Entre     Mais       Total
                    2***     2e3        3e5       5e6       6e8        8 e 10   10 e 15   15 e 20   20 e 30    de 30
Telefone            4,15     9,31       17,52     26,68     35,36      41,64     54,79     66,64     82,51    105,64     31,86
fixo****
Telefone            0,74      1,30      3,21       4,63      6,75     10,43     13,81     26,15     42,42     106,38     11,29
celular
Quantidade de    7.949.351 6.747.421 10.181.484 3.528.908 5.086.643 3.349.073 4.571.410 2.416.195 2.236.892 2.467.262 48.534.638
famílias
Tamanho             3,34      3,53      3,68       3,73      3,72      3,70      3,80      3,72      3,72      3,63       3,62
médio da família

       Fonte: Pesquisa de Orçamentos Familiares 2002-2003 (IBGE)
       * O coeficiente médio de variação da despesa total em relação à amostra da pesquisa é de 2% para telefone fixo e
       4,5% para telefone celular
       ** Salário mínimo de R$ 200, vigente durante o período a realização da pesquisa do IBGE
       *** Inclusive os que não possuem rendimentos
       **** Não inclui gastos com telefone público


       118
No Brasil, em que grande parte da população                      ventiva quanto de reparos, mas boa parte dos cus-
está abaixo da linha de pobreza, a situação torna                   tos da rede física já estão amortizados.
necessária a criação de medidas voltadas para as                       Algumas Câmaras Municipais e Assembléias
classes mais desfavorecidas e, conseqüentemente,                    Estaduais já aprovaram projetos de lei que derru-
uma maior participação do Estado na garantia da                     bavam a cobrança a taxa. A argumentação era de
universalização do acesso à telefonia.                              que a Constituição brasileira, em seu artigo 24,
   A última pesquisa sobre os orçamentos famili-                    permite uma competência corrente à União e a
ares do IBGE aponta o impacto dos gastos da po-                     estados sobre a legislação de consumo e produ-
pulação com telefonia fixa e móvel (veja tabela na                  ção, embora o artigo 22 diga que compete ape-
página anterior). Os quase 120 milhões de                           nas à União legislar sobre telecomunicações. Todos
brasileiros que recebem menos de oito salários                      os projetos foram derrubados após decisões
mínimos – que, na época da pesquisa, era de R$                      judiciais.
200 – gastam, em média por mês, cerca de R$ 36
com telefone fixo e menos de R$ 7 com celulares.                                                   área    teleco-
                                                                    Mapeamento do setor privado na área de teleco -
   Os últimos anos mostram que o número de                          municações
telefones celulares em funcionamento ultrapassou
o número de linhas fixas. Desses, mais de 80% são                      Telefonia fixa
de telefones pré-pagos (ver mais dados abaixo).                        Desde 2001, a média brasileira de
Isso evidencia a opção que vem sendo feita por                      teledensidade (quantidade de acessos por cada 100
muitos consumidores de substituir a linha fixa pelo                 mil habitantes) é praticamente a mesma. Em 2003,
telefone pré-pago. A média de gastos, no entan-                     quando o último levantamento foi feito, esse ín-
to, evidencia que os telefones ainda têm um pa-                     dice foi de 29%, exatamente o mesmo de 2002 e
pel de recepção muito maior do que de ligações.                     apenas dois pontos percentuais a mais do que o
O que faz com que ainda sejam os telefones pós-                     registrado em 2001. Isso significa que, a despeito
pagos os que sustentam as operadoras móveis.                        do incentivo à competição de mercado almejada
   Repetindo o que já foi apontado nos atributos                    pelo processo de privatização das empresas de
D1.1 e D1.2, o processo de privatização das tele-                   telecomunicação de meados dos anos 90, a utili-
comunicações não priorizou o maior acesso à po-                     zação do serviço de telefonia fixa no Brasil está
pulação a preços razoáveis: os ganhos financeiros                   praticamente estabilizada.
do governo brasileiro com o processo são                               A Telemar é a maior operadora brasileira, com
questionáveis, o Estado não manteve uma presen-                     cerca de 17,4 milhões de linhas instaladas em
ça mínima estratégica no setor e as tarifas subi-                   2.975 localidades que cobrem 94,6 milhões de
ram a números superiores aos da inflação brasileira.                brasileiros e brasileiras. A Telefônica vem em se-
Com relação a este último, o aumento das tarifas                    guida com 14,8 milhões de linhas instaladas, em
da telefonia fixa foi de 611,03% nos últimos 10                     622 municípios (38 milhões de pessoas). Na se-
anos. Em 1994, a assinatura residencial custava                     qüência, aparece a Brasil Telecom com 10,7 mi-
R$0,69. Hoje ela custa na cidade de São Paulo R$                    lhões de linhas instaladas em 1.798 cidades (po-
34,29. Um aumento de quase 5.000%, bem maior                        pulação atendida de 40,8 milhões).
que a inflação no período: de 145,01%11. Apenas                        O serviço de telefonia chega praticamente a
entre 1995 e 1997, a assinatura subiu 2.172%, no                    todos os 5,5 mil municípios do Brasil, mas o pata-
processo de preparação para as privatizações.                       mar da universalização dos serviços ainda está
   A assinatura básica acaba por ser um dos mai-                    distante. A utopia da plena concorrência que re-
ores limitadores do acesso e, ao mesmo tempo,                       sultaria em um melhor atendimento dos cidadãos
uma grande fonte de receita para as operadoras                      brasileiros tampouco se concretizou. A competi-
de telefonia fixa. Cerca de 40% do faturamento das                  ção ainda está restrita às empresas, ao mercado
empresas se baseiam na arrecadação desta taxa                       corporativo. No entanto, o mercado de telefonia
mensal. Entretanto, a constitucionalidade da co-                    está às vésperas de mudanças drásticas com a in-
brança da assinatura básica é questionada na                        trodução da telefonia por Internet Protocol (IP) e o
Justiça e nas instâncias legislativas do país. A con-               uso da tecnologia IEEE 802.16 (wi-max). Os
tinuidade da cobrança seria abusiva, pois deveria                   impactos atuais ainda são pequenos, mas as pers-
cobrir essencialmente os custos de instalação.                      pectivas são enormes.
Existe ainda um custo de manutenção, tanto pre-                        As empresas-espelho, como a Vésper (compra-


11. A tarifa de telefonia fixa foi a que mais subiu nos últimos dez anos (611,03%), seguida pelos aluguéis (544,1%). A inflação no
período acumulou alta de 145,01% entre julho de 1994, início do Plano Real, e junho de 2004. (Globo Online, 05/07/2004).


                                                                                                                              119
da pela Embratel) e a GVT, não cumprem a função          90% do Índice Potencial de Consumo (IPC),
de disponibilizar serviços concorrentes para loca-       parâmetro calculado pela empresa Target que
lidades com poder de consumo significativo, até          mede percentual que cada município tem no con-
por não serem obrigadas por lei a cumprir o Plano        sumo nacional. Fica claro, portanto, que a compe-
Geral de Metas de Universalização, e seguem              tição na telefonia móvel se dá dentro do imperati-
cambaleantes.                                            vo da lógica de mercado.
    Das cerca de 1 milhão de linhas instaladas
pela GVT, 70% estão em serviço. Já a Vésper,                Infra-estrutura de telecomunicações (fibras ópticas)
apesar de ter o maior potencial de mercado, tem             A capacidade ociosa do setor de fibras ópticas
cerca de seis milhões de linhas instaladas, mas          chega a 90% no país e não há novas demandas.
apenas 500 mil assinantes, número que não os-            Em 2001, por exemplo, foram vendidos no Brasil
cila há anos. Ou seja, não basta potencial para          2,5 milhões de quilômetros de cabos; em 2003,
crescer. A sua compra pela Embratel indica a             esse número não passou de 100 mil. Também em
intenção desta em alcançar a última milha. Re-           2003, 250 mil quilômetros de fibras ópticas foram
centemente, já tem sido anunciada pela empre-            instaladas. Em 2001, foram mais de 2 milhões de
sa a possibilidade do consumidor adquirir um             quilômetros. Na média mundial, a diferença de
telefone fixo sem assinatura básica. A Telmex,           2001 para 2003 caiu de 90 para 50 milhões de
dona da Embratel, adquiriu também a NET Ser-             quilômetros instalados.
viços, possibilitando o provimento de acesso                A novidade no mercado foi o investimento pe-
telefônico domiciliar via cabo.                          sado da Telmex, que comprou a AT&T Latin
    A experiência de maior fracasso no modelo bra-       America por US$ 205 milhões no final de 2003. Já
sileiro é a das espelhinhos, previstas para fortalecer   a Telemar e a Embratel, também em 2003,
a concorrência em âmbito local. Apesar de ter au-        venceram a última grande licitação de terceirização
torização para atuar em 344 municípios (já               de rede do Banco do Brasil, com um lance de R$
chegaram a quase 600), poucas delas estão em             311 milhões e R$ 316 milhões, respectivamente.
operação.
                                                             Satélites
   Telefonia móvel                                           Este é outro setor em que a oferta hoje é mai-
   O número de linhas celulares em operação vem          or do que a demanda, em cerca de 20%. Os ope-
crescendo em altas proporções. O ano de 2004             radores de satélite esperam que as condições
fechou com 65.605.577 acessos em operação, um            negativas do setor passem por mudanças a par-
crescimento de 41,47% em relação a 2003. Des-            tir de 2008, quando a troca dos satélites hoje
ses, 80,47% são linhas pré-pagas, que cresceram          em órbita deve impor um ciclo de
em participação em relação às linhas pós-pagas.          reestruturações e consolidações no mercado. As
   A teledensidade (número de celulares em ser-          transmissões de TVs abertas e por assinatura
viço para cada 100 habitantes) do país subiu de          representam mundialmente cerca de 70% da re-
26,22 (2003) para 36,63 (2004)                           ceita dos satélites.
   Nesse contexto, a tecnologia TDMA, embora
mantenha 35,53% do mercado, vem perdendo                    Banda larga
market share para a tecnologia GSM, sobretudo pela          Há cerca de 250 municípios onde o serviço é
sua flexibilidade territorial e pela maior segurança     disponibilizado. A tecnologia ADSL é a líder abso-
proporcionada, diminuindo os riscos de clonagem.         luta do mercado no Brasil. Até o final de 2003, a
Celulares GSM já representam 34,18% do mercado.          Telefônica possuía 383 mil assinantes do Speedy
Enquanto isso, a tecnologia CDMA, ainda                  concentrados no Estado de São Paulo; a Telemar
concentrada nos grandes conglomerados urbanos,           tinha 217 mil assinantes do Velox e a Brasil
mantém uma faixa de 29,67% do mercado.                   Telecom, 195 mil assinantes do BRTurbo em di-
   O mercado de telefonia móvel praticamente             versos estados (AC, DF, GO, MS, MT, PR, RO, RS, SC
desistiu de expandir a sua cobertura com o intui-        e TO). A tecnologia cable modem é operada pela
to de atingir uma quantidade maior de municípi-          NET, com o Virtua, e pela TVA, com o Ajato.
os. Cerca de três mil municípios brasileiros (25,8          No Brasil, como dito acima, no final de 2004 o
milhões de pessoas) não têm cobertura.                   número de usuários residenciais com banda larga
   Existem, porém, 1.492 municípios em que há            era de 5,3 milhões, representando 28,5% dos 18,6
duas ou mais operadoras de telefonia móvel, mas          milhões usuários domiciliares de internet.
que representam 135,5 milhões de habitantes e



120
6) TV por assinatura
   Pelas redes de cabo ou MMDS, a TV chega hoje
a 508 municípios do Brasil. A negociação da Telmex
com a NET serviços, operadora de TV a cabo per-
tencente ao conglomerado das Organizações Glo-
bo, é a grande novidade do setor. Com a opera-
ção, toda a rede de infra-estrutura da NET passa a
ser controlada pelo grupo mexicano. Na TV por
satélite, foi anunciada a fusão da Sky com a DirecTV,
o que deixa 95% desse mercado (e cerca de 30% do
mercado total de TV por assinatura) na mão do
mesmo grupo.




                                                        121
D2: Disponibilidade de conteúdo relevante para todas as
comunidades lingüísticas e grupos marginalizados
D2.1 Ações de apoio para produção de conteúdo por e para todas as
comunidades lingüísticas.
D2.2 Apoio ao desenvolvimento de software lingüísticos técnicos e interfaces de
hardware.


    É possível identificar dois tipos de comunida-    comunidades lingüísticas marginalizadas. Mais do
des lingüísticas ou grupos marginalizados. O pri-     que isso, não existe nenhuma base legal que
meiro são os indígenas, sendo 235 povos no Bra-       garanta ou sustente ações para o desenvolvimento
sil, segundo o Conselho Indigenista Missionário       de conteúdos, hardware e software para
(Cimi). O total de indígenas de todos os povos,       comunidades lingüísticas.
segundo o Censo 2000, são 734.131, vivendo em             No tocante às pessoas portadora de deficiên-
825 terras pelo país. Apenas 37% dessas terras        cia, a Lei 10.098, de 2000, estabelece:
tiveram seu procedimento de demarcação
concluído.                                            Art. 17. O Poder Público promoverá a eliminação de
    Além do português, falado por alguns povos,          barreiras na comunicação e estabelecerá mecanis-
180 línguas diferentes são faladas por essas co-         mos e alternativas técnicas que tornem acessíveis
munidades, muitas dessas línguas em processo             os sistemas de comunicação e sinalização às pes-
                                                         soas portadoras de deficiência sensorial e com di-
acelerado de extinção. Todo o restante da popula-
                                                         ficuldade de comunicação, para garantir-lhes o di-
ção brasileira fala o português.                         reito de acesso à informação, à comunicação, ao
    O outro grupo marginalizado são as pessoas           trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao
portadoras de deficiência. Segundo estimativa da         esporte e ao lazer.
Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de
10% dos brasileiros – 18 milhões de habitantes –      Art. 18. O Poder Público implementará a formação de
são portadores de algum tipo de deficiência. Se-         profissionais intérpretes de escrita em braile, lin-
gundo a Rede Saci, especializada na questão, “acre-      guagem de sinais e de guias-intérpretes, para faci-
dita-se que esse número possa ser ainda maior,           litar qualquer tipo de comunicação direta à pessoa
uma vez que o Brasil é campeão em acidentes de           portadora de deficiência sensorial e com dificulda-
                                                         de de comunicação.
trânsito e trabalho e tem índices crescentes de
violência urbana”. Segundo o censo realizado pelo     Art. 19. Os serviços de radiodifusão sonora e de sons
IBGE, em 2000, são 24,5 milhões de brasileiros,          e imagens adotarão plano de medidas técnicas com
ou seja, 14,5% da população, com algum tipo de           o objetivo de permitir o uso da linguagem de sinais
deficiência.                                             ou outra subtitulação, para garantir o direito de
                                                         acesso à informação às pessoas portadoras de
                                                         deficiência auditiva, na forma e no prazo previstos
BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                              em regulamento.

    Tradicionalmente, as línguas indígenas não são        O Decreto 5.296, que regulamenta a lei, foi pu-
levadas em conta na elaboração de políticas pú-       blicado em 2004, e estabelece em seu capítulo VI
blicas. A maior ameaça à cultura indígena, no en-     uma série de obrigações para permitir acesso à
tanto, está na ausência de políticas para demarca-    informação e comunicação por parte das pessoas
ção de terras e nas condições políticas e             portadoras de deficiência, entre elas:
socioeconômicas para sua sobrevivência. Segun-            - portais e sítios da administração pública na
do o Cimi, “para garantir a diversidade cultural, é   internet com acessibilidade garantida;
necessário garantir as condições de reprodução            - telecentros públicos devem possuir instala-
dessa cultura”. A inexistência, portanto, de base     ções plenamente acessíveis e, pelo menos, um
legal nesse sentido acaba prejudicando as             computador com sistema de som instalado, para
condições para produção de conteúdo por               uso preferencial por pessoas portadoras de defici-


122
ência visual;                                           PAPEL                ATORES
                                                      O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
   - as empresas de telefonia fixa devem instalar
telefones públicos adaptados e garantir a dispo-          O Cimi atua na luta pela garantia dos direitos
nibilidade de instalação de telefones para uso de     dos povos indígenas. A entidade age para unificar
pessoas portadoras de deficiência auditiva, entre     a ação missionária junto aos índios, “intervindo
outras ações;                                         nas ações do Executivo, Legislativo e Judiciário que
   - empresas de telefonia móvel devem garantir       atinjam os interesses dos índios e estimulando os
interoperabilidade para possibilitar o envio de       diversos setores sociais para que se solidarizem
mensagens de texto (SMS) entre celulares de dife-     com a causa indígena”. Assim, trabalha pela
rentes empresas;                                      manutenção e reprodução da cultura indígena.
   - deve haver incentivo da oferta de aparelhos          Atuando na área da deficiência, a Rede Saci
de televisão equipados com recursos tecnológicos      partiu da Universidade de São Paulo (USP) e reúne
que permitam sua utilização de modo a garantir        diversas universidades para atuar como
o direito de acesso à informação às pessoas porta-    facilitadores da comunicação e da difusão de in-
doras de deficiência auditiva ou visual, entre elas   formações sobre o tema. Segundo a sua página
legenda oculta (closed caption), tecla SAP e fones    web, suas principais ferramentas de trabalho são
de ouvido;                                            a internet e os Centros de Informação e Convivên-
   - as emissoras de TV ficam obrigadas a trans-      cia (CICs). “Por meio da internet, disponibiliza aos
mitir utilizando sistemas de reprodução das men-      seus usuários endereço eletrônico, suporte técni-
sagens veiculadas para as pessoas portadoras de       co, softwares adaptados para deficientes, além de
deficiência auditiva e visual, como legendas ocul-    bases de dados, listas de discussão, agenda de
tas, janela com intérprete de Linguagem Brasileira    eventos, entre outros serviços. Já os CICs são lo-
de Sinais (Libras) e descrição e narração em voz      cais de fácil acesso, abertos a portadores de defi-
de cenas e imagens;                                   ciência, onde são ministrados cursos gratuitos de
   - o projeto de desenvolvimento e implementa-       capacitação para o uso da internet e da
ção da televisão digital no país deverá contem-       informática”.
plar obrigatoriamente os três tipos de sistema de         A Rede Saci conta com cerca de três mil usuários
acesso à informação citados acima.                    cadastrados, e atua também em parceria com o
                                                      poder público, como no caso dos telecentros de
                                                      São Paulo. Outra entidade que lida com o tema é
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                         a Escola de Gente, com projetos e ações que colo-
                                                      cam a comunicação a serviço da inclusão de gru-
    No caso da disponibilização de conteúdo em        pos vulneráveis na sociedade, principalmente de
línguas indígenas, não há nenhum exemplo nesse        pessoas portadoras de deficiência.
sentido, até pela ampla maioria da população,
inclusive parte dos indígenas, ter o português
como língua-mãe. Contudo, sem ações efetivas                     ATUAIS
                                                      TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
para a reprodução da cultura indígena, não há
nenhum estímulo à permanência dessas culturas,           A ser mantida essa política de não reconheci-
e já há várias línguas que desapareceram.             mento dos direitos dos índios, as 180 línguas ain-
    Na questão da acessibilidade, o decreto que       da existentes devem diminuir em quantidade, já
regulamenta a lei ainda é muito recente, e torna-     que os esforços em preservar as línguas têm par-
se difícil mensurar os efeitos de sua promulgação.    tido apenas dos próprios indígenas.
A Universidade Federal do Rio de Janeiro se tor-         Já no campo das pessoas portadoras de
nou referência mundial ao desenvolver o DOX VOX,      deficiência, parece difícil descrever tendências. Por
um software para pessoas portadoras de deficiên-      um lado, a legislação é muito evoluída, e garante
cia visual. No entanto, é possível notar que ainda    a acessibilidade aos meios de comunicação, de
são poucos os sítios acessíveis a portadores desse    massa ou não. Por outro, a plena acessibilidade,
tipo de deficiência. Já no tocante aos telecentros,   para além dos sítios do poder público, depende
vários deles já contam com condições plenas de        de disposição particular dos sítios em assumir as
acessibilidade, até pelo envolvimento de atores       condições para alcançar essa acessibilidade, o que
que lidam com essa questão, como a Rede Saci.         parece impossível prever nesse momento.




                                                                                                     123
D3: Competências e habilidades disseminadas que
permitam ao povo e suas comunidades fazerem uso das
TICs para atingir seus objetivos individuais e coletivos.
D3.1 Apoio para desenvolvimento de competências e habilidades, como
treinamentos, programas de intercâmbio, módulos curriculares formais etc.,
amplamente disponíveis em estabelecimentos de ensino comuns, como escolas,
bibliotecas, centros comunitários etc.


BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL                           produção de conteúdos escritos e visuais sobre
                                                      temas relevantes e atuais da sua própria comuni-
   Não há base legal que sustente o apoio para        dade.
desenvolvimento de competências e habilidades.           Apesar de demonstrarem intenções relevantes,
                                                      essas são iniciativas isoladas, não necessariamente
                                                      fruto de política pública planejada. Dependem
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                         puramente, portanto, da boa vontade dos gestores
                                                      que as aplicam.
    Embora não esteja consagrada por lei, a idéia
do desenvolvimento de competências e habilida-
des para a população lidar e se apropriar das         O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES
                                                        PAPEL                ATORES
tecnologias de informação e comunicação (TICs)
está presente em algumas políticas públicas.             O fato de nenhum dos programas de inclusão
    Em alguns programas de inclusão digital, como     digital por parte do poder público estar consoli-
os telecentros da Prefeitura de São Paulo, o deba-    dado em bases legais torna frágeis as condições
te sobre acessibilidade tem sido feito buscando       para aprofundamentos, tais como o apoio a trei-
fortalecer a produção de conteúdo próprio pelos       namentos e educação.
usuários. Um programa de oficinas de criação de          Por parte do governo federal, o programa
sites chegou a ser disponibilizado para os usuári-    Gesac, coordenado pelo Ministério das Comuni-
os em 2004.                                           cações, e as Casas Brasil (ver a seguir em
    Também o programa Governo Eletrônico -            “Tendências Atuais e Futuras”), coordenadas pela
Serviço de Atendimento ao Cidadão (Gesac) tem         Casa Civil da Presidência da República, são os
buscado fortalecer a produção de conteúdo próprio     principais espaços em potencial para a realização
pelos usuários. A homepage do Gesac mantém no         desse tipo de atividade. Também as escolas públi-
ar o seguinte chamado: “O Gesac lança um desafio!     cas de todo o país, a partir de políticas próprias e
Convida a todos os usuários dos pontos de             de sua integração ao Gesac, podem se tornar im-
presença a produzirem sites das suas respectivas      portantes agentes desse processo.
comunidades, divulgando sua cultura, seus
negócios, além da própria cidade. Participe!
Organize-se em seu Centro Comunitário e publique                 ATUAIS
                                                      TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
seu website!”
    Segundo o sítio, haveria a possibilidade de          As Casas Brasil têm sido previstas não apenas
desenvolver projetos como a construção de uma         como telecentros, mas como uma central pública
página da comunidade na internet, a redação de        em que o cidadão poderá usufruir de diversos ser-
um jornal eletrônico, a produção de áudios            viços e se apropriar de tecnologias nas suas diver-
comunitários locais (rádios e ilhas multimídias), a   sas formas, como rádio comunitária e programa-
tradução de softwares livres educacionais e a         ção de sítios. Assim, ela se mostra como o espaço
montagem de cursos educacionais à distância.          ideal para o desenvolvimento de competências e
    A terceira fase do programa Gesac é a que con-    habilidades por parte da população.
templa o treinamento dos multiplicadores. O ob-          Além disso, as discussões sobre diretrizes
jetivo é que esses multiplicadores possam promo-      curriculares no Ministério da Educação (MEC) já
ver o uso intensivo das TICs disponibilizadas e a     buscam opções para lidar com TICs no programa


124
das escolas. No entanto, ainda há questões que
antecedem ao desenvolvimento de capacidades.
Segundo o próprio MEC, apenas 10% das escolas
públicas têm acesso à internet e, em várias delas,
há apenas um computador, vinculado à diretoria.
As poucas escolas que possuem laboratório de
informática têm a oportunidade de oferecer trei-
namentos específicos, mas falta também uma po-
lítica que proponha metodologias e dinâmicas
para esse fim.




                                                     125
D4. Participação efetiva da sociedade civil no processo de
governança, incluindo sua formulação, projeto, regulação,
implementação e avaliação.
D4.1 Um processo participativo e multilateral de desenvolvimento de estratégias,
que inclua participação significativa da sociedade civil e os recursos necessários
para que todos os participantes dêem contribuições efetivas. Isto inclui infra-
estrutura (seja fixa, sem-fio ou outros) e serviços (como telefonia, celulares,
transmissão de dados e internet); e a natureza da compreensão e planejamento
estratégicos por parte de todos.

D4.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações públicas com relação a
governança e políticas sejam ouvidas e atendidas.

D4.3 Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e
implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando
apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais.

D4.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados
pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo.

BASE CONSTITUCIONAL LEGAL                             empresarial (provedores de acesso, conteúdo, infra-
                                                      estrutura, indústria de telemática e usuários em-
    Repetindo o que já foi exposto em detalhes no     presariais) e seus respectivos suplentes; quatro
atributo A6, o principal espaço de participação da    representantes do terceiro setor e seus respecti-
sociedade civil nas questões de acesso às TICs é      vos suplentes e três representantes da comunida-
hoje o Comitê Gestor da Internet no Brasil.           de científica e tecnológica e seus respectivos su-
Inicialmente criado pela portaria interministerial    plentes.
147, de 31 de maio de 1995, o CGIBr foi alterado         Já no campo da telefonia, a criação da Agência
por inúmeras normas até a atual forma, dada pelo      Nacional de Telecomunicações (Anatel) não previu
Decreto 4.829/03. Originalmente, o comitê foi         a participação da sociedade civil no principal
vinculado a dois ministérios: das Comunicações        espaço de decisão da Agência, o Conselho Diretor.
e de Ciência e Tecnologia. Hoje ele assumiu           A Lei 9.472, intitulada Lei Geral de Telecomuni-
personalidade jurídica própria, e tem na escolha      cações (LGT) prevê que esse tipo de inserção se dá
democrática de seus integrantes uma das marcas        no Conselho Consultivo, como se vê abaixo.
mais positivas.
    Sua função é coordenar e implementar todas        Art 33. O Conselho Consultivo é o órgão de participa-
as atividades necessárias à gestão eficiente e qua-      ção institucionalizada da sociedade na Agência.
lificada dos serviços de internet. Isso significa
operar desde a atribuição de endereços e registro     Art 34. O Conselho será integrado por representantes
                                                         indicados pelo Senado Federal, pela Câmara dos
de nomes de domínios até a recomendação de
                                                         Deputados, pelo Poder Executivo, pelas entidades
padrões e procedimentos técnicos para o desen-           de classe das prestadoras de serviços de teleco-
volvimento do setor, entre muitas outras tarefas.        municações, por entidades representativas dos usu-
    Em julho de 2004 foi realizada a primeira            ários e por entidades representativas da socieda-
eleição direta dos integrantes do CGIBr. A compo-        de, nos termos do regulamento.
sição do Comitê visa contemplar diversos setores      Parágrafo único. O Presidente do Conselho Consultivo
da comunidade brasileira intrinsecamente relaci-         será eleito pelos seus membros e terá mandato de
onada à internet: quatro representantes do setor         um ano.


126
Art 35. Cabe ao Conselho Consultivo:                         PAPEL                ATORES
                                                           O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES

I - opinar, antes de seu encaminhamento ao Ministé-            Tanto no campo da telefonia como da internet,
    rio das Comunicações, sobre o plano geral de ou-       são poucos os atores da sociedade civil que traba-
    torgas, o plano geral de metas para universalização
                                                           lham ativamente pela participação nas decisões
    de serviços prestados no regime público e demais
    políticas governamentais de telecomunicações;
                                                           desses setores.
II - aconselhar quanto à instituição ou eliminação da          Em relação à telefonia, a Federação Interesta-
    prestação de serviço no regime público;                dual de Trabalhadores em Telecomunicações
III - apreciar os relatórios anuais do Conselho Diretor;   (Fittel) atua buscando interferir nas decisões do
IV - requerer informação e fazer proposição a respei-      setor, por meio de espaços como o Conselho Con-
    to das ações referidas no art. 22.                     sultivo da Anatel. Há também órgãos de defesa
                                                           do consumidor que trabalham para que as empre-
Art 36. Os membros do Conselho Consultivo, que não         sas cumpram as metas e parâmetros de qualida-
   serão remunerados, terão mandato de três anos,          de, encaminhando as queixas e cobrando soluções
   vedada a recondução.
                                                           por parte das operadoras. Destacam-se especial-
§ 1º Os mandatos dos primeiros membros do Conse-
   lho serão de um, dois e três anos, na proporção de
                                                           mente o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec)
   um terço para cada período.                             e a Procuradoria de Defesa do Consumidor
§ 2º O Conselho será renovado anualmente em um             (Procon). Da parte do Estado, o principal ator é
   terço.                                                  mesmo a Anatel, que, como foi apontado, regula
                                                           e fiscaliza o setor.
                                                                Na questão da internet, duas instituições
IMPLEMENTAÇÃO
IMPLEMENTAÇÃO                                              da sociedade civil tiveram papel marcante na
                                                           atuação para democratização do Comitê Gestor
   A falsa oposição entre “técnico” e “político” tem       da Internet no Brasil. A Rede de Informações
marcado o discurso que sustenta as agências re-            para o Terceiro Setor (Rits) atuou junto com a
guladoras no país. Até mesmo a indicação de um             Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) para
ex-sindicalista para a presidência da Anatel               que se determinasse a independência e se ado-
provocou reações na grande mídia, evidenciando             tasse o modelo de eleição direta para o comi-
a dificuldade de se aceitar a proposta de controle         tê. Outros atores, como o Projeto Software Li-
público para as comunicações. Da maneira como              vre Brasil, também têm buscado interferir nas
está hoje, o Conselho Consultivo, espaço em que            decisões desse campo, atuando pela amplia-
há participação da sociedade civil, acaba tendo            ção da democratização.
pouca interferência e visibilidade.                            Da parte do governo, destacam-se três ato-
   No caso do CGIBr, não é possível fazer julga-           res. O primeiro é a própria Anatel, diretamente
mento de sua eficácia com o novo modelo, já que            responsável pela regulação, já que a internet é
sua instalação se deu ao final de 2004.                    serviço de valor adicionado. Em segundo lugar,
   A realização de consultas públicas têm ocorri-          o Instituto Nacional de Tecnologia da Informa-
do por vezes, ainda que não haja uma divulgação            ção (ITI), Autoridade Certificadora Raiz da infra-
ampla nem um acompanhamento sistemático de                 estrutura de chaves públicas brasileira. O ITI é
suas decorrências para que se possa afirmar que            uma autarquia vinculada à Casa Civil da Presi-
elas são eficazes. No caso do Serviço de Comuni-           dência da República, responsável por estimular e
cações Digitais, por exemplo, os documentos de             articular projetos de pesquisa científica e de de-
Plano de Outorgas e de Metas de Universalização            senvolvimento tecnológico voltados à ampliação
foram colocados em consulta. Se isso demonstrou            da cidadania digital. Há ainda o Serviço Federal
uma disposição ao diálogo, reforçada pela marca-           de Processamento de Dados (Serpro), empresa pú-
ção de uma agenda de audiências públicas em seis           blica de prestação de serviços em tecnologia da
capitais de estados brasileiros, por outro, o prazo        informação, responsável por boa parte das
de 18 dias para a consulta dificultou manifesta-           interfaces para e-gov, que também busca interfe-
ções mais aprofundadas.                                    rir nas decisões do setor.
   Há, portanto, uma propensão a mecanismos
formais de diálogo, mas sem que haja participa-
ção efetiva da sociedade civil na definição e acom-                   ATUAIS
                                                           TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS
panhamento de políticas, com exceção do caso do
Comitê Gestor da Internet no Brasil.                          Está para ser votado no Congresso Nacional um
                                                           projeto de lei que modifica o papel das agências


                                                                                                       127
reguladoras e sua relação com o governo. A pro-
posta foi apresentada pelo próprio governo (e
agora tramita na forma de substitutivo), e dimi-
nui a independência das agências tornando-as mais
ligadas ao governo. A proposta obriga a Anatel a
assinar um contrato de gestão com o Ministério
das Comunicações e transfere a responsabilidade
das concessões do regulador para o Executivo.
    O substitutivo da Lei das Agências amplia a
sujeição da agência, até então independente, ao
Executivo e ainda dá direito ao Ministério de edi-
tar regulamentos. Além disso, tira da Anatel a res-
ponsabilidade de instruir processos sobre condu-
ta anticompetitiva no setor no Conselho Adminis-
trativo de Defesa da Concorrência (Cade).




128
Referências
Legislação e instrumentos regulatórios nacionais e
internacionais
Toda a legislação nacional consultada foi obtida em:
-     Presidência da República – http://www.planalto.gov.br
-     Senado Federal – http://www.senado.gov.br

Destacam-se, entre outros, os seguintes textos:
-   Constituição Federal da República Federativa do Brasil, 1988;
-    Lei 4.117, de 1962 (Código Brasileiro de Telecomunicações);
-    Decreto Lei 236, de 1967, que regulamenta o Código Brasileiro de Telecomunicações;
-    Lei 8.977, de 1995, que trata da cabodifusão no Brasil;
-    Lei 9.472, de 1997, Lei Geral das Telecomunicações;
-    Lei 9.612, de 1998, que regula a radiodifusão de sons de caráter comunitário no Brasil;
-    Decreto 4.829, de 2003, que dispõe sobre o Comitê Gestor da Internet no Brasil.

Os Projetos de Lei foram obtidos em:
-     Câmara dos Deputados – http://www.camara.gov.br
-     Senado Federal – http://www.senado.gov.br

Outros documentos e instrumentos regulatórios foram obtidos em páginas de
instituições do Estado na internet:
-     Agência Brasileira de Inteligência – http://www.abin.gov.br
-     Agência Nacional de Cinema – http://www.ancine.gov.br
-     Agência Nacional de Telecomunicações – http://www.anatel.gov.br
-     Comitê Executivo de Comércio Eletrônico – http://ce.mdic.gov.br
-     Comitê Gestor da Internet no Brasil – http://www.cg.org.br
-     Conselho de Comunicação Social – http://www.senado.gov.br/ccs
-     Conselho Nacional de Arquivos – http://www.arquivonacional.gov.br
-     Empresa Brasileira de Comunicação – http://www.radiobras.gov.br
-     Financiadora de Estudos e Projetos – http://www.finep.br
-     Fundação PROCON-SP – http://www.procon.sp.gov.br
-     Governo Eletrônico – Serviço de Atendimento ao Cidadão (Gesac) – http://www.gesac.gov.br
-     ICP Brasil – http://www.icpbrasil.gov.br
-     Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – http://www.ibge.gov.br
-     Instituto Nacional da Propriedade Industrial – http://www.inpi.gov.br
-     Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) – http://www.iti.br
-     Interlegis – Comunidade Virtual do Poder Legislativo – http://www.interlegis.gov.br
-     Ministério da Ciência e Tecnologia – http://www.mct.gov.br
-     Ministério da Cultura – http://www.cultura.gov.br
-     Ministério da Justiça – http://www.mj.gov.br
-     Ministério das Comunicações – http://www.mc.gov.br
-     Ministério Público Federal – http://www.mpf.gov.br
-     Ministério Público Federal – Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) –
      http://www.pgr.mpf.gov.br/pfdc
-     Portal Software Livre – http://www.softwarelivre.gov.br
-     Presidência da República – http://www.presidencia.gov.br
-     Receita Federal – Ministério da Fazenda – http://www.receita.fazenda.gov.br
-     SERPRO – http://www.serpro.gov.br


                                                                                               129
-     Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi)
      http://www.tesouro.fazenda.gov.br/siafi/
-     Tribunal de Contas da União – http://www.contaspublicas.gov.br


Fontes internacionais consultadas:
-      Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (CMSI) – http://www.cmsi.org.br
-      Organização das Nações Unidas – www.un.org
-      Organização Mundial do Comércio – http://www.wto.org
-      Organização Mundial de Propriedade Intelectual - www.wipo.org
-      UNESCO - Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Ciência, da Educação
       e da Cultura – www.unesco.org


Entidades empresariais e da sociedade civil
PIL AR A
PILAR
-       ABONG - Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais –
        http://www.abong.org.br
-       Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI) - http://www.andi.org.br
-       Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão - http://www.abert.org.br
-       Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec) -
        http://www.abepec.com.br
-       Associação Brasileira de Imprensa - http://www.abi.org.br
-       Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo – http://www.abraji.org.br
-       Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço) - http://www.abraconet.org.br
-       Associação Brasileira de Televisão Universitária (ABTU) - http://www.abtu.org.br
-       Associação Brasileira de TVs Comunitárias (Abccom) - http://www.abccom.com.br
-       Associação Nacional de Editores de Revistas - http://www.aner.org.br
-       Associação Nacional de Jornais - http://www.anj.org.br
-       Campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania - http://www.eticanatv.org.br
-       Centro de Mídia Independente (CMI) - http://www.midiaindependente.org
-       Congresso Brasileiro de Cinema (CBC) - http://www.congressocinema.com.br
-       Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) - http://www.conar.org.br
-       DireitoNet - http://www.direitonet.com.br
-       Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos) -
        http://www.enecos.org.br
-       Federação Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel) -
        http://www.fittel.org.br
-       Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) - http://www.fenaj.org.br
-       Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) – http://www.fndc.org.br
-       Freedom House - http://www.freedomhouse.org
-       Globopar, Holding do Grupo Globo de Comunicação – http://globopar.globo.com
-       Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) - http://www.inesc.org.br/pt/index.php
-       Informativo Eletrônico SETE PONTOS - http://www.comunicacao.pro.br/setepontos
-       Instituto Ethos http://www.ethos.org.br
-       Instituto Gutenberg http://www.igutenberg.org
-       Instituto da Sociedade Civil para o Controle da Administração Pública (Fisccal) -
        http://www.fisccal.org.br
-       Jurista online http://www.juristaonline.com.br
-       Jus Navigandi http://www.jus.com.br
-       Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) http://www.mndh.org.br
-       Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) – http://www.mst.org.br
-       Movimentos de Rádios Livres - http://www.radiolivre.org



130
-        Observatório da Imprensa - http://www.observatoriodaimprensa.com.br
-        Ordem dos Advogados do Brasil - http://www.oab.org.br
-        Parem as máquinas - http://www.paremasmaquinas.com.br
-        Rede Brasileira de Comunicação Cidadã (RBC) – http://www.rbc.org.br
-        Rede de informações para o Terceiro Setor (Rits) – http://www.rits.org.br
-        Rede Direitos Humanos e Cultura http://www.dhnet.org.br
-        Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa -
         http://www.liberdadedeimprensa.org.br/
-        Revista Iberoamericana de Arbitraje y Mediación - http://www.servilex.com.pe/arbitraje
-        SOS Imprensa - http://www.unb.br/fac/sos
-        TV Cultura de São Paulo – http://www.tvcultura.gov.br
-        TV Educativa do Rio Grande do Sul – http://www.tve.com.br

PIL AR B
PILAR
-       Associação Brasileira de Autores, Compositores, Intérpretes e Músicos –
        http://www.abrac.org.br
-       Associação Brasileira de Direitos Reprográficos – http://www.abdr.org.br
-       Associação Brasileira de Empresas de Software – http://www.abes.org.br
-       Associação Brasileira de Escritores – http://www.abe.org.br
-       Associação Brasileira de Música – http://www.abramus.org.br
-       Associação Brasileira dos Autores de Livros Educativos – http://www.abrale.org.br
-       Associação Brasileira dos Direitos de Autores Visuais – http://www.autvis.org.br
-       Associação Brasileira dos Produtores de Discos – http://www.abpd.org.br
-       Associação de Compositores e Intérpretes Musicais do Brasil – http://www.acimbra.org.br
-       Associação de Defesa da Propriedade Intelectual – http://www.adepi.org.br
-       Associação de Músicos, Arranjadores e Regentes – http://www.amar.org.br
-       Associação Defensora de Direitos Autorais Fonomecânicos - http://www.addaf.org.br
-       Associação dos Titulares de Direitos Autorais – http://www.atida.org.br
-       Associação Nacional de Autores, Compositores, Intérpretes e Músicos –
        http://www.anacim.org.br
-       Creative Commons – http://www.creativecommons.org
-       Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – http://www.ecad.org.br
-       Faculdade Getúlio Vargas – http://www.diretorio.fgv.br/cts
-       Instituto de Direito do Comércio Internacional e Desenvolvimento – http://www.idcid.org.br
-       Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual – http://www.inbrap.org.br
-       IP Justice – http://www.ipjustice.org.br
-       Projeto Inter-meios – http://www.projetointermeios.com.br
-       Projeto Software Livre Brasil – http://www.softwarelivre.org.br
-       Rede Brasileira pela Integração dos Povos – http://www.rebrip.org.br
-       Sociedade Administradora de Direitos de Execução Musical do Brasil - www.sadembra.org.br
-       Sociedade Brasileira de Administração e Proteção de Direitos Intelectuais –
        http://www.socimpro.org.br
-       Sociedade Brasileira de Autores, Compositores e Escritores de Música –
        http://www.sbacem.org.br
-       Sociedade Independente de Compositores e Autores Musicais – http://www.sicam.org.br
-       The Free Software Foundation - http://www.fsf.org
-       União Brasileira de Compositores – www.ubc.org.br

PIL AR
PILAR    C
-         Grupo Brasil AntiSPAM - http://www.brasilantispam.org/
-         Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) – http://www.idec.org.br
-         Instituto de Estudos e Projetos em Comunicação e Cultura (Indecs) –
          http://www.indecs.org.br
-         Movimento Brasileiro de Combate ao SPAM - http://www.antispam.org.br
-         Privacy International – http://www.privacyinternational.org


                                                                                                  131
-     The Coalition Against Unsolicited Commercial Email - http://www.cauce.org
-     The European Coalition Against Unsolicited Commercial Email -http://www.euro.cauce.org/

PIL AR D
PILAR
-       Cemina – http://www.cemina.org.br
-       Centro Indigenista Missionário (Cimi) – http://www.cimi.org.br
-       Comitê pela Democratização da Informática (CDI) – http://www.cdi.org.br
-       Federação Interestadual de Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel) – http:///
www.fittel.org.br
-       Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) – http://www.ibase.org.br
-       IBOPE Net Ratings – http://www.ibope.com.br
-       Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) – http://www.idec.org.br
-       Instituto Florestan Fernandes – http://www.iff.org.br
-       Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits) – http://www.rits.org.br
-       Rede Saci – http://www.redesaci.org.br
-       Sampa.org – http://www.sampa.org.br


Documentos, livros, notícias e artigos
FONTES GERAIS DE NOTÍCIAS
Agência Carta Maior - http://www.agenciacartamaior.com.br/
Globo On line – http://www.globoonline.com.br
Jornal Brasil de Fato http://www.brasildefato.com.br/
Portal dos Jornalistas http://www.jornalistas.com/
Portal Terra – http://www.terra.com.br
Primeira Leitura – http://www.primeiraleitura.com.br/
Folha online – http://www.folha.uol.com.br/
IDG Now – http://www.idgnow.com.br
Tela Viva/Pay TV – http://www.paytv.com.br

PIL AR A
PILAR
-       Relatório Anual sobre Liberdade de Imprensa no Brasil, organizado pela ANJ - período de
        agosto de 2002 a agosto de 2003
-       Relatório Repórteres Sem Fronteiras sobre liberdade de imprensa – ano 2004 - Third Annual
        Worldwide Press Freedom Index
-       Ranking 2004 de Liberdade de Imprensa publicado pela organização não governamental
        Freedom House
-       Relatório Caminhos da Transparência, realizado pela Organização Transparência Brasil
-       Relatório final do Seminário Internacional sobre Direito de Acesso a Informações Públicas -
        setembro de 2003
-       “Conselho Federal de Jornalismo – Ética e Liberdade” – Publicado pela Fenaj em setembro
        de 2004
-       POSSEBOM, Samuel Lamoglia. Globo e Abril diante de um novo paradigma comunicacional:
        a Internet. Dissertação para obtenção de título de mestrado no Programa de Pós-graduação
        da Universidade de Brasília, Brasília, 2002.
-       SALVATI, Ideli. A Tela é Nossa. Artigo publicado no jornal O Globo em 30 de agosto de 2004.
        Disponível em www.cultura.gov.br/projetoancinav/materia/materia.php?codigo=34.
-       Palestra do Ouvidor da Anatel no Conselho de Comunicação Social. Disponível em
        www.senado.gov.br/web/comissoes/ccs/palestra.asp
-       Teses à IX Plenária do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação sobre o
        processo de instalação do Conselho de Comunicação Social. Disponível em http://
        www.fndc.org.br/IX_plenaria/data/Lista_de_Teses.html.
-       Conferência Municipal de Comunicação de Porto Alegre. Disponível em
        www.portoalegre.rs.gov.br/conf_comunicacao/


132
default.asp?proj=460&secao=1327&m1=11519.

PIL AR B
PILAR
-       BASSO, Maristela. O Direito Internacional da Propriedade Intelectual. Porto Alegre: Livraria
        do Advogado Editora, 2000.
-       BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária,
        1989.
-       CARBONI, Guilherme C. Direito de autor na multimídia. São Paulo , Quartier Latin, 2003.
-       CHAVES, Antonio. Nova Lei Brasileira de Direito de Autor: estudo comparativo com o projeto
        que lhe deu origem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1975.
-       CHAVES, Antonio. Obra criada no âmbito de um contrato de trabalho - obra sob encomenda.
        in Revista dos Tribunais 491/11
-       DANTAS, Marcos. A Lógica do Capital Informação. Rio de Janeiro. 2002
-       GINDRE, Gustavo. Comunicação nas Sociedades em Crise. Rio e Janeiro. 2002
-       MANSO, Eduardo Vieira. Direito Autoral. São Paulo: José Bushasky, 1980
-       NETTO, José Carlos Costa. Direito Autoral no Brasil. São Paulo: FTD, 1998.
-       SOARES, Guido F.S. O tratamento da propriedade intelectual no sistema da organização
        mundial do comércio: uma descrição geral do acordo "TRIPS". in Revista de Direito Civil 74/
        98, Revista dos Tribunais.
-       SOUZA, Carlos Fernando Mathias de. Direito Autoral. Brasília:Brasília Jurídica,1998.

PIL AR
PILAR    C
-         Brasil é o quarto no ranking mundial do spam, IDG Now!, 1/7/2004
-         Cartilha Anti-SPAM (http://www.brasilantispam.org/main/cartilha.htm)
-         Censura na Internet. Mário Antônio Lobato de Paiva. (http://www.mundojuridico.adv.br). 01/
          7/2004
-         Certificação Digital: Entenda e use. ICP-Brasil.
-         Código de Ética AntiSPAM e Melhores Práticas de Uso de Mensagens Eletrônicas. Grupo
          Brasil Anti-SPAM. (http://www.brasilantispam.org/main/codigo.htm)
-         Comissão de Justiça aprova "Lei da Mordaça". Jornal do Senado, 5/12/2002
-         Em manchete, ‘Lei da Mordaça’ acende nova polêmica no Senado, Agência Carta Maior, 6/12/
          2002
-         Leis anti-SPAM ainda não surtiram efeito. IDG Now!, 21/5/2004
-         NIC BR Security Office. Cartilha de Segurança para Internet (http://www.nbso.nic.br/docs/
          cartilha)
-         O que diz a lei brasileira sobre o spam. Giordani Rodrigues. Portal Terra (www.terra.com.br)
          4/7/2004
-         Projetos de lei em andamento no Congresso Nacional, FERREIRA, Ana Amelia Menna Barreto
          de Castro, Site http://www.camara-e.net/
-         Sociedade civil definirá gestão e políticas para Internet no Brasil, Bia Barbosa, Agência Carta
          Maior, 13/04/2004
-         Tecnologia, democracia e liberdade em reciprocidade, Marcelo Thompson Mello Guimarães
          (procurador-chefe do ITI)

PIL AR D
PILAR
-     Plano Plurianual 2003-2007, Governo Federal
-     Boletim Em Questão, Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica do Governo Federal
-     Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD) 2003 – IBGE
-     Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2002-2003 - IBGE




                                                                                                    133
Entrevistas e colaboração
PIL AR
PILAR    A
-         Venício Artur de Lima - Professor aposentado da Universidade de Brasília
-         Murilo César Ramos - Professor da Universidade de Brasília
-         Edson Duarte – Deputado Federal - PV-BA
-         ONG Transparência Brasil

PIL AR
PILAR    B
-         Alessandra Nilo - Gestos
-         Guilherme Alberto de Almeida - IDCID
-         Gustavo Gindre - Indecs
-         Pablo de Camargo Cerdeira - IDCID
-         Pedro de Paranaguá Moniz - CTS/FGV-RJ

PIL AR C
PILAR
-      Pablo de Camargo Cerdeira – IDCID
-      Marcelo Thompson – ITI

PIL AR
PILAR    D
-         Sérgio Amadeu – presidente do ITI
-         Gustavo Gindre – INDECS
-         Paulo Lima – Rits
-         José Zunga – Fittel




134
Projeto de Governança Global
REALIZAÇÃO
Campanha CRIS – Communication Rights in the Information Society
COORDENAÇÃO INTERNACIONAL
Sean O’Siochrú


O direito à comunicação no Brasil
REALIZAÇÃO
Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
PESQUISADORES                                     REVISÃO TÉCNICA
Pilar A                                           Gustavo Gindre
Adriano de Ângelis
Jonas Valente                                     REVISÃO
Rogério Tomaz                                     Bia Barbosa
Pilar B                                           Oona Castro
Diogo Moysés
Pilar C                                           DIAGRAMAÇÃO
Marcio Kameoka                                    Marcio Kameoka
Pilar D
Aloísio Milani                                      APA
                                                  C APA
Rodrigo Savazoni                                  Rodrigo Murtinho
                                                  Ilustração: Vicente Mendonça
COORDENAÇÃO DA PESQUISA
João Brant
Marcio Kameoka


PAR TICIPANTES DO PROCES SO DE
PARTICIP
    TICIPANTES    PROCESSO
  ALIDAÇÃO
V ALID AÇÃO

Adaucto Rodrigues – Federação das Rádios          Elisa Monteiro – Executiva Nacional dos Estu-
Comunitárias do RJ (Farc)                         dantes de Comunicação Social (Enecos)
Adilson Cabral – Sete Pontos                      Eula Tavares Cabral – Sete Pontos
Adriano de Angelis – Intervozes                   Fausto Oliveira – Fase
Alessandra Nilo – Gestos PE/Abong-NE1/Fopecom     Graciela Selaimen – Rits
Aline Lucena – Sinos/Fopecom                      Ivan Moraes Filho – CCLF/MNDH-PE/Fopecom
Ana Lúcia de Castro – Imagens e Vozes da          James Görgen – Epcom
Esperança (IVE)                                   João Brant – Intervozes
Ana Toni – Fundação Ford                          Jonas Valente – Intervozes
Bia Barbosa – Intervozes                          José Arnaldo de Oliveira – Rede GTA (Grupo de
Carlos Moreira – Engenharia Social (3 setor)      Trabalho Amazônico)
Corinto Meffe – Ministério do Planejamento        Julia Hoffmann – Universidade de Amsterdam
Cunca Bocayuva – Fase                             Luciana Peregrino – Grupo Origem/Abong NE1/
Diogo Moysés – Intervozes                         Fopecom
Douglas Soares Vieira – Criar Brasil              Lucio Pereira Mello – Intervozes
Edgar Rebouças – Núcleo de Políticas e Estraté-   Magaly Pazello – DAWN/Socid
gias da Intercom                                  Marcia Correa e Castro – Bem TV


                                                                                            135
Marcia Evangelista de Souza – Folha de Xerém/      Paulo Lima – Rits
Associação dos Moradores de Xerém                  Priscila D. Carvalho – Cimi
Marcio Alexandre – Rits                            Regina dos Santos – Dombali e Fonacor
Marcus Aurelio – Unirr                             Rodrigo Murtinho – Comunicação UFF
Marcus Azaziel – consultor                         Rodrigo Savazoni – Intervozes
Maria das Graças de O. Nascimento – MIR/ISER/      Rosário de Pompéia – CCLF/Abong-NE1/Fopecom
IVE                                                Taís Ladeira – Amarc
Mauro Vianna – Jornal Inverta                      Tiago Quiroga - UFRJ
Michelle Prazeres – Ação Educativa – Observató-    Tori Holmes – Open Knowledge Network
rio da Educação                                    Venicio A. De Lima – UnB
Neuza Regina Carneiro – Imac                       Viviane Brochardt – Articulação do Semi-árido
Nilza Iraci – Geledés                              Brasileiro (ASA)
Orlando Tavares - PPGCOM-UFF                       Wallace Hermann – Ponto Com Saúde
Pablo Camargo Cerdeira – IDCID                     William Dias Braga – ECO/UFRJ e ULEPICC Brasil



                                 realização                VALID
                                                            ALIDAÇÃO:
Agradecimentos pelo apoio para a r ealização da OFICINA DE VALID AÇÃO:

Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits)
Associação Brasileira de Imprensa (ABI)
Fundação Ford




 Copyleft. Permitida a reprodução sem fins comerciais, desde que citada a fonte.
                              Brasil. Junho de 2005
               Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social

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E-Book Direito à Comunicação no Brasil: Base Constitucional e Legal, Implementação, o Papel dos Diferentes Atores e Tendências Atuais e Futuras

  • 1. DIREITO À COMUNICAÇÃO NO BRASIL •Base constitucional e legal •Implementação •O papel dos diferentes atores •Tendências atuais e futuras Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social Projeto de Governança Global Campanha CRIS - Communication Rights in the Information Society Apoio: Fundação Ford
  • 3. Relatório da Pesquisa Direito à Comunicação no Brasil Base constitucional e legal, implementação, o papel dos diferentes atores e tendências atuais e futuras Terceira Versão Versão Junho de 2005 Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social Projeto de Governança Global Campanha CRIS - Communication Rights in the Information Society Apoio - Fundação Ford 1
  • 4. 2
  • 5. Índice Introdução 5 Quadro genérico de referência 9 Pilar A: A esfera pública 19 A 1 - Liberdade de expressão 19 A 2 - Liberdade de imprensa 23 A 3 - Acesso a informações públicas e governamentais 28 A 4 - Acesso a informações empresariais 34 A 5 - Diversidade, pluralidade e acessibilidade 36 A 6 - Participação efetiva da sociedade civil 59 Pilar B: Uso do conhecimento e domínio público 67 B 1 - Por um regime balanceado do conhecimento 68 B 2 - Implementação deste regime 76 B 3 - Conhecimento financiado por recursos públicos para o domínio público 85 B 4 - Participação efetiva da sociedade civil 87 Pilar C: Liberdades civis na sociedade da informação 89 C 1 - Privacidade de informação e proteção de dados 89 C 2 - Direito à privacidade na comunicação 95 C 3 - Ausência de censura eletrônica 99 C 4 - Liberdade de associação 101 C 5 - Participação efetiva da sociedade civil 102 Pilar D: Acesso eqüitativo a TICs 105 D 1 - Acesso de todo o povo e suas comunidades a TICs 105 D 2 - Disponibilidade de conteúdo para minorias 122 D 3 - Disseminação de competências e habilidades 124 D 4 - Participação efetiva da sociedade civil 126 Referências 129 Créditos 135 3
  • 6. 4
  • 7. Introdução Este é o relatório de pesquisa produzido como rentemente dos anos 70, hoje busca-se tratar de resultado do Projeto de Governança Global da uma série de direitos que devem ser considerados Campanha CRIS ( Communication Rights in the em conjunto, entendidos a partir de sua Information Society). Esse estudo pretende revelar complementariedade e indivisibilidade. Na práti- a situação atual no Brasil dos diversos elementos ca, o que o quadro de referência tenta responder que formam, em conjunto, o direito à comunica- é de que direitos estamos falando, quais são seus ção. São abordados temas como liberdade de atributos e que indicadores podem medir a sua expressão, pluralidade dos meios, propriedade efetivação. intelectual, respeito à diversidade cultural, Tendo esse quadro de referência ( generic privacidade nas comunicações, acesso às framework) como baliza, partimos para uma apli- Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) cação dos indicadores nele definidos à realidade e participação da sociedade civil nas decisões brasileira. A orientação geral da pesquisa nos cin- sobre essas questões. co países em que ela está sendo feita (Brasil, Co- O objetivo de sua realização é, antes de tudo, lômbia, Filipinas, Quênia e Itália – esta última materializar uma referência tão importante quan- avaliando a União Européia) foi trabalhar sempre to ampla: o direito à comunicação. Entender suas com quatro parâmetros: a base legal, a nuances, possibilidades, variações e interferênci- implantação dessa legislação, o papel dos atores as. Além disso, esse estudo experimenta um envolvidos e as tendências para o futuro. Quadro de Referência Genérico, concebido em con- Essa abordagem evidencia que o que se bus- junto por pesquisadores de diversos países (Bra- cou nessa pesquisa foram essencialmente as refe- sil, Colômbia, Quênia, Filipinas, Itália, Canadá, Ir- rências de políticas públicas para os temas, mais landa, Estados Unidos, Reino Unido, entre outros) do que tentar entender tudo o que se passa nas a fim de que possa ser usado em estudos compa- esferas privada e não governamental. Tanto em- rados, tanto entre países, como ao longo do tem- presas quanto entidades da sociedade civil têm po. papel fundamental no atual quadro político, mas Esse quadro de referência pretende identificar, partiu-se da premissa de que processos com olhos de um novo século, qual a amplitude e regulatórios dependem de políticas públicas e, quais os limites do campo da comunicação. Desde portanto, esse deveria ser o objeto da pesquisa. Jean D’Arcy, no final dos anos 60, e da Nova Ordem A metodologia utilizada partiu do acesso a fon- Mundial para Informação e Comunicação (NOMIC), tes primárias e secundárias, tais como legislação, nos anos 70, a questão do direito à comunicação documentos de governo, relatórios de instituições, é uma referência fundamental nos estudos da área. entrevistas com especialistas, levantamentos de Contudo, com a convergência tecnológica e a agências do governo etc. Mais do que precisão efetivação da globalização econômica, é preciso científica, buscamos aqui um levantamento fiel da observar quais são suas características, como ele realidade das políticas públicas e de seu estágio muda e o que o define. de implementação. Sem dúvida, há dificuldades Em inglês, a opção foi substituir o termo right inerentes ao processo. A checagem das to communicate por communication rights, informações, por exemplo, é trabalhosa e por vezes ampliando o conceito. Embora em português haja impossível de ser realizada com absoluto rigor. um debate sobre qual a melhor expressão a se Sempre que possível, buscamos índices e indi- utilizar, continua-se usando o mesmo termo, di- cadores de fontes sabidamente confiáveis, que nos reito à comunicação, que se tomado literalmente pudessem servir de referência para análises mais está “localizado” entre as duas formulações ingle- aprofundadas. Inerente a um trabalho desse tipo sas. Independentemente da solução adotada, mais é a sensação permanente de que poderíamos ter do que uma questão semântica, está expressa nes- ido além. A cada mês, surgiam novas informações, sa mudança uma alteração na abordagem. Dife- novos dados, mudança nas políticas públicas. 5
  • 8. Temas como inclusão digital, acesso a informações indígenas têm garantido seu conhecimento públicas e política do audiovisual, por exemplo, tradicional. A escassez de dados desse tipo também estão em constante modificação, o que exige a tornou frágil a abordagem desse ponto. Aqui é atenção permanente dos interessados no debate. importante ressaltar que a versão do quadro de Assim, mais do que um relato definitivo, este referência utilizada na pesquisa foi a preliminar, e trabalho é um retrato instantâneo do quadro do que versões mais recentes já consideram essa direito à comunicação no Brasil. Ao mesmo tem- questão com mais profundidade. O Intervozes po que pode servir como referência importante, procurará disponibilizar em sua página na Internet uma de suas características é ter que ser as versões mais recentes do quadro de referência. constantemente atualizado. Buscamos encarar isso Por último, foi apontada a necessidade de ca- como um fato natural do processo, e não como pítulos analíticos e conceituais, que pudessem limitante. explicitar os termos com os quais trabalhamos, a visão de sociedade da informação adotada e os VALIDAÇÃO referenciais teóricos. Aproveitamos essa observa- Essa versão final da pesquisa já expressa mais ção para esclarecer o caráter da pesquisa. Enten- do que o trabalho realizado pelo Intervozes. Após demos que o quadro de referência busca realizada uma primeira versão, ela passou por um estabelecer indicadores a partir de definições processo de validação, incluindo uma oficina em objetivas das questões envolvidas e que em poucos que especialistas das diversas áreas puderam casos suscita dúvidas quanto a qual parâmetro opinar sobre o texto, sugerir fontes e avaliar a ideal está implícito. Assim, os próprios indicadores, abordagem em cada pilar. A essas pessoas, por exemplo, respondem à definição dos conceitos agradecemos muitíssimo a contribuição e presentes nos atributos. De qualquer forma, por registramos a importância desse olhar externo ser realizada concomitantemente por cinco equipes como balizador de qualidade da pesquisa. em diferentes partes do mundo, a pesquisa Algumas observações desse processo de vali- responde a conceitos pactuados internacio- dação merecem destaque, especialmente aquelas nalmente, que são explicitados no relatório que tivemos dificuldade de traduzir na pesquisa. internacional do Projeto de Governança Global. A primeira delas é o desafio de expressar, em um Portanto, não pode ser vista isolada de seu texto como esse, as realidades dos diversos Brasis. contexto e deve ser entendida como parte de um Grande parcela dos debates feitos ainda parte de projeto internacional mais amplo. uma visão urbana, especialmente dos grandes centros. No entanto, buscamos observar sempre OBSERVAÇÕES SOBRE O PROCESSO OBSERV PROCESSO que possível como as políticas públicas se É pertinente observarmos aqui algumas opções materializam nas diferentes regiões do país, e feitas no processo de pesquisa. pudemos notar uma recente preocupação em equalizar oportunidades. Contudo, essa preocu- Politização pação é ainda marginal, o que fica evidente ao se Percebemos, de imediato, a necessidade de analisar, por exemplo, uma lei de rádios comuni- definir o quanto se deveria ou não “politizar” as tárias que limita a 1 km de raio o alcance das respostas a esses indicadores. Em quase todos eles, emissoras. Se isso já se conforma como limitação era possível escolher um tom mais neutro ou um no meio urbano, o que se dirá no meio rural? O tom mais crítico. Como parte dos indicadores não que é 1 km na região amazônica? Qual realidade definia com precisão a resposta buscada (o o legislador teve como referência ao criar a lei? parâmetro “ideal”), em alguns casos fizemos a Ficou claro que esse é um debate a ser opção a partir de convicções que expressamos no aprofundado. próprio relatório de pesquisa. Na oficina de Outra questão importante que surgiu na ofici- validação, a indicação dos participantes foi a de na de validação foi a discussão de diversidade cul- que deveríamos optar por um tom crítico o tural, bem como os desafios de abordar as questões suficiente para evidenciar o quadro real de cada étnico-raciais e de gênero. O próprio quadro de uma das questões tratadas. Concordamos que não referência trata desses pontos em alguns quesitos, valeria optar por uma suposta neutralidade se isso mas não confere a eles um tratamento especial. significasse uma resposta que não deixasse claro No Brasil, é fundamental conseguirmos analisar, o real estado daquela questão no Brasil. Acabamos por exemplo, a presença do negro e da negra na assumindo que, embora o relatório tenha o papel realização da comunicação, como as mulheres são de ser o mais objetivo possível, ele parte de uma atingidas pela exclusão digital ou como os orientação política de defesa do direito à comuni- 6
  • 9. cação. Portanto, todas as violações a esse direito R epetição deveriam ser tratadas como tal. Como há assuntos que se cruzam entre os in- dicadores, muitas vezes as respostas tendiam a se Amplitude e natureza repetir. A escolha sobre como lidar com essa situ- A amplitude que cada indicador alcança é muito ação dependia do tipo de leitura que se espera ter diferente. Há alguns que pediam respostas curtas, do relatório. Se a idéia é que a abordagem seja de específicas sobre algum aspecto do direito à leituras fragmentadas por indicadores, fazia total comunicação. Há outros mais genéricos, em que sentido repetir as informações em cada indicador. eram necessárias respostas longas e que cobriam Se a proposta é que se dê uma leitura contínua do uma grande gama de assuntos, como no caso do texto todo, então não fazia sentido a repetição de A5. A natureza dos indicadores também era todas as informações. No nosso caso, fizemos a diferente. Alguns se referiam à existência ou não opção de manter a repetição, por preferir pecar de legislação naquele sentido, outros, à sua pelo excesso do que pela falta. No entanto, ao in- implementação ou a dados quantitativos. Em vés de repetir todas as informações de maneira certos momentos era impossível tratá-los igual, escolhemos abordagens diferentes do mes- separadamente, por serem todos baseados na mo tema para cada indicador. Um exemplo é o mesma base legal e terem as mesmas característi- Comitê Gestor da Internet no Brasil, citado em três cas quanto à implementação. Isso fez com que em dos quatro pilares. Em um dos pilares, o destaque alguns momentos, como no Pilar B, tenhamos são aspectos como a democracia na escolha de optado por fazer uma abordagem por atributo, seus membros; em outros pilares, o principal é a unindo indicadores. posição adotada pelo Comitê em relação a determinada questão. Aprofundamento Esse quesito nos requereu uma opção desde o Peso primeiro momento. Havia a possibilidade de ado- Ainda que todas as questões expressas no qua- tarmos uma visão mais superficial da pesquisa, dro de referência sejam extremamente importan- simplificando as respostas e obtendo um resulta- tes, elas podem (ou até devem) ter pesos diferen- do mais enxuto. No entanto, consideramos que tes. No momento em que se reúnem em um só dessa forma ficaria pouco clara a realidade de cada atributo (A5) quase todas as grandes questões de um dos atributos e indicadores tratados. Preferi- mídia, por exemplo, fica claro o peso maior de mos, então, a opção de uma abordagem mais pro- alguns atributos e indicadores em relação a ou- funda na grande maioria dos temas tratados. Houve tros. alguns sobre os quais foi muito difícil obter infor- mações, em virtude da ausência de fontes e até POR FIM mesmo da não definição de políticas públicas. Em Aproveitamos para agradecer a revisão técnica todos os outros casos, foi possível uma aborda- feita pelo pesquisador Gustavo Gindre, que mesmo gem completa. contando com pouco tempo para a tarefa contribuiu com obser vações absolutamente Rigor da divisão relevantes. Ressaltamos, no entanto, que nenhuma A proposta era tratarmos, para cada indicador, das falhas, erros ou ausências nessa versão final a base legal, a implentação, os atores envolvidos deve ser creditada a ele ou aos colaboradores, e as tendências futuras. No entanto, em alguns sendo de única responsabilidade da equipe dos casos, essa divisão não tinha como ser preci- realizadora. sa. Por vezes, por exemplo, a base legal e os ato- Essa pesquisa não se encerra com sua publica- res envolvidos eram os mesmos para todos os ção; ao contrário, o objetivo é que ela engendre indicadores. Foi difícil, portanto, escolher um ações práticas a partir de seus resultados. Espera- padrão único, e acabamos preferindo definir um mos que esse documento possa servir como refe- padrão específico para cada pilar. rência, ajudando na tarefa de compreender a situ- ação do direito à comunicação no Brasil e na ár- dua luta pela sua efetivação plena para toda a população. 7
  • 10. 8
  • 11. Quadro genérico de referência do direito à comunicação: Atributos e indicadores Pilar A: A criação de espaços para ambientes democráticos: a esfera pública Atributos do Direito à Indicadores de um ambiente propício Comunicação para o direito à comunicação A1: Liberdade de expressão, inclusi- A1.1 Provisão constitucional e leis que garantam a liberda- ve uma atmosfera de abertura e o de de expressão. direito a criticar aqueles no poder. A1.2 A ausência de ações governamentais ou de empresas que restrinjam a liberdade de expressão e a garantia ativa do cumprimento das leis de liberdade de expressão. A1.3 Medidas ativas para a promoção de uma atmosfera de abertura e discussão ampla. A2: Liberdade de imprensa e mídia, A2.1 Provisão constitucional e/ou leis que garantam a inclusive para jornalistas realizarem liberdade da imprensa e de todos os tipos de mídia, além de seu trabalho e responsabilidades independência editorial, com o mínimo de restrições, inclu- relacionadas. indo a proibição de monopólios em qualquer mídia. A2.2 Medidas para prevenir a violação de direitos humanos dos jornalistas na execução de seu trabalho, especialmente em áreas de conflito. A2.3 Medidas para apoiar a liberdade editorial de jornalis- tas, inclusive segurança no emprego, sindicalização, direitos morais de autor e resistência à coerção moral e outras formas de coerção por parte de empregadores ou outrem. A2.4 Instrumentos independentes e medidas que assegu- rem o direito de resposta, que protejam o público contra processos difamatórios, protejam a privacidade e evitem o incitamento à violência, e outras provisões contidas em acordos internacionais. A2.5 Medidas para prevenir censura por parte de entidades comerciais de material relevante para a esfera pública, inclusive de conteúdo eletrônico e para a internet – por parte, por exemplo, de provedores de acesso à internet, mecanismos de busca e provedores de banda (infra-estrutura de internet, empresa de telefonia, internet a cabo ou via satélite). A3: Acesso e pronta disponibilida- A3.1 Legislação sobre liberdade da informação, com a de de informações públicas e gover- mínima retenção por parte de órgãos públicos e governa- namentais, de modo abrangente, mentais, e com acesso máximo por parte do mais amplo útil e rápido, especialmente no que público. concerne ao desenvolvimento e A3.2: A implementação de tais leis que tornem tal informa- implementação de políticas e ques- ção disponível de maneira acessível economicamente e em tões de interesse público, como tempo correto para todos. saúde, segurança etc. 9
  • 12. A3.3 Esforços ativos por parte dos setores público e estatal para expandir a abertura e a transparência, inclusive através de meios como: - estruturas ou escritórios para reunir e divulgar informações de forma apropriada; - a publicação de objetivos e planejamentos de políticas e serviços públicos; - proteção para funcionários públicos que revelem informação de e em prol do interesse público; - a transmissão das deliberações dos representantes eleitos e órgãos públicos; - transparência do processo decisório em questões de interesse público, como decisões de gabinete. A3.4 Abertura e transparência governamental em negocia- ções e instituições internacionais relacionadas à mídia e à esfera pública. A4: Acesso a informações empre- A4.1: Legislação/regulamentação sobre quebra de sigilo sariais, de modo abrangente e corporativo, além das informações financeiras básicas, de rápido, quando relevantes para o modo a incluir informação disponível das corporações que interesse público. terão influência sobre políticas públicas e o interesse públi- co. A5: Diversidade, pluralidade e A5.1 Legislação e medidas efetivas para impedir a concen- acesso a mídias e conteúdo, assegu- tração da propriedade na mídia ou controles por parte de rando um amplo espectro de visões qualquer interesse setorial, indivíduo ou entidade, incluin- por parte de todos os setores da do: sociedade, inclusive minorias e - concentração da propriedade de um tipo de mídia grupos marginalizados, e a justa em particular; representação de todos os grupos, - propriedade cruzada entre mídias; inclusive mulheres, minorias e - propriedade cruzada da produção, disseminação de grupos étnicos. conteúdo e componentes de infra-estrutura dos meios de comunicação; - propriedade excessiva por parte de estrangeiros e empresas não-ligadas ao setor de mídia. A5.2 Um quadro legal que ampare a emergência de uma pluralidade de tipos de canais e empresas em nível nacional e, quando apropriado, em níveis regionais (internacional) e local: canais e empresas públicas, comerciais e comunitárias/ independentes, inclusive a alocação de modo transparente e igualitário do espectro de radiofreqüências e outros bens públicos. A5.3 Medidas efetivas para assegurar que canais e empresas públicas tenham disponíveis financiamento e recursos adequados, especialmente em relação ao noticiário e ao trato de assuntos atuais, de forma completamente indepen- dente dos governos e não sujeita a interferências arbitrárias, e livre de regulamentações desnecessariamente pesadas. A5.4 Medidas efetivas que assegurem que empresas e canais comunitários e sem fins lucrativos tenham recursos adequados, inclusive bens públicos como o espectro de freqüências; estejam livres de interferências arbitrárias; sejam transparentes, democráticos e participativos; e apóiem e tenham participação de comunidades excluídas e marginalizadas. 10
  • 13. A5.5 Obrigações regulatórias aplicáveis sobre empresas e canais comerciais, inclusive difusores, quando apropriado, para assegurar o cumprimento dos requisitos da prestação de serviço público. A5.6 Medidas efetivas para assegurar acessibilidade, até mesmo econômica, às mídias relevantes (inclusive jornais e televisão) e conteúdos, especialmente por parte de grupos culturais e lingüísticos marginalizados. Por exemplo, regi- mes de impostos diferenciados, difusão livre em TV aberta, obrigar os operadores de rede a aceitar os canais (must- carry) etc. A5.7 Medidas efetivas, de acordo com a necessidade, para enfrentar a representação inadequada ou torpe de mulheres, grupos étnicos, grupos mais pobres e marginalizados por parte da mídia. A5.8 Apoio a medidas nas instituições e fóruns multilaterais que assegurem a proteção e o apoio a mídias nacionais, inclusive o direito a discriminar em favor de empresas e canais locais, e a regulação de conteúdo estrangeiro. A5.9 Medidas efetivas para impedir que a propaganda exerça uma influência negativa sobre a esfera pública, por exemplo com a identificação ostensiva, limitação do volume de propaganda e de conteúdo político ou religioso. Os gastos públicos em propaganda também podem ser usados para apoiar a esfera pública. A6: Participação efetiva por parte A6.1 Consultas públicas abertas e extensivas e de todos os elementos da sociedade participação no desenvolvimento de políticas para a mídia, civil na preparação, implementação inclusive em instituições e fóruns inter-governamentais. e avaliação de estruturas e políticas A6.2 Meios efetivos e dinâmicos que façam com que preo- de governança da mídia. cupações e reclamações públicas sejam ouvidas e atendidas, de acordo com as políticas de mídia. A6.3 Mecanismos permanentes para participação indepen- dente e direta do público na revisão e implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando apro- priado – por exemplo, através de conselhos públicos e conferências públicas periódicas, que contem com ampla participação da sociedade civil. A6.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo. 11
  • 14. Pilar B: Retomando o uso do conhecimento e do domínio público Atributos do direito à Indicadores de um ambiente propício comunicação para o direito à comunicação B1: Um regime equilibrado de B1.1 Uma estratégia nacional e uma orientação política com partilha do conhecimento que relação a criação, disseminação e uso do conhecimento assegure que o conhecimento (especialmente copyright, incluindo materiais e softwares gerado ou disseminado por empre- educacionais publicados) cujos objetivos explícitos sejam sas, canais e setores de enriquecer o domínio público, satisfazer as várias necessida- comunicação esteja disponível para des de conhecimento e encorajar a criatividade de todos os todos de modo igualitário e setores da sociedade. Isto pode ser expresso em termos de acessível financeiramente, e que posições e políticas sobre Direitos de Propriedade Intelectual encoraje a criatividade da forma (IPR) em uma ‘sociedade da informação’, em mídia e outras mais ampla possível por toda a áreas, tanto em organizações nacionais como internacionais, sociedade. acordos e tratados. B2: Medidas práticas para B.2.1 Políticas públicas e ações para encorajar e possibilitar implementar este regime. a mais ampla e difusa geração e comunicação do conheci- mento, que podem incluir: - modos de celebrar bons trabalhos por parte de profissionais e do público; - incentivos públicos para pesquisa e criação local/ nacional do conhecimento em áreas de reconhecida necessi- dade; - instrumentos públicos para facilitar o acesso ao conhecimento, inclusive uma política de disseminação de conteúdo de interesse público; - apoio público para software livre e de código aberto – por exemplo através de uma política pública de provisão – e para o desenvolvimento de especialistas nacionais; - currículos escolares que encorajem métodos críticos e questionadores de aprendizado; - apoio prático ao desenvolvimento de abordagens voltadas ao desenvolvimento e amistosas à comunidade para a partilha do conhecimento, como copyleft, General Public License (GPL) etc. B2.2 Uma interpretação ativa e a implementação, por parte de órgãos públicos e estatais, das leis e acordos nacionais e internacionais sobre copyright e patentes relevantes, favorecendo uma partilha equilibrada do conheci- mento, ou seja: - apoio para o ‘uso justo’ de material sobre copyright, freqüentemente barrado por termos de licenciamento não negociáveis para material digital, como publicações especializadas; - reconhecimento e proteção dos ‘direitos morais’ dos autores; - restrições sobre o gerenciamento de direitos digitais, encriptação e mecanismos anti-burladores que inibam o uso justo de informação eletrônica; - esforços para formatar a propriedade intelectual de acordo com condições nacionais, o que freqüentemente irá contra tendências nos acordos internacionais; 12
  • 15. - esforços para formatar a propriedade intelectual em produtos digitais que promovam novos modelos de negóci- os, baseados na partilha do conhecimento, e que coíbam medidas (como o patenteamento de software) que mante- nham monopólios ou oligopólios e inibam a inovação; - esforços para assegurar que expressões de folclore não sejam registradas e exploradas por terceiras partes (incluindo o problema do ‘autor identificável’), ou seja, pela incorporação da proteção folclórica na legislação nacional (casos de Bolívia, 1968, e Quênia, 1975). B3: Todos os trabalhos financia- B3.1 Políticas públicas e medidas práticas para assegurar dos e produzidos de forma pública que todo o conhecimento apoiado por fundos públicos se se tornam parte do domínio públi- torne imediatamente parte do domínio público. co. B3.2 (Ver A3.3) O volume de informação mantida por órgãos públicos deve ser colocado sob domínio público. B3.3 Canais e empresas públicas devem colocar seus arquivos sob domínio público. B4: Participação efetiva da socie- B4.1 Um processo participativo de desenvolvimento de dade civil no processo de políticas, que inclua participação significativa da sociedade governança, inclusive em sua formu- civil e os recursos necessários para que todos os parceiros lação, preparação, regulação, dêem contribuições efetivas. implementação e revisão, além de B4.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações apoio para participação em nível públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas internacional. e atendidas. B4.3 Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais. B4.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo. 13
  • 16. Pilar C: Liberdades civis e direitos políticos na Sociedade da Informação Atributos do direito à Indicadores de um ambiente propício comunicação para o direito à comunicação C1: Privacidade de informação e C1.1 Leis que assegurem que dados pessoais são mantidos proteção de dados, atendendo ao pelo mínimo período necessário, bem como utilizados direito de saber, acessar, corrigir e apenas para os propósitos autorizados expressamente pela controlar o uso de toda informação pessoa a qual se referem. Isto inclui dados pessoais pessoal mantida em forma digital fornecidos a serviços (saúde, finanças, compras etc.), por outrem. atividades de segurança pública ou privada, material de vigilância em vídeo, informações inclusas em fichas de identificação (em eventos ou pedidos de emprego) e dados de funcionários mantidos por empregadores. C1.2 Garantia do cumprimento de tais leis de modo acessí- vel financeiramente, transparente e pró-ativo, e com o direito de revisão quando direitos tiverem sido violados. C1.3 Existência de uma cultura ampla e difundida de auto- regulação e códigos de conduta em termos de privacidade e proteção de dados, entre atores da sociedade civil, do governo e do setor privado. C2: O direito à privacidade na C2.1 Leis e regulações que assegurem o direito à privacida- comunicação é um direito humano e de na comunicação, seja através da internet, telefonia ou é essencial para o desenvolvimento outros meios eletrônicos, com exceções apenas em circuns- humano auto-determinado, em tâncias extremas e claramente definidas, e que valham em atividades tanto cívicas, políticas, ambientes privados, públicos e comerciais. sociais e econômicas como C2.2 Garantia do cumprimento de tais leis de modo trans- culturais. parente, não-partidário e pró-ativo, inclusive contra violações praticadas pelos governos, e com o direito de revisão quando direitos tiverem sido violados. C2.3 Leis para controlar SPAM (mensagens comerciais de correio eletrônico não solicitadas) e impedi-lo de inibir a capacidade geral de interação na internet. C3: Ausência de censura C3.1 Leis de proteção contra censura na internet ou eletrônica. O direito de transmitir outros meios de publicação eletrônica, seja através de filtros, informação eletrônica sem censura sites prescritos, sanções contra provedores de acesso ou ou controle por parte de agentes do conteúdo e a responsabilização dos provedores por Estado, judiciais, comerciais, conteúdo hospedado. empregadores ou outrem. C3.2 Leis ou regulações, inclusive auto-regulação por parte da indústria, que inclua obrigações para que operado- res comerciais de publicações e difusão eletrônicas (provedo- res de acesso, mecanismos de busca, provedores de banda [infra-estrutura de internet, empresa de telefonia, internet a cabo ou via satélite]) ajam como operadores de rede (common carriers) para material judicialmente legal. C3.3 Garantia do cumprimento de tais leis de modo acessí- vel financeiramente, transparente e pró-ativo, e com o direito de revisão quando direitos tiverem sido violados. 14
  • 17. C4. Liberdade de associação no C4.1 Leis que salvaguardem contra vigilância em vídeo meio eletrônico, para participar de excessiva e seu possível efeito intimidante sobre a liberdade protestos públicos ou debates de associação. online. C5. Participação efetiva da socie- C5.1 Um processo participativo de desenvolvimento de dade civil no processo de políticas, que inclua participação significativa da sociedade governança, incluindo sua formula- civil e os recursos necessários para que todos os parceiros ção, projeto, regulação, dêem contribuições efetivas. implementação e avaliação. C5.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas e atendidas. C5.3 Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais. C5.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo. (ver C1.3 acima) 15
  • 18. Pilar D: Assegurando acesso eqüitativo e a preços razoáveis a TICs Atributos do direito à Indicadores de um ambiente propício comunicação para o direito à comunicação D1: Acesso a TICs, inclusive à D1.1 Um quadro legal e regulatório que favoreça fortemen- telefonia, à internet e a outros te a extensão de modo universal dos serviços e do acesso a serviços, de modo econômico, TICs como a prioridade para este setor. igualitário e apropriado para todo o D1.2 Medidas políticas, convencionais e inovadoras, que povo e suas comunidades. vão além das abordagens mercadológicas e corporativas, para incluir, por exemplo, redes comunitárias, subsídios cruzados efetivos por parte de usuários mais ricos com fins de universalização do serviço, e assim por diante. Serão então considerados: - infra-estrutura fixa e telefonia; - telefonia móvel, inclusive em termos de custos; - telecentros comunitários; - licenciamento de provedores de acesso, portais de internet e medidas de apoio à internet; - links de satélite Vsat e de dados. D1.3 Apoio ao desenvolvimento de indústrias locais ao longo dos setores relacionados a TICs, tais como incentivos específicos, períodos de transição para a criação de compa- nhias locais etc. D1.4 Estatísticas e indicadores que demonstrem que o efeito cumulativo das políticas implementadas está realmen- te reduzindo a exclusão em termos de acesso, disponibilida- de, acessibilidade econômica, acessibilidade e uso, e na promoção do bem-estar público. D2: Disponibilidade de D2.1 Ações de apoio para produção de conteúdo por e para conteúdo relevante para todas as todas as comunidades lingüísticas. comunidades lingüísticas e grupos D2.2 Apoio ao desenvolvimento de softwares lingüísticos marginalizados. técnicos e interfaces de hardware. D3: Competências e habilidades D3.1 Apoio para desenvolvimentos de competências e que permitam ao povo e a suas habilidades, como treinamentos, programas de intercâmbio, comunidades fazerem uso das TICs módulos curriculares formais etc., amplamente disponíveis para atingir seus objetivos individu- em estabelecimentos de ensino comuns, como escolas, ais e coletivos. bibliotecas, centros comunitários etc. D4: Participação efetiva da socie- D4.1 Um processo participativo e multilateral de dade civil no processo de desenvolvimento de estratégias, que inclua participação governança, incluindo sua formula- significativa da sociedade civil e os recursos necessários para ção, projeto, regulação, que todos os participantes dêem contribuições efetivas. Isto implementação e avaliação. inclui infra-estrutura (seja fixa, sem-fio ou outros) e serviços (como telefonia, celulares, transmissão de dados e internet); e a natureza da compreensão e planejamento estratégicos por parte de todos. D4.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas e atendidas. 16
  • 19. D4.3 Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais. D4.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo. 17
  • 20. 18
  • 21. Pilar A A criação de espaços para ambientes democráticos: a esfera pública A1 – Liberdade de expressão, inclusive uma atmosfera de abertura e o direito a criticar aqueles no poder. A1.1 - Provisão constitucional e leis que garantam a liberdade de expressão. A1.2 - A ausência de ações governamentais ou de empresas que restrinjam a liberdade de expressão e a garantia ativa do cumprimento das leis de liberdade de expressão. A1.3 - Medidas ativas para a promoção de uma atmosfera de abertura e discussão ampla. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL Carta Democrática Interamericana e a Declaração A base legal que sustenta o princípio da liber- de Princípios sobre Liberdade de Expressão. dade de expressão é bastante ampla e tem refe- Também existem leis no Brasil que, em dife- rências nacionais e internacionais. rentes níveis, interferem na liberdade de expres- A Constituição Federal Brasileira de 1988, no são, mas que funcionam como proteção aos direi- capítulo DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS tos individuais fundamentais: as chamadas leis de E COLETIVOS, determina no inciso IV do artigo 5º calúnia, injúria e difamação. No direito penal que “é livre a manifestação do pensamento, sendo brasileiro, estes dispositivos, também chamados vedado o anonimato”. No mesmo artigo, o inciso de crimes contra a honra, estão presentes ao IX estabelece que “é livre a expressão da atividade mesmo tempo no Código Penal e na Lei de intelectual, artística, científica e de comunicação, in- Imprensa. Alguns juristas afirmam que bastaria que dependentemente de censura ou licença”. Em outro estivessem no Código Penal para que a sua capítulo, DA COMUNICAÇÃO SOCIAL, o artigo 220 aplicação fosse feita sem com isso gerar nenhum diz que “a manifestação do pensamento, a criação, a mecanismo restritivo à expressão livre do expressão e a informação, sob qualquer forma, processo pensamento. ou veículo não sofrerão qualquer restrição”. E o seu São situações em que a liberdade de expressão parágrafo 1º afirma que “nenhuma lei conterá dis- fica sujeita a outras aplicações legais: positivo que possa constituir embaraço à plena liber- 1. Considera-se crime fazer propaganda de dade de informação jornalística em qualquer veículo guerra, de processos violentos ou ilegais de alte- de comunicação social”. O parágrafo 6º, que “a ração da ordem social ou política, ou de qualquer publicação de veículo impresso de comunicação forma de preconceito (racial, religioso ou de independe de licença de autoridade”. classe). Disposições legais: a) artigo 22 da Lei 7.170/ O Brasil também é signatário de alguns trata- 83 (Lei de Segurança Nacional); b) artigo 20 da Lei dos internacionais que abordam essa questão. São 7.716/89 (crimes resultantes do preconceito de raça eles a Declaração Universal dos Direitos do Ho- ou cor); c) artigo 1°, parágrafo 1°, e artigo 14 da mem, o Tratado Internacional de Chapultepec, a Lei de Imprensa1. Declaração Americana Sobre Direitos Humanos, a 2. Quando estiver em pauta a segurança naci- 1 Veja mais sobre a atual Lei de Imprensa e sobre o projeto para a nova lei em “Tendências Atuais e Futuras” do atributo A2. 19
  • 22. onal, a preparação interna ou externa do país, e o direito de resposta. O intuito da lei é permitir houver determinação prévia sobre o sigilo neces- que as ofensas veiculadas pela mídia – em qual- sário, aquele que publicar ou divulgar segredo de quer de suas modalidades – não fiquem impunes Estado ou informação sigilosa (de acordo com o e tenham, de fato, a oportunidade de resposta. dito no início) deverá ser punido. Isso é previsto Esse direito está expresso no inciso V do artigo 5º nos: a) artigo 15 da Lei de Imprensa; b) artigo 21 da Constituição, prevendo que seja proporcional da Lei 7.170/83 (Lei de Segurança Nacional). ao agravo, e no capítulo IV (artigos 29 a 36) da Lei 3. Há normas que afirmam ser crime publicar 5.250/67, que regula a liberdade de manifestação ou divulgar notícias falsas ou verdades truncadas do pensamento e de informação. Direito também (incompletas) que perturbem a ordem pública, expresso no artigo 14 da Convenção Americana: incitem desconfiança sobre instituição financeira “toda pessoa afetada por declarações falsas ou ou que abalem o sistema financeiro, em nível pes- agravantes emitidas em seu prejuízo através de meios soal (pessoa física) ou empresarial (pessoa jurídi- de difusão legalmente regulamentados e que se dirijam ca), havendo abalo de crédito, ou em nível ao público em geral tem direito a realizar pelo mesmo governamental, quando houver prejuízo ao crédi- meio de difusão sua retificação ou resposta nas to das esferas administrativas. As disposições condições que estabeleça a lei”. normativas são: a) artigo 16 da Lei de Imprensa; b) artigo 3° da Lei 7.192/86 (crimes contra o siste- ma financeiro nacional). IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO 4. Manipular a liberdade de expressão consis- Comparado a países em que o Estado exerce te em fazer, em não fazer ou em impedir que se forte repressão à liberdade de expressão, o Brasil faça publicação, transmissão ou distribuição da mantém desde 1985, com o fim da ditadura mili- notícia, por quaisquer meios, utilizando como tar, um regime de tolerância. Não tem havido apli- causa a procura por dinheiro ou favores (vanta- cação, por exemplo, dos artigos autoritários da gens). Sobre esse assunto, regem: a) artigo 18 da Lei de Imprensa que possibilitam o recolhimento Lei de Imprensa; b) artigo 158 do Código Penal. de material impresso, ou mesmo um uso excessi- 5. É crime utilizar a liberdade de expressão a vo das leis de injúria, calúnia e difamação que fim de estimular a infração de leis, fazendo apolo- configurem censura na prática. gia de ato criminoso ou do próprio criminoso. No entanto, a implementação das leis que ga- Pode-se analisar: a) artigo 19 da Lei de Imprensa; rantam essa liberdade esbarra em questões de b) artigos 286 e 287 do Código Penal. ordem prática e sofre muitas vezes os efeitos do 6. É crime ofender “a moral pública e os bons poderio econômico na comunicação. São entraves costumes” (artigo 17 da Lei de Imprensa). São reais à liberdade de expressão na nação brasileira: puníveis a calúnia (imputação de fato criminoso a Censura implícita e velada - Uma democracia ple- alguém, de forma falsa, equivocadamente), a difa- na e irrestrita prevê o fim da censura de qualquer mação (imputação de fato ofensivo à reputação tipo – sutil ou agressiva, tácita ou explícita, polí- de alguém) e a injúria (ofensa, insulto), os três tica ou econômica, social ou individual. A existên- abusos ofendendo tanto pessoas físicas vivas quan- cia de ações sutis de controle e de censura mere- to a memória dos mortos. Em termos de legisla- cem grande reflexão no Brasil, pois podemos en- ção: contrar ameaças veladas ou explícitas de demis- - calúnia: a) artigo 20 da Lei de Imprensa; b) são de profissionais, censura a matérias artigo 138 do Código Penal. jornalísticas e artigos que contrariam interesses - difamação: a) artigo 139 do Código Penal; b) políticos ou empresariais, além de exposição a artigo 21 da Lei de Imprensa. pressões e constrangimentos variados. Essas são - injúria: a) artigo 140 do Código Penal; b) artigo práticas correntes porque, embora a liberdade seja 22 da Lei de Imprensa. garantida pelo direito positivado, não existem no país leis que explicitamente atinjam ações que Na Lei de Imprensa, dispõe o parágrafo único atacam a plena liberdade de expressão, a não ser do artigo 22, que o juiz não poderá aplicar a pena quando há explicitamente ou dinheiro envolvidos. quando o ofendido tiver provocado diretamente Em visita feita ao Brasil em abril de 2004, o a injúria ou quando há retorsão imediata, que Relator Especial da Organização dos Estados Ame- consista em outra injúria. O caso de ofensa contra ricanos (OEA), advogado argentino Eduardo a memória dos mortos é regido pelo artigo 24 da Bertoni, informou que nos dois últimos relatórios Lei de Imprensa. anuais (2002 e 2003) preparados pela Relatoria, Existem também os dispositivos que garantem ambos aprovados pela CIDH (Comissão Interame- 20
  • 23. ricana de Direitos Humanos), constam quatro as- pelos governos. Apesar desse tipo de manifesta- sassinatos de jornalistas brasileiros como conse- ção ser permitido por lei, muitas vezes há o uso qüência de seu trabalho, no ano de 2003. Porém, de força policial para reprimi-las, com a alegação segundo o próprio Bertoni, a OEA tem recebido de subversão da ordem pública. informações que demonstram o avanço das inves- tigações das autoridades para esclarecer esses fa- tos e coibir esse tipo de prática. PAPEL O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES ATORES Ações de censura por meio do Poder Judiciário – A A sociedade civil organizada Lei de Imprensa não prevê a possibilidade de pro- No Brasil, os principais atores da sociedade ci- va da verdade pelo veículo que apresenta uma vil organizada que lidam com o tema da liberda- denúncia. Um caso recente de uso da força do de de expressão são: a Federação Nacional dos Judiciário como forma de intimidação e censura à Jornalistas (Fenaj), que reúne sindicatos de jorna- liberdade de expressão foi uma liminar sentencia- listas de todo o país; a Associação Brasileira de da contra o jornal Correio Braziliense, do Distrito Imprensa (ABI), tradicional órgão que reúne pro- Federal. Por meio de ação impetrada pela advoca- fissionais de jornalismo em suas diversas cia do governador Joaquim Roriz (acusado de estar modalidades e tem por finalidade maior “a defesa envolvido com a máfia da grilagem de terras no da ética, dos direitos humanos e da liberdade de Distrito Federal), o jornal sofreu censura prévia informação e expressão”; a Ordem dos Advoga- de possível matéria que relacionasse a ocorrência dos do Brasil (OAB), conselho profissional que con- com o governador. Casos como esse ainda têm trola e regulamenta o exercício da advocacia e tem espaço por conta da vigência da Lei de Imprensa tradição na defesa da liberdade de expressão; e o da época da ditadura militar. Movimento Nacional de Direitos Humanos Concentração e oligopólio dos meios de (MNDH), que congrega 316 entidades de defesa comunicação – A forte concentração (horizontal, dos direitos humanos de todo o país. vertical e cruzada) da propriedade dos meios de Entre os órgãos com atuação internacional, há comunicação no Brasil nas mãos de empresas pri- a Relatoria Especial para a Liberdade de Expres- vadas implica potencial redução da liberdade de são, criada em 1998 pela Comissão Interamericana expressão da sociedade brasileira. Quanto maior de Direitos Humanos da OEA. Trata-se de um or- a concentração dos meios de comunicação, menor ganismo de caráter permanente, com a quantidade de grupos que se expressam através independência funcional e orçamento próprio, que desses meios. Atualmente, a oposição à liberdade monitora e elabora informes anuais sobre a situa- de expressão não se dá mais pelo Estado - como ção da liberdade de expressão no países acontecia na época da ditadura militar - mas pelas americanos e também produz relatórios especiais próprias empresas jornalísticas. Grosso modo, sobre assuntos relacionados com esse direito. Há, podemos dizer que existe a liberdade das nove ainda, a Rede Internacional para a Liberdade de famílias que detêm os oligopólios da mídia, Expressão (IFEX), grupo de organizações não-go- controlando cerca de 85% da informação que vernamentais e profissionais comprometido com circula no país, contra cerca de 180 milhões de o alerta e a coordenação de ações contra ameaças brasileiros que não têm acesso à produção de sua à liberdade de informação. O IFEX, que tem o apoio própria comunicação. Além disso, restrições legais, da Unesco, possui mais de 300 integrantes, em dificuldade na liberação de outorgas e persegui- 92 países (a maioria deles em desenvolvimento). ção criminal aos veículos comunitários ajudam a manter essa situação de desigualdade no cenário A grande mídia brasileiro. Normalmente, quando algum abalo à liberda- Falta de liberdade de manifestações públicas – Atu- de de expressão (exceto aqueles de cunho implíci- almente, garantir a liberdade de expressão tam- to e velado) se manifesta nas entranhas do meio bém através das manifestações públicas é funda- jornalístico, os grandes meios de comunicação do mental, já que estas se constituem, efetivamente, Brasil levantam-se para rechaçar atitudes desse como ações de interesse público. Exemplos brasi- cunho. São alguns exemplos recentes o caso Tim leiros são as manifestações sindicais, estudantis e Lopes, jornalista investigativo da Rede Globo de de movimentos sociais como os sem-terra e os Televisão, assassinado enquanto produzia matéria sem-teto, que todos os anos ocupam praças e ave- em favela do Rio de Janeiro; e a morte durante nidas de várias cidades do país. Essas manifesta- exercício profissional do repórter fotográfico da ções funcionam como canais de expressão forma- revista Época, Luís Antônio da Costa, assassinado dos por opiniões contrárias às decisões tomadas por assaltantes fugitivos enquanto fazia a 21
  • 24. cobertura de uma ocupação em um acampamen- ao verificarem que os interesses da Rede Globo to de trabalhadores sem-teto em São Bernardo do estavam prevalecendo sobre os das demais, SBT, Campo (SP). Record, Bandeirantes e RedeTV (as outras quatro Também é comum os empresários da comuni- grandes redes de TV) saíram da Abert e criaram, cação falarem em censura, em restrições à liber- em março de 2002, a UneTV, transformada em dade de expressão e de imprensa a qualquer sinal novembro de 2004 na Abra. Atualmente, a Abert de discussão sobre regulamentação das comuni- reúne apenas a Globo e emissoras regionais. cações no Brasil, principalmente se o debate vier de fora do setor empresarial. Esse tipo de postura configura uma clara estratégia de encerrar a dis- ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS cussão sem efetivamente fazê-la, já que o debate Está no Congresso Nacional, há quase seis pode gerar mudanças contrárias a seus interesses. anos, uma proposta que regula o direito de O tratamento que se deu em 2004 aos projetos publicação pelo Ministério Público de informações de criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ) das instâncias públicas sob investigação. O Projeto e Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual de Lei da Câmara 65/99, apresentado pela (Ancinav) – sem qualquer avaliação de mérito – Presidência da República, “proíbe magistrados, são exemplos contundentes dessa postura empre- membros do Ministério Público, integrantes do sarial, que tenta classificar qualquer projeto de Tribunal de Contas, bem como autoridades policiais e regulação como censura logo quando surge e, com administrativas de revelarem ou permitirem, isso, tenta encerrar, ou ao menos fragilizar, a dis- indevidamente, que cheguem ao conhecimento de cussão de interesse público. O setor empresarial terceiro ou aos meios de comunicação fatos ou normalmente age como se estivesse acima das leis informações de que tenha ciência em razão do cargo e e se julga isento de toda e qualquer forma de que violem o sigilo legal, a intimidade, a vida privada, regulação estatal e/ou pública. a imagem e a honra das pessoas (...)”. Entre as entidades que representam os inte- Esse projeto foi considerado por vários órgãos resses dos empresários estão a Associação Nacio- de imprensa um atentado à liberdade de expressão. nal de Jornais (ANJ), a Associação Nacional de Edi- Ao não permitir a divulgação de informações cons- tores de Revista (Aner), a Associação Brasileira de tantes de processos ainda não públicos, o projeto Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e a Associ- questiona o fato de a liberdade de expressão ser ação Brasileira de Radiodifusores (Abra). Histori- um conceito absoluto. Esse debate apresenta camente, a Abert sempre foi uma entidade muito nuances e revela a linha tênue entre a censura e a poderosa e representativa, pois reunia a grande proteção à privacidade. maioria das emissoras de TV brasileiras. Porém, 22
  • 25. A 2 – Liberdade de imprensa e mídia, inclusive para jornalistas realizarem seu trabalho e responsabilidades relacionadas A 2.1 - Provisão constitucional e/ou leis que garantam a liberdade da imprensa e de todos os tipos de mídia, além de independência editorial, com o mínimo de restrições, incluindo a proibição de monopólios em qualquer mídia. A 2.2 - Medidas para prevenir a violação de direitos humanos dos jornalistas na execução de seu trabalho, especialmente em áreas de conflito. A 2.3 - Medidas para apoiar a liberdade editorial de jornalistas, inclusive segurança no emprego, sindicalização, direitos morais de autor e a resistência à coerção moral e outras formas de coerção por parte de empregadores ou outrem. A 2.4 - Instrumentos independentes e medidas que assegurem o direito de resposta, que protejam o público contra processos difamatórios, protejam a privacidade e evitem o incitamento à violência, e outras provisões contidas em acordos internacionais. A 2.5 - Medidas para prevenir censura por parte de entidades comerciais de material relevante para a esfera pública, inclusive de conteúdo eletrônico e para a internet – por parte, por exemplo, de provedores de acesso à internet, mecanismos de busca, e provedores de banda (infra-estrutura de internet, empresa de telefonia, internet a cabo ou via satélite). BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL casos, sofre aplicação com restrições e alterações A base legal que sustenta a liberdade de im- de penalidades. A lei em vigor prevê apreensão prensa é, em sua maioria, a mesma que garante a de jornais que incitem a subversão da ordem po- liberdade de expressão, visto que os direitos es- lítica e social. Prevê, também, que, em caso de tão diretamente conectados. Vale destacar o pará- processo por calúnia, injúria ou difamação, este grafo 6º do artigo 220 da Constituição, que prevê deve ser encaminhado contra o diretor ou editor, que “a publicação de veículo impresso de comunica- e não contra a empresa. Os órgãos de imprensa ção independe de licença de autoridade”. podem ser punidos por questionar o poder públi- Além destas, destaca-se na legislação brasilei- co e não têm direito à prova da verdade contra o ra a Lei 5.250, a Lei da Imprensa, datada de 09/ Presidente da República, o presidente do Senado 02/1967 (no período da ditadura militar), que re- Federal, o presidente da Câmara dos Deputados, gula a liberdade de manifestação do pensamento os ministros do Supremo Tribunal Federal, chefes e da informação. A atual regulamentação que trata de Estado ou de Governo estrangeiros, ou seus de liberdade de imprensa é defasada, já que a Lei representantes diplomáticos. Isto é, não podem de Imprensa de 1967 não foi incorporada pela provar que a denúncia ou acusação é procedente. Constituição Federal de 1988 e até hoje ainda não Em virtude de seu caráter autoritário, a lei há tem- foi definida uma nova lei, o que gera alguns pos não vem sendo aplicada em seus pormenores choques de interpretação e prevalência. Contudo, e foi criado um vácuo pela falta de outra que a mesmo sob fortes críticas de setores da área substitua. jornalística, ela continua sendo aplicada pelo Sobre a proposta de substituição da Lei de Im- Poder Judiciário, com a ressalva de que, em certos prensa, veja em “Tendências Atuais Futuras”. 23
  • 26. IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO à liberdade de expressão. Um bom exemplo dessa Alguns impeditivos à liberdade de imprensa dificuldade da aplicabilidade da Lei de Imprensa é surgem no cotidiano da atividade jornalística. a falta de limitação para as multas referentes aos Muitos deles se configuram como problemas de crimes de imprensa. A decisão fica a cargo do juiz, ordem econômica e política. que algumas vezes pode ter interesse particular A propriedade de veículos de comunicação por em coibir uma ação jornalística através de políticos de âmbito local, regional e nacional pode intimidação jurídica. O valor da indenização do se configurar como importante entrave à liberda- dano moral decorrente de ofensa praticada através de de expressão e de imprensa, visto que, não ra- da imprensa não está limitado ao disposto nos ramente, interesses entre as redações e os que artigos 51 e 52 da Lei 5.250/67, que regula a detêm o poder político e econômico tomam o lu- liberdade de manifestação do pensamento e de gar do interesse público. Muitas vezes, portanto, informação. Essa lei também determina em seu existe a liberdade para os donos de empresa, mas artigo 29 que “toda pessoa natural ou jurídica, órgão não para os jornalistas. Nesses casos, configura- ou entidade pública, que for acusado ou ofendido em se uma situação em que o interesse público é pre- publicação feita em jornal ou periódico, ou em judicado pelo interesse particular. transmissão de radiodifusão, ou a cujo respeito os meios Outra questão de importância é a dependência de informação e divulgação veicularem fato inverídico que os veículos têm da publicidade. Dados de 2002 ou errôneo, tem direito a resposta ou retificação”. da Associação Nacional de Jornais (ANJ) apontam Existem também os impeditivos de natureza que o Brasil tinha 523 jornais diários, com arbitrária e mesmo criminosa. Nos últimos anos, circulação média de 6,97 milhões de cópias (num o Brasil registrou a ocorrência contra a imprensa país de mais de 180 milhões de habitantes). de ameaças, agressões, censuras, restrições, pres- Desses 523 jornais, pouco mais de cinco têm sões, intimidações, prisões arbitrárias, danos ao relevância nacional. A importância dos anuncian- patrimônio, apreensões de jornais, processos, tes dentro dos veículos também se constitui como condenações judiciais, seqüestro e assassinatos de um fator que diminui a real liberdade de expressão profissionais da imprensa, diretamente vinculados dos comunicadores, pois os veículos são cada vez ao exercício do jornalismo. Segundo o Relatório mais dependentes do capital publicitário, o que Anual sobre Liberdade de Imprensa no Brasil, or- torna, na prática, difícil a divulgação de opiniões ganizado pela ANJ – que abrange o período de contrárias aos interesses desses patrocinadores. agosto de 2002 a agosto de 2003 – foram Isso inclui a dependência também de anunciantes registradas sete agressões e duas ameaças a jor- oficiais, como os governos federal, estaduais e nalistas. Três veículos impressos sofreram censu- municipais. A dependência de propaganda, ra prévia por mandado judicial, dois jornais im- portanto, torna-se um limitador da liberdade de pressos e uma emissora de TV sofreram processo. imprensa. Por outro lado, algumas vezes, a publi- Além disso, dois jornalistas foram processados e cação de notícias negativas funciona como forma um foi condenado à prisão2. de pressão a governos e empresas para que anun- No relatório da Federação Internacional de Jor- ciem em seus veículos, configurando uma nalistas (FIJ) de 2004, foram apontados seis jorna- “chantagem velada” do veículo. listas mortos no Brasil no exercício da profissão, o A atuação da Justiça nesse campo também pode que coloca o país no 4º lugar do ranking mundial, se constituir um problema, dependendo do tipo atrás de Filipinas, Índia e Iraque. A maioria deles de encaminhamento dado. Isso também se dá pelo foi assassinada por motivo de denúncias políticas atual “limbo regulatório”, em que a Lei de ou relacionadas ao crime organizado. Imprensa vigente (que é de 1967) e o Código Brasileiro de Telecomunicações (de 1962) não acompanham o que diz a Constituição de 1988 e PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES nem são condizentes com as discussões atuais no Duas entidades que freqüentemente têm de- que diz respeito à imprensa, aos meios de batido as questões da liberdade de imprensa são comunicação de maneira geral e particularmente a ANJ e a Associação Brasileira de Jornalismo 2. O relatório não se posiciona a respeito, mas nem todas as acusações e processos emitidos foram equivocados ou emitidos pela Justiça como uma retaliação qualquer. Algumas funcionam como medidas cabíveis no sentido de se garantir a defesa das partes que se sentiram difamadas pelos jornais e jornalistas. Está correta a imprensa quando afirma que ninguém deve impor-lhe censura prévia, mas a mídia e os jornalistas não têm imunidades. Depois de publicada a notícia, os cidadãos que se sentirem lesados devem ter o direito de contestar e cobrar retificações e reparações que acharem necessárias. 24
  • 27. Investigativo (Abraji). A ANJ defende os interesses proferida. Em agosto de 2004, a Fenaj propôs a dos empresários donos de jornais e, portanto, faz criação do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ) e grandes esforços para garantir a plena liberdade encaminhou projeto de lei ao Congresso Nacional de acesso e publicação de informações por meio do Palácio do Planalto (a quem cabia a jornalísticas, incluindo polêmicas governamentais prerrogativa legal). Essa proposta causou bastante e outras. Já a Abraji tem, no que concerne ao acesso polêmica, já que a criação desse órgão poderia a informações governamentais e públicas, um mudar as relações trabalhistas na área da produção grande interesse em defender a liberdade de jornalística, tocando em questões centrais como expressão e de imprensa, pois são direitos chaves a emissão dos registros (que passaria a ter controle para a execução do trabalho de seus associados. nacional e unificado), a fiscalização do exercício Outras entidades como a Associação Brasileira de profissional e, indiretamente, a obrigatoriedade Imprensa (ABI) e a Ordem dos Advogados do Brasil do diploma de jornalista. O projeto foi rejeitado (OAB) têm desempenhado papéis importantes nos no Congresso. debates sobre liberdade de imprensa, principal- Em termos de acompanhamento da situação mente em casos de repercussão pública. da liberdade de imprensa, duas organizações so- Outros atores importantes são os sindicatos de ciais fazem relatórios com rankings mundiais. A jornalismo e a Federação Nacional dos Jornalistas organização não-governamental Freedom House (Fenaj), que buscam defender os interesses dos publica anualmente um ranking de liberdade de jornalistas em relação às pressões das empresas. imprensa4. O Brasil está na 80ª posição, juntamen- Uma das principais questões a partir da qual eles te com México, Mongólia e Cabo Verde; recebeu se inserem no debate da liberdade de imprensa é nota 36 e é considerado parcialmente livre no a obrigatoriedade do diploma do curso universi- quesito liberdade de imprensa. No topo da lista tário de jornalismo para o exercício da profissão do ano de 2004 (que reflete o estágio de liberda- de jornalista, como tentativa de garantir a quali- de no ano de 2003), encontramos Dinamarca, Is- dade do trabalho e a não precarização da profis- lândia e Suécia, com nota 8, seguidas por Bélgica, são3. Recentemente, duas liminares diferentes da Noruega e Suíça, com nota 9. Justiça brasileira deram pareceres favoráveis à não Em outra classificação mundial de liberdade de obrigatoriedade do diploma, baseando-se para tal imprensa – publicada pela organização Repórteres no artigo 5º da Constituição Federal. Com isso, sem Fronteiras (RSF) – o Brasil ocupa o 66º lugar muitos brasileiros sem formação universitária em no ranking5 (que vale para o período 2003-2004), jornalismo puderam obter nas Delegacias uma melhoria de cinco posições em relação ao re- Regionais de Trabalho seus registros como latório anterior, publicado em outubro de 2002. jornalistas profissionais. Contudo, a decisão final Segundo o ranking atual, em que foram avaliados ainda não foi tomada pelas instâncias superiores 167 países, o Brasil aparece avaliado com nota da Justiça brasileira e não tem prazo para ser 16,50. No ano anterior o Brasil teve nota 16,75. 3. Segundo estimativa da Fenaj, publicada em setembro de 2004, com base em dados do Ministério do Trabalho e levantamento junto aos sindicatos, existem aproximadamente 100 mil registros profissionais expedidos desde 1969: 20 mil jornalistas que trabalham em redações (rádio, tv, jornais, revistas, Internet); 20 mil jornalistas em assessorias (setor público e privado), universi- dades e free lancer; 10 mil jornalistas desempregados; 50 mil não exercem a profissão por motivo de falecimento, aposentadoria ou mudança de atividade profissional. 4. Tal ranking é construído a partir das informações obtidas pela instituição acerca de três conjuntos de critérios: legais (leis e regulamentações que garantem ou obstruem a liberdade de expressão); políticos (formas políticas de se controlar a liberdade de expressão, como censura) e econômicos (como o sistema de propriedade do setor). A partir da coleta das informações são atribuídas notas aos critérios e, ao final, os países podem ter uma pontuação global entre 0 e 100 pontos, sendo a nota 0 um indicador de total liberdade de imprensa e a nota 100, de total restrição. A instituição trabalha com três grandes categorias de países: países com médias que variem entre 0 e 30 pontos são considerados livres, entre 31 e 60 temos os países parcialmente livres e, entre 61 e 100, os países não livres. 5. O ranking foi constituído a partir de entrevistas com mais de 100 correspondentes ao redor do mundo, representantes de 14 organizações de liberdade de expressão nos cinco continentes, jornalistas, pesquisadores, juristas e ativistas de direitos humanos. Eles responderam 52 perguntas relativas ao conjunto dos atentados contra a liberdade de imprensa (assassinatos ou ameaças de jornalistas, censura, prisões, monopólio do Estado em determinados aspectos, sanções para os delitos de imprensa, regulação dos meios de comunicação etc.) que ajudaram a indicar o estado de liberdade de imprensa nos 167 países relacionados. Os países que ocupam o primeiro lugar no ranking são Dinamarca, Finlândia, Islândia, Irlanda, Holanda, Noruega, Eslováquia e Suíça, todos com nota 0,50. Já os piores classificados são a Coréia do Norte, em último lugar, com nota 107,50; Cuba, em 166º lugar, com nota 106,83; e Myanmar (ex-Birmânia), em 165º, com nota 103,63. 25
  • 28. Outra iniciativa de acompanhamento do tema caso mostra uma tentativa clara de intimidação é a Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa, pelo uso da força legal. iniciativa conjunta da Organização das Nações Esse caso levantou um amplo debate no Brasil Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura sobre liberdade de expressão e de imprensa, (Unesco) e da ANJ. Foi criado um sítio web embora a matéria não tenha sido originalmente (www.liberdadedeimprensa.org.br) com o intuito publicada por um órgão brasileiro. de ser um meio de acesso aos assuntos As tendências relacionadas à liberdade de im- relacionados à liberdade de imprensa no Brasil e prensa no Brasil podem, muitas vezes, ser oferecer ampla informação sobre a ocorrência de identificadas a partir de exemplos pontuais. Um fatos atentatórios, restritivos ou contrários ao livre caso atual e que envolve a aplicabilidade da Lei exercício do jornalismo. No entanto, por ser da Imprensa é o fato do Supremo Tribunal Federal promovida pelo setor patronal, ela se mostra (STF) ter julgado inconstitucional o artigo da lei extremamente limitada, já tendo dado exemplos atual que fixa em três meses o prazo para a pes- de que não pretende tocar em questões que soa que se sentir ofendida por uma reportagem afrontem qualquer dos jornais associados à ANJ. mover ação de indenização por dano moral con- No Pará, por exemplo, houve uma agressão de tra a empresa jornalística. O Supremo examinou Rômulo Maiorana, dono de um dos principais no dia 1º de junho de 2004 um recurso do jornal jornais do estado, a Lúcio Flávio Pinto, jornalista O Dia, do Rio de Janeiro, contra o pagamento de que havia escrito uma matéria que denunciava o indenização ao médico Carlos Alberto de Oliveira, comprovado abuso de poder da família Maiorana. autor de uma ação pela qual acusa a empresa de A rede silenciou sobre o tema. Também não houve danos morais. Os ministros consideraram que a nenhuma citação sobre o processo que Jaime Constituição de 1988 não “recepcionou” o artigo Câmara, principal empresário de mídia de Goiás, 56 da Lei de Imprensa, que trata do prazo para moveu contra o jornalista Jorge Kajuru por conta propor ação de indenização por dano moral. Isso das denúncias sobre o envolvimento do empresário significa que, no entendimento dos ministros do em um esquema montado pelo governo do estado Supremo, a norma da lei é incompatível com o para o Campeonato Goiano de Futebol. novo texto da Constituição, porque o prazo de Especialmente por contar com o apoio da Unesco, três meses se confrontaria com a parte que trata a iniciativa motivou diversas manifestações dos direitos individuais do cidadão (artigo 5º), es- contrárias por parte da sociedade civil organizada, pecialmente os direitos de resposta e de indeni- denunciando a postura de defesa empresarial zação por dano material, moral ou à imagem. Esse assumida pela Rede. exemplo mostra a carência de um alicerce legal sólido para o entendimento da liberdade de im- prensa no Brasil. Enquanto essa base jurídica não ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS for satisfatoriamente resolvida, a tendência é de O país tem assistido a exemplos que revelam a que permaneça um cenário instável, variando de dificuldade em lidar com casos em que a liberda- acordo com a interpretação dos juízes. de de imprensa é utilizada para divulgação de Nesse sentido, existe um substitutivo da Lei denúncias supostamente caluniosas. Um recente de Imprensa (Projeto de Lei 3.232/92) que está em exemplo foi o caso “Lula - The New York Times”. trâmite no Congresso Nacional. Os pontos princi- Depois que o jornal publicou uma matéria do pais previstos no projeto são: a obrigação de pu- repórter Larry Rohter sobre os hábitos de consumo blicar qualquer matéria paga, desde que não sig- de álcool do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e nifique afronta à pessoa humana ou à ordem de- uma suposta preocupação nacional sobre o fato mocrática; definição de responsabilidades, no caso poder afetar a administração do governo brasileiro, de processos, ao autor (se este não for vinculado o presidente decidiu cancelar o visto do repórter ao órgão) e solidariamente à empresa, ao autor e americano. Um dos pontos mais graves desse epi- ao editor, no caso de matéria assinada por funcio- sódio é a falta de elementos para julgar um caso nário da empresa jornalística. O projeto prevê tam- desses. Grosso modo, o presidente Lula agiu como bém que o autor possa se negar a assinar a maté- juiz num caso em que ele era a vítima. Mais grave ria se tiver sofrido modificações que o façam não do que o visto ser cancelado ou não, é isso não assumir o que está escrito. Fica garantido o direi- ter sido feito pelo Judiciário, mas pelo Presidente to de sigilo da fonte, o que não exclui as respon- da República diretamente. No final, o jornalista e sabilidades civis e penais e nem o ônus da prova. o presidente entraram em um acordo de descul- Regulamenta o direito de resposta, impedindo a pas e o pedido de cancelamento foi suspenso. Tal empresa de publicar qualquer outro texto falado 26
  • 29. ou impresso em conjunto com a resposta que se ções milionárias e acreditam que é preciso esta- caracterize como tréplica (o que implica, no caso, belecer valores máximos na lei para que não se mais um direito de resposta). O capítulo mais fortaleça no Brasil a “indústria de indenizações por polêmico, no entanto, é o das sanções, que não dano moral”, como eles dizem acontecer nos EUA. estabelece valor máximo para multas e indeniza- As empresas justificam ainda que uma nova Lei ções. Não é possível prever quando haverá a apre- de Imprensa significaria a possibilidade de serem ciação do projeto, ainda que ele seja resultado da punidas por acusações inverossímeis ou serem compilação de um grande número de projetos em obrigadas a conceder direito de resposta a qual- tramitação no início da década de 90. quer um. Da maneira como está definido hoje, o Esse debate sobre a constituição da nova Lei direito de resposta pode ser publicado juntamen- de Imprensa é conflituoso e sintomático. A parte te a outra resposta do veículo (prática comum nos do projeto que se refere à idéia de não limitação meios impressos), o que configura uma tréplica e máxima para multas e indenizações, por exemplo, acaba desconfigurando a garantia do direito. Pelo gerou uma forte campanha contra por parte dos fato do mercado ser, na prática, desregulamentado, empresários, que consideram que a ausência de a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e definições é uma censura implícita. Eles afirmam Televisão (Abert) defende a simples revogação da que as empresas não publicariam qualquer polê- lei atual, ação que deixaria todas essas questões mica com medo de serem acionadas por indeniza- somente sob as esferas penal e cível. 27
  • 30. A 3 - Acesso e pronta disponibilidade de informações públicas e governamentais, de modo abrangente, útil e rápido, especialmente no que concerne ao desenvolvimento e implementação de políticas e questões de interesse público, como saúde, segurança etc. A 3.1 - Legislação sobre liberdade da informação, com a mínima retenção por parte de órgãos públicos e governamentais, e com acesso máximo por parte do mais amplo público. A 3.2 - A implementação de tais leis que tornem tal informação disponível de maneira acessível economicamente e em tempo correto para todos. A 3.3 - Esforços ativos por parte dos setores público e estatal para expandir a abertura e a transparência, inclusive através de meios como: estruturas ou escritórios para reunir e divulgar informações de forma apropriada; a publicação de objetivos e planejamentos de políticas e serviços públicos; proteção para funcionários públicos que revelem informação de e em prol do interesse público; a transmissão das deliberações dos representantes eleitos e órgãos públicos; transparência do processo decisório em questões de interesse público, como decisões de gabinete. A 3.4 - Abertura e transparência governamental em negociações e instituições internacionais relacionadas à mídia e à esfera pública. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL No Brasil, o direito à informação encontra-se É importante notar que a Constituição Federal consagrado na Constituição Federal de 1988 por acolheu tanto a liberdade pública de informar meio dos incisos XIV e XXXIII do artigo 5º: quanto o direito ao acesso à informação. Aponta, XIV — é assegurado a todos o acesso à informa- ainda, o fato de que o direito de acesso à informa- ção e resguardado o sigilo da fonte, quando necessá- ção é colocado, nesse documento, expressamente rio ao exercício profissional; como um direito coletivo, assegurado a todos e XXXIII — todos têm direito a receber dos órgãos todas. Outra questão fundamental prevista na públicos informações de seu interesse particular, ou de Constituição é o princípio da publicidade dos atos interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo administrativos, extensiva a toda organização da da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aque- administração pública. O artigo 37 aponta que “a las cujo sigilo seja imprescindível à segurança da soci- administração pública direta, indireta ou fundacional, edade e do Estado. de qualquer dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios obedecerá aos Também podem ser considerados instrumen- princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, tos para a garantia do direito ao acesso à publicidade”. informação – e do direito à informação – a ação 28
  • 31. civil pública (cuja disciplina consta da Lei 7.347/ órgãos e entidades de todos os níveis da federação 85), a ação popular (Lei 4.717/65) e o mandado (União, estados, Distrito Federal e municípios), no de segurança (Lei 1.533/51), que disciplinam as âmbito dos poderes Executivo, Legislativo e ações coletivas e individuais destinadas à Judiciário, estão incumbidos de manter disponíveis superação de situações de ilegalidade provocadas em seus sites na Internet dados e informações ali por autoridades públicas. especificados. As informações contidas na Especialmente em relação à legislação homepage não são abertas ao público em geral e infraconstitucional, há que se ressaltar a Lei 9.507/ para ter acesso a esses dados é necessário o pre- 97, que regula o direito de acesso à informação enchimento de um formulário para a identifica- constante de registro ou banco de dados de cará- ção do órgão responsável, do nível de governo ter público e o procedimento do habeas data, con- (municípios e estados) e dos endereços eletrôni- sistente na ação judicial cabível: I — para assegu- cos na Internet (links) que permitirão tal acesso às rar o conhecimento de informações relativas à páginas específicas contendo os referidos dados e pessoa do impetrante, constante de registro ou informações. banco de dados de entidades governamentais ou Outro instrumento virtual criado nesse senti- de caráter público; II — para retificação de dados, do é o Interlegis. Um programa desenvolvido pelo quando não se puder fazê-lo por processo sigilo- Congresso Nacional brasileiro, em parceria com o so, judicial ou administrativo; III — para a anota- Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ção nos assentamentos do interessado, da con- de integração do Poder Legislativo nos seus ní- testação ou explicação sobre dado verdadeiro, mas veis federal, estadual e municipal através de co- justificável, e que esteja sob pendência judicial ou munidade virtual. Dessa forma, os parlamentares amigável. e casas legislativas cadastradas no portal podem Existe, ainda, a Lei 8.159/91, que estabelece trocar informações e ter acesso a documentos e as diretrizes da política nacional de arquivos pú- notícias do Poder Legislativo. No entanto, o pú- blicos e privados, assegurando a todos o direito blico em geral somente tem acesso aos dados pu- de acesso pleno a quaisquer documentos públi- blicados no portal Interlegis. cos. São considerados públicos “os conjuntos de Implantado em janeiro de 1987, pela Secreta- documentos produzidos e recebidos, no exercício de ria do Tesouro Nacional, ligada ao Ministério da suas atividades, por órgãos públicos de âmbito fede- Fazenda, o Sistema Integrado de Administração ral, estadual, do Distrito Federal e municipal em de- Financeira (Siafi) é anunciado pelo governo como corrência de suas funções administrativas, legislativas um importante instrumento utilizado para regis- e judiciárias” (art. 7o, caput). A tais documentos tro, acompanhamento e controle da execução or- assegura-se o direito de acesso pleno (art. 22), com çamentária, financeira e patrimonial do governo exceção daqueles de caráter sigiloso, “cuja divul- federal. É um sistema informatizado que processa gação ponha em risco a segurança da sociedade e do e controla, por meio de terminais instalados em Estado” ou exponha indevidamente a intimidade, território nacional, a execução orçamentária, a vida privada ou a imagem das pessoas (art. 23, financeira, patrimonial e contábil dos órgãos da caput e § 1o). A mesma lei atribui à legislação es- Administração Pública Direta federal, das tadual e municipal a gestão do acesso aos respec- autarquias, fundações e empresas públicas fede- tivos documentos, mas com a obrigação de aten- rais e das sociedades de economia mista que esti- derem aos dispositivos constitucionais e às nor- verem contempladas no Orçamento Fiscal e/ou no mas gerais de acesso nela previstas (art. 21). Orçamento da Seguridade Social da União. Entre Na última década, algumas leis foram criadas seus objetivos, o Siafi destina-se a permitir que a pelo governo brasileiro para tentar por em práti- contabilidade pública seja fonte segura de infor- ca a efetividade do direito à informação de caráter mações gerenciais destinadas a todos os níveis da público. A Lei 9.755, de 16 de dezembro de 1998, Administração Pública Federal; permitir o acom- dispõe sobre a criação de homepage na internet panhamento e a avaliação do uso dos recursos pelo Tribunal de Contas da União públicos e proporcionar a transparência dos gas- (www.contaspublicas.gov.br), para divulgação dos tos do governo federal. A utilização do sistema é dados e informações que especifica. A referida lei feita exclusivamente por operadores vinculados à considera que os dados e informações de que tra- administração pública e o acesso às informações ta o TCU devem ser divulgados pelos órgãos sobre as despesas do governo federal é restrito. O responsáveis em atendimento ao princípio da público em geral não tem acesso direto às infor- publicidade, consagrado no art. 37 da Constitui- mações, somente através de consultas pelos sites ção Federal. Segundo o art. 2º da lei, todos os do Serviço Federal de Processamento de Dados 29
  • 32. (Serpro), da Receita Federal ou do próprio Siafi. com informações até então restritas a Apesar de alguns esforços governamentais po- parlamentares (incluindo as do Siafi). Técnicos do sitivos, decretos presidenciais recentes foram cri- Congresso e jornalistas terão acesso a esse siste- ados no sentido contrário à livre obtenção de da- ma. Contudo, segundo Cláudio Weber Abramo, dos públicos. Um bom exemplo é o Decreto 4553/ diretor da Transparência Brasil, a implantação do 02, editado no final do mandato do ex-presidente site é um avanço muito pequeno. “O acesso ainda Fernando Henrique Cardoso, que limita o livre é restrito a poucos, mesmo com a inclusão de acesso a informações governamentais e altera os jornalistas. A informação não chega à sociedade prazos para divulgação de documentos do gover- como um todo”, aponta. no. Pela nova legislação, os documentos “reserva- Segundo o relatório Caminhos da Transparên- dos” podem permanecer fora do acesso público cia, realizado pela Transparência Brasil sobre o por 10 anos, renováveis por mais 10. Os docu- acesso às informações públicas e governamentais, mentos “confidenciais”, por 20 anos, prorrogáveis em muitos casos de requisição de informações pelo por igual período. Já os documentos “secretos” público, é possível perceber um interesse maior por 30 anos, renováveis por mais 30. Por fim, os nas informações pessoais do que um uso maior e documentos “ultra-secretos” serão indisponíveis amplo do direito à informação. “Isso parece decor- por 50 anos, podendo ser este período renovável rer do contexto de origem dessas legislações, que pro- indefinidamente, ficando, para sempre, fora do curavam demarcar limites para o segredo governamen- acesso público. Esta situação é tida como tal pela garantia do direito à privacidade e do direito inconstitucional, porque a Lei dos Arquivos (8.159/ de ‘saber’ das pessoas. No caso brasileiro, seria uma 91), constitucionalmente superior a um decreto tentativa de controlar as agências de segurança do presidencial, estabelece o prazo limite de 30 anos, regime militar, preservadas nos acordos da transição renováveis por um único igual período, e em ne- conservadora. Todavia, este caráter reativo e restrito nhum momento menciona que qualquer docu- tende a mudar, permanecendo o habeas data como mento pode ficar eternamente sob sigilo. Essa si- uma garantia central para a cidadania”. O habeas tuação dificulta o acesso de pesquisadores a do- data aparece como um dos principais instrumen- cumentos históricos, especialmente àqueles tos jurídicos para obrigar legalmente os respon- relacionados ao período da ditadura militar. No sáveis a cederem informações requisitadas segun- início de dezembro de 2004, o decreto foi revoga- do a legislação em vigor. “Em muitos países latino- do e substituído por uma medida provisória e um americanos (por exemplo, Argentina, Brasil e Peru) e decreto que reduzem os prazos de sigilo das dife- do Leste Europeu (como Bulgária, Hungria e Repúbli- rentes classificações. Se, por um lado, essas medi- ca Tcheca), o direito de habeas data foi adotado prin- das acabaram com a renovação indefinida da clas- cipalmente pela necessidade de garantir aos indivídu- sificação ultra-secreta, por outro, elas criaram um os o acesso e a correção de informações pessoais ar- conselho governamental, vinculado à Casa Civil mazenadas nos arquivos dos serviços de segurança dos da Presidência, que define se e quando renovar a antigos regimes autoritários”, aponta o documento. classificação de documentos públicos, instituindo O fato é que a aplicação do sistema legal que na prática a possibilidade de sigilo eterno decre- assegura e regula o direito à informação no Brasil tado pela Presidência, para documentos de qual- encontra algumas resistências e dificuldades. quer classificação, não apenas ultra-secretos. Primeiramente, devido ao quase desconhecimen- Sobre a questão das negociações e instituições to acerca do próprio conteúdo dessa legislação, internacionais relacionadas à mídia e à esfera pú- que é muito pouco divulgada. Em segundo lugar, blica, prevista no indicador A3.4, não há base le- surge a dificuldade de compreensão legal que o gal específica atualmente em vigor. público leigo tem. E, por último, mas nem por isso menos importante, estão os limites adminis- trativos das instâncias governamentais. Segundo IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO o mesmo relatório, “a inconsistência do direito à A realidade para aqueles que buscam o acesso informação no Brasil resulta de um círculo vicioso em a informações públicas revela algumas dificulda- que a desorganização e a precariedade dos registros des impostas pelo poder público. O caso do Siafi arquivísticos, computacionais e outros, sob a guarda mostra isso, com as informações sendo restritas a dos diversos órgãos da administração pública, reforçam parlamentares e gestores públicos. Há alguns si- a opacidade governamental e impõem limites políti- nais de maior abertura, embora tímidos. Em de- cos e administrativos adicionais à incompletude da zembro de 2004, o Senado inaugurou o portal Siga legislação”. O relatório faz ainda um alerta, nor- Brasil, que promete ter um amplo banco de dados malmente não tão evidente, sobre essa dificulda- 30
  • 33. de em se entender as informações públicas Em relação à negociação de questões inter- disponibilizadas ao público, tal qual acontece no nacionais relacionadas à mídia, o governo fede- Brasil com o Siafi e o Interlegis: “Um aspecto im- ral tem mantido uma postura pouco clara. Os portante refere-se à opacidade informacional da selva processos de tomada de decisão para questões burocrática, que impossibilita ao cidadão chegar sem como a Cúpula Mundial sobre a Sociedade da maiores problemas às informações requisitadas. Em Informação (CMSI), por exemplo, acontecem no geral, ninguém fora do governo compreende o funcio- âmbito do Ministério das Relações Exteriores, namento e a complexidade da gestão das informações embora haja uma comissão interministerial para nos órgãos públicos. Por isso, é indispensável que as tratar do assunto. A participação da sociedade administrações coloquem à disposição do público os civil é limitada, ainda que tenha havido convite índices internos e os catálogos que informam o cidadão a algumas instituições (sem nenhum critério cla- sobre qual departamento é responsável por o que, qual ro) para participar do processo de diálogo so- departamento deve dispor de que tipo de informação bre a Cúpula. Não se pode dizer que há um obs- referente a certo assunto, para que o cidadão possa curantismo por parte do governo, mas ao mes- encaminhar seus pedidos de forma mais eficiente.” A mo tempo não existe nenhuma busca por trans- obstrução deliberada de funcionários também parência e pela definição de critérios para parti- pode, segundo o relatório, ser considerada um cipação e para as decisões. grave entrave ao acesso informacional público. “Em geral, os órgãos públicos temem discussões abertas com a população e a sociedade civil organizada. Os servi- PAPEL O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES ATORES dores públicos inibem a livre circulação de informa- As principais entidades da sociedade civil or- ções – por exemplo, a publicação de relatórios de ganizada que têm debatido a questão são a projetos ou programas – porque temem críticas e Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo obstrução a seus projetos (...) Porém é preciso salientar (Abraji) e a Associação Nacional de Jornais (ANJ). que uma cultura aberta e transparente não surge em Para o jornalista Fernando Rodrigues, da Abraji, o ambientes nos quais não existe uma legislação clara cidadão brasileiro precisa lutar para obter acesso referente ao acesso à informação”. à informação pública. “É preciso chamar atenção da Segundo Cláudio Weber Abramo, secretário sociedade para esse debate. Como não existe lei a res- geral da Organização Transparência Brasil, algu- peito, todos os cidadãos ficam à mercê de um ou ou- mas ações do governo atual vão contra o direito tro governante, mais ou menos liberal, que lhe forneça às informações públicas porque as tratam como as informações”, alertou. Um importante projeto publicidade. Como exemplo do que ele considera de lei, o PL 219/03, em tramitação na Câmara, do um retrocesso em termos de disponibilização de deputado Reginaldo Lopes (PT-MG), é considerado informação, o jornalista lembrou que, no gover- bastante completo nessa área. Fernando Rodrigues no Fernando Henrique Cardoso, os ministros eram ainda chama atenção para o fato de autoridades obrigados a informar a sua agenda de trabalho; o locais decidirem sobre a liberação de informações governo Lula revogou a decisão. Apesar disso, ele de acordo com suas próprias conveniências. Ele lembrou que o volume de informação que o Brasil também admite, no entanto, que há saídas palia- disponibiliza na Internet é bem maior do que o tivas para resolver o problema, como o uso de resto da América Latina. Abramo afirmou ainda petições à Justiça – que servem principalmente a que a precariedade dos jornais – como no caso jornalistas, mas que dificilmente podem ser usa- das pequenas publicações do interior, que geral- das por cidadãos comuns devido à necessidade mente são ligadas a grupos políticos ou de contratação de advogados. empresariais – é um dos principais fatores que hoje Há também outras organizações não gover- dificultam o fluxo de informação. namentais que lidam com o tema. A Transparên- Um dos exemplos das dificuldades impostas cia Brasil tem produzido relatórios que expõem pelo próprio poder público no acesso a informa- o quadro do acesso a dados e informações go- ções é a ausência de uma listagem pública dos vernamentais (ver o item anterior, donos de emissoras de rádio e TV que têm con- Implementação O Instituto de Estudos Implementação). cessões públicas. Em 2004, o Ministério das Co- Sócioeconômicos (Inesc), que realiza periodica- municações divulgou na Internet a lista com os mente estudos de análise do orçamento e sobre sócios das emissoras pela primeira vez na história os indicadores socioeconômicos nacionais, tem do país. No entanto, as pressões políticas fizeram, sido uma das entidades que mais veementemen- pouco tempo depois, o Ministério retirar as te defende uma maior abertura das informações informações do ar. públicas. Também a Ordem dos Advogados do 31
  • 34. Brasil (OAB) atua na defesa de ampliar o acesso. Algumas das atividades desse fórum permanente Existem ainda alguns órgãos públicos que têm são: levantamento de todas as leis federais, esta- entre suas atribuições a operacionalização de gran- duais e municipais e das regulamentações dos três de volume de informações de interesse geral. O poderes que tratem do direito de acesso a infor- Conselho Nacional de Arquivos (Conarq) é um mações públicas; levantamento de leis que conte- órgão colegiado, vinculado ao Arquivo Nacional nham artigos relativos à transparência ou à publi- da Casa Civil da Presidência da República, que tem cidade, como a Lei de Licitações e a Lei de Res- por finalidade definir a política nacional de arqui- ponsabilidade Fiscal; levantamento das sentenças vos públicos e privados, como órgão central de dos casos de recursos à Justiça; levantamento de um Sistema Nacional de Arquivos, bem como exer- todos os projetos de lei em tramitação na Câmara cer orientação normativa visando à gestão docu- dos Deputados, no Senado e nas Assembléias mental e à proteção especial aos documentos de Legislativas que digam respeito ao direito de arquivo. A Agência Brasileira de Inteligência (Abin), acesso a informações públicas; estudo das leis órgão auxiliar à Presidência da República, tem existentes e dos projetos de lei em tramitação, entre suas atribuições a responsabilidade de uma com o objetivo de traçar uma estratégia para grande coleta de informações individuais, empre- modificá-los, apoiá-los ou apresentar outra pro- sariais e públicas que funcionam como auxílio nas posta de Lei de Transparência; manter contato com decisões do Presidente da República. Para tanto, a o grupo de congressistas que esteve presente ao Abin se utiliza de vários métodos obscuros, como seminário para debater o encaminhamento – e escutas telefônicas, infiltração em reuniões e ma- eventual unificação – das propostas sobre uma lei nifestações. Legalmente, porém, a agência é proi- de direito de acesso. Durante o seminário foram bida de fazer escuta telefônica, pois a Lei 9.296/ ressaltados alguns projetos já em tramitação no 96, que regulamenta o dispositivo constitucional, Congresso Nacional: o do já citado deputado art. 5º, inciso XII, estabelece quais os órgãos Reginaldo Lopes (PT-MG); o projeto Transparência competentes para executar, com autorização nas Contas Públicas, do senador João Capiberibe judicial, a interceptação telefônica, e a ABIN não (PSB-AP) e da deputada federal Janete Capiberibe se enquadra nessa determinação legal. (PSB-AP), que tramita simultaneamente no Senado e na Câmara; e o da deputada Denise Frossard (PSDB-RJ), que obriga o governo a democratizar o ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS acesso ao Siafi. Uma das primeiras atividades pro- A partir de iniciativa da Abraji e com a partici- postas para o Fórum de Direito de Acesso a Infor- pação de representantes da OAB, Associação mações Públicas foi fazer um levantamento sobre Brasileira de ONGs (Abong), Fenaj, Organização todos os itens legais que atentam contra a aber- Transparência Brasil, ANJ e Projeto SOS Imprensa, tura prevista pela Constituição, mover uma Ação foi realizado em Brasília nos dias 29 e 30 de se- Direta de Inconstitucionalidade para derrubar es- tembro de 2003 o Seminário Internacional sobre ses itens e então encorajar os congressistas a subs- Direito de Acesso a Informações Públicas. Uma das tituir esse vácuo legal por legislações mais afins resoluções do seminário foi a proposta de consti- do direito de acesso. tuição de um fórum permanente para discussão e O importante estudo feito pela Organização encaminhamento de propostas relativas ao direi- Transparência Brasil salienta as dificuldades que to de acesso a informações públicas e sobre te- ainda restam no campo da legislação referente ao mas correlatos, como alterações na lei de arqui- acesso a informações públicas e governamentais vos públicos. Esse fórum foi criado na reunião pro- no Brasil: “Nos últimos dez anos, avançou-se mais na movida pela Abraji no dia 25 de novembro de 2004, regulamentação do segredo governamental e dos pro- em Brasília. O Fórum do Direito de Acesso a Infor- cedimentos de segurança de informações (principal- mações Públicas reúne 18 entidades da sociedade mente graças aos Decretos6 2.134/97 e 2.910/98) do civil em torno da proposta de encorajar o gover- que na regulamentação do direito à informação e do no a tomar medidas de abertura dos arquivos “da acesso aos registros governamentais. Por isso, é preciso ditadura, da democracia e da monarquia”, como reconhecer que ainda temos um longo caminho pela discutido em seu fórum de discussões na internet. frente se quisermos garantir o direito dos cidadãos à 6. O decreto 2.134, de 27.1.97 (Documentos Públicos Sigilosos) regulamenta o art. 23 da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991, que dispõe sobre a categoria dos documentos públicos sigilosos e o acesso a eles e dá outras providências. Já o decreto 2.910 de 29.12.98 (Normas para Salvaguarda de Documentos, Materiais, Comunicações e Sistemas) estabelece normas para a salvaguarda de documentos, materiais, áreas, comunicações e sistemas de informação de natureza sigilosa e dá outras providências. 32
  • 35. informação no Brasil”. mações públicas e encaminhar propostas a con- Ainda segundo o relatório, a apropriação de gressistas interessados no assunto. A publicação papéis historicamente públicos por algumas em- de três fotografias antigas de um homem calvo presas privadas tende a complicar um pouco o em situação vexatória fez com que importantes acesso às informações de interesse público: “A re- entidades da sociedade civil, como o movimento cente tendência à privatização de muitas funções Tortura Nunca Mais e a OAB, reclamassem a aber- públicas trouxe outras complicações. Enquanto tura dos arquivos da ditadura. Como não há lei antigamente as responsabilidades referentes à clara sobre acesso a documentos, não é possível prestação de contas (accountability) eram claramente saber exatamente o que continua vedado ao aces- delineadas e determinadas, hoje em dia muitas funções so da população – sejam documentos da ditadura da administração pública são exercidas por entidades, ou de outros períodos. Uma nota do governo reti- sobretudo empresas privadas, que não sentem ficando a identidade do homem retratado (o pa- necessidade de prestar contas ao público geral. Elas se dre canadense Leopold D’Astous), porém, deixou julgam meros clientes do governo. Dessa maneira, mui- a entender que há muitos arquivos ainda desco- tas informações são retidas sob o pretexto de se tratar nhecidos. Gradualmente, foram surgindo informa- de informações comerciais e, portanto, confidenciais”. ções e condições políticas que levaram o governo Em outubro de 2004, a polêmica sobre as ima- a admitir a existência de arquivos da ditadura e a gens que supostamente mostrariam as últimas alterar o Decreto 4.553/02, criando uma comissão horas de vida do jornalista Vladimir Herzog, morto presidencial de análise dos documentos. Ainda não em 1975 no DOI-CODI (órgão de repressão da é exatamente um aceno quanto a uma lei de direi- ditadura militar), reabriu na sociedade e na to de acesso – o debate ainda está muito centrado imprensa o debate sobre a abertura dos arquivos na abertura de documentos sobre abusos ocorri- da ditadura militar. Foram realizados ao final de dos no período da ditadura. Mas existe um “caldo 2004 dois encontros, promovidos pela Abraji, no de cultura” que permite a gradual ampliação do Rio e em Brasília, para debater o acesso a infor- debate. 33
  • 36. A 4 - Acesso a informações empresariais, de modo abrangente e rápido, quando relevantes para o interesse público. A 4.1 - Legislação/regulamentação sobre quebra de sigilo corporativo, além das informações financeiras básicas, de modo a incluir informação disponível das corporações que terão influência sobre políticas públicas e o interesse público. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL público leigo, fazendo com que a publicação não passe, por vezes, de formalidade. Além disso, é A Lei 6.404, de 1976, que regula as companhi- prática comum hoje no Brasil o uso de empresas as e sociedades anônimas, prevê a publicação de offshore para a realização de transações, deixan- seus balanços anuais no Diário Oficial do estado do-as sujeitas a legislações de paraísos fiscais ou no qual têm sede e num jornal de grande simplesmente desreguladas. circulação. Além disso, a lei prevê outras obrigações de transparências, como no parágrafo 4º de seu artigo 157: “os administradores da PAPEL DOS DIFERENTES ATORES ATORES companhia aberta são obrigados a comunicar imedi- atamente à bolsa de valores e a divulgar pela imprensa As Imprensas Oficiais têm aparecido como ato- qualquer deliberação da assembléia-geral ou dos órgãos res destacados no cenário de defesa da transpa- de administração da companhia, ou fato relevante rência das informações corporativas. ocorrido nos seus negócios, que possa influir, de modo Recentemente, a Associação Brasileira de Impren- ponderável, na decisão dos investidores do mercado sas Oficiais se manifestou favoravelmente à apro- de vender ou comprar valores mobiliários emitidos pela vação do Projeto de Lei 3.741 (ver abaixo, em Ten- companhia”. dências Atuais e Futuras tal como está, reforçando Futuras) As sociedades limitadas, no entanto, estão fora a importância das sociedades limitadas estarem dessas regras, e essa tem sido uma estratégia para também sujeitas a obrigação da publicação dos fugir da obrigação de transparência. No entanto, balanços. o novo Código Civil brasileiro, em vigor desde O Instituto Ethos de Responsabilidade Empre- 2003, consagra a figura da empresa como sarial reúne centenas de grandes empresas, bus- irradiadora de direitos e obrigações, independen- cando criar marcos e indicadores de responsabili- temente de ser sociedade anônima ou limitada. dade empresarial. No ano de 2003, seus associa- É importante notar que o Código de Defesa do dos tiveram que responder às seguintes questões: Consumidor (Lei 8.078/90), ao impor uma política Com relação à elaboração de relatório sobre os nacional das relações de consumo pautada pelos aspectos econômicos, sociais e ambientais de suas princípios da transparência e da harmonia, atividades, a empresa: determina aos fabricantes e fornecedores o dever - Elabora sem regularidade definida relatório com de garantir ao consumidor as informações informações sobre suas ações sociais e ambientais. desejadas. Esse artifício configura-se como - Elabora um relatório anualmente, descrevendo instrumento de acesso a informações empresari- suas ações sociais e ambientais e incorporando aspectos ais de interesse público. Também as novas práti- quantitativos. cas da chamada “governança corporativa” pare- - Produz um balanço social que aborda aspectos cem acrescentar elementos de transparência, em- sociais, ambientais e econômicos de suas atividades, bora careçam de base legal constituída. contendo exclusivamente resultados favoráveis e sendo facilmente acessível. - Produz um balanço social que integra as dimen- IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO sões sociais, ambientais e econômicas de suas atividades, elaborado com amplo envolvimento interno Como já dito, as grandes empresas limitadas e de stakeholders externos, e facilmente acessível. não têm a obrigação da publicação de seu balan- - Não havíamos tratado antes deste assunto. ço, o que torna extremamente árdua a tarefa de - Não vemos aplicação disto em nossa empresa. conseguir informações a seu respeito. Já no to- (Justifique.) cante às sociedades anônimas, a publicação é fei- Além dessa questão, existem mais cinco outras ta, mas muitas vezes é incompreensível para o para as quais os empresários tiveram que respon- 34
  • 37. der sim ou não: 5. A empresa disponibiliza dados sobre aspectos 1. Ao publicar informações sobre aspectos soci- econômico-financeiros, sociais e ambientais de suas ais e ambientais de seu desempenho, a empresa inclui atividades na internet? dados desfavoráveis e discute pendências? 2. As informações sobre a situação econômico- financeira das atividades da empresa são auditadas ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS por terceiros? 3. As informações sobre aspectos sociais e O Projeto de Lei 3.741, encaminhado pelo ambientais das atividades da empresa são auditadas Executivo em 1997, busca estender a obrigação por terceiros? de publicação dos balanços às limitadas de gran- 4. No processo de elaboração e/ou lançamento de porte. O projeto prevê ainda a uniformização do balanço social, a empresa envolve pelo menos três das regras de elaboração de balanços de acordo dos seguintes stakeholders: comunidade, público in- com padrões nacionais e internacionais da terno, consumidores e clientes, fornecedores, governo contabilidade, tornando mais claras e e sociedade em geral (por exemplo, por meio de orga- compreensíveis as demonstrações financeiras das nizações de defesa do meio ambiente, sindicatos, empresas. No entanto, existem diversas emendas organizações voltadas para a saúde pública ou defesa propostas ao texto (que está em tramitação) que dos direitos humanos etc.)? se aprovadas desfigurariam o seu objetivo original. 35
  • 38. A 5 - Diversidade, pluralidade e acesso a mídias e conteúdo, assegurando um amplo espectro de visões por parte de todos os setores da sociedade, inclusive minorias e grupos marginalizados, e a justa representação de todos os grupos, inclusive mulheres, minorias e grupos étnicos. A5.1- Legislação e medidas efetivas para impedir a concentração da propriedade na mídia ou controles por parte de qualquer interesse setorial, indivíduo ou entidade, incluindo: concentração da propriedade de um tipo de mídia em particular; propriedade cruzada entre mídias; propriedade cruzada da produção, disseminação de conteúdo e componentes de infra-estrutura dos meios de comunicação; propriedade excessiva por parte de estrangeiros e empresas não-ligadas ao setor de mídia. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL de pessoas jurídicas e a abertura de um percentual de até 30% para acionistas de capital não nacional. O inciso 5º do artigo 220 da Constituição esta- "Art. 2º - A participação de estrangeiros ou de belece que “os meios de comunicação social não brasileiros naturalizados há menos de dez anos no podem, direta o indiretamente, ser objeto de capital social de empresas jornalísticas e de monopólio ou oligopólio”. No entanto, não há lei radiodifusão não poderá exceder a trinta por cento do regulamentando este artigo. O que existe na le- capital total e do capital votante dessas empresas e gislação brasileira são limitações presentes em somente se dará de forma indireta, por intermédio de outras normas. O artigo 12 do Decreto Lei 236/ pessoa jurídica constituída sob as leis brasileiras e que 67, que alterou a Lei 4.117/62 (Código Brasileiro tenha sede no País”, disciplina a Lei 10.610/02, que de Telecomunicações), estabelece o limite de pro- regulamentou a emenda. priedade para cada entidade de: (a) quatro emis- A abertura foi veementemente contestada por soras de ondas médias e seis de freqüência modu- grande parte da sociedade civil organizada e, lada para radiodifusão de sons em nível local; três como contrapartida, os parlamentares que a emissoras de ondas médias e ondas tropicais em aprovaram inseriram algumas chamadas nível regional, sendo no máximo duas por cada “garantias” para proteger a mídia nacional, como estado; e duas emissoras de ondas médias de on- a nova redação para o artigo 38 da Lei 4.117/62, das curtas em nível nacional. (b) para radiodifu- que passa a estabelecer que “os administradores ou são de sons e imagens: dez emissoras em todo gerentes que detenham poder de gestão e de território nacional, podendo ser o máximo de cin- representação civil e judicial serão brasileiros natos co em VHF e duas por estado. ou naturalizados há mais de dez anos”, e que “a alte- Em relação ao controle da propriedade dos ração dos objetivos sociais, a modificação do quadro meios de comunicação por capital nacional, a Lei diretivo, a alteração do controle societário das 4.117/62 estabeleceu que apenas brasileiros natos empresas e a transferência da concessão, da permis- ou naturalizados há pelo menos dez anos poderi- são ou da autorização dependem, para sua validade, am ser donos de uma concessão. Tal limitação se de prévia anuência do órgão competente do Poder manteve na Constituição Federal de 1988, mas a Executivo”. Emenda Constitucional 36, de 2002, alterou o A restrição em relação a capital estrangeiro está artigo 222 da Constituição permitindo a entrada também nas normas que regulam a difusão de 36
  • 39. sons e imagens por cabo no Brasil. A Lei 8.977/ 2001, pouco mais de 50% da audiência de TV aber- 95, que trata da cabodifusão no Brasil, estabele- ta. Se somada à audiência da emissora SBT (Siste- ceu que a concessão para distribuidoras de con- ma Brasileiro de Televisão), de quase 24%, nota-se teúdo audiovisual via cabo só poderá ser dada a que apenas duas redes controlam 75% da audiên- pessoa jurídica de direito privado que tenha “I - cia de televisão aberta no Brasil. Em relação à dis- sede no Brasil; II - pelo menos cinqüenta e um por tribuição de verba publicitária, por exemplo, dados cento do capital social, com direito a voto, pertencen- do Projeto Inter-Meios9 mostram que a Rede Glo- te a brasileiros natos ou naturalizados há mais de dez bo, principal grupo de mídia do país, faturou, em anos ou a sociedade sediada no País, cujo controle 2004, 79% do mercado publicitário brasileiro, con- pertença a brasileiros natos ou naturalizados há mais siderando os investimentos em TV aberta, o que de dez anos". Entretanto, as regulamentações dos correspondeu naquele ano a R$ 8,2 bilhões de sistemas de microondas (MMDS) e satélite (DTH) faturamento bruto. No mesmo ano, chegaram a não se deram por meio de lei e não contêm R$ 13,5 bilhões as verbas publicitárias dos restrição alguma à propriedade por estrangeiros. veículos que participam do Inter-Meios (que Para ambos os casos, é importante destacar que representam cerca de 90% do faturamento total tais limitações à presença de capital estrangeiro da mídia brasileira). são facilmente manipuladas, especialmente porque Os dados acima apresentados se referem ape- a mesma emenda constitucional permite que as nas à concentração de propriedade horizontal (de empresas se tornem sociedades anônimas (o que apenas uma mídia). O próprio exemplo do Grupo antes era proibido). Isso faz com que haja espaço, Globo demonstra como esta concentração se dá por exemplo, para que empresas brasileiras co- também de forma vertical e cruzada. Hoje o gru- muns detenham as emissoras na cota do “capital po possui emissoras de TV, jornais (que geraram nacional”. A questão é que essas empresas podem de receita líquida, em 2002, de R$ 159,5 milhões), também ter participação estrangeira, o que confi- 15 emissoras de rádio, participação nos grupos gura o controle delas pelo capital estrangeiro. de televisão por assinatura Net e Sky, uma editora com 11 títulos de revistas, um portal eletrônico e duas gravadoras (Som Livre e RGE). No caso de IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO sua atuação na cabodifusão, o grupo detém empresas que produzem conteúdo (como os canais Apesar do monopólio e do oligopólio serem SporTV, GNT, Multishow e GloboNews) e que o proibidos pela Constituição Federal, a concentra- distribuem (a operadora Net Brasil), além de ção de propriedade dos meios de comunicação é participação acionária na empresa que controla realidade no Brasil. Ela acontece atingindo toda a rede de cabos e infra-estrutura (Net Servi- prioritariamente três esferas: a propriedade, a ços). Todo este complexo vem sendo usado tam- audiência e a distribuição da verba publicitária. bém pelo grupo para oferecer outros serviços, A maioria absoluta do sistema de mídia no Bra- como Internet de banda larga (o novo serviço sil é controlada por oito grupos (Globo, RBS, Abril, Virtua). Bandeirantes, SBT, Record, Folha, Estado). Destes, Outros exemplos podem ser tirados desde o o Grupo Globo é o melhor exemplo do monopólio Norte (a TV e o jornal A crítica no Amazonas) até o no país. Segundo dados apresentados pelo jorna- Sul do país (o grupo RBS é o segundo maior em lista Samuel Possebom 7 em sua dissertação de faturamento do Brasil e possui a maior TV e o maior mestrado, atualmente a Rede Globo chega a mais jornal da região, além de jornais menores, rádios de 99,8% do território e da população brasileiros. e um portal na internet). Na maioria dos estados, São ao todo cinco emissoras próprias (com sede há grupos afiliados às principais cabeças-de-rede nas cidades de São Paulo, Brasília, Rio de Janeiro, que detêm emissoras de TV e rádio, jornal e por- Belo Horizonte e Recife) e mais 108 emissoras afi- tal de internet, como é o caso dos grupos Rede liadas. Amazônica (região Norte), Edson Queiroz (Ceará) Em relação à audiência, dados divulgados pela e Jaime Câmara (Goiás). Na grande maioria dos Globopar8 revelaram que a TV Globo detinha, em casos, os grupos que controlam regionalmente a 7. POSSEBOM, Samuel Lamoglia. Globo e Abril diante de um novo paradigma comunicacional: a internet. Dissertação para obtenção de título de mestrado no Programa de Pós-graduação da Universidade de Brasília, Brasília, 2002. Além do estudo, o jornalista tem longa experiência no tema por conta do trabalho a frente de publicações especializadas sobre comunicação. 8. Holding do grupo Globo 9. O Projeto Inter-Meios é uma iniciativa do veículo Meio e Mensagem que atua no levantamento de dados referentes ao investi- mento publicitário no país. Seu endereço na internet é www.projetointermeios.com.br 37
  • 40. mídia estão diretamente ligados às oligarquias esteve sempre na pauta da sociedade civil regionais. Este é um fenômeno que vem da for- organizada da área da comunicação. A partir da mação do Brasil, com grupos familiares detendo década de 80, houve mobilizações que resultaram o poder em determinadas regiões e o exercendo na criação da Frente Nacional por Políticas em suas diferentes formas. A política foi a primei- Democráticas de Comunicação e na articulação ra e mais evidente. Os meios de comunicação são que apresentou as propostas da sociedade civil outra dessas formas, reforçada com a expansão no processo de elaboração da Constituição Federal das redes durante a década de 70. em 88. Atualmente, existem inúmeras iniciativas, A legislação e a realidade brasileiras se apre- mas que apresentam articulação frágil entre si. sentam como dois elementos quase Uma delas é o Fórum Nacional pela Democrati- diametralmente opostos. Apesar da proibição do zação da Comunicação (FNDC), organização que monopólio e da formação de redes, elas existem e reúne diversas entidades representativas. O FNDC apresentam crescimento sempre centrado nas ca- já teve papel central como interlocutor da socie- beças, que produzem o conteúdo e formulam as dade civil para os assuntos da área, especialmen- bases de gestão. Ao mesmo tempo em que há o te na primeira metade dos anos 90. A atuação princípio constitucional, não existe e nunca hou- destes atores na garantia de restrições ao mono- ve uma política de controle da concentração de pólio teve sua maior efervescência, nos últimos propriedade nos meios de comunicação. As cabe- anos, em 2002, quando foi aprovada a Lei 10.610/ ças produzem quase a totalidade do conteúdo 02 (sobre capital estrangeiro, já citada anterior- transmitido pelas retransmissoras, formando re- mente), e chegou a ser proposta uma nova des com base em uma brecha da lei, mas mesmo legislação para a radiodifusão brasileira. assim constituindo formação de monopólio indi- Há também iniciativas de enfrentamento direto reto, o que contraria a constituição. O pesquisa- que concebem o combate ao monopólio, como o dor Venício Artur de Lima10 explica: ato de fazer crescer a mídia alternativa e “Apesar do artigo 12 do Decreto Lei 236/67 independente, caso do Centro de Mídia estabelecer que ‘cada entidade só poderá ter con- Independente (www.midiaindependente.org) e cessão ou permissão para executar serviço de ra- dos movimentos de rádios livres e comunitárias diodifusão, em todo o país, dentro dos seguintes em todo o Brasil. limites: (...) II - estações radiodifusoras de som e A manutenção da contradição entre a legisla- imagem - 10 (dez) em todo o território nacional, ção e a realidade existe também pela forte organi- sendo no máximo 5 (cinco) em VHF e 2 (duas) por zação e presença do empresariado de comunica- estado; (...) § 7º - As empresas concessionárias ou ção na definição das políticas do setor. Capitanea- permissionárias de serviço de radiodifusão não do pela Associação Brasileira de Emissoras de Rá- poderão estar subordinadas a outras entidades que dio e Televisão (Abert), que representa cerca de se constituem com a finalidade de estabelecer di- duas mil das 3.232 emissoras de radiodifusão no reção ou orientação única, através de cadeias ou país 11 , o setor continua forte, mas vem se associações de qualquer espécie’ a norma legal se fragmentando e não atuando com a mesma torna inócua porque, contrário a toda a evidên- unidade, comum nos anos anteriores. Outras cia, o Ministério das Comunicações considera cabeças-de-rede, como Bandeirantes, SBT, RedeTV ‘entidade’ como significando ‘pessoa física’, não e Record, se desligaram da Abert e, após um levando em conta o parentesco, e não considera período de indefinições, formaram a Associação as ‘redes’ formadas com a ‘afiliação’ contratual de Brasileira de Radiodifusores (Abra). O objetivo da emissoras como constituindo subordinação ‘com nova entidade é representar as emissoras sem a a finalidade de estabelecer direção ou orientação hegemonia da Rede Globo. Embora ocupe espaços única’”. institucionais diversos, o empresariado sempre se unifica para manter a estratégia de promover e garantir a falta de políticas e regulação na área da PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES radiodifusão. Não tem havido por parte do Estado nenhuma A discussão sobre o monopólio dos meios de ação concreta no sentido de dirimir o problema comunicação do Brasil já vem de longa data, e da concentração de propriedade, embora haja um 10. Professor aposentado da Universidade de Brasília e escritor de obras como “Mídia: Teoria e Política”, publicada pela Fundação Perseu Abramo. 11. Segundo dados de seu sítio, www.abert.org.br 38
  • 41. sistema de defesa da concorrência instalado, com nas mãos de um só grupo. O processo ainda tem três órgãos (Secretaria de Acompanhamento Eco- que ser analisado pela Anatel e pelo Cade (Conse- nômico, ligada ao Ministério da Fazenda, a Secre- lho Administrativo de Defesa Econômica), que re- taria de Direito Econômico, ligada ao Ministério ceberam do Conselho de Comunicação Social (CCS) da Justiça, e o Conselho Administrativo de Defesa um relatório recomendando a não aceitação da Econômica). Esses órgãos não têm, contudo, atu- fusão. ado no enfrentamento à concentração de proprie- No mês de janeiro de 2005, o governo federal dade, embora contem com todas as condições para anunciou a intenção de elaborar durante o ano isso. uma Lei Geral de Comunicação de Massa. Ela seria Há também um outro empecilho ao fortaleci- instrumento regulatório de toda a comunicação mento da legislação para controle de proprieda- eletrônica (rádio, TV aberta e TV paga) no Brasil, de, advindo do fato de que há vários parlamenta- incluindo mídias públicas, comunitárias e privadas. res que são sócios de veículos de radiodifusão. No No entanto, no decreto publicado em abril que caso do Senado, estima-se que esse número che- cria o Grupo de Trabalho Interministerial que gue a 29 dos 81 senadores, embora seja difícil um elaborará o projeto, constam como objeto da lei dado preciso por conta da existência de registros apenas os artigos 221 e 222 da Constituição, o societários em nome de parentes. Assim, configu- que significa que as limitações ao monopólio e ao ra-se claro conflito de interesses, com os deputa- oligopólio, presentes no artigo 220, podem ficar dos e senadores legislando, muitas vezes, em cau- de fora. sa própria. Também deverá ganhar corpo esse ano o pro- cesso de digitalização da comunicação eletrônica, que inclui TV e rádio, e apresenta possibilidades TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS ATUAIS de reorganização do espectro e de ampliação do número de canais. O assunto será tratado com O ano de 2005 poderá trazer novos elementos mais detalhes no indicador seguinte. para esse quadro. Foi anunciada, no final de 2004, Até o momento, contudo, não há, em nenhu- a fusão da Sky com a DirecTV para operações na ma dessas iniciativas, indícios de medidas que América Latina, que, se concretizada, deixará 96% venham incidir sobre o quadro de concentração do mercado de TV por assinatura por satélite (DTH) apontado anteriormente. 12. Sobre o CCS, ver item 6.3. 39
  • 42. A 5.2 - Um quadro legal que ampare a emergência de uma pluralidade de tipos de canais e empresas em nível nacional e, quando apropriado, em níveis regionais (internacional) e local: canais e empresas públicas, comerciais e comunitárias/ independentes, inclusive a alocação de modo transparente e igualitário do espectro de radiofreqüências e outros bens públicos. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO Não há quadro legal que ampare a pluralidade Há até hoje divergências entre teóricos e enti- nos meios de comunicação social. Há um modelo dades representativas do setor sobre o que seri- de radiodifusão que supostamente deveria ser am veículos públicos no país. Há um grupo de constituído de forma complementar entre siste- emissoras estatais, algumas com gestão mista (por mas público, estatal e privado, mas que apresen- meio de conselhos) que se reivindicam como ta grandes contradições em seu marco regulatório públicas, como a TV Cultura de São Paulo e a TV e na aplicação das leis decorrentes deste. O artigo Educativa do Rio Grande do Sul. Todas elas, entre- 220 da Constituição Federal afirma que "a mani- tanto, dependem de verbas dos governos estadu- festação do pensamento, a criação, a expressão e a ais para funcionar. O sistema privado é tão informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, consolidado que na disputa por estas concessões não sofrerão qualquer restrição". há apenas empresas. Esta realidade é reforçada Um dos elementos para garantir a pluralidade, pelo fator econômico presente na disputa, com o o impedimento ao monopólio, já foi abordado no sistema de leilões sendo utilizado para a defini- indicador anterior (A 5.1). A área de radiodifusão ção da entidade destinatária de canal ou comunitária será abordada no item A 5.4. Resta- freqüência, onde as condições técnicas e financeiras nos uma pequena exposição sobre a legislação em das pleiteantes aparecem como critério prioritário. geral e as educativas. O artigo 223 da Constitui- O incentivo, no entanto, não é somente à apro- ção Federal estabelece que "compete ao Poder priação das concessões por empresas, mas à ma- Executivo outorgar e renovar concessão, permis- nutenção destas à frente de cada um dos espaços são e autorização para o serviço de radiodifusão no espectro magnético. O inciso 3 do artigo 33 da sonora e de sons e imagens, observado o princí- Lei 4.117/62 estipula que “os prazos de concessão e pio da complementaridade dos sistemas privado, autorização serão de 10 anos para o serviço de público e estatal", mas esta norma nunca foi regu- radiodifusão sonora e de 15 anos para o de televisão, lamentada, deixando o conceito de sistema públi- podendo ser renovados por períodos sucessivos e iguais co como uma expressão que não se concretiza. se os concessionários houverem cumprido todas as Na Lei 4.117/62, está prevista a concessão de obrigações legais e contratuais, mantido a mesma emissoras educativas, que devem ser dadas prefe- idoneidade técnica, financeira e moral, e atendido o rencialmente a fundações de direito público. interesse público”. A condição para a não renova- Diferentemente das comerciais, as educativas ção, colocada na mesma lei, é a desaprovação de recebem permissões (e não concessões) do 3/5 do Congresso Nacional por meio de votação Executivo. O governo federal utilizou as emissoras nominal, um critério que dificulta por demais educativas para criar uma rede de emissoras esta- qualquer mudança, já que, além de condicionar a tais, com uma cabeça-de-rede (a TV Nacional, ligada mudança a um quorum alto, obriga a ao sistema de comunicação do governo, chamado manifestação pública por parte dos parlamentares. Radiobrás), e uma emissora por estado. O capítulo Mesmo com todas estas amarras e facilidades da mesma legislação ainda coloca como princípio para os grandes grupos de mídia, o Executivo bra- da programação das emissoras de rádio e televi- sileiro, principalmente durante a gestão Fernando são a produção audiovisual regionalizada: "art. Henrique Cardoso, utilizou como moeda de troca 221. A produção e a programação das emissoras de de favores políticos as retransmissoras (RTVs), que rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: eram habilitadas para a produção de conteúdo mas III - regionalização da produção cultural, artística e dependiam apenas de uma permissão do Executi- jornalística, conforme percentuais estabelecidos em lei". vo. Em dezembro de 1996, pouco tempo antes da 40
  • 43. votação da emenda que permitia a reeleição do cífico abordado neste capítulo, destaca-se a Asso- Presidente da República no Congresso Nacional, ciação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas foram distribuídas quase 400. Esta “facilidade” só e Culturais (Abepec). Esta entidade reúne grande foi proibida no Decreto 3.965, de 2001. parte das emissoras “educativas-estatais”13 do país Outro nó é a descentralização da produção de e de emissoras auto-denominadas “públicas”. conteúdo nas diversas regiões do país. Apesar de Como já explicado anteriormente, o termo é evo- estar prevista na Constituição Federal a cado por algumas destas (como a TV Cultura de regionalização da produção artística, cultural e São Paulo e a TVE do Rio Grande do Sul) por haver jornalística como princípio para a programação um modelo de gestão que, apesar de subordina- das emissoras, o Projeto de Lei para regulamentar do ao Estado, tem como principal instância um o artigo tramita no Congresso Federal há 14 anos, conselho com representantes da sociedade. A e vem sendo alvo de diversos ataques de Abepec tem como grande mérito a organização parlamentares ligados aos interesses do das emissoras para a formulação de diretrizes do empresariado da área de comunicação (sobre esse que seria uma comunicação pública, que estão em projeto, ver “Regionalização da produção constante debate e atualização e partem da carta audiovisual”, a seguir). Outro ponto novamente de princípios de cunho humanista elaborada pela contraditório em relação à Constituição Federal é entidade14. o fato desta prever o sistema público de radiodi- Alguns atores da sociedade civil, como setores fusão e não existir norma complementar alguma organizados dentro do campo sindical dos jorna- que o regule. listas, vêm defendendo a inserção destes canais Há um elemento importante a ser menciona- de uso público na televisão aberta. O movimento do. Um avanço foi obtido na lei que regulou a de audiovisual (capitaneado principalmente pelo cabodifusão com a criação dos canais de uso pú- Congresso Brasileiro de Cinema, entidade que blico: Universitário, Comunitário, TV Câmara, TV reúne produtores independentes, cineastas e Senado. No entanto, a abertura destes canais, que trabalhadores do setor cinematográfico) tem se dão voz a representações importantes da mobilizado de forma incisiva para garantir a apro- sociedade e transparência a outros setores do vação do projeto que regulamenta a regionalização Estado hoje sem espaço na televisão aberta brasi- da produção audiovisual (ver “Regionalização da leira, ficou restrita a uma determinada faixa da produção audiovisual”, ainda neste capítulo). população com poder aquisitivo para poder dis- por de um serviço de televisão a cabo. Esses ca- nais, de caráter extremamente relevante, estão ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS disponíveis para menos de cinco milhões de pes- soas (3% da população), já que mesmo dentro do Digitalização da comunicação social eletrônica sistema de TV por assinatura eles só constam das Apesar de ser de interesse dos empresários que TVs a cabo, não sendo as TVs por satélites ou o sistema de mídia nacional não seja modificado, MMDS obrigadas a retransmiti-los. Além deste a convergência tecnológica apresenta um cenário problema, a alocação das emissoras mantidas com que pode gerar profundas mudanças no modelo recursos públicos em um sistema de difusão pago das comunicações. No caso do Brasil, este proces- configura bitributação para o cidadão brasileiro, so passa pela discussão sobre a digitalização da que é obrigado a pagar se quiser ter acesso a essas mídia eletrônica (TV e rádio). Mesmo no meio de emissoras (TV Câmara, TV Senado, TVs das um fogo cruzado de pressões dos três maiores assembléias legislativas estaduais e dos órgãos do padrões do mundo (o norte-americano ATSC, o Judiciário). europeu DVB e o japonês ISDB), o governo brasileiro optou por pesquisar a possibilidade de um “sistema” nacional (que pode, ou não, incluir O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES PAPEL ATORES a confecção de um padrão de transmissão). Além da questão tecnológica, a discussão sobre o Siste- A briga pelo processo de democratização do ma Brasileiro de TV Digital (SBTV) passa por ou- sistema de mídia nacional se apresenta em diver- tras esferas, como a política industrial inerente, sas vertentes (já citadas no ponto anterior e tam- as parcerias internacionais, as mudanças bém a seguir no ponto A 5.4, que trata especifica- regulatórias necessárias e os modelos de negóci- mente dos veículos comunitários). No caso espe- os e de uso. 13. Utiliza-se este termo para designar aquelas que são educativas mas têm vinculação direta com o Estado. 14. Ver mais em www.abepec.org.br 41
  • 44. Em relação a este último ponto (o modelo de ministérios – tem como função estabelecer as di- uso), o governo federal sinaliza que a prioridade retrizes para a implementação da TV digital, acom- do SBTVD é promover inclusão social, no sentido panhar as pesquisas, tomar decisões sobre ques- de estender serviços online e interatividade a uma tões como o padrão tecnológico e supervisionar vasta camada da população. O problema está no o Grupo Gestor. O Grupo Gestor – formado por fato de esta definição ainda estar colocada em ter- sete ministérios, além do Instituto Nacional de mos muitos genéricos. Tecnologia da Informação (ITI) e Agência Nacional A mudança da TV digital traz a possibilidade de Telecomunicações (Anatel) – deve executar as de se efetivar um modelo de comunicação que ações estabelecidas pelo Comitê de Desenvolvi- caminhe no sentido da democratização, desde que mento. Cabe ao Grupo Gestor definir prazos, pri- haja um canal de retorno que permita a oridades de pesquisa e o montante de recursos a transmissão de grande quantidade de dados sem ser investido. Estão previstos investimentos de altos custos. Com a possibilidade de compressão cerca de 65 milhões de reais do Fundo de Pesquisa dos dados transmitidos, é possível ter um maior Tecnológica em Telecomunicações (Funttel). Cerca número de canais dentro do espectro de 80 universidades foram habilitadas para eletromagnético, o que abre espaço para que se desenvolver o sistema brasileiro e 19 projetos altere a distribuição de poder na radiodifusão foram aprovados. As áreas de pesquisa são trans- nacional. A implantação desse novo modelo missão e recepção, codificação de canal e modula- poderia criar um momento favorável para discutir ção; camada de transporte; canal de interatividade; a regulação das telecomunicações e a produção codificação de sinais fonte; middleware; serviços e de conteúdo no país, mas isso não tem acontecido aplicações e conteúdo. O prazo para entrega dos até o momento. Nada impede, por exemplo, que resultados pelas universidades é dezembro de essa compressão dos dados seja utilizada não para 2005, para que as decisões sobre a SBTVD sejam a ampliação do número de canais (e conseqüente tomadas no início de 2006. democratização), mas seja cedida para as mesmas O Comitê Consultivo tem como função ser um emissoras atuais transmitirem em alta definição espaço da sociedade civil e do setor privado para ou em diferentes canais (como vários ângulos de propor diretrizes, avaliar e dar mais transparência um mesmo jogo de futebol). ao processo. Ele é formado por 23 instituições Há também outras questões estratégicas que representantes do setor produtivo – telecomuni- permanecem sem definição: (1) Haverá uma polí- cações, eletroeletrônica, software –, de trabalha- tica de estímulo e capacitação para a produção de dores e da sociedade civil. Para fazer a compara- conteúdo digital, especialmente para emissoras ção entre os modelos, o Comitê pretende avaliar não-comerciais? Haverá uma política de investi- a questão econômica, a questão tecnológica e os mentos para equipar efortalecer TVs educativas e usos da TV digital. Cabe a ele também analisar o universitárias? (2) Haverá um novo marco marco regulatório e identificar necessidades de regulatório que inclua as diversas plataformas mudanças na legislação, adaptando-a à realidade tecnológicas (TV aberta, TV por assinatura, radio- digital da TV. difusão sonora, operadoras de telefonia fixa e Em relação às escolhas de padrão que ainda móvel e Internet)? (3) Haverá garantias de que os precisam ser feitas para a definição do modelo de serviços interativos oferecidos sejam de utilidade TV digital no Brasil, há duas opções distintas. Uma pública (como governo eletrônico) e não sirvam delas é a transmissão de conteúdo em alta defini- apenas como ferramentas de consumo? (4) Será ção (HDTV). Nesse caso, não há otimização do es- garantido o equilíbrio de condições dos sistemas pectro – cada canal que atualmente é ocupado por público, estatal e privado quando houver a trans- uma estação analógica passará a ser destinado a ferência tecnológica? (5) Com um modelo nacio- uma estação digital. Esse tem sido o modelo ado- nal, haverá uma política de fomento à produção tado, por exemplo, nos Estados Unidos. A outra de sistemas, aparelhos e componentes para este opção é a transmissão em qualidade standard mercado? Em que termos serão negociados os (SDTV) ou enhanced (EDTV). Cada canal atual po- acordos internacionais e a transferência derá ser transformado em até cinco, além de um tecnológica com outros países? canal extra de retorno, para utilização de serviços Para definir o SBTVD, foram criadas três instân- interativos. Essa opção tem sido a utilizada na cias de formulação sobre o tema: Comitê de De- maior parte da Europa e, ao que tudo indica, tam- senvolvimento, Comitê Consultivo e Grupo Gestor. bém deve ser a adotada no Brasil. O Comitê de desenvolvimento – formado por 10 42
  • 45. Digitalização no rádio Engenharia de Televisão e Telecomunicações (SET) Embora esteja em uma etapa ainda embrioná- já realizaram estudos comparativos e optaram pelo ria, a discussão sobre a digitalização do rádio tem padrão Iboc. É cedo ainda para apontar qual dos o mesmo foco do debate sobre o SBTVD: qual o padrões é melhor, mas é possível e necessário padrão tecnológico a ser adotado. Órgãos do problematizar as motivações de cada grupo no governo, universidades e entidades representantes processo. É esperado que os radiodifusores defen- do setor produtivo já estão estudando os padrões dam o padrão norte-americano, pois ele não mexe existentes hoje, o norte-americano Iboc (In Band na disposição atual das concessões e é mais bara- on Channel), o europeu Eureka e o japonês da ISDB- to. A adoção do Eureka significaria um processo Tsb. O primeiro trabalha com a transição para a de escolha de novas emissoras para a faixa que difusão digitalizada dentro do espectro atual. O seria criada e geraria uma demanda de divulgação segundo prevê a criação de uma nova faixa no do novo meio que é difícil de ser assumida por espectro onde todas as emissoras transmitem de alguma das partes (empresários ou Estado). apenas uma antena e possuem alcance igual. Já o padrão japonês aproveita a sinergia com a TV Regionalização da produção audiovisual digital, de forma a criar um novo universo de Em relação à regionalização do conteúdo vei- comunicação. culado por radiodifusão de sons e imagens, há 14 O rádio digital terá qualidade sonora melhor, anos tramita no Congresso Nacional o Projeto de principalmente na faixa de ondas médias (emis- Lei da deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ), hoje soras AM), e possibilitará a transmissão, além do identificado como PLC (Projeto de Lei da Câmara som, de informações textuais e outros tipos de dos Deputados) 59/03, que regulamenta o inciso dados. A recepção digital exige adaptação do equi- III do artigo 221 da Constituição Federal. Inicial- pamento transmissor e, portanto, investimento mente o PL propunha 30% de programação regio- das emissoras de rádio. Considerando que, no Bra- nal por dia entre as 7h e 24h. Depois das negoci- sil, este veículo tem uma economia razoavelmen- ações durante a tramitação e de aprovação da te frágil, já que compete com a televisão em volu- matéria na Câmara, o projeto foi alterado profun- me de verba publicitária, pesquisadores do tema damente, perdendo muito de seu espírito inicial. não acreditam que a digitalização venha a acon- Segundo informações contidas no parecer da tecer em pouco tempo no Brasil. relatora Berenice Mendes sobre o PLC para o Con- Murilo César Ramos15 avalia que as vantagens selho de Comunicação Social16, o tempo de pro- na qualidade da transmissão podem fazer com que dução regional da proposta atual foi reduzido de o rádio digital seja mais interessante para trans- 30% da programação diária das redes para 22 ho- missões na freqüência AM do que para a FM. Um ras semanais para emissoras que atendam áreas dos fatores limitantes da AM é a baixa qualidade com mais de 1,5 milhão de domicílios com televi- do som. Com a digitalização, será possível trans- sores, 17 horas semanais para aquelas com menos mitir em estéreo e com maior qualidade. Assim, de um 1,5 milhão e 10 horas semanais para as esta faixa de freqüência – que tem como caracte- localidades com menos de 500 mil domicílios. "Ou rística um alcance maior do que a FM – poderia seja, a exigência de 30% da programação diária aumentar a penetração no público, transforman- regional foi reduzida para, de modo aproximado, do seu modelo de negócio. respectivamente 12%, 10% e 7% semanal", afirma Apesar da previsão de um processo demorado o parecer. O projeto irá agora para votação no por especialistas e estudiosos, os empresários da Senado Federal, ainda sob resistência dos empre- comunicação já vêm se preparando para o deba- sários do ramo da comunicação social, que alegam te. A Associação Brasileira de Emissoras de Rádio ser tal norma uma imposição. e Televisão (Abert) e a Sociedade Brasileira de 15. Professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília e estudioso das políticas de comunicação no Brasil. 16. Órgão consultivo do Senado para assuntos relativos à área, que será analisado de forma mais aprofundada no indicador A6. 43
  • 46. A 5.3 - Medidas efetivas para assegurar que canais e empresas públicas tenham disponíveis financiamento e recursos adequados, especialmente em relação ao noticiário e ao trato de assuntos atuais, de forma completamente independente dos governos e não sujeita a interferências arbitrárias, e livre de regulamentações desnecessariamente pesadas. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL ingerência na linha editorial de emissoras em vá- rios estados, como em Minas Gerais (RedeMinas) Como mencionado anteriormente, não existe e no Mato Grosso do Sul (TVE MS). de forma regulamentada a figura jurídica do que seriam emissoras públicas. As que se auto-deno- PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES minam como tal são legalmente educativas liga- das aos governos estaduais geridas por fundações A discussão sobre alternativas de financiamen- de direito privado. A forma de financiamento é to das emissoras “públicas” tem acontecido den- diferenciada e geralmente dentro do orçamento tro da Associação Brasileira de Emissoras Públicas, de cada unidade da Federação, não existindo caso Educativas e Culturais (Abepec). É esta entidade de vinculação direta a algum imposto ou outra que promove seminários e se constitui como fonte de renda vinculada. As medidas efetivas para interlocutora destas emissoras em debates e garantir o financiamento não existem; ao contrá- reivindicações institucionais como as expostas rio, o que há são restrições às educativas, como abaixo. As próprias emissoras têm travado intensa proibição do uso da publicidade como forma de disputa em seus estados com os executivos das financiamento. unidades da federação, no sentido de aumentar sua receita, solicitação que até agora não alcançou IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO sucesso nem mesmo no Estado de São Paulo, onde a TV Cultura tem tradição e reconhecimento. Esse cenário vem causando intenso debate den- tro do setor de emissoras “públicas”. Vários semi- TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS ATUAIS nários e fóruns já foram realizados nos últimos anos para discutir os rumos da radiodifusão pú- Foi realizado na cidade do Rio de Janeiro em blica, com grande ênfase na questão do financia- junho de 2003 um seminário que discutiu os ru- mento. A falta destas medidas se torna ainda mais mos das TVs públicas. Uma das pautas centrais foi crítica diante do quadro de crise financeira que o problema do financiamento. Há setores dentro vem tomando conta dessas emissoras. Uma das do movimento de TVs públicas que atuam para saídas é a utilização da outras fontes de financia- criar alternativas de financiamento que vão desde mento, principalmente a publicidade, o que já a permissão e aumento da publicidade, passando acontece em alguns casos. Como exemplo do pela prestação de serviços, até a adoção do mo- sucateamento das emissoras, estima-se17 que, em delo inglês de contribuição direta da população. 2004, o montante de recursos oriundos de receita No entanto, apesar de ter sido constituída no Con- própria18 da TV Cultura (maior emissora estatal/ gresso Nacional uma Frente Nacional em Defesa educativa do país) some R$ 38,4 milhões, mais de da TV Pública, ainda não há iniciativa conjunta 30% do orçamento do veículo previsto para o ano, sistematizada para propor normas que apontem que pode chegar a de R$ 125 milhões. Uma alter- novas formas de financiamento. nativa já proposta para o caso da TV Cultura foi a Desde 2004 vem sendo discutido dentro do inclusão de uma taxa na conta de luz da popula- Banco Nacional para o Desenvolvimento Social ção do estado. A iniciativa encontrou grande re- (BNDES) uma linha de financiamento para dívidas jeição por se tratar de uma medida que atinge de curto prazo das empresas de comunicação, com- igualmente pessoas em situações muito díspares pra de papel para a imprensa e aquisição de equi- de renda. pamentos. A Abepec se movimentou e apresentou A falta de independência das emissoras pedido de linha específica para esse tipo de difusora, educativas/estatais não se dá somente no âmbito solicitação para a qual o banco ainda não havia do financiamento. Já foram feitas denúncias de dado resposta. 17. De acordo com informação publicada pelo jornalista Daniel Castro no jornal Folha de S. Paulo no dia 19 de abril de 2004. 18. Que incluem prestação de serviços, convênios, leis de incentivos fiscais e publicidade. 44
  • 47. A 5.4 - Medidas efetivas que assegurem que empresas e canais comunitários e sem fins lucrativos tenham recursos adequados, inclusive bens públicos como o espectro de freqüências; estejam livres de interferências arbitrárias; sejam transparentes, democráticos e participativos; e apóiem e tenham participação de comunidades excluídas e marginalizadas. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL tos que tenham sede na comunidade em questão. Tal instrução restringe extremamente os instrumen- A radiodifusão comunitária é regulada por duas tos de geração de recursos das emissoras, impe- leis no Brasil. A primeira é a Lei 9.612/98, que dindo seu crescimento e sustentabilidade. dispõe sobre o serviço de radiodifusão de sons Há outros pontos que também merecem aten- (rádio) comunitário e a segunda é a Lei 8.977/95 ção, como a proibição da formação de redes, prá- (que disciplina a atividade de cabodifusão no país), tica disseminada nos meios comerciais e que versa sobre a radiodifusão de sons e imagens educativos, e a definição para as rádios comunitá- (televisão) tratando de alguns aspectos da TV co- rias de um só canal por município, que se localiza munitária. A rigor, não há uma legislação para re- em ponto na extremidade do dial. O Decreto gular TVs comunitárias. O movimento de rádios 2.615/98, que regulamentou a Lei 9.612/98, tem comunitárias e livres tem posição bastante crítica medidas mais restritivas ainda. Ele condiciona a em relação à legislação que atinge a radiodifusão possibilidade de participação no conselho de comunitária. O primeiro problema diz respeito às gestão do veículo à moradia dentro desta área de punições previstas na legislação. O Código cobertura, além de definir quase 30 punições Brasileiro de Telecomunicações estabelece, em seu extremamente rigorosas referentes às normas artigo 70, pena de um a dois anos de detenção infringidas por uma emissora. para a transmissão de conteúdo por meio do No bojo das discussões sobre a Lei 9.612, op- espectro eletromagnético sem permissão. Já a Lei tou-se por retirar a radiodifusão de sons e ima- Geral de Telecomunicações (9.472/97) estabelece, gens desta norma e restringi-la aos canais de em seu artigo 183, pena de dois a quatro anos acesso público presentes na Lei 8.977/95, que para quem “desenvolver clandestinamente regula os serviços de televisão a cabo. Foi definido atividade de telecomunicação”. que as operadoras do serviço de cabodifusão A Lei 9.612 materializa a concepção repressora devem deixar um canal para fins da operação de da legislação sobre o tema. Ela é extremamente radiodifusão de sons e imagens de caráter limitada e comprometida com a manutenção da comunitário. Não houve nenhuma regulamenta- hegemonia do sistema comercial na radiodifusão ção para a transmissão da TV comunitária em brasileira19. A norma, em conjunto com o decreto sistema aberto, que poderia ser pensada pela que a regulamenta, estabelece a potência de 25W utilização do UHF, que comporta 66 canais e não para os transmissores das rádios e restringe a “co- é aproveitado. bertura” (área protegida da transmissão) a apenas 1 km de raio, definição restritiva, muito difícil de ser cumprida até mesmo com transmissores fun- IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO cionando na potência baixa definida. A lei apresenta outros problemas centrais. Um No caso da radiodifusão comunitária, o pro- deles é a relação desigual com as emissoras co- blema já está na própria legislação. A lei 9.612 foi merciais estabelecida por meio da determinação construída com perfil restritivo, como já indica- de que a interferência de uma rádio comunitária do, o que engendra uma aplicação rigorosa da le- em uma comercial significa falta grave passível de gislação, principalmente no que diz respeito à fechamento, enquanto o inverso não constitui apreensão de todo e qualquer equipamento de qualquer problema. Outro é a limitação dos mei- uma rádio fechada e à condenação dos seus ope- os de sobrevivência estrutural e financeira da emis- radores. sora. A rádio não pode veicular publicidade, so- Há também uma armadilha no fato de que a brando como instrumento apenas um apoio de- estrutura hoje disponível para a operação dos nominado “cultural” e somente de estabelecimen- processos de pedidos de autorização (no âmbito 19. Ver alguns artigos no sítio da Rede Brasileira de Comunicação Cidadã, www.rbc.org.br/artigos.htm 45
  • 48. do Ministério das Comunicações) não tem ço). Além dela, ainda no âmbito nacional, existem condição de encaminhá-los, incentivando a outras entidades como: o Fórum Democracia na ilegalidade. Ou seja, o Estado fecha as rádios sem Comunicação, a Rede Brasil de Comunicação Cida- discutir que grande parte delas pode estar “ilegal” dã (RBC), a Associação Nacional das Rádios Comu- pela própria morosidade do órgão responsável nitárias Católicas (Ancarc) e a representação brasi- pela análise dos processos. Hoje, existem quase leira da Associação Mundial de Comunicação Co- 10 mil pedidos no Ministério das Comunicações, munitária (Amarc). Na área de televisão comunitá- que declarou publicamente ter condições de ex- ria, constituiu-se recentemente uma entidade na- pedir apenas 1.500 liberações por ano. Essa situ- cional denominada Associação Brasileira de TVs ação cria um contingente de rádios que podem Comunitárias (Abracom). passar mais de cinco anos na “ilegalidade” por Esse quadro com variadas entidades foi culpa do Executivo Federal e provavelmente se- provocado por sucessivos desentendimentos po- rão fechadas se forem descobertas pelo órgão res- líticos dentro do movimento de radiodifusão co- ponsável pela fiscalização, a Agência Nacional de munitária. No último ano, as diferentes frentes do Telecomunicações (Anatel). A gravidade da situa- movimento retomaram o diálogo conjunto, em ção se expressa na comparação do número de virtude da possibilidade anunciada pelo governo rádios legalizadas com o número de rádios fecha- de uma Conferência Nacional de Radiodifusão Co- das. Enquanto há cerca de 2.300 rádios20 já auto- munitária (ver ainda neste capítulo). rizadas desde o início do processo de legalização, As rádios comunitárias vêm sendo usadas tam- em 1998, segundo a Associação Mundial de Radi- bém para potencializar a ação dos movimentos odifusão Comunitária (Amarc), o número de rádi- sociais. O caso mais exemplar é do Movimento os fechadas pela fiscalização entre o início de 2002 dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que e março de 2004 chegava a 8.474. possui uma rede de aproximadamente 30 rádios Em 2003, foi montada uma força tarefa para espalhadas em seus assentamentos em todo o país. agilizar a análise dos processos. Esta ação teve Segundo informações da coordenação do resultados positivos, mas não gerou a conseqüê- movimento, as rádios do MST “são uma ferramenta ncia mais necessária para a resolução do proble- para fazer o debate com a sociedade e com a nossa ma: a ampliação da estrutura responsável pelo trâ- base sobre o modelo de desenvolvimento para o mite dos processos. Outro ponto que atrapalha a campo e também divulgar as conquistas da dinamização dos processos é o fato de cada pedi- reforma agrária”. Cada coletivo da rádio organiza do de concessão ter de passar pelas comissões de seus temas de trabalho de acordo com as linhas Comunicação da Câmara dos Deputados e de Edu- gerais do MST. cação do Senado Federal. O trâmite dos processos No campo empresarial, é importante destacar incha a pauta das comissões e, ao mesmo tempo, a Associação Brasileira de Empresas de Rádio e é pouco célere por depender delas. Um dos nós Televisão (Abert). A entidade representava até bem da aplicação da já restritiva Lei 9.612 é a alocação pouco tempo, como visto anteriormente, grande de freqüências para as rádios comunitárias. Até parte das empresas de comunicação do país. Ela 2004, ainda não havia sido definido um canal para teve papel determinante na elaboração da Lei as rádios comunitárias de São Paulo, município 9.612/98, assumindo a função de interlocutora tan- com mais rádios no país. Portanto, além da legis- to com o Executivo quanto com os deputados e lação repressiva, há o problema de indefinições senadores, apresentando as posições dos empre- por parte do poder público acerca de regulamen- sários que formam o sistema comercial, posições tações específicas. estas que, analisando o resultado, foram vitorio- sas na discussão sobre a regulamentação da radi- odifusão comunitária. A Abert tem trabalhado com PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIEFERENTES ATORES a denúncia das rádios que funcionam sem autori- zação legal, chegando a encaminhar cerca de 50 A situação precária da radiodifusão comunitá- casos por mês à Anatel. ria ainda é amplificada pela fragmentação das or- No âmbito do Estado, o Ministério das Comu- ganizações que atuam neste campo. Atualmente, nicações, nas últimas gestões, tem tomado pou- há uma entidade que se reivindica representante cas medidas em relação à falta de celeridade no das rádios comunitárias em nível nacional, a As- andamento dos processos de abertura de rádios. sociação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abra- Foi criada, no entanto, uma força-tarefa por meio 20. Dados da Agência Nacional de Telecomunicações. 46
  • 49. de um Grupo de Trabalho Interministerial para ria. A presença da Internet, que se apresenta como tentar encaminhar a questão. O prazo para esse alternativa ao problema do limite físico do espec- grupo encaminhar as sugestões de mudanças nos tro eletromagnético, vem crescendo dentro das processos e na legislação é agosto de 2005. Já a rádios comunitárias tanto para a troca de infor- Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), mações quanto para ser um meio de divulgação vem, pelo contrário, sendo extremamente eficien- para fora do seu raio de alcance. Ainda no seio te no fechamento das rádios “ilegais”, processo dessa discussão, a digitalização da comunicação no qual conta com a ajuda da Polícia Federal, que social eletrônica vem ganhando espaço no Brasil, promove apreensões e fechamentos de rádios. mas principalmente ainda no âmbito da televisão. Em relação ao financiamento destes veículos, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS Lei 3.269/04, do deputado Edson Duarte (PV-BA), que institui Fundo de Apoio à Radiodifusão Co- Há, atualmente, no Congresso Nacional, cerca munitária. O fundo seria constituído de recursos de 900 ações (propostas de emendas, substitutivos do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações etc.) que têm como objetivo algum tipo de altera- (Fistel), de doações e dotações orçamentárias. Ele ção na Lei 9.612. No entanto, não há perspectiva teria como objetivo financiar a manutenção e aqui- de sistematização de todas estas propostas de for- sição de equipamentos; implantação e moderni- ma a fomentar um debate mais amplo sobre esta zação de sistemas de transmissão; construção, norma e seu impacto na radiodifusão comunitá- aparelhamento e reforma de estúdios e laborató- ria. Há também o Projeto de Lei 2701/97, do rios destinados à produção de programas e deputado Fernando Ferro (PT-PE), que propõe a vinhetas da emissora; programas de bolsas para veiculação em sistema aberto dos canais formação de profissionais e consultoria técnica comunitários de televisão. especializada; e treinamento técnico. Do ponto de vista da organização da sociedade O deputado Edson Duarte também apresentou civil, é importante ressaltar as discussões acerca um projeto de lei que revoga o artigo 183 da Lei da construção de uma Conferência Nacional de Co- Geral de Telecomunicações (9.472/97). municação Comunitária. A proposta ainda está Indevidamente, o artigo é usado pela Anatel e sendo debatida por apenas parte das entidades Polícia Federal nas ações de repressão às rádios que compõem o movimento de rádios comunitárias comunitárias. Cerca de mil pessoas já foram e está sendo articulada em parceria com o Banco indiciadas em inquérito policial por causa desse do Brasil, como órgão financiador. Os objetivos dispositivo. Na opinião de alguns juristas, o arti- deste fórum ainda não foram definidos e não há go 183 não se aplica às emissoras comunitárias clareza sobre o que pode acontecer em relação a por ser serviço de radiodifusão, e não de teleco- ele. municações. "Existe, porém, uma vontade políti- Assim como no resto do mundo, o processo de ca de reprimir um direito sagrado do povo, que é convergência tecnológica está na pauta dos ato- o de se comunicar. Temos aqui uma agressão à res envolvidos na área de radiodifusão comunitá- liberdade de expressão", diz o deputado. 47
  • 50. A 5.5 - Obrigações regulatórias aplicáveis sobre empresas e canais comerciais, inclusive difusores, quando apropriado, para assegurar o cumprimento dos requisitos da prestação de serviço público. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL TV; III- a fiscalização do serviço, em todo o território nacional; IV - a resolução, em primeira instância, das Há pouquíssimo ou quase nada estabelecido dúvidas e conflitos que surgirem em decorrência da no que se refere a disposições nas normas que interpretação desta Lei e de sua regulamentação. V - definam as obrigações para assegurar o os critérios legais que coíbam os abusos de poder cumprimento dos requisitos da prestação de econômico no serviço de TV a Cabo ; VI - o serviço público. O público, na legislação brasileira, desenvolvimento do serviço de TV a Cabo em regime aparece muito mais como premissa genérica do de livre concorrência; VII - o estabelecimento de que como conceito que se materialize nas tais diretrizes para a prestação do serviço de TV a Cabo obrigações. Desta forma, a análise sobre a estimulem e incentivem o desenvolvimento da indústria veiculação de conteúdo de interesse público passa cinematográfica nacional e da produção de filmes, a ser pouco objetiva e depende muito dos desenhos animados, vídeo e multimídia no País”. instrumentos de análise e controle dos meios de No entanto, não há, para o sistema aberto, comunicação (que serão melhor abordados no nenhum mecanismo de controle ou qualquer ór- atributo A6), que também são praticamente gão a que o cidadão possa se remeter para apon- inexistentes. tar irregularidades. No caso da TV a cabo, previu- Se analisadas as finalidades dos meios, regula- se em lei que todas as regulamentações e posteri- das na prática através do estabelecimento de por- ores mudanças teriam antes que ser submetidas centagem em relação à totalidade da programa- ao parecer consultivo do Conselho de Comunica- ção, vemos que a própria legislação aponta para a ção Social (analisado no atributo A6). Isso não não realização da prestação de serviço público. O garante, todavia, nenhum espaço para o aponta- Decreto 52.795/63, que regulamentou o Código mento de irregularidades. Brasileiro de Telecomunicações, coloca a possibi- Como única alternativa para denúncias públi- lidade de publicidade na programação em um cas está o Ministério Público, tornado indepen- percentual cinco vezes maior do que a exigência dente do sistema judiciário em 1988, que acolhe de conteúdo educativo e noticioso. “Art. 28 - As as denúncias dos cidadãos e trabalha pela promo- concessionárias - permissionárias de serviços de toria dos direitos. radiodifusão, além de outros que o Governo julgue convenientes aos interesses nacionais, estão sujeitas aos seguintes preceitos e obrigações: 12 - na IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO organização da programação: c) destinar um mínimo de 5% (cinco por cento) do horário de sua programação O contra-senso da legislação citada (sobre a diária à transmissão de serviço noticioso; d) limitar relação entre publicidade permitida e programação ao máximo de 25% (vinte e cinco por cento) do horário educacional e noticiosa exigida) é ainda mais da sua programação diária o tempo destinado à explorado pelas grandes emissoras. O publicidade comercial; e) reservar 5 (cinco) horas merchandising já é prática comum em todas as semanais para a transmissão de programas emissoras comerciais e está em quase todos os educacionais”. programas de entretenimento (novelas, shows de A lei que regula o sistema de TV a cabo (8.977/ auditório etc.), não tendo sido computado como 95) prevê a normatização ou determinação pelo publicidade para efeito do controle estabelecido Poder Executivo dos seguintes elementos: “I - os pela lei. Já os programas educacionais são parâmetros técnicos de qualidade e desempenho da transmitidos sempre em horários de pouca execução e exploração do serviço; II - os requisitos audiência, como a madrugada e o início do dia. para a integração, efetiva ou potencial, ao Sistema Um dos poucos recursos para protestar contra Nacional de Telecomunicações, do serviço de TV a Cabo o conteúdo de baixa qualidade é o Ministério Pú- e das redes capacitadas para o transporte de sinais de blico, órgão do sistema de Justiça e segurança 48
  • 51. pública formado pela Procuradoria Geral da Repú- luta pela garantia do cumprimento do serviço blica e por escritórios estaduais. O Ministério Pú- público é a campanha “Quem financia a baixaria é blico recebe denúncias que, conforme sua validade contra a cidadania” (www.eticanatv.org.br), uma jurídica, são encaminhadas via ação civil pública iniciativa da Comissão de Direitos Humanos da aos tribunais. Por meio dele, várias ações de exa- Câmara dos Deputados. A campanha funciona por geros e mau uso do espaço de veiculação em ca- meio de uma articulação de entidades (que já está nais de emissoras já foram movidas contra as em 17 estados) e de uma coordenação que recebe empresas de mídia. É o caso da falsa entrevista e sistematiza denúncias de abusos na programação com um grupo pertencente à organização crimi- veiculada, divulgando periodicamente “rankings nosa denominada PCC (Primeiro Comando da Ca- da baixaria” e atuando junto aos anunciantes para pital) forjada pelo programa de entretenimento propor a retirada de apoio aos programas “Programa do Gugu”, onde a farsa foi descoberta. considerados abusivos. Com dois anos de O programa foi punido com suspensão temporá- funcionamento, a campanha já conseguiu criar um ria de exibição e o apresentador, multado. Outra debate público sobre a qualidade da programação. iniciativa é a reação do MP em apoio à campanha A campanha tem pressionado o parlamento “Quem financia a baixaria é contra a cidadania” para a aprovação de Projeto de Lei 1.600/03 de (que será abordada mais à frente) de propor acordos autoria do coordenador da iniciativa, o deputado com as emissoras para que estas retirem do ar Orlando Fantazzini (PT-SP), que institui um códi- programas policiais de cunho apelativo. No go de ética para a programação televisiva, com entanto, estes casos são raros devido à precarie- princípios como isenção, exatidão e respeito aos dade da legislação que os embasaria. direitos humanos. Apesar da campanha ser uma Um dos avanços no cumprimento do serviço iniciativa que tem conseguido minimamente público dos meios vem sendo a nova política da capilarizar o debate sobre o controle público dos Radiobrás, empresa estatal de comunicação do meios, ela constrói seus parâmetros a partir de Executivo. Na gestão atual do governo federal, sob denúncias do público que não dependem de crité- a presidência do jornalista e pesquisador Eugênio rio algum, muitas vezes se baseando numa inter- Bucci, a Radiobrás e seus veículos têm desenvol- pretação moral subjetiva. vido uma comunicação que vem se aproximando A Radiobrás, empresa ligada à Secretaria de mais do caráter público. Embora faça uma Comunicação e Gestão Estratégica do Governo comunicação estatal, o processo de “publicização” Federal (Secom), opera cinco estações de rádio, da Radiobrás tem se manifestado tanto no con- dois canais de televisão, uma agência de notícias, teúdo editorial quanto na formulação deste, que uma radioagência e um serviço radiofônico via em alguns casos tem se utilizado de conselhos satélite. Sua agência e sua radioagência, que tra- para dar maior permeabilidade à sociedade na balham no sistema copyleft (o conteúdo pode ser definição das pautas. Em diversos momentos, a reproduzido com a citação da fonte) atingem um empresa pratica um jornalismo não vinculado ao número muito grande21 de veículos, principalmen- Estado, apresentado olhares críticos e te no interior do país. Assim como ela, as já cita- contrapontos em relação às versões do governo. das emissoras estatais-educativas reunidas na A TV Nacional, emissora estatal aberta, apresen- Associação Brasileira de Emissoras Públicas, tou, em 2005, nova programação baseada na Educativas e Culturais (Abepec) também vêm veiculação do conteúdo produzido nas emissoras atuando para garantir a prestação de serviço estatais-educativas de todos os estados, priman- público. do pela diversidade. Mas mesmo dentro do No campo da comunicação universitária, des- sistema de emissoras estatais-educativas se de 2000, as emissoras ligadas a estas instituições materializa o poder político e cultural de São Paulo, se organizam por meio da Associação Brasileira representado na TV Cultura como cabeça-de-rede de Televisão Universitária (ABTU). Segundo dados das emissoras deste tipo. da entidade, existem 49 canais22 controlados por instituições de ensino superior e mais de 100 universidades produzindo algum tipo de conteú- PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES do em vídeo. Embora seja possível comemorar o rápido crescimento do setor de TVs universitárias, Uma ação que vem mostrando resultados na é importante registrar a crítica que já é feita há 21. Não há dados que comprovem o número exato de veículos que usam o conteúdo produzido pela Radiobrás. 22. Estes canais não são apenas os previstos na Lei da Cabodifusão. Há casos de canais de TV aberta, como a TV Universitária de Recife (PE). 49
  • 52. anos principalmente pela Executiva Nacional dos regulação no projeto a ser encaminhado ao Con- Estudantes de Comunicação Social (Enecos) de que gresso, mantendo apenas a idéia de uma agên- estas TVs têm realizado um tipo de comunicação cia de fomento. Foi anunciada, então, a propos- mais institucional do que pública. ta de que o processo de regulação seja tratado No âmbito do Judiciário, a atuação do Ministé- numa Lei Geral da Comunicação de Massa, que rio Público tem sido articulada principalmente em cobriria não apenas a produção de conteúdo torno das Procuradorias Federal e Regionais dos audiovisual, mas todas as etapas relacionadas à Direitos do Cidadão (PFDC e PRDCs). Está sendo produção, distribuição e infra-estrutura de toda criado um grupo dentro deste órgão no intuito de a comunicação de massa no país. O projeto ori- unificar a atuação do MP nos casos de abusos nos ginal da Lei do Audiovisual não fazia menção à meios de comunicação. Este grupo já está radiodifusão sonora e à televisão pública e aca- estabelecendo diálogo com emissoras com o bava mantendo a separação entre conteúdo, dis- objetivo de tirar programas policiais do ar. tribuição e estrutura. O debate da Lei do Audiovisual evidenciou a força dos empresários (não somente os ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS FUTURAS radiodifusores, mas também os exibidores), que intensificaram as críticas com o objetivo de dimi- O Ministério da Cultura apresentou, em 2004, nuir toda a taxação e punição para os abusos eco- um projeto de lei para o Audiovisual. A proposta nômicos. Esta pressão já teve resultado, provo- tem o objetivo de fazer a regulação do conteúdo cando alterações na proposta do governo federal, independente do meio de comunicação, além de como a diminuição da taxação sobre a publicida- estipular taxas sobre cópias de produções de de 4% para 3% e sobre filmes com mais de 300 estrangeiras e anunciantes de publicidade, com cópias de R$ 600 mil para R$ 50 mil, além da intuito de criar um fundo para o desenvolvimento alteração do valor máximo das multas, que che- de todo o setor. Ela define um sistema de gou à redução do teto para uma das infrações de regulação que é operado por um conselho com R$ 5 milhões para R$ 100 mil. participação da sociedade civil, do setor produtivo, Do outro lado, as entidades progressistas da da Agência Nacional do Audiovisual (Ancinav) e sociedade civil têm manifestado apoio à propos- órgãos do Estado (Ministérios da Cultura e das ta com abaixo-assinados e dentro do Conselho Comunicações). O projeto vem sendo alvo de Superior de Cinema, espaço institucional onde intensos debates, com o empresariado criticando esta vem sendo analisada pelo conjunto da soci- qualquer regulação de um lado e o movimento de edade representado no órgão. A divisão nas vi- audiovisual defendendo regras e incentivos à sões sobre o tema está inclusive causando uma produção do outro. reorganização nas entidades, como é o caso do O processo demonstra o Ministério da Cultura Congresso Brasileiro de Cinema (CBC), que como órgão do governo que mais se aproxima da vivenciou a saída das organizações ligadas aos defesa da concepção da comunicação como direito exibidores e empresários. Essas organizações se e bem público e, conseqüentemente, como alvo uniram para criar o Fórum do Audiovisual e do de políticas públicas e regulação. Cinema (FAC), uma nova entidade que congrega No entanto, no início de 2005, o governo agentes conservadores do setor. anunciou a intenção de não incluir o processo de 50
  • 53. A 5.6 - Medidas efetivas para assegurar acessibilidade, até mesmo econômica, às mídias relevantes (inclusive jornais e televisão) e conteúdos, especialmente por parte de grupos culturais e lingüísticos marginalizados. Por exemplo, regimes de impostos diferenciados, difusão livre em TV aberta, obrigar os operadores de rede a aceitar os canais (must-carry) etc. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES Não há garantia nenhuma na legislação brasi- As TVs Câmara e Senado foram criadas a partir leira de acesso plural da população a mídias rele- da aprovação da Lei da Cabodifusão e desde en- vantes. tão estão em atividade. No plano nacional, elas A única lei que contém elementos nesse senti- têm conseguido desenvolver relativa independên- do é a 8.977/95 (cabodifusão), que estabeleceu a cia das influências políticas do parlamento, e obrigatoriedade das operadoras de TV a cabo de, construído uma linha editorial mais próxima da na sua área de prestação de serviço, reservarem reflexão e da problematização das pautas do seis canais básicos de utilização gratuita: 1) canal parlamento. comunitário aberto para utilização livre por enti- Como já dito, o Ministério da Cultura tem as- dades governamentais e sem fins lucrativos; 2) sumido papel importante na disputa interna do Senado; 3) Câmara Federal; 4) canal do Legislativo governo federal sobre as políticas de comunica- municipal/estadual (para ser compartilhado entre ção. Com um olhar voltado para a compreensão as duas assembléias); 5) canal universitário; e 6) da comunicação e da cultura como direitos, ele canal educativo-cultural, para ser utilizado pelos tem desenvolvido ações e proposto normas (como órgãos do governo que tratam de educação e cul- os Pontos de Cultura e a Lei do Audiovisual) com- tura em âmbito municipal, estadual e federal. Pos- prometidas com a efetivação desses conceitos. A teriormente, foi acrescentado o canal da Justiça. iniciativa da criação da Agência Nacional do Ci- nema e do Audiovisual (Ancinav) era muito im- portante, mesmo com as concessões que o Mi- IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO nistério vinha fazendo para os empresários du- rante a formatação da proposta que iria ao Con- Em relação aos canais de caráter público que gresso Nacional (antes da decisão do governo de cada distribuidora de serviços de TV a cabo deve transformá-la em simples agência de fomento). veicular, há ainda muitos espaços ociosos em to- dos eles. No entanto, não existem estudos ou pes- quisas que apresentem um quadro nacional das ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS emissoras e que avaliem o aproveitamento destes canais, já que as operadoras colocam obstáculos Em relação ao governo federal, há hoje dois ou se recusam a transmiti-los. Destes canais, os projetos que trabalham com a lógica da necessi- dois ligados ao parlamento (TV Câmara e TV dade de garantir à população de baixa renda e/ou Senado) vêm desempenhando papel importante marginalizada acesso a mídias relevantes. Um de socialização do processo legislativo para a deles é uma proposta do Ministério da Integração população. As sessões em plenário são filmadas e Nacional, em parceria com a Radiobrás, de insta- transmitidas ao vivo, bem como reunião de lação de sete rádios na região do Alto Solimões comissões temáticas das duas casas. Além disso, (na Amazônia), onde a ocorrência de meios de os canais realizam um trabalho de desmistificação comunicação é extremamente baixa. A iniciativa do legislativo para a população, explicando a não trabalha somente com a idéia de acesso à in- legislação e seus impactos. Todavia, é importante formação, mas também à produção dela. Ela pre- lembrar que estes canais ficam restritos apenas à vê a gestão e a elaboração do conteúdo destas audiência das operadoras de TV a cabo, sem falar rádios com participação da comunidade por meio no problema da bitributação, já analisado do sistema de conselhos e tem como objetivo cons- anteriormente. tituir uma real rede de rádios públicas na região. Outro projeto é chamado Pontos de Cultura. A iniciativa do Ministério da Cultura visa instalar 51
  • 54. centros de produção de conteúdo em todo o país so aos meios de comunicação e informação pos- por meio do fornecimento de estruturas e equipa- suem hoje foco mais centrado nas Tecnologias mentos como computadores, câmeras, gravado- da Informação e da Comunicação (que serão abor- res e editores. Inicialmente, 65 pontos estão em dadas no pilar D) e não nas mídias escritas e que processo de implantação através de parcerias com recebem radiodifusão de sons e imagens. No en- entidades da sociedade civil (podem chegar a 100). tanto, o projeto Casa Brasil, se concretizado e Dentro do governo federal, estuda-se um projeto consolidado dentro do governo federal, pode que amplia o Ponto de Cultura e os telecentros23 apontar para a criação de centrais comunitárias que estão em implantação em projetos de diver- de comunicação, com produção de conteúdo para sos órgãos do Estado24 e cria Casas Brasil. Estes ser veiculado por estruturas de telecomunicações, espaços congregariam um telecentro, um Ponto radiodifusão, imprensa e exibição direta. Ainda de Cultura, pontos de bancarização e de presença assim, ele corre o risco de esbarrar no tratamen- do governo federal. Este projeto será melhor ex- to dado às rádios comunitárias já descrito e ana- plicado e analisado no Pilar D. lisado no item A5.4. As políticas e medidas de promoção do aces- 23. Espaços públicos de acesso comunitário à internet 24. Hoje no governo, como será abordado no Pilar D, existe uma série de iniciativas de instalação de telecentros em projetos que vão desde empresas estatais (como a Petrobrás e o Banco do Brasil) até os próprios ministérios. 52
  • 55. A5.7. Medidas efetivas, de acordo com a necessidade, para enfrentar a representação inadequada ou torpe de mulheres, grupos étnicos, grupos mais pobres e marginalizados por parte da mídia. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL buna do Norte no dia 29 de abril, apresenta o rosto de uma mulher espancada com a chamada “Mecâ- A Lei 7.716/89, em seu artigo 20º, estipula pena nica, funilaria e pintura Via Costeira. Tá na cara de um a três anos para quem “praticar, induzir ou que precisa”. incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, No dia 14 de junho de 2003, o Ministério Pú- etnia, religião ou procedência nacional”. blico do Rio Grande do Norte emitiu um termo O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA - de ajustamento de conduta que obrigou a con- Lei 8.069/90) define em seu artigo 247 como in- cessionária Via Costeira e a agência Lúmina a pro- fração administrativa, passível de pena de três a moverem um evento sobre a violência contra a vinte salários, o ato de “divulgar, total ou parcial- mulher, cabendo à concessionária cobrir a parte mente, sem autorização devida, por qualquer meio de financeira, particularmente a locação do auditó- comunicação, nome, ato ou documento de procedi- rio e o pagamento do material de divulgação, mento policial, administrativo ou judicial relativo à produzido pela Lúmina. Além disso, o procura- criança ou adolescente a que se atribua ato dor de Justiça Eduardo Cavalcanti, que elaborou infracional”. Da mesma forma, o Estatuto do Idoso o termo, determinou que este fosse publicado (Lei 10.741/03) define, em seu artigo 105, como em um espaço correspondente a um quarto de crime “exibir ou veicular, por qualquer meio de página do jornal que veiculou a mensagem pu- comunicação, informações ou imagens depreciativas blicitária, sob responsabilidade da Via Costeira, ou injuriosas à pessoa do idoso” , podendo o e no Diário Oficial do Estado. A repercussão na- condenado pegar até três anos de pena. cional e internacional do caso foi tão grande que motivou um cidadão da Alemanha a escrever uma carta à matriz da Volkswagen pedindo um pro- IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO nunciamento sobre o comportamento da sua con- cessionária em Natal. Durante a pesquisa, foi notada a escassez de Há outros exemplos como esse de sentenças material sobre a efetividade dessas leis. A maioria oriundas de denúncias feitas por movimentos so- dos instrumentos legais que visam ao combate ciais que trabalham contra a discriminação de gê- ou à diminuição da representação distorcida de nero, raça ou identidade sexual. Recentemente, a grupos marginalizados tem apresentado poucos Justiça concedeu direito de resposta coletivo aos resultados práticos. Além disso, nestes poucos praticantes de religiões afro-brasileiras, vítimas de instrumentos, não há uma preocupação explícita preconceito em programas da TV Record e Rede com a contribuição dos meios de comunicação para Mulher. A ação civil pública que originou a a discriminação dos grupos sociais protegidos por condenação havia sido interposta pela cada instrumento. Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão de O maior movimento de denúncia e combate São Paulo em novembro de 2004. aos preconceitos e violações dos direitos de seg- mentos marginalizados da sociedade dissemina- dos pela mídia é a já citada campanha “Quem fi- PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES nancia a baixaria é contra a baixaria”. Diversas ações civis têm acionado a Justiça brasileira com Os principais atores contra a representação ina- relação a casos de disseminação de preconceitos dequada têm sido os movimentos sociais ligados e discriminação de etnia, cor, gênero, religião e a estas categorias, como o Instituto Patrícia Galvão, outros tipos. a Marcha Mundial de Mulheres, o Movimento Ne- Um exemplo é a condenação por parte do Mi- gro Unificado e a Associação Brasileira de Gays, nistério Público do Rio Grande do Norte, no pri- Lésbicas, Bissexuais e Transgêneros. Suas denún- meiro semestre de 2003, da concessionária Via cias têm colocado na pauta a discussão sobre a Costeira e da agência de publicidade Lúmina por forma discriminatória como a mídia, principalmen- utilizarem a banalização da violência contra a mu- te os programas de entretenimento e as peças lher para vender serviços oferecidos pela empresa publicitárias, vem tratando os marginalizados. Em automotiva. O anúncio, publicado no jornal Tri- 2003, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem 53
  • 56. Terra (MST) adensou o debate com a iniciativa de punido na forma das leis específicas”. uma jornada pela Democratização da Mídia, que O projeto de lei que trata da criação do Estatu- teve no mês de novembro atos em grandes cidades to da Igualdade Racial (PLS 213/03) em seu artigo do país, mas acabou não tendo continuidade. 4º, parágrafo VIII, prevê que "VII – implementação No campo da comunicação, destaca-se a já ci- de programas de ação afirmativa destinados ao tada campanha pela ética na TV. Há uma série de enfrentamento das desigualdades raciais nas esferas organizações, principalmente ONGs, que já de- da educação, cultura, esporte e lazer, saúde, trabalho, senvolveram ações no monitoramento da mídia mídia, terras de quilombos, acesso à justiça, em relação ao tratamento de marginalizados. É financiamentos públicos, contratação pública de o caso da Agência de Notícias dos Direitos da serviços e obras e outras”. Na mídia, o projeto propõe Infância (Andi), que desenvolve periodicamente cotas de, no mínimo, 20% para atores afro- pesquisas sobre o tratamento dado pelos gran- descendentes em programas de televisão e peças des meios à cobertura de questões envolvendo publicitárias. crianças e adolescentes. A melhor perspectiva de ampliação das denún- cias de conteúdos discriminatórios veiculados em meios de comunicação é através da campanha ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”. Os rankings periodicamente divulgados e pauta- O Projeto de Lei que propõe o Estatuto da dos na própria mídia têm gerado um debate pú- Mulher (PL 1.399/03) assegura, em seu artigo 4º blico, ainda que tímido, sobre os programas e a que “nenhuma mulher será submetida a tortura nem discriminação em questão. A atuação do Ministé- a tratamento desumano ou degradante, discrimina- rio Público, também já citada, é outro elemento ção, exploração, violência, crueldade e opressão, importante para esta luta. 54
  • 57. A 5.8 - Apoio a medidas nas instituições e fóruns multilaterais que assegurem a proteção e o apoio a mídias nacionais, inclusive, por exemplo, o direito a discriminar em favor empresas e canais locais, e para regular conteúdo originário de fora. O principal fórum internacional na área da Co- para operar essa formulação. municação é a Cúpula Mundial sobre a Sociedade O Brasil (Estado e sociedade civil) se prepara da Informação (CMSI). A posição do governo federal também para a intervenção no processo interna- vem sendo elaborada em três eixos: gestão do cional de debate sobre a diversidade cultural, que conhecimento e software livre, governança na tem como horizonte próximo a aprovação de uma Internet e solidariedade digital. No primeiro, no convenção sobre o tema no âmbito da Unesco Brasil é hegemônica a posição de defesa do (Organização das Nações Unidas para a Educação, software livre e do compartilhamento do conheci- a Ciência e a Cultura) em outubro de 2005. mento como condição para o desenvolvimento As posições do Brasil durante a reunião social dos países, principalmente os periféricos. O intergovernamental de fevereiro de 2005 privile- governo faz dura crítica às regras de propriedade giaram, de maneira geral, os aspectos culturais intelectual que só beneficiam a produção de co- em relação aos econômicos e mereceram elogios nhecimento que está basicamente nos países ricos de representantes de organizações não governa- e que instituem uma lógica de subordinação do mentais que estiveram presentes. O fato é bastan- conhecimento. te positivo porque, até o momento, o governo No segundo eixo, tem mais força a posição de brasileiro era acusado de ter uma postura dúbia a levar a gestão mundial da Internet para um orga- respeito da Convenção. nismo multilateral como a União Internacional de Por um lado, o Ministério da Cultura é visto Telecomunicações (UIT) (ou a criação de um novo como defensor de um texto mais avançado e com órgão específico no interior da Organização das instrumentos concretos que garantam a implan- Nações Unidas). A idéia é tirar o domínio da tação de políticas de diversidade cultural. De ou- definição das políticas da Internet Corporation for tro lado, os Ministérios da Fazenda, Indústria e Assigned Names and Numbers (ICANN), entidade Comércio e Agricultura tendem a priorizar a atua- privada sediada nos EUA. ção brasileira na Organização Mundial do No terceiro eixo, o Governo trabalha com a Comércio (OMC) e garantir que a cultura se adeqüe proposição de fundos de solidariedade digital para às regras do comércio internacional. Também a incluir digitalmente os países mais pobres de Globo, exportadora de audiovisual e compradora forma a garantir sua independência tecnológica de diversos programas norte-americanos, tem ou incentivá-la por meio da produção de funcionado como instrumento de pressão contra conhecimento baseado em software livre e na uma posição mais avançada do Brasil. capacitação de programadores e desenvolvedores 55
  • 58. A5.9. Medidas efetivas para impedir que a propaganda exerça uma influência negativa sobre a esfera pública, por exemplo com a identificação ostensiva, limitação do volume de propaganda e de conteúdo político ou religioso. Os gastos públicos em propaganda também podem ser usados para apoiar a esfera pública. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL público e/ou social. A base legal da Constituição não tem funcionado como instrumento de defesa Em diversos artigos, a Constituição Federal do público em relação aos abusos da publicidade coloca a proibição de peças publicitárias que exer- comercial. O casuísmo é muitas vezes utilizado çam influência negativa na esfera pública. O artigo para adequar ou contornar os preceitos legais 5º, inciso XLI, afirma que “a lei punirá qualquer dis- diante da indústria da publicidade e seus parceiros. criminação atentatória dos direitos e liberdades fun- Exemplo disso foi a Medida Provisória editada pelo damentais”. O artigo 220, § 3º, inciso II, diz ser governo (em abril de 2003, por ocasião do Grande papel do Estado Brasileiro “estabelecer os meios Prêmio de Fórmula 1 realizado em São Paulo) que legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade adiou para 2005 a entrada em vigor da lei federal de se defenderem de programas ou programações de que proíbe a propaganda de cigarros em eventos rádio e televisão que contrariem o disposto no art. esportivos. 221, bem como da propaganda de produtos, práticas e serviços que possam ser nocivos à saúde e ao meio ambiente”. PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES O artigo 220, § 4º, estabelece que “a propagan- da comercial de tabaco, bebidas alcoólicas, Os atores da luta contra as influências prejudi- agrotóxicos, medicamentos e terapias estará sujeita ciais que a propaganda pode exercer na sociedade a restrições legais, nos termos do inciso II do parágrafo são os mesmos relatados anteriormente que con- anterior, e conterá, sempre que necessário, advertên- testam o tratamento discriminatório dado aos mar- cia sobre os malefícios decorrentes de seu uso”. O artigo ginalizados pela mídia. A propaganda é uma face 227 afirma ser “dever da família, da sociedade e do do preconceito manifesto na programação dos Estado assegurar à criança e ao adolescente, com meios de comunicação. absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, Há uma movimentação no interior da campa- discriminação, exploração, violência, crueldade e nha “Quem financia a baixaria é contra a cidada- opressão”. nia” para incluir a publicidade nas análises, dada sua influência na sociedade. No Congresso Nacio- nal tramita o Projeto de Lei 5.921/01, de autoria IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO do deputado federal Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), que proíbe a propaganda de produtos infantis. Já A publicidade de cigarros foi limitada a displays foi aprovada na Comissão de Defesa do Consumi- nos pontos de venda, tendo sido proibidos os dor e segue a tramitação na Câmara. A proposta anúncios em rádios, jornais e TV. Para bebidas e visa estabelecer o impedimento já existente em medicamentos, foi instituída a obrigatoriedade da outros países. Na Suécia, foi proibida qualquer pro- veiculação de advertências em relação ao risco para paganda dirigida ao público infantil ou mesmo saúde. protagonizada por crianças. Em Portugal, está Em função da autonomia plena do Conselho sendo realizado estudo a respeito. Quando Nacional de Auto-regulamentação Publicitária presidiu a União Européia, a Suécia propôs esta (Conar)25, a publicidade comercial não é objeto, proibição para todo o bloco, mas teve a proposta na prática, de nenhum dispositivo de controle rejeitada. 25. Ver item 6.4 56
  • 59. Tema transversal: O setor cinematográfico Existe uma temática em relação a este indica- ra técnica, específicos da área audiovisual, sendo dor (A5) que entendemos ser transversal e não estar vedada, entretanto, a aquisição, reforma ou cons- totalmente contemplada pelo recorte dos nove trução de imóveis para tais fins cinematográficos. sub-indicadores definidos, que é a situação do No entanto, as duas leis estão baseadas na idéia setor cinematográfico no país. de renúncia fiscal, que pode chegar a 124%. Os O setor cinematográfico brasileiro vem se re- investidores escolhem, entre as dezenas de proje- cuperando depois de um período crítico no início tos certificados pelo Ministério da Cultura, aquele dos anos 90, durante o governo Fernando Collor em que querem investir, e deduzem o valor inte- de Melo, quando foram extintos incentivos fiscais gral (ou mais, no caso dos 124% citados acima) de para a área cultural bem como os órgãos que fi- seu imposto de renda. Assim, a lei, na prática, nanciavam a produção, distribuição e exibição de permite que as empresas guiem as políticas cultu- filmes nacionais, como o Ministério da Cultura, a rais que são feitas inteiramente com recursos pú- Fundação do Cinema Brasileiro, o Conselho blicos, e ainda se beneficiem da publicidade de- Nacional de Cinema (Concine) e a Embrafilme. Os las. mecanismos que rearticularam tais processos foram A criação de escritórios regionais da Ancine pelo frutos da luta posterior dos cineastas. Hoje a país está prevista na Medida Provisória 2228-1, regulação e a definição de políticas para setor estão mas existem dificuldades operacionais para isto. sob a responsabilidade da Agência Nacional de A descentralização da Ancine com a criação dos Cinema (Ancine), instituída pela na Medida Provi- escritórios regionais cria expectativa na fiscaliza- sória 2.228-1, de 6 de setembro de 2001. Suas ção da legislação dos mercados regionais e na principais tarefas junto ao Ministério da Cultura transparência das atividades da agência junto à (MinC) são a análise, a aprovação e o acompanha- sociedade civil. mento dos projetos cinematográficos, relativos aos O conjunto desses instrumentos constitui a benefícios das Leis 8.313/91 e 8.685/93. política brasileira na área, sinalizando uma consi- Criado pela Medida Provisória 2.228-1, o derável presença estatal, incentivando direta (por Conselho Superior de Cinema (CSC) é um órgão empresas estatais) ou indiretamente (por deliberativo e consultivo ligado à Casa Civil da incentivos fiscais a instituições privadas) tais obras. Presidência da República. Ele é formado por nove Seguindo o padrão brasileiro das leis de ministros de Estado, seis especialistas do setor (e incentivo à cultura, até agora as leis de cinema seus suplentes) e três representantes da socieda- trabalharam exclusivamente sobre a produção, não de civil (e seus suplentes). Entre suas atribuições sobre a distribuição. “Hoje, no Brasil, 80% do que está formular a política nacional do cinema. Tra- é veiculado nas salas de cinema são filmes ta-se de um interlocutor qualificado, pois congre- produzidos nos Estados Unidos. Na TV, esse índice ga Estado e entidades civis para analisar as políti- chega a 90%. A TV atinge 41,5 milhões de cas públicas de audiovisual. domicílios. Exatamente o veículo que permitiria A Lei de Incentivo à Cultura, ou Lei Rouanet o acesso da população ao cinema nacional (Lei 8.313/91), institui o Programa Nacional de restringe mais do que as próprias salas de cinema. Apoio à Cultura (Pronac), cuja finalidade é a Existe aqui apenas uma sala de cinema para cada captação e canalização de recursos para os diversos 110 mil brasileiros. Essas salas de cinema estão setores culturais, para facilitar o acesso, produção concentradas em apenas 7% dos municípios e o e difusão pública das fontes da cultura. Já a Lei do filme brasileiro é exibido, no máximo, em 1% de Audiovisual (Lei 8.685/93) cria mecanismos espe- nossas cidades. O mercado brasileiro de vídeo e cíficos de incentivo fiscal para a atividade DVD, significativo para o cinema americano, é audiovisual. Permite que os investimentos reali- quase inexistente para as produções nacionais”26. zados na produção de obras audiovisuais cinema- Nessa conjuntura, se destaca o atual papel dos tográficas brasileiras de produção independente festivais que ocorrem no Brasil, como substituto sejam deduzidos do imposto de renda, e que se- do mercado, pois é uma das raras oportunidades jam viabilizados, pelos mesmos incentivos fiscais, de se ver filmes brasileiros. Se por um lado talis projetos de exibição, distribuição e infra-estrutu- filmes atingem, de uma só vez, um número 26. Ideli Salvatti, senadora (PT-SC), em artigo publicado em O Globo em 30/08/2004. 57
  • 60. considerável de pessoas, esta vitrine não tem uma seqüência comercial em grande parte dos casos. Outro fator desarticulador de espaços para fil- mes brasileiros é o desaparecimento de salas de exibição em cidades do interior, onde o cinema nacional tinha mais público (sendo substituído pela TV). Além disso, também influencia para essa desarticulação a subseqüente construção de cinemas multiplex, que são geralmente vincula- dos a grandes redes de distribuidores de cinema e a grandes shoppings centers. A perspectiva de transformar o setor cinematográfico, descentralizando a produção e distribuição, está na disputa pela aprovação do projeto do Ministério da Cultura que cria a Ancinav, já analisado neste estudo. 58
  • 61. A 6 - Participação efetiva por parte de todos os elementos da sociedade civil na preparação, implementação e avaliação de estruturas e políticas de governança da mídia. A 6.1 - Consultas públicas abertas e extensivas e participação no desenvolvimento de políticas para a mídia, inclusive em instituições e fóruns inter- governamentais. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL mente: III – propor a realização de consultas públicas, visando propiciar a efetiva participação dos diversos O Decreto 2.338/97, que aprova o Regulamento segmentos da sociedade na proposição de políticas, da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), diretrizes, objetivos e metas referentes aos serviços de afirma, em seu artigo 16, que “à Agência compete radiodifusão, seus ancilares e auxiliares”. adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, e especialmente: (...) III IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO – elaborar e propor ao Presidente da República, por intermédio do Ministro de Estado das Comunicações, Em nível nacional, é comum a realização de a adoção das medidas (...) submetendo previamente a consultas públicas, para sugestões e comentários consulta pública às relativas aos incisos I a III”. O acerca de normas, projetos técnicos e projetos de mesmo decreto ainda estipula em seu artigo 67 lei, através da internet. Estas consultas são reali- que “as minutas de atos normativos serão submeti- zadas tanto pelos órgãos do Poder Executivo das a consulta pública, formalizada por publicação no quanto por agências reguladoras (como a Anatel Diário Oficial da União, devendo as críticas e sugestões e a Agência Nacional de Cinema). No entanto, este merecer exame e permanecer à disposição do público instrumento é muito limitado, pois é apenas um na Biblioteca, nos termos do Regimento Interno”. levantamento de posições da sociedade sem O Regimento Interno27, em seu artigo 3º, ca- qualquer garantia de que estas se façam ouvidas. racteriza a consulta pública como “procedimento As propostas em consulta recebem comentários e administrativo que submete documento ou assunto [e contribuições, mas esta forma de suposto diálogo também atos normativos, como explicita o artigo 47 tem tido mais serventia para justificar um discurso do referido documento] a comentários e sugestões do de participação social que na verdade não se público em geral”, sendo responsabilidade do efetiva. A limitação já se exprime na forma em que Conselho Relator encaminhar as sugestões colhidas é feito, por meio da internet, ser viço de ao Conselho Diretor, que julgará a medida ou ato comunicação a que menos de 15% da população em instância final. O parágrafo único do artigo 49 dispõe de acesso. obriga o Conselho Diretor a, antes de editar a Há também o instrumento das audiências pú- resolução, analisar as sugestões encaminhadas, blicas, seminários e eventos similares. Porém, eles “devendo expor em documento próprio as razões para geralmente funcionam como a consulta, com po- a adoção ou não das medidas, que será arquivado na der limitado de intervenção da sociedade, ocor- Biblioteca, ficando à disposição de todos os rem em espaços restritos (fisicamente), com divul- interessados”. gação pequena (voltada unicamente aos principais O Regimento Interno do Ministério das Comu- atores políticos do setor), e quase sempre aconte- nicações28, em seu artigo 237, define como incum- cem apenas na capital federal. Em geral, são con- bência do Secretário de Serviços de Comunicação vocados pelo legislativo no momento do debate Eletrônica “planejar, dirigir, coordenar, orientar, acom- sobre propostas em tramitação nas casas (Câmara panhar e avaliar a execução das atividades das dos Deputados e Senado Federal). unidades que integram sua Secretaria e, especifica- 27. Anexo da Resolução Anatel 270/01 28. Anexo à Portaria 313, de 23/06/03 59
  • 62. PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS Em sua maioria, os movimentos sociais e as A reflexão acerca da criação de instrumentos organizações civis do campo da comunicação não que reforcem o sentido “público” das políticas para possuem propostas estratégicas nem discutem a área da comunicação ganhou novamente a pau- regularmente a respeito da existência de instru- ta da sociedade com as propostas de Lei do mentos de participação na formulação e avaliação Audiovisual, do Conselho Federal de Jornalismo e de políticas da área de comunicação. Há uma for- do Sistema Brasileiro de Televisão Digital, já mulação encontrada notadamente no programa tratadas anteriormente. Com o debate pautado do Fórum Nacional pela Democratização da sobre a cultura, a informação e a difusão destes Comunicação (FNDC), que trata de controle públi- como elementos estratégicos, as discussões co e de espaços e instrumentos para que isso ocor- reacenderam a divergência entre, de um lado, os ra. Porém, não há iniciativas concretas (com exce- movimentos sociais e as entidades de classe e ção da luta pela instalação do Conselho de Comu- comprometidas com o direito à comunicação e, nicação Social, que será tratada no item A 6.3) nem de outro lado, o empresariado de comunicação. reivindicações por espaços e instrumentos que Enquanto os representantes do empresariado tenham ganhado a pauta dos movimentos sociais usam seus veículos para defender seu modelo de e do Estado. Geralmente, os movimentos sociais mercado desregulado e concentrador, os e as entidades atuam em questões pontuais e movimentos sociais pedem espaços de debate participam destes espaços com suas contribuições, mais abertos e participativos. mas sem a garantia de que suas opiniões Essas pressões produziram resultado, mesmo provocarão mudanças efetivas ou serão, pelo que limitado, em algumas destas pautas. No caso menos, levadas em consideração. da proposta de Lei do Audiovisual, como já foi O ouvidor da Anatel, em palestra proferida no apontado, o Ministério da Cultura colocou o Conselho de Comunicação Social do Congresso, projeto em consulta pública na Internet (lembran- lembrou que as contribuições feitas às consultas do do caráter excludente deste meio), mas não se públicas realizadas pela agência são originárias limitou a isso, realizando audiências em vários em grande medida dos “setores econômicos” da pólos de produção audiovisual para debater com comunicação. No entanto, a participação nas a sociedade, além de promover ampla discussão consultas não é o meio principal de atuação desses no Conselho Superior de Cinema, instância do setores, e sim o lobby no Congresso Nacional e Executivo com representação da sociedade civil nas esferas políticas em que determinada pauta organizada da área do audiovisual. está sendo encaminhada. Dois exemplos são a A discussão acerca do Sistema Brasileiro de Te- atuação das grandes empresas de telefonia junto levisão Digital vinha sendo feita basicamente em ao ministro da Fazenda brasileiro, Antônio Palocci, âmbito estatal, antes na esfera da Anatel e não do em 2003, para evitar que o então ministro das Ministério das Comunicações. Várias entidades Comunicações, Miro Teixeira, suspendesse o protestaram reivindicando a ampliação do debate reajuste das tarifas de telefonia por parte da Anatel; por meio da criação de espaços institucionais e as constantes demonstrações, visitas e reuniões participativos e ações como a realização de feitas por representantes dos modelos de TV digital audiências públicas nas Assembléias Legislativas dos EUA (ATSC), da Europa (DVB) e do Japão (ISDB) de todas as unidades da Federação. Foi criado um junto a dirigentes do Executivo envolvidos na Comitê Consultivo que, embora limitado – como definição do Sistema Brasileiro de Televisão Digi- todos os instrumentos consultivos (como já tal. explicitado acima) –, passou a ser um espaço onde o Executivo tem de prestar contas sobre o processo e tem de ouvir as entidades do setor. 29. www.fndc.org.br/doc_historico/data/programa.doc 30. www.senado.gov.br/web/comissoes/ccs/palestra.asp 60
  • 63. A6.2. Meios efetivos e dinâmicos que façam com que preocupações e reclamações públicas sejam ouvidas e atendidas, de acordo com as políticas de mídia. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL res, normalmente semestrais, com grande densi- dade; participa de debates públicos; sugere pro- A Lei Geral das Telecomunicações (9.472/97) cedimentos e cobra medidas do Conselho Diretor prevê como parte da estrutura da Agência Nacio- para que os objetivos da Agência sejam atingidos. nal de Telecomunicações (Anatel) uma ouvidoria A Anatel possui ainda um serviço de atendimento que tem como função dar mais transparência ao por telefone gratuito que se coloca como canal de órgão e aproximar a agência da sociedade. A acesso da população à agência. Só em 2004 mesma norma estipula que o ouvidor será indicado começou a ter efeito a fiscalização da Anatel, que pelo Presidente da República para um mandato apertou o cerco contra as operadoras móveis. A de dois anos. Agência tem publicado um ranking das Ele tem acesso a todos os assuntos e conta com operadoras com mais reclamações e daquelas que o apoio administrativo que lhe for necessário, mais dão encaminhamento às reclamações “competindo-lhe produzir, semestralmente ou recebidas. Em 2005, a Anatel anunciou a intenção quando oportuno, apreciações críticas sobre a atu- de praticar o mesmo rigor em relação às ação da Agência, encaminhando-as ao Conselho operadoras de telefonia fixa. Contudo, este direito Diretor, ao Conselho Consultivo, ao Ministério das do usuário muitas vezes serve para legitimar a Comunicações, a outros órgãos do Poder Executi- política da Anatel, como o número 0800 33 2001, vo e ao Congresso Nacional, fazendo publicá-las pelo qual o cidadão pode denunciar rádios não para conhecimento geral” . A norma garante tam- legalizadas (apontadas como “clandestinas”)32. bém ao ouvidor independência e estabilidade no O Comitê de Defesa dos Usuários de Serviços cargo, não o submetendo hierarquicamente a ne- de Telecomunicações ainda não se consolidou de nhuma das instâncias da agência. fato. A última reunião ocorreu em dezembro de A resolução 107/99 da ANATEL cria o Comitê 2000. Depois disso, ficou cerca de dois anos es- de Defesa dos Usuários de Serviços de Telecomu- quecido pela direção da Anatel e somente após nicações, uma instância da agência que visa re- cobrança do ouvidor foi colocado em processo de presentar os interesses dos usuários, especialmen- reativação, estado em que se encontra até hoje. te nas modalidades Serviço de Telefone Fixo Existe ainda um projeto de lei (PL 110/95), de au- Comutado (STFC) e Serviço Móvel Pessoal (SMP), e toria do senador Pedro Simon (PMDB-RS), que pro- tem como finalidade “assessorar e subsidiar o Con- põe a criação de um serviço de ouvidoria (deno- selho Diretor da Anatel no exercício de suas com- minado “serviço de atendimento ao público”) nas petências legais em matéria de controle, prevenção emissoras de rádio e TV do país. Entretanto, o PL e repressão das infrações dos direitos dos usuári- foi arquivado em 1999. Atualmente, a Folha de os de Serviços de Telecomunicações”. S.Paulo é um dos poucos veículos que conta com É papel do comitê apresentar ao Conselho Di- um ombudsman, com mandato fixo, estabilidade retor diretrizes para a avaliação, controle e acom- no emprego e independência em relação à linha panhamento dos serviços por parte dos usuários, editorial do jornal. além de medidas e métodos de resoluções de pro- blemas, insatisfações e denúncias. Ele é compos- to de membros da Anatel e de representantes de PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES usuários dos serviços fiscalizados pela agência. Nos últimos anos, houve um enfraquecimento da atuação da sociedade civil na área de IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO telecomunicações, que após a privatização ficou principalmente a cargo do movimento sindical, no A Ouvidoria da Anatel, ainda que seja restrita caso a Federação dos Trabalhadores em Empresas ao âmbito das telecomunicações, tem se mostra- de Telecomunicações (Fittel). É relativa a análise do bastante atuante. Apresenta relatórios regula- sobre um possível abrandamento da atuação da 31. Lei 9.472/97, artigo 45 32. O papel da Anatel na repressão às rádios livres e comunitárias não-legalizadas já foi abordado no item A5. 61
  • 64. Fittel em relação ao governo federal, mas é possí- vel dizer que suas relações com o Executivo ga- nharam força na gestão de Luiz Inácio Lula da Sil- va, quando a federação indicou o primeiro Secre- tário-Executivo do Ministério das Comunicações, José Guimarães Palácios, e o presidente da Anatel naquele exercício, Pedro Jaime Ziller, além do pró- prio ouvidor da agência, Aristóteles dos Santos. ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS Todas as iniciativas que vão no sentido de efe- tivar as reivindicações dos movimentos sociais, sejam da área de comunicação ou não, já foram relatadas em outros atributos e indicadores. Eles passam pela campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”, pela reivindicação de um Conselho de Comunicação Social (CCS) com poder de definição de políticas e pelos processos decisórios da área de comunicação. 62
  • 65. A6.3. Mecanismos permanentes para participação independente e direta do público na revisão e implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando apropriado – por exemplo, através de conselhos públicos e conferências públicas periódicas, que contem com ampla participação da sociedade civil. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL mídia nacional foi rapidamente colocada como pri- oridade na pauta do parlamento, por conta da cri- A Constituição Federal, em seu artigo 224, pre- se financeira que assolou as empresas de comuni- vê que o Congresso Nacional instituirá, “como seu cação de capital nacional. Em poucos meses, foi órgão auxiliar, o Conselho de Comunicação Soci- aprovada na Câmara e no Senado. al”. Sua regulamentação aconteceu por meio da A instalação do CCS foi uma contrapartida Lei 8.389/91, que definiu como suas atribuições a exigida pelos partidos de oposição para que estes realização de estudos, pareceres, recomendações aceitassem a aprovação da PEC. Esta negociação solicitadas pelo Congresso Nacional a respeito de também incluiu a composição do Conselho. Ao fi- temas como: “a) liberdade de manifestação do nal, sua formatação foi muito ruim para os inte- pensamento, da criação, da expressão e da informa- resses da sociedade civil organizada, com a eleição ção; (...) d) produção e programação das emissoras de de um ex-advogado do jornal O Estado de S. Paulo, rádio e televisão; e) monopólio ou oligopólio dos meios o empresário da RBS Jayme Sirotsky e notáveis que de comunicação social; (...) g) promoção da cultura não representavam ninguém senão eles mesmos nacional e regional, e estímulo à produção indepen- nas vagas da sociedade civil. No final de 2004, dente e à regionalização da produção cultural, artística foram indicados os nomes para a segunda gestão e jornalística; (...) j) propriedade de empresa do CCS. A composição ficou ainda pior para a jornalística e de radiodifusão sonora e de sons e sociedade civil, com as vagas desse campo sendo imagens”, entre outros. Ele é composto de repre- ocupadas por empresários da comunicação, sentantes dos trabalhadores, empresários e de setores ligados à Igreja Católica, um advogado de membros da sociedade civil, que têm mandatos militância reconhecidamente conservadora e um de dois anos, com direito à recondução. ex-jornalista com ligações históricas com grupos Existem também experiências de conselhos de de mídia privada. abrangência não nacional no Brasil, cada um de- Hoje, decorridos dois anos de sua existência, o les com atribuições diferentes. Há conselhos em Conselho de Comunicação Social sofre inúmeros atividade no Estado de Alagoas e em alguns questionamentos, inclusive internos, por parte de municípios, como Porto Alegre (RS), Goiânia (GO) alguns conselheiros. As principais críticas se diri- e São Gonçalo (RJ). gem às limitações regimentais do órgão. Sendo meramente uma instância consultiva, nada garante que as posições do Conselho sejam acatadas pelo IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO parlamento. Além disso, a composição do órgão é restrita (4 representantes do empresariado, 4 re- Apesar de ter sido incluído na Constituição Fe- presentantes dos trabalhadores e 5 da sociedade deral de 1988, a materialização efetiva do Conse- civil), ficando longe de representar minimamente lho de Comunicação Social só ocorreu catorze anos a diversidade cultural e política dos segmentos depois, em junho de 2002, quando foram nomea- da sociedade brasileira e até mesmo do campo da dos e empossados os conselheiros titulares e su- comunicação. plentes para a primeira gestão. É importante res- O único benefício percebido pela maioria dos saltar que o CCS só foi instalado como fruto de atores políticos que analisam o CCS é a inserção barganha política33. No final de 2001, após passar dos debates da área na esfera do Estado. O Conse- mais de cinco anos parada no Congresso Nacio- lho opera através de reuniões presenciais ordiná- nal, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) rias, sessões extras, audiências públicas e que permitia a entrada de capital estrangeiro na congêneres. A regra geral das reuniões é a polari- 33. As teses que mostram as posições em relação a este processo pelos atores podem ser vistas no sítio do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, www.fndc.org.br/IX_plenaria/data/Lista_de_Teses.html 63
  • 66. zação do debate entre os representantes do neste sentido existem nos estados do Acre, Minas empresariado da mídia e a “bancada” das catego- Gerais (cuja Constituição Estadual prevê o órgão, rias de trabalhadores presentes no Conselho. desde 1989), Pará, Paraíba, Paraná, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo (através dos movimentos de direitos humanos) e Roraima. PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES Em Porto Alegre também ocorreu uma Confe- rência Municipal de Comunicação, onde foram Os atores que atuam nesse campo são os mes- deliberadas propostas que, caso fossem acatadas mos citados nos indicadores anteriores: FNDC (es- e implementadas pelo poder público local (como pecialmente Federação Nacional dos Jornalistas e o aperfeiçoamento do Conselho Municipal de Co- Federação Interestadual de Trabalhadores em Rá- municação), poderiam alterar bastante o quadro dio e Televisão) e Congresso Brasileiro de Cinema, da comunicação local. no campo da sociedade civil. Pelo empresariado, Em 2004, teve início também um movimento a Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e em busca da realização da primeira edição de uma Televisão (Abert) e a Associação Brasileira de Conferência Nacional das Comunicações. Em outros Radiodifusores (Abra) e outras entidades patronais. campos, como Meio Ambiente, Direitos Humanos etc., conferências nacionais, precedidas de etapas estaduais e municipais, vem acontecendo, com ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS mais intensidade, desde 2003. Apesar de inúmeros problemas verificados em vários momentos do Sabe-se que estão aumentando, por parte da processo, as conferências têm servido para sociedade, em várias localidades do país, as ações mobilizar e organizar a sociedade, assim como de pressão em prol da criação de conselhos muni- capilarizar as discussões relacionadas às políticas cipais e estaduais de comunicação. Movimentos públicas de cada setor. 64
  • 67. A6.4. Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO Como mecanismo de auto-governança, existe Em julho de 2004, foi realizada a eleição dos o Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGIBr), integrantes do CGIBr. A composição do Comitê visa criado pela Portaria Interministerial 147, de 31/ contemplar diversos setores da comunidade bra- 05/95, e alterado por inúmeras normas até a atual sileira intrinsecamente relacionada à internet: forma, dada pelo Decreto 4.829/03. Originalmen- quatro representantes do setor empresarial (pro- te, o Comitê foi vinculado aos Ministérios das vedores de acesso, conteúdo, infra-estrutura, in- Comunicações (MC) e de Ciência e Tecnologia dústria de telemática e usuários empresariais) e (MCT), mas com o último decreto ele assumiu per- seus respectivos suplentes; quatro representantes sonalidade jurídica própria. Sua função é coorde- do terceiro setor e seus respectivos suplentes e nar e implementar todas as atividades necessári- três representantes da comunidade científica e as à gestão eficiente e qualificada dos serviços de tecnológica e seus respectivos suplentes. Além de Internet. Isso significa operar desde a atribuição dez membros indicados pelo Poder Público. de endereços IP e registro de nomes de domínios Já o Conar trabalha sob demanda, ou seja, só até a recomendação de padrões e procedimentos atua quando há formulação de denúncia sobre técnicos para o desenvolvimento do setor, entre "quebra da ética publicitária", formulada por seus muitas outras tarefas. associados, por seus integrantes ou por outros Ele é formado por representantes do Poder atores da sociedade. Ao longo de 24 anos de Público (Ministérios, Executivos Estaduais, Anatel funcionamento, julgou mais de 4 mil casos. Em e Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientí- 2003, instaurou 368 processos. fico e Tecnológico); de empresários (provedores Apesar disso, é explícito, hoje, o abismo entre de conteúdo e infra-estrutura, indústrias de ele- a "ética publicitária" e a realidade da propaganda trônicos e empresas usuárias); do terceiro setor e comercial. Diariamente é possível constatar os um de notório saber no tema. A eleição das cadei- abusos cometidos através da difusão de estereóti- ras do terceiro setor é feita de forma democrática pos que estimulam a discriminação e o preconcei- entre as entidades que atendam às exigências da to dos mais variados tipos, atentando assim con- legislação e que se cadastrem em determinado tra os direitos humanos, especialmente de seg- prazo antes da eleição. mentos marginalizados e minorizados. O fato de O CGIBr é a primeira experiência mundial de o Conar ser uma entidade de "pares julgando pares" um órgão nacional de governança da internet a torna sua eficácia questionável. ter representantes eleitos. Na área da publicidade, foi instituído em 1980 o Conselho Nacional de Auto-Regulamentação PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES Publicitária (Conar). Ele é a organização que enca- minha e opera o Código de Auto-Regulamentação Embora o Brasil seja um dos países que teve Publicitária, uma resposta das entidades e empre- crescimento mais rápido em relação ao número sas da área a uma lei que estava sendo elaborada de usuários conectados à rede mundial de com- pelo governo federal no final da década de 70, putadores, o debate sobre a governança na durante a ditadura militar, que instituía uma cen- Internet ainda caminha a passos lentos dentro das sura prévia para a publicidade. A finalidade do entidades e organizações que historicamente dis- Conar, de acordo com o artigo 5º de seu Estatuto cutem a comunicação. Na parte da sociedade ci- Social, é “zelar pela comunicação comercial, sob vil, a entidade com maior conhecimento na área é todas as formas de propaganda, fazendo obser- a Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits), var as normas do Código Brasileiro de Auto-Regu- que possui um dos membros da sociedade civil lamentação Publicitária, que prevalecerão sobre no CGIBr. Outro ator que se destaca na sociedade quaisquer outras”. civil é o Projeto Software Livre Brasil, que elegeu 65
  • 68. um dos conselheiros e tem grande força internaci- ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS onal, já tendo realizado uma série de fóruns no Brasil, mais especificamente na cidade de Porto O Comitê Gestor da Internet no Brasil tem um Alegre, e conseguindo pautar setores do governo árduo desafio pela frente. O primeiro é ganhar le- brasileiro para a questão do software livre, como gitimidade e navegar em um terreno sem o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação precendentes no país (o de uma instituição de (ITI). O ITI tem sido uma das principais vozes no auto-governança); o segundo é de conseguir or- debate interno do governo federal, defendendo o ganizar as políticas de gestão da internet no Bra- uso do conhecimento compartilhado e, em rela- sil; o terceiro é o de se posicionar em relação aos ção à internet, trabalhando para construir a visão processos internacionais. Estão na pauta do co- no CGIBr da defesa em âmbito internacional da mitê, em âmbito interno, o debate sobre a políti- proposta de transferir a gestão da rede mundial ca de universalização dos serviços de telecomuni- para um organismo ligado à ONU. cações com recursos do Fundo de Universalização O Conar é formado por um Conselho Superior dos Serviços de Telecomunicações (Fust), criado e um Conselho de Ética, que julga os casos e pos- para financiar este processo, e o Serviço de sui 132 conselheiros. Ele trabalha com violações Comunicação Digital, proposta feita pelo governo como propaganda comparativa, responsabilidade federal para utilização desses recursos. Em âmbito social, ferimento do direito autoral, apresentação externo, a discussão sobre a governança na rede, inverídica do produto, omissão de frase de adver- sobre a qual o Brasil tem construído posição já tência e falta de adequação às leis. O Conar pos- explicitada neste estudo de defender a gestão da sui grande legitimidade dentro do setor publici- internet por um organismo ou fórum ligado à ONU, tário pela sua composição, que reúne as maiores garantindo um processo transparente, multilateral agências do país, e pela sua gênese, pois foi uma e com participantes dos diversos setores (multi- saída para evitar a intervenção da ditadura militar stakeholder). no conteúdo das propagandas veiculadas no final da década de 70. 66
  • 69. Pilar B Retomando o uso do conhecimento e do domínio público No Brasil, qualquer análise sobre as possibili- É indispensável, portanto, considerar a reali- dades de acesso ao conhecimento deve conside- dade socioeconômica do país não somente para rar a extrema desigualdade da estrutura social e avaliar as atuais regras que regem o uso do co- econômica nacional. Parcela significativa da po- nhecimento, como também para considerar as pulação não tem acesso a bens materiais que re- ações dos poderes públicos e dos diversos atores produzem o conhecimento gerado pelos diferen- da sociedade civil. Como veremos, o atual forma- tes segmentos da sociedade, no Brasil e no mun- to das leis que regem a propriedade intelectual do. As reflexões sobre um regime que propicie a no Brasil – assim como no restante do mundo – circulação da informação e da cultura no país de- não é o mais apropriado para o estímulo da vem considerar que, enquanto não for radicalmen- criatividade e para o desenvolvimento cultural, te superado esse quadro de desigualdades, não social e econômico dos indivíduos e dos grupos será possível alcançar um regime equilibrado de sociais. partilha e acesso igualitário às obras e criações. 67
  • 70. B1: Um regime equilibrado de partilha do conhecimento que assegure que o conhecimento gerado ou disseminado por empresas, canais e setores de comunicação esteja disponível para todos de modo igualitário e acessível financeiramente, e que encoraje a criatividade da forma mais ampla possível por toda a sociedade. B1.1 Uma estratégia nacional e uma orientação política com relação a criação, disseminação e uso do conhecimento (especialmente copyright e incluindo materiais e softwares educacionais publicados e transmitidos) cujos objetivos explícitos sejam enriquecer o domínio público, satisfazer as várias necessidades por conhecimento, e encorajar a criatividade de todos os setores da sociedade. Isto pode ser expresso em termos de posições e políticas sobre Direitos de Propriedade Intelectual (IPR), em uma ‘sociedade da informação’ ou uma “economia do conhecimento”, em mídia e outras áreas, tanto nacionalmente como em organizações, acordos e tratados internacionais. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL Para a construção de um regime equilibrado de partilha do conhecimento, o direito garantido Constituição Federal no artigo 5º da Constituição Federal – de Art. 5º. Todos são iguais perante a lei sem distinção exploração comercial das obras pelos autores ou de qualquer natureza, garantindo-se aos brasilei- por aqueles cujo direito foi cedido pelo autor – ros e aos estrangeiros residentes no país a deve ser balanceado com outros direitos humanos inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igual- igualmente positivados na Constituição, como o dade, à segurança e à propriedade, nos termos direito à educação e à cultura. Como todo direito, seguintes: o direito autoral não é absoluto. As legislações XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de complementares sobre direito autoral – para que utilização, publicação ou reprodução de suas obras, não haja abuso deste direito – ao serem formuladas transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei e debatidas (especialmente nas questões relativas fixa; aos limites do direito autoral), devem considerar a existência de outros direitos, em especial os con- XXVIII - são assegurados nos termos da lei: tidos no Capítulo III da Constituição: a) a proteção às participações individuais em obras Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Es- coletivas e à reprodução de imagens e voz huma- tado e da família, será promovida e incentivada com nas, inclusive nas atividades desportivas; a colaboração da sociedade, visando ao pleno de- senvolvimento da pessoa, seu preparo para o exer- b) o direito de fiscalização do aproveitamento econô- cício da cidadania e sua qualificação para o traba- mico das obras que criarem ou de que participa- lho. rem aos criadores, aos intérpretes, e às respecti- vas representações sindicais e associativas; Art.215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos in- nacional, e apoiará e incentivará a valorização e dustriais privilégios temporários para sua utiliza- difusão das manifestações culturais. ção, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas O Brasil no ordenamento jurídico internacional e a outros signos distintivos, tendo em vista o inte- resse social e o desenvolvimento tecnológico e eco- No plano internacional, o Brasil é signatário nômico do país; das principais convenções e tratados sobre pro- priedade intelectual. Entre os acordos sobre direi- 68
  • 71. tos autorais e conexos estão a Convenção de Ber- 9.610/98, a principal sobre direito autoral no Bra- na relativa à Proteção das Obras Literárias e Artís- sil, procurou responder às transformações impos- ticas, de 1886; a Convenção sobre Direito de Au- tas pelo desenvolvimento das novas tecnologias tor; a Convenção Internacional de Roma para a e às possibilidades de armazenamento e reprodu- Proteção aos Artistas Intérpretes ou Executantes, ção de cópias de produções artísticas em suportes aos Produtores de Fonogramas e aos Organismos digitais. A intenção dos legisladores foi, claramen- de Radiodifusão, de 1961; a Convenção de Gene- te, a de conciliar a legislação brasileira com as bra para a Proteção de Produtores de Fonogramas normas estabelecidas no Acordo TRIPS. Contra a Reprodução não Autorizada de seus Em alguns casos, apesar de o TRIPS não exi- Fonogramas, de 1971; e o Tratado sobre o Regis- gir proteção extrema, a legislação brasileira, de tro Internacional de Obras Audiovisuais (Tratado forma equívoca – tendo em vista o estágio de Sobre Registro de Filmes), de 1989. desenvolvimento deste país ao tempo da criação No âmbito da Organização dos Estados da legislação pertinente – concedeu direitos mais Americanos (OEA), o Brasil ratificou a Convenção amplos aos detentores de propriedade intelectu- Interamericana sobre os Direitos de Autor em al, numa clara pressão exercida pela indústria es- Obras Literárias, Científicas e Artísticas. trangeira. O Brasil também ratificou, em 1995, o Acordo Logo após o TRIPS, vale ressaltar, o Brasil tam- sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Inte- bém aprovou a Lei de Propriedade Industrial3, em lectual Relacionados ao Comércio (TRIPS1), que 1996, e, em 1997, a Lei de Cultivares4. Somadas à integra o Acordo Constitutivo da Organização lei sobre direito autoral e à que versa sobre os Mundial do Comércio (OMC), assinado pelo Bra- programas de computador (Lei 9.609/98), consti- sil em 19942. O Acordo TRIPS, apesar de ter en- tuem as principais regras jurídicas que adequa- trado em vigor em 1995, tornou-se eficaz no Brasil ram o ordenamento brasileiro ao TRIPS. apenas no início do ano 2000. Após longos A Lei de Direitos Autorais de 1998 define os lobbies dos EUA – com a colaboração da Europa direitos morais dos autores (artigos 24 a 27), como e do Japão – o tema da propriedade intelectual o direito ou prerrogativa que tem aquele que criou passou a ser tratado eminentemente como um uma obra intelectual de defendê-la como atributo bem econômico. de sua própria personalidade. Todavia, vale res- Nesse sentido, o TRIPS significou uma grande saltar que o TRIPS, por tratar-se de um acordo com vitória dos países industrializados e detentores fins comerciais, não obriga os países signatários a da maior parcela de direitos de propriedade in- preverem estes direitos em seus ordenamentos telectual. Em termos práticos, o TRIPS trouxe dois jurídicos internos. Tal entendimento provém da resultados: tradição anglo-saxã, liderada pelos EUA e basea- a) um amplo e forte patamar mínimo de pro- da no common law, em que os direitos são funda- teção a diversos direitos de propriedade inte- mentados nos costumes e na tradição, e não em lectual; leis codificadas. Segundo esta concepção, não exis- b) uma direta responsabilidade legal para ma- te proteção aos direitos morais. Por outro lado, a nutenção e promoção dos direitos de proprieda- existência de um direito eminentemente econô- de intelectual a ser observada por todos os mem- mico, chamado de “direito de cópia”, ou bros signatários do TRIPS, já que passou a ser “copyright”, constituiu-se num dos pilares do ca- possível aplicar sanções a países que não respei- pitalismo, ao transformar conhecimento em mer- tem o disposto no acordo. cadoria. Nos artigos 28 a 45, a Lei de Direitos Autorais Lei 9.610/98: adequação ao Acordo TRIPS define os chamados direitos patrimoniais do au- Em 1998, foi aprovada no Congresso Nacional tor, garantindo ao titular ou ao cessionário do di- e sancionada pelo presidente da República, à épo- reito autoral o monopólio da exploração material ca Fernando Henrique Cardoso, a Lei 9.610, que das obras (art. 28. Cabe ao autor o direito exclusivo alterou, atualizou e consolidou a legislação ante- de utilizar, fruir e dispor da obra literária, artística ou rior sobre direitos autorais, datada de 1973. A Lei científica), conferindo ao autor da obra intelectual 1. Na maioria dos países de língua latina o TRIPS (Trade Related Aspects of Intellectual Property Rights) é conhecido como ADPIC. Entretanto, por ser comumente empregado no Brasil, usaremos neste relatório a sigla em inglês. 2. O TRIPS passou a se aplicado no Brasil a partir do Decreto Legislativo 30, de 15/12/1994 e do Decreto Federal 1.355, de 30/12/ 1994. 3. Lei 9.279/96. Também faz parte da legislação sobre propriedade industrial o Decreto 2.553/98. 4. Lei 9.456/97 69
  • 72. a prerrogativa de auferir vantagens pecuniárias qualquer meio ou processo, de obra intelectual, com a utilização da obra e ser remunerado por interpretação, execução ou fonograma, sem auto- sua exploração econômica. Tal exploração pode rização expressa do autor, do artista intérprete ou ser realizada pelo próprio autor ou por pessoa executante, do produtor, conforme o caso, ou de quem os represente: autorizada por ele(a), conforme ficar estipulado Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e mul- em contratos nos quais artistas cedem os direitos ta. a terceiros (artigos 49 a 67). Há que se destacar, também, a existência dos § 2º Na mesma pena do § 1º incorre quem, com o “direitos conexos” (artigos 89 a 96), ou seja, a lei intuito de lucro direto ou indireto, distribui, vende, assume que o produtor do fonograma, do livro expõe à venda, aluga, introduz no País, adquire, ou da obra audiovisual, por exemplo, detém algu- oculta, tem em depósito, original ou cópia de obra ma interferência no resultado autoral das obras intelectual ou fonograma reproduzido com viola- que promove. Neste caso, o direito autoral se con- ção do direito de autor, do direito de artista intér- funde, quase que em definitivo, com a lógica da prete ou executante ou do direito do produtor de fonograma, ou, ainda, aluga original ou cópia de produção industrial. Confusão esta que só aumenta obra intelectual ou fonograma, sem a expressa por ser o Brasil o único país que possui apenas autorização dos titulares dos direitos ou de quem um órgão para arrecadar tanto os direitos auto- os represente. rais quanto os direitos conexos. Por fim, a lei versa sobre as sanções civis aos § 3º Se a violação consistir no oferecimento ao públi- violadores dos direitos autorais (artigos 102 a co, mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou 110), que serão, também, objeto do Código Civil qualquer outro sistema que permita ao usuário re- (artigos 186 e 927). alizar a seleção da obra ou produção para recebê- A Lei 5.988 de 1973 – anterior à atual – quando la em um tempo e lugar previamente determina- da promulgação da atual Lei de Direitos Autorais dos por quem formula a demanda, com intuito de lucro, direto ou indireto, sem autorização expres- (Lei 9.610), não foi completamente revogada. sa, conforme o caso, do autor, do artista intérprete Manteve-se o artigo 17 (§ 1º e 2º), que possibilita ou executante, do produtor de fonograma, ou de o registro das obras pelos autores em instituições quem os represente: mantidas pelo Estado brasileiro, como a Biblioteca Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e mul- Nacional, a Escola de Música e a Escola de Belas ta. Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o Instituto Nacional do Cinema e o Conselho Federal § 4º O disposto nos §§ 1º, 2º e 3º não se aplica quando de Engenharia, Arquitetura e Agronomia. As regras se tratar de exceção ou limitação ao direito de autor para o registro são estabelecidas por cada uma ou os que lhe são conexos, em conformidade com dessas entidades. o previsto na Lei nº. 9.610, de 19 de fevereiro de 1998, nem a cópia de obra intelectual ou fonograma, em um só exemplar, para uso privado Lei 10.695/03 (Lei Anti-pirataria) do copista, sem intuito de lucro direto ou indireto. A Lei 10.695 de 2003, mais conhecida como Lei Anti-Pirataria, alterou o Código Penal e o Códi- No parágrafo 3º, evidencia-se a intenção dos go de Processo Penal, elevando as penas e os ti- legisladores de incluir a prática de contrafação pela pos penais para os violadores de direitos auto- internet, assim como das ligações clandestinas de rais. A pena mínima para a prática de contrafação TV a cabo5, tipificando como crime o oferecimen- com o intuito de lucro, a partir de 2003, passou to de arquivos digitalizados a terceiros. de um para dois anos. Já o último parágrafo, apesar de estabelecer que não incorre nas penas dos parágrafos Código Penal anteriores a prática sem fins lucrativos, dá margem Art. 184 - Violar direitos de autor e os que lhe são para que as reproduções para uso próprio sejam conexos: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou enquadradas pelo caput do artigo, que prevê a pena multa. de três meses a um ano de detenção. Esta interpretação é freqüentemente utilizada nos § 1º Se a violação consistir em reprodução total ou tribunais pelos advogados da indústria do direito parcial, com intuito de lucro direto ou indireto, por de autor. 5. Conhecidas popularmente como “gatos”, as ligações clandestinas de TV a cabo são prática comum tanto em favelas como em condomínios de classe média. 70
  • 73. Nesse sentido, deve-se questionar com veemên- pela revolução digital – de apropriação da infor- cia o fato da legislação estabelecer, mesmo em mação pela lógica da mercadoria. casos de reprodução sem fins lucrativos de Ao longo do século XX, o centro do capitalis- fonogramas, videogramas e obras literárias, uma mo passou da produção industrial para o sistema relação com a esfera do Direito Penal, com penas financeiro. A racionalidade deste novo modelo de restritivas de liberdade. Pelo princípio da interven- acumulação capitalista pressupõe que as leis que ção mínima, não se deve encarcerar um ser huma- protegem a propriedade estendam-se para além no por um ano, ou mesmo três meses, pela viola- do produto e passem a incorporar os processos ção de um direito autoral. de criação, ou seja, passem a proteger o conheci- Além disso, a Lei Anti-pirataria alterou o Códi- mento empregado nestes processos8. Este (o co- go de Processo Penal, facilitando a busca e apre- nhecimento), por sua vez, revela-se a nova base ensão dos materiais reproduzidos ilegalmente, do capitalismo e, para garantir o lucro dos deten- assim como os equipamentos utilizados para tores da informação, foi preciso impor barreiras viabilizar as reproduções. Da mesma forma, a nova ao acesso deste bem e torná-lo um bem escasso. redação do Código de Processo Penal atribuiu aos As conseqüências mais visíveis desse processo, titulares de direito de autor a condição de fiéis além da convergência tecnológica, são a progres- depositários de todos os bens apreendidos. Por siva concentração da propriedade e a emergência fim, as alterações deram ao Judiciário o poder de de um reduzido número de corporações determinar a destruição dos bens ilicitamente pro- transnacionais de comunicação, assim como a fe- duzidos ou reproduzidos e às associações de titu- roz pressão da indústria do direito autoral sobre lares de direitos de autor a possibilidade de funci- os governos nacionais. As recentes fusões das onar como assistente da acusação nos crimes pre- corporações de comunicação são sintoma desse vistos no artigo 184 do Código Penal, quando pra- processo. Ao mesmo tempo em que se concen- ticado em detrimento de qualquer de seus associ- tram os grupos com capital para financiar a pro- ados6. dução de informação e cultura, cresce a necessi- dade de controle da circulação dessa produção para garantir que o fluxo desses bens seja exclusi- IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO vamente marcado por uma relação capitalista e ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES que os lucros auferidos por essas companhias se- ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS jam cada vez maiores9. O fato da propriedade in- telectual, e mais especificamente do direito auto- O regime de partilha do conhecimento ral, passar a ser regido por um acordo de negoci- A intenção dos legisladores, em 1998, foi con- ações comerciais multilaterais da Organização ciliar o ordenamento jurídico do período anterior Mundial do Comércio (OMC) é símbolo dessa às normas estabelecidas no Acordo TRIPS. Ao mes- transformação. Vincular o tema da propriedade mo tempo em que procura dar proteção ao direi- intelectual ao comércio internacional foi, de fato, to moral dos autores, a lei brasileira também visa uma necessidade imposta para garantir a garantir a integralidade do direito autoral exploração comercial dos bens materiais e patrimonial e a respectiva proteção às reprodu- simbólicos produzidos nos países desenvolvidos ções não autorizadas das obras. Na prática, pro- e exportados para os países em desenvolvimento, curam preservar o modelo desenvolvido no sécu- assim como os bens produzidos nos países em lo XX, com as indústrias audiovisual, fonográfica desenvolvimento cujos direitos de exploração per- e editorial mantendo o monopólio da difusão da tencem a companhias transnacionais. cultura e do conhecimento. A substituição da Con- A universalização do neoliberalismo nas últi- venção de Paris7 pelo TRIPS demonstra que entra- mas décadas requereu, contraditoriamente, que mos numa nova fase – especialmente radicalizada os Estados se tornassem guardiões dessa relação 6. Para ver o texto completo da Lei 10.695/03, ver legislação consolidada em www.planalto.gov.br 7. A Convenção Internacional para a proteção do Direito do Autor, revista em Paris a 24 de julho de 1971 foi ratificada no Brasil pela Lei 76.905 de 24/12/75. 8. Um outro fator importante para o incremento da lógica da propriedade intelectual foi o crescimento exponencial do “trabalho morto”, de caráter repetitivo, realizado pelo maquinário (cada vez mais sofisticado). Assim, o valor acrescido na mercadoria cada vez mais se deslocou para o campo do trabalho imaterial. 9. A própria natureza intrínseca da informação tende a “facilitar” a sua reprodução. A informação tem custo de reprodução zero (ainda mais com a digitalização de seu suporte material) e não sofre (ao contrário de todas as demais mercadorias) a depreciação natural do tempo (entropia). 71
  • 74. comercial e passassem a regular a circulação da de impostos relacionados à venda de cópias não informação e da cultura para atender a interesses autorizadas13. Porém, o alto índice de pirataria, privados. A legislação autoral brasileira, ao prote- combinação do pequeno poder aquisitivo da po- ger mais o direito daqueles que exercem a ativi- pulação e da ausência histórica de políticas de dade industrial de reprodução do suporte materi- democratização do acesso aos bens culturais, aca- al onde a obra está contida (direitos conexos) do ba por criar – e isso não se pode negar – uma que o criador propriamente, evidencia que o co- indústria ilegal que possui vínculos estreitos com nhecimento, ou a cultura, transformou-se em mer- o crime organizado. Tal relação tende a legitimar cadoria, passível de uma única forma de regulação: o discurso repressor da indústria do direito autoral a que tenha como objetivo garantir o lucro da in- e dificulta o debate público sobre a necessidade dústria do direito autoral. Dessa forma, protege- da reformulação do marco regulatório. se não a criação, mas apenas a distribuição de um A lista dos 20 CDs e DVDs mais vendidos no produto. Brasil em 2004 mostra a predominância de O sistema de proteção da propriedade intelec- cantores e cantoras nacionais no gosto do tual vigente, portanto, transforma os direitos do consumidor. Os únicos nomes internacionais autor em “direitos da indústria” e, conseqüente- presentes entre os CDs são o grupo U2 e a mente, o alto custo da aquisição de obras em di- coletânea “Malhação Internacional 2004”. Entre ferentes suportes, num país com as características os DVDs, 16 dos 20 títulos são de artistas do Brasil, torna inviável seu consumo pela maio- nacionais. Quem lucra com isso, no entanto, não ria da população. As baixas vendagens das obras/ é o Brasil. As majors internacionais Universal, BMG, produtos, em função do alto preço e do baixo Sony, EMI e Warner são responsáveis por 14 dos poder aquisitivo da população, acabam por servir 20 CDs mais vendidos. No campo dos DVDs, o como justificativa para o aumento dos preços quadro se repete, com 15 entre os 20 mais dessas mercadorias para que o lucro por unidade vendidos sendo das transnacionais. compense o pequeno poder aquisitivo da maioria Paralelamente, a ausência de um modelo de dos indivíduos. Os altos preços desestimulam negócio que se adapte às condições ainda mais os consumidores, que vêem nos socioeconômicas brasileiras, aliadas às transfor- produtos pirateados10 uma possibilidade legítima mações tecnológicas atuais, tem criado as condi- de ter acesso à informação e à cultura. ções para que, cada vez mais, compositores e in- térpretes abandonem as grandes gravadoras para Segmento Musical se tornarem "independentes", voltando a contro- Essa realidade é evidente na indústria lar a publicação e comercialização das edições de fonográfica, onde os produtos piratas respondem seus trabalhos. Dessa forma, ao mesmo tempo em por 63%11 das vendagens e têm sido, segundo exe- que não cedem seus direitos a terceiros, criam cutivos das grandes companhias, um dos diver- condições de reformalização das relações comer- sos fatores de desestruturação das principais gra- ciais que hoje aparecem como antagônicas aos vadoras12. Contudo, os diferentes números apre- direitos autorais14. sentados pelas empresas, entidades de gestão de É preciso reafirmar que a indústria do direito direitos autorais e órgãos de combate à pirataria autoral do segmento musical tem contribuído não possibilitam estimar com precisão os “prejuí- decisivamente para o desvirtuamento das funções zos” reais da indústria fonográfica e a sonegação públicas dos veículos de radiodifusão. As grandes 10. Termo bastante difundido no Brasil, a “pirataria” refere-se à reprodução não autorizada de produtos protegidos pelo direito autoral com a clara finalidade de geração de lucro. Normalmente, esses produtos são reproduzidos em grande escala e depois repassados para o comércio informal. 11. Fonte: Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD) 12. Os CDs de música piratas são vendidos, em média, por um preço cinco vezes menor. É imprecisa, entretanto, a afirmação de que a pirataria é a única ou principal causa das dificuldades atuais das majors. Porém, tal interferência existe e não pode ser desconsiderada. O relatório anual da ABPD, que congrega as cinco maiores gravadoras estrangeiras, ou majors (EMI, Sony, BMG, Universal e Warner), aponta uma queda de 17% em valores e de 25% no que diz respeito a unidades vendidas em 2003 em relação a 2002. 13. Isso se justifica porque a compra de um CD não autorizado não pode ser computada como uma possível compra de um CD “legal”, exatamente porque o que viabiliza o acesso aos produtos pela população é seu preço mais baixo. Fosse o valor dos produtos ilegais semelhante ao praticado pela indústria, aí sim se poderia estabelecer uma relação direta entre um CD “pirata” comprado e um CD “legal” não comprado. 14. Nesse sentido, o aumento do número de selos independentes – e de artistas de renome que a eles aderem – também pode, em certa medida, ser considerado uma das causas da queda nas vendas das majors. 15. No Brasil, a despeito do crescente número de selos independentes, as cinco maiores gravadoras permanecem as majors. 72
  • 75. gravadoras15 utilizam-se ininterruptamente de um coibir a cópia de produtos não licenciados, as gran- instrumento popularmente conhecido como des empresas de softwares de código fechado fi- “jabaculê”, ou “jabá”. Na prática, trata-se da com- nanciam intensas campanhas publicitárias em rá- pra pelas gravadoras de espaço nos veículos de dio, televisão, salas de cinema, internet e periódi- radiodifusão para a inserção dos artistas cujos di- cos diários e semanais. reitos de exploração das obras foram a ela cedi- Tais campanhas, que promovem a relação sim- dos. No rádio, em especial nos grandes e médios bólica entre o usuário de cópias ilegais e o crime centros urbanos, é o “jabá” que determina a gra- organizado, somadas às multas aplicadas a um de de programação da maioria das rádios comer- número significativo de empresas que utilizavam ciais (e que possuem maior audiência). Na televi- softwares copiados ilegalmente, reduziram sensi- são, a realidade não difere: parcela significativa velmente a porcentagem de softwares piratas nos dos programas musicais e “de auditório” determi- computadores brasileiros. De 1994 a 2002, o ín- na os artistas que farão parte da programação em dice de softwares copiados sem autorização no função das verbas que recebem das majors. Brasil passou de 77% para 55%. Devido ao cresci- Atualmente, apesar de as grandes corporações mento de número de computadores no mesmo do setor musical serem responsáveis por apenas período, tal redução, porém, não significou um 16% dos discos de música brasileira lançados, seus decréscimo em números absolutos de computa- “produtos” ocupam 97% da radiodifusão pública16. dores com softwares copiados ilegalmente18. Por certo, o principal papel cumprido pelas multinacionais tem sido o de impedir que o pú- Livros e bibliotecas públicas blico tenha acesso à maior parcela do se produz No caso das fotocópias de livros, em especial musicalmente no país. Mais do que um meio imo- no uso relacionado à educação, houve, a partir de ral e ilegal de promover as vendas, o jabá conver- 1998, uma pressão crescente das organizações de teu-se numa forma intolerável de censura à pro- editores, em especial da Associação Brasileira de dução/distribuição cultural nacional, comprome- Direitos Reprográficos (ABDR), para que os cen- tendo a radiodifusão como um espaço de autênti- tros de fotocópias de universidades passassem a ca troca cultural. ser fiscalizados e impedissem a cópia de obras O dispêndio das gravadoras com a compra ile- acadêmicas e literárias. gal de espaço no rádio e na televisão pode ser O objetivo das pressões era reduzir as repro- considerado, em conjunto com altos preços dos duções completas ou de grandes trechos de livros. produtos, uma das principais causas da progressi- A influência coercitiva, na prática, dilui-se com o va desestruturação financeira das majors no Brasil tempo. Diante da impossibilidade de aquisição de e foi, assumidamente, a causa da falência da livros pela maioria dos estudantes e da dificuldade principal tentativa recente de criação de uma na definição de “pequenos trechos”, como consta grande gravadora de capital nacional17. na Lei 9.610, os centros de fotocópia continuam a ser a principal fonte de material educacional im- Programas de computador presso19. Segundo pesquisa, estima-se que entre As cópias não autorizadas de softwares propri- 20 e 28 bilhões de páginas sejam copiadas por etários (cujos valores no mercado informal podem ano nas universidades, ou seja, se o cálculo for ser até 50 vezes mais baixos do que a licença de feito a partir do número de páginas, para cada uso de um software proprietário) respondem por livro vendido, quatro são copiados20. Porém, como mais da metade do mercado brasileiro de progra- não há uma definição possível para “pequenos tre- mas de computador. Para preservar seus lucros e chos”, como consta na Lei 9.610/98, é impossível 16. Fonte: pesquisa de Sérgio Rubens de Araújo Torres, disponível em www.horadopovo.com.br/2004/julho/16-07-2004/pag8a.htm 17. A Abril Music, que pertencia ao Grupo Abril, encerrou suas atividades em 2002. Alguns de seus executivos admitiram publicamente que a empresa não estava suportando financeiramente o custeio das “verbas de promoção”, novo rótulo para a prática do jabá. 18. Fonte: Associação Brasileira de Empresas de Software (Abes) 19. Há, entretanto, a continuidade de uma série de ações repressivas. Em todo o país, segundo a ABDR, mais de 90 ações foram promovidas só em 2004. Exemplos de outras ações já realizadas são: em outubro de 2002, foram apreendidas em copiadoras na UERJ cópias de 140 obras. Em outubro de 2003, uma ação policial no campus da UFRJ resultou na apreensão de 300 cópias de obras. Em abril de 2003, mais de 200 cópias de livros foram apreendidas na UNB. Em novembro de 2003, na cidade de Goiânia, foram apreendias 350 livros em copiadoras. 20. Fonte: RIBEIRO, Ana Cláudia da Silva Paiva. Academia e Pirataria - O livro na Universidade. UFRJ, 2002. Segundo a ABDR, a cópia de livros propicia perdas anuais de R$ 400 milhões às editoras. Entretanto, assim como no setor musical, não é possível considerar que uma cópia de livro corresponderia à compra de outro. O baixo custo da cópia é que proporciona o acesso ao conteúdo pelos estudantes. Fosse a cópia impossível, assim como na música, a maioria não teria condições de comprar os livros. 73
  • 76. dizer quantas dessas cópias seriam “ilegais” se- FONTE: ABDR VENDAS SUBSETOR CIENTIFICOS gundo o ordenamento jurídico atual. TECNICOS E PROFISSIONAIS VERSUS De fato, não há, pelo menos de maneira gene- MATRICULAS ENSINO SUPERIOR ralizada, um entendimento por parte de professores, pesquisadores e alunos de que a cópia 3.500.000 3.000.000 Cientificos,Tecnicos de livros constitui-se ato ilícito. Os docentes, 2.500.000 e Profissionais em 2.000.000 R$ 1000 inclusive, estimulam a prática com as chamadas 1.500.000 Matriculas no “pastas de professor”, em que os docentes 1.000.000 Ensino Superior 500.000 selecionam textos de diversas procedências para - compor a bibliografia de uma determinada 8 9 0 1 2 9 9 0 0 0 19 19 20 20 20 disciplina e deixam nas copiadoras de suas unidades de ensino. A busca pelo controle das fotocópias nas esco- A tabela acima, que relaciona a venda de livros las e universidades, em parte, se explica pela soma acadêmicos/universitários e a evolução das do restrito hábito de leitura e da dificuldade na matrículas no ensino superior, ajuda a dimensionar aquisição de livros pela maioria da população. essa relação. Enquanto cresceram as matrículas, Entre os membros da classe A, 50% têm o hábito diminuíram as vendas. Por certo, o principal motor de ler; na B, 37%; na C, 27%, e na classe D, 21%. As da expansão do ensino superior foi o crescimento porcentagens são igualmente proporcionais ao das instituições privadas de ensino que, nível de escolaridade: grau superior, 55%; ensino contraditoriamente, têm como principal público médio, 29%; 5ª a 8ª séries, 15%; 1ª a 4ª séries, estudantes de baixa renda. Portanto, há uma 10%21. O “desinteresse” pela leitura está ligado, evidente relação entre a aquisição de livros e o portanto, não somente a razões econômicas, mas poder aquisitivo dos estudantes que, de 1998 a também culturais/educacionais, visto que não po- 2002, foi especialmente afetado pela crise econô- demos atribuir o pouco hábito de leitura exclusi- mica que atingiu o país24. vamente à impossibilidade de aquisição de livros. As bibliotecas públicas, que poderiam demo- Como mostram os números, as classes A e B tam- cratizar o acesso ao conhecimento, não atingem bém não lêem como suas equivalentes em outros parcela significativa da população. Segundo da- paises do mundo, como a Argentina e o México. dos do Instituto Brasileiro de Geografia e Segundo aponta pesquisa recente, apenas 26 Estatística (IBGE), 20% dos municípios brasileiros milhões dos brasileiros leram ao menos um livro não possuem bibliotecas públicas. Mesmo entre nos últimos três meses, o que corresponde a 30% aqueles municípios que têm o equipamento, 69% da população adulta alfabetizada. O mercado con- possuem apenas uma biblioteca. sumidor é ainda menor: 17,2 milhões de pessoas Ainda em relação à democratização do conhe- alfabetizadas acima de 14 anos compraram pelo cimento na área educacional, é importante desta- menos um livro no ano de 2000 22. Somente car que o Estado brasileiro despende anualmente metade (53%) dos brasileiros alfabetizados possui aproximadamente R$ 580 milhões na compra de mais de dez livros em casa. livros didáticos para a distribuição aos alunos da A concentração do poder aquisitivo, sintoma rede pública. Os custos dos 124 milhões de volu- de uma sociedade desigual como a brasileira, re- mes comprados por ano incluem o pagamento de flete também a desigualdade do poder de compra royalties aos autores (aproximadamente 10% dos de livros. No Brasil, 16% da população concentram preços de venda dos livros25). Caso seja necessá- 73% dos livros adquiridos por pessoas físicas. Em rio adquirir mais unidades dos mesmos livros, o seis estados das regiões Sul e Sudeste concentram- Estado brasileiro deve arcar novamente não so- se mais da metade dos compradores (58%). Segun- mente com os royalties – já que os conteúdos dos do revela a mesma pesquisa23, metade dos livros livros não passam a fazer parte do domínio públi- lidos atualmente não são comprados. Ou seja, são co e não podem ser reproduzidos livremente, mes- emprestados ou doados. mo que resguardos os direitos morais dos auto- 21. Fonte: Câmara Brasil do Livro. 22. Idem. 23. Fonte: Pesquisa Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro 2002 24. Segundo dados do IBGE, a renda média do brasileiro caiu 25% de 1997 a 2002. 25. Fonte: ABDR e Associação Brasileira de Escritores(ABE) 26. Fonte: Ministério da Educação - www.mec.gov.br www.mec.gov .mec.gov.br 27. Idem. 74
  • 77. res – mas deve proceder nova compra sob mes- me de direitos autorais idealizado pelos legisla- mas regras de mercado26. Em função disso, a com- dores seja colocado em prática. Inversamente, a pra governamental de livros didáticos é responsá- busca pela efetivação do regime proposto pela vel pelo lucro de parcela significativa de editoras legislação acaba por criar mais obstáculos ao de- e resulta em pressões permanentes dessas empre- senvolvimento da sociedade brasileira, na medi- sas sobre as comissões avaliadoras dos livros, res- da em que restringe a livre circulação de informa- ponsáveis pela escolha dos livros. ções. É preciso especial atenção a essa questão, prin- cipalmente pelo fato do governo brasileiro ser o O direito autoral na multimídia maior comprador de livros do Brasil e do mundo, Segundo apontam autores mais recentes, as Leis tendo adquirido, em 2002, 162,2 milhões de 9.610/98 e 9.609/98, apesar de ambientar a legis- exemplares para seus programas de ensino lação brasileira ao TRIPS, já podem ser considera- básico 27. das defasadas em relação à atual realidade Em relação a copias de obras em suporte de tecnológica, pois transferem para as obras digi- papel, especialistas e juristas brasileiros com atu- tais os mesmo princípios das obras analógicas. Tal ação no campo do direito autoral – e que não ad- raciocínio aplica-se especialmente às criações em vogam para empresas ou associações gestoras de multimídia, onde duas ou mais formas direitos autorais – são unânimes em afirmar que, digitalizadas de expressão artística são transmiti- no Brasil, é fundamental forjar uma definição am- das através de um software. pla do conceito de “uso pessoal”, para que a cir- Ao contrário da Europa e dos EUA, o Brasil ain- culação do conhecimento produzido não seja da não possui qualquer lei específica sobre a ma- obstruída pelas necessidades de mercado impos- téria. A concepção individualista que impera na tas pelas editoras. regulamentação do direito de autor nas obras As restrições previstas na legislação brasileira, analógicas pode tornar-se um entrave à criação que só autoriza cópia de “pequenos trechos”, “em no ambiente digital, na medida em que o criador um só exemplar”, “para uso privado do copista”, da obra multimídia deve necessariamente obter quando referidas ao mundo digital, tornam a si- permissão dos autores das obras que vão compor tuação ainda mais complexa. Considerando que a o multimídia. Na medida em que não pode utilizar Lei 9.610/98 controla, dentre outros elementos, componentes de obras de terceiros (característica os direitos de “cópia”, o direito autoral, como co- fundamental do multimídia) para a criação dessa locado no ordenamento brasileiro, passa a ser nova obra, o autor encontra um sério obstáculo hegemônico no ambiente digital. Em termos prá- ao desenvolvimento dos produtos. Como conse- ticos, representa barreiras muito altas de acesso à qüência, o criador da obra multimídia, em parcela informação, ao conhecimento e, portanto, à significativa dos casos, acaba optando entre vio- efetivação de direitos humanos, em especial o di- lar o direito autoral (utilizando o material sem reito à educação e à cultura. autorização), desistir do projeto ou utilizar somen- Impõe-se, assim, um ciclo vicioso. A ausência te material próprio ou de domínio público, limi- de condições materiais impossibilita que o regi- tando a concepção original da obra. 75
  • 78. B 2: Medidas práticas para implementar esse regime. B 2.1 - Políticas públicas e ações para encorajar e possibilitar a mais ampla e difusa geração e comunicação do conhecimento, que podem incluir: - modos de celebrar bons trabalhos por parte de profissionais e do público; - incentivos públicos para pesquisa e criação local/nacional do conhecimento em áreas de reconhecida necessidade; - instrumentos públicos para facilitar o acesso ao conhecimento, inclusive uma política de disseminação de conteúdo de interesse público; - apoio público para software livre e de código aberto – por exemplo através de uma política pública de provisão – e para o desenvolvimento de especialistas nacionais; - currículos escolares que encorajem métodos críticos e questionadores de aprendizado; - apoio prático ao desenvolvimento de abordagens voltadas ao desenvolvimento e amistosas à comunidade para a partilha do conhecimento, como copyleft, General Public License (GPL) etc. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL Apesar de facultativa aos titulares do direito – A Lei 9.609/98, publicada simultaneamente à os empregadores, conforme estabelece o artigo Lei de Direitos Autorais (9.610), dispõe sobre a 4º – a regulamentação sobre o registro dos proteção da propriedade intelectual de programas programas foi estabelecida pelo Decreto de computador e sua comercialização no país. Presidencial 2.556, também de 1998. Ao tratar o software com o mesmo status que Art. 2º. O regime de proteção à propriedade intelec- a obra literária, a legislação brasileira não só ga- tual de programa de computador é o conferido às rante sua proteção pela Lei 9.610/98 como tam- obras literárias pela legislação de direitos autorais bém propicia o entendimento de que a criação do e conexos vigente no País. software é exclusivamente individual (ou de um grupo de pessoas) e, portanto, passível de prote- § 1º Não se aplicam ao programa de computador as disposições relativas aos direitos morais, ção28. Não há na principal lei brasileira sobre o ressalvado, a qualquer tempo, o direito do autor assunto qualquer menção expressa à possibilida- de reivindicar a paternidade do programa de de de criação colaborativa de softwares, como é o computador e o direito do autor de opor-se a caso do software livre. Tal entendimento estende- alterações não-autorizadas, quando estas se a toda produção científico-tecnológica atual impliquem deformação, mutilação ou outra que, de fato, pode ser considerada de caráter co- modificação do programa de computador, que letivo, mas que é tratada na legislação como fruto prejudiquem a sua honra ou a sua reputação. exclusivo de elaboração individual. Os softwares, por ficção jurídica, apesar de se- § 2º Fica assegurada a tutela dos direitos relativos a rem tratados como obras literárias, em princípio programa de computador pelo prazo de 50 anos, contados a partir de 1º de janeiro do ano subse- não precisam ser registrados para obter proteção qüente ao da sua publicação ou, na ausência des- legal. Todavia, para que a proteção possa “produzir ta, da sua criação. efeitos em relação a terceiros”29, ou seja, para que 28. Por outro lado, toda a política de fomento aos softwares nacionais, desenvolvida pelo Ministério da Ciência e Tecnologia e pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, trata os programas de computador como produtos industriais e, por isso, coletivos. 29. Lei 9.609/98, Art. 11º 76
  • 79. os direitos possam ser exercidos contra alguém pessoas, encaminhou ao Ministério da Justiça re- que porventura venha a violar os direitos do titu- latório em que propõe a adoção de uma série de lar, o software precisa ser registrados no Instituto medidas para combater a pirataria no Brasil. A mais Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). importante das propostas é a criação do Plano Nacional de Combate à Pirataria, que articularia diversos setores do governo para diminuir a eva- IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO são fiscal e os “delitos” contra a propriedade inte- PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES lectual. ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS As recomendações do relatório da CPI, a per- manente pressão da indústria do direito autoral e Pressões da Indústria do direito autoral a crescente prática de contrafação motivaram a A ineficácia das políticas governamentais para criação, em 2004, do Conselho Nacional de impedir a pirataria tem sido motivo de sucessivas Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade pressões internacionais sobre o Brasil, especial- Intelectual. Trata-se de um órgão colegiado mente do governo norte-americano e das organi- consultivo vinculado ao Ministério da Justiça e que zações que representam a indústria de direitos de tem como função justamente elaborar as diretrizes autor nos Estados Unidos e possuem escritórios para a formulação e proposição do Plano Nacional no Brasil. Em junho de 2004, por exemplo, os Es- de Combate à Pirataria. O conselho, tados Unidos anunciaram que o Brasil poderia principalmente pelas pressões que motivaram sua perder o acesso a um regime especial de tarifas criação, tende a tornar-se um espaço institucional caso não apresentasse “melhoras” na proteção à ocupado majoritariamente por representantes dos propriedade intelectual. Um mês antes, em 20 de interesses das grandes corporações. maio, a International Intellectual Property Alliance Outro sinal evidente das movimentações da enviou correspondência oficial ao Escritório de indústria está no desenvolvimento e uso de Representação Comercial dos EUA indicando que tecnologias restritivas. No final de 2002, a grava- o Brasil não “cumpria suas obrigações” no que se dora EMI lançou os primeiros CDs musicais com referia à proteção da propriedade intelectual. um dispositivo "antipirataria" desenvolvido pela Para responder às pressões da indústria de Microsoft, que impede que um CD musical, legiti- direito autoral nacional e internacional, o Congres- mamente adquirido, seja copiado para o compu- so Nacional aprovou em 2003 a Lei 10.695, mais tador do consumidor e, conseqüentemente, gra- conhecida como Lei Anti-pirataria, aumentando as vado em outro CD ou transmitido pela internet. punições para a prática de contrafação. Os sete Como assume a própria Philips, detentora da mil processos por “pirataria audiovisual” abertos tecnologia dos Compact Discs, os novos discos no Brasil, entretanto, resultaram em apenas 16 antipirataria não poderiam ser chamados de CDs, condenações e nenhuma prisão30. A relação nu- porque eles usam técnicas de gravação diferentes mérica revela que uma realidade socialmente do CD comum, reduzindo a qualidade do som e a injusta como a do Brasil gera dificuldades no meio durabilidade das mídias33. jurídico em determinar a linha divisória entre o Contudo, a adoção de mecanismos que impe- legal e o legítimo. Mais ainda, evidencia que não dem a cópia de um CD musical – como bem frisam há qualquer ambiente para a punição de usuários as provocações encaminhadas por advogados ao de cópias reproduzidas para uso pessoal sem pa- Ministério Público – é uma ação que extrapola os gamento de royalties. direitos patrimoniais do autor e afronta o atual Também em 2003, o Congresso Nacional ins- ordenamento jurídico brasileiro. Por impedir o li- talou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) vre acesso à informação e à cultura, inalienáveis e da Pirataria31 com o objetivo de investigar e pro- indisponíveis direitos de todos os indivíduos, a cessar os grandes capitalistas das falsificações e EMI e as outras majors travam atualmente uma cópias ilegais32. A CPI, que finalizou seus trabalhos disputa nos tribunais para legitimar a nova em junho de 2004 e sugeriu o indiciamento de 80 ecnologia, ainda não generalizada no país34. 30. Fonte: Associação de Defesa da Propriedade Intelectual (Adepi) 31. www.camara.gov.br 32. Os pequenos comerciantes de produtos ilegais são, por enquanto, poupados das ações policiais. Quando flagrados, costuma- se somente apreender os produtos, apesar da legislação também criminalizar os comerciantes de produtos copiados ilegalmente. 33. Fonte: Consultor Jurídico – www.conjur.uol.com.br 34. Nos EUA, os maiores selos de música do mundo estão sendo processados por inúmeros consumidores por causa de CDs anti- pirataria, projetados para evitar a troca ilegal de músicas pela internet. 77
  • 80. A gestão coletiva no setor musical plo, inviabilizar o desenvolvimento de atividades Na outra ponta do direito autoral estão entida- econômicas no mesmo e em outros segmentos, des representativas dos autores, que estabelecem assim como impedir o funcionamento de espaços regras para o recolhimento da arrecadação e dis- públicos culturais e de entretenimento que não tribuição dos royalties. A Lei 9.610/98 estabelece tenham fins lucrativos. em seu artigo 97 que “para o exercício e defesa de A mesma política de arrecadação proposta pela seus direitos, podem os autores e os titulares de legislação não diferencia os “tipos” de mídia, como direitos conexos associar-se sem o intuito de lucro” as rádios comunitárias. Em sua maioria, tais veí- e mantém o Escritório Central de Arrecadação e culos não têm qualquer mecanismo de geração Distribuição (Ecad)35, criação da lei de 1973. O de renda (dada, em grande parte, a legislação re- órgão é o responsável por coordenar a fiscaliza- pressiva para o setor), não podendo arcar com ção, arrecadação e distribuição dos valores prove- custos relativos ao pagamento de royalties. Atual- nientes das execuções de obras musicais, repas- mente, devido à evidente penúria financeira das sando 82% dos valores relativos à arrecadação para rádios, a pressão do Ecad sobre os veículos comu- associações de músicos que, por sua vez, repas- nitários diminuiu. Porém, tal fato é mais uma evi- sam os valores, descontados mais 6%, aos compo- dência da necessidade do desenvolvimento de uma sitores a elas filiados. legislação de direitos autorais que diferencie não No segmento musical, as práticas do Ecad são só os tipos de mídia como também os espaços de contestadas por músicos e produtores. Entre as execução pública das obras musicais. questões mais relevantes estão a ausência de cri- térios na cobrança de usuários, o cerceamento à A gestão dos direitos autorais dos autores de realização de eventos populares sem fins lucrati- livros, artes visuais e teatro vos, os mecanismos pouco claros de distribuição Não há, no Brasil, a gestão coletiva dos direi- de royalties e a apropriação de valores relativos ao tos dos autores de livros. O repasse dos royalties recolhimento sobre composições cujos autores não provenientes da exploração comercial das obras é são filiados a associações. feito diretamente pelas editoras aos autores. En- Há, além disso, uma falsa liberdade associativa. tretanto, diversas entidades procuram organizar Segundo a legislação (artigos 98 e 99 da Lei os autores de livros. Entre elas estão a Associação 9.610), o compositor pode optar entre fazer a ar- Brasileira de Escritores (ABE), entidade nacional recadação por si ou mediante associação, não para a “defesa dos direitos autorais e demais havendo, portanto, obrigatoriedade de associação. direitos dos escritores”, e Associação Brasileira dos Entretanto, caso o compositor não se associe a Autores de Livros Educativos (Abrale). uma entidade filiada, o Ecad recolhe os royalties Na área de teatro/artes cênicas, os direitos au- relativos à exibição pública de suas obras, mas torais podem ser recolhidos pela Sociedade não repassa ao autor36. Brasileira de Autores Teatrais (SBAT), entidade No Brasil, diferentemente de países como a fundada em 1917 e que atualmente se encontra França, a Inglaterra e os EUA, não há qualquer bastante desarticulada. controle governamental sobre as entidades Em 2004, foi criada a Associação Brasileira dos gestoras coletivas de direitos autorais37, seja o Direitos de Autores Visuais (AUTVIS), a primeira Ecad, sejam as associações. Tal falta de controle, com finalidade de administrar os direitos autorais muitas vezes, faz com que a prerrogativa do mo- dos criadores visuais e possibilitar o intercâmbio nopólio de gestão dos direitos autorais seja mundial das obras por meio das sociedades exercida abusivamente. A cobrança de altos valores internacionais de administração de direitos para a execução de obras musicais pode, por exem- autorais38. 35. Lei 9.610/98 - Art. 99. As associações manterão um único escritório central para a arrecadação e distribuição, em comum, dos direitos relativos à execução pública das obras musicais e lítero-musicais e de fonogramas, inclusive por meio da radiodifusão e transmissão por qualquer modalidade, e da exibição de obras audiovisuais 36. Diversos compositores e produtores de eventos musicais relatam experiências em que foram obrigados a arcar com os custos impostos pelo Ecad, mesmo com os autores não sendo filiados a nenhuma associação. Procurado, o Ecad não quis se pronunciar sobre a questão. 37. Fonte: Ministério da Cultura – www.cultura.gov.br 38. Para saber mais sobre a atuação das entidades consultar: www.abe.org.br, www.abrale.org,br, www.autvis.org.br e www.sbat.org.br 78
  • 81. B 2.2 - Uma interpretação ativa e a implementação, por parte de órgãos públicos e estatais, das leis e acordos nacionais e internacionais sobre copyright e patentes relevantes, favorecendo uma partilha equilibrada do conhecimento, ou seja: - apoio para o ‘uso justo’ de material sobre copyright, freqüentemente barrado por termos de licenciamento não negociáveis para material digital, como publicações especializadas; - reconhecimento e proteção dos ‘direitos morais’ dos autores; - restrições sobre o gerenciamento de direitos digitais, encriptação e mecanismos anti-burladores que inibam o uso justo de informação eletrônica; - esforços para formatar a propriedade intelectual de acordo com condições nacionais, o que freqüentemente irá contra tendências nos acordos internacionais; - esforços para formatar a propriedade intelectual em produtos digitais que promovam novos modelos de negócios, baseados na partilha do conhecimento, e que coíbam medidas (como o patenteamento de software) que mantenham monopólios ou oligopólios e inibam a inovação; - esforços para assegurar que expressões de folclore não sejam registradas e exploradas por terceiras partes (incluindo o problema do ‘autor identificável’), ou seja, pela incorporação da proteção folclórica na legislação nacional (casos de Bolívia, 1968, e Quênia, 1975). BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL público nem sequer pode ter acesso à obra, por estar fora de catálogo ou esgotada. Limitações do direito de autor Mesmo nos EUA, a legislação prevê o chamado No artigo 46, a Lei de Direitos Autorais (9.610/ “fair use”, que poderia ser traduzido como “uso 98) estabelece as limitações aos direitos autorais. justo”. Na prática, o "fair use", por se inscrever como Define que não constitui ofensa ao autor a “re- um princípio e não detalhar as formas permitidas produção, em um só exemplar de pequenos tre- de sua utilização, abre espaço, na tradição da chos, para uso privado do copista, desde que seja common law, para a criação de jurisprudências tra- feita por este, sem intuito de lucro”. Este trecho tando de novos usos. No caso da educação, por da legislação, por sua imprecisão ao definir “pe- exemplo, é legítimo o uso de obra protegida por quenos trechos” de obras artísticas, literárias e copyright se utilizada para o ensino (inclusive científicas, e por ter relação direta na efetivação múltiplas cópias para uso em sala de aula). dos direitos à educação e à cultura, ambos garan- Além disso, não são passíveis de proteção as tias constitucionais e direitos fundamentais, é um “idéias, procedimentos normativos, sistemas, mé- dos mais controversos e importantes artigos da todos, projetos ou conceitos matemáticos como lei. Entretanto, essa definição, que autoriza a có- tais”, assim como os “esquemas, planos ou regras pia de "pequenos trechos", "em um só exemplar", para realizar atos mentais, jogos ou negócios”, os "para uso privado do copista", como apontam di- “formulários em branco para serem preenchidos versos estudos de legislação comparada, pode ser por qualquer tipo de informação, científica ou não, considerada uma das mais restritas do mundo. e suas instruções”, os “textos de tratados ou con- Na Alemanha, por exemplo, é possível se fazer venções, leis, decretos, regulamentos, decisões cópia integral, para uso privado e pessoal, se a judiciais e demais atos oficiais”, as “informações edição de uma obra literária estiver esgotada há de uso comum tais como calendários, agendas, pelo menos dois anos. Como justificativa, a com- cadastros ou legendas”, os “nomes e títulos isola- preensão de que não há qualquer sentido a exis- dos” e o “aproveitamento industrial ou comercial tência de um direito exclusivo, por exemplo, se o das idéias contidas nas obras”39. 39. Lei 9.610/98 – incisos I à VII do artigo 8º 79
  • 82. Proteção ao conhecimento dos povos tradicionais A mudança de postura do governo brasileiro A Constituição Federal também procura asse- nas questões relativas à propriedade intelectual gurar a defesa das expressões dos povos tradicio- colocou em movimento o debate sobre o fluxo e nais e do folclore brasileiro, impondo ao Estado a o uso do conhecimento na sociedade da informa- responsabilidade de garantir os direitos relativos ção. Porém, conclusões sobre a eficácia da estra- à cultura, seja em relação à preservação, seja em tégia governamental atual e os rumos do direito relação à produção e à difusão: autoral no Brasil tendem a ser imprecisas. As aná- lises devem considerar que tal processo está atu- Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício almente em curso e pode ser interrompido em dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura curto prazo de tempo. Além disso, é importante nacional, e apoiará e incentivará a valorização e ressaltar a existência de contradições internas na difusão das manifestações culturais. gestão das políticas de governo, reflexo das di- vergências político-ideológicas dos membros da § 1º O Estado protegerá as manifestações das cultu- ras populares, indígenas e afro-brasileiras, e das administração federal e principal explicação para de outros grupos participantes do processo as diferenças entre o discurso de seus membros e civilizatório nacional. a prática da máquina estatal. De qualquer forma, podemos afirmar que o atual sentido do discurso Não há, contudo, qualquer legislação específi- governamental aponta para a possibilidade de uma ca que regulamente esses princípios constitucio- disputa conceitual sobre o regime de direitos au- nais, a não ser a instituição do registro de bens torais no Brasil. culturais de natureza imaterial e a criação do Pla- Se é correto afirmar que há avanços, deve-se no Nacional do Patrimônio Imaterial40 que, como registrar, porém, que o ímpeto brasileiro na defe- veremos, nunca se tornou realidade. sa de um regime de partilha do conhecimento mais justo no plano internacional não encontra a mes- ma força no plano interno. Muitas vezes, o discur- IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO so ou a divulgação de uma determinada vontade política não corresponde necessariamente a uma Com a desativação do Conselho Nacional de realização concreta. Direito Autoral, em 1990, a formulação de uma política para área do direito autoral foi abandona- A atuação brasileira no plano internacional da pelo governo brasileiro. Os oito anos da admi- O governo brasileiro, especialmente a partir de nistração de Fernando Henrique Cardoso (1995- 2003, tem defendido nos fóruns internacionais41 2002) consolidaram a hegemonia neoliberal no um regime de partilha do conhecimento que pri- país e com ela germinou o entendimento de que vilegie o desenvolvimento de tecnologias e recur- o Estado não seria responsável pela mediação das sos humanos locais, buscando regras claras na cir- questões relacionadas à área autoral e que os con- culação de produtos audiovisuais que permitam a flitos daí derivados deveriam ser resolvidos medi- sobrevivência das identidades, artistas, cientistas ante acordos contratuais diretos entre autores e e produtores nacionais. usuários. Ou seja, que deveriam ser regidas exclu- Nas negociações da Área de Livre Comércio das sivamente pelas regras de mercado. Américas (Alca), a diplomacia brasileira tem reite- A partir de 2003, o governo brasileiro redefiniu rado sua disposição em abandonar por completo algumas premissas que regiam os trabalhos so- o capítulo que versa sobre propriedade bre a questão da propriedade intelectual. A intelectual42. Entre outras providências, o governo redefinição dos aspectos relacionados à tutela brasileiro posiciona-se contra a ampliação dos pro- administrativa dos direitos autorais, com atribui- cedimentos criminais nas violações da propriedade ção de novas competências, começou a ocupar intelectual, assim como também rechaça as novas relativo espaço na agenda governamental e o Es- – e restritivas – definições dos termos “uso tado passou a reivindicar algum protagonismo na honesto”, “uso pessoal”, e do “acesso para formulação de estratégias de desenvolvimento propósitos educacionais” propostas pelos norte- relacionadas à propriedade intelectual. americanos. Esse mesmo capítulo propõe que 40. Decreto 3.511/00 41. É preciso deixar claro que a postura do governo brasileiro nos fóruns internacionais reflete-se de maneira bastante tímida no plano interno. São, portanto, iniciativas que devem ser analisadas separadamente. Tal constatação, entretanto, não desmerece os méritos da postura adotada internacionalmente. 42. Para saber mais sobre a Alca e sua relação com a comunicação ver IP Justice – www.ipjustice.org 80
  • 83. todas as disputas sobre domínios de internet sejam Na reunião anual da OMPI, em setembro e resolvidas pela Internet Corporation for Assigned outubro de 2004, o governo brasileiro, em Names and Numbers (Icann), uma associação privada conjunto com os governos argentino e boliviano, com sede nos EUA e vínculos com o governo norte- apresentou um documento sugerindo a negocia- americano, hoje responsável pela governança da ção de um tratado para promover o acesso dos internet. países em desenvolvimento ao conhecimento e à Nas recentes rodadas da Organização Mundial tecnologia, assim como a adoção de mecanismos da Propriedade Intelectual (OMPI), em que alguns colaborativos de compartilhamento de informação países têm insistido na introdução de um tratado para estimular a inovação. O documento também para expandir o direito sui generis europeu sobre propunha uma emenda à constituição da OMPI, bancos de dados para o mundo, o Brasil, com o salientando a necessidade de se considerar os apoio da Índia, Rússia, China e associações civis interesses dos países menos desenvolvidos na internacionais tem insistido que a proposta não elaboração das normas internacionais de pode prosperar. Por este novo “direito”, tudo propriedade intelectual, bem como a participação aquilo que é inserido em um banco de dados, de ONGs e da sociedade civil nos fóruns de discus- mesmo que faça parte do domínio público, passa são, como representantes do interesse público. a ser de propriedade do criador do banco de dados. A firme posição brasileira em relação à Alca e à O Brasil também tem recusado o estabelecimen- OMPI contrasta com as negociações do Mercosul to de compromissos adicionais ao Acordo TRIPS – lideradas pelo Brasil – com a União Européia, na Organização Mundial do Comércio (OMC), em que o governo brasileiro negocia regras mais conhecidos como TRIPS-plus. Se a recusa de al- brandas – e ainda pouco claras – no mercado guns governos, entre eles o brasileiro, tem difi- brasileiro para o setor audiovisual europeu como cultado o estabelecimento multilateral do TRIPS- moeda de troca para uma possível abertura da plus, tal prática tem ocorrido por meio de acordos Europa aos produtos agrícolas do Mercosul45. de comércio bilaterais e regionais, em particular os feitos pelos Estados Unidos. Além disso, o Brasil não assinou o tratado da PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES OMPI de Direitos Autorais43, de 1996, que propõe ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS medidas tecnológicas para obras protegidas pelo direito autoral (que os EUA adotaram por meio do O incentivo à difusão do software livre Digital Millennium Copyright Act e pelos mecanis- Um dos esforços mais claros do governo brasi- mos de Digital Rights Management e anti- leiro em relação à partilha do conhecimento está circunvention). Segundo a proposta, o atual sistema relacionado à implementação de políticas de in- de compra de um exemplar de um livro, de um CD centivo à adoção e produção de softwares livres. de música ou de um DVD seria substituído pelo Segundo o governo federal, o desenvolvimento modelo já adotado no software, de licença de uso. de softwares tem como objetivo a redução do A legislação também tem implicações sobre a pagamento de direitos autorais e o envio de divi- legalidade da troca de arquivos em redes e vai sas para o exterior – por ano, US$ 1 bilhão é obrigar provedores de acesso a retirar conteúdo remetido como pagamento de royalties 46 –; o do ar caso sejam solicitados a isso por alguém desenvolvimento da inteligência coletiva do país que alegue ter tido seus direitos autorais violados. e a criação de uma indústria nacional de tecnologia Na Bélgica, por exemplo, em recentes casos da informação, com a promoção de novos mode- envolvendo a troca de arquivos P2P (peer-to-peer)44, los de negócios; e a viabilização dos programas servidores de acesso foram obrigados a cortar a de inclusão digital, já que o orçamento público conexão dos usuários acusados de trocar arquivos não seria suficiente para os projetos caso fossem através desta tecnologia. Além disso, os titulares utilizados sistemas proprietários. de direitos autorais poderão intimar os provedores Alguns estados brasileiros já haviam buscado de acesso para obter informações pessoais sobre implementar políticas de incentivo ao software usuários suspeitos, transformando pessoas comuns livre. O Rio Grande do Sul, caso mais emblemático, em potenciais criminosos. aprovou uma lei estadual em 2002 tornando pre- 43. Em inglês, o tratado é conhecido como WIPO Copyright Treaty 44 Conexões ponto-a-ponto, diretamente entre usuários. 44. 45. Tal orientação explica-se pela forte presença de representantes do agro-negócio dentro do governo brasileiro, que possuem grande interesse na abertura do mercado europeu aos produtos agrícolas do Brasil. 46. Fonte: Ministério da Ciência e Tecnologia 81
  • 84. ferencial a adoção de softwares livres nas reparti- operacionais de código aberto. A Secretaria Geral ções públicas. A lei foi contestada na Justiça pela da Presidência e a Radiobrás também estão em Microsoft, e o Supremo Tribunal Federal conce- fase de migração. deu liminar impedindo que ela entrasse em vigor47. Outras iniciativas importantes promovidas pelo O governo federal, em 2003, optou por utilizar os ITI foram a realização de encontros de capacitação precedentes da legislação atual (como a necessi- em software livre e a confecção de diferentes pu- dade de promover o desenvolvimento nacional e blicações que incluem amostras de plataformas de de gerir os recursos públicos de maneira respon- código aberto. Tais produtos procuram apresen- sável) para implementar as políticas de incentivo tar o software livre aos cidadãos e reverter a im- ao software livre. Tal estratégia tem sido pressão generalizada de que os softwares não pro- reproduzida por diferentes governos estaduais e prietários são incompatíveis com os arquivos ge- municipais. Como resultado, o Brasil acabou se rados nos softwares da Microsoft. tornando o país pioneiro a ter uma política pública Simultaneamente, tramita na Comissão de Ci- voltada ao software livre que buscasse superar o ência e Tecnologia, Comunicação e Informática da impasse jurídico surgido a partir da impossibili- Câmara dos Deputados um projeto de lei (PL 3.280/ dade contratual de tradução da licença GNU-GPL48 04) do deputado Luiz Couto (PT-PB) que determina (caracterizada por assegurar o direito de executar, a utilização de software livre em todas as escolas estudar, aperfeiçoar e modificar o programa, as- públicas do país. sim como de redistribuir cópias do mesmo). Em 2003, o Executivo federal criou o Comitê As iniciativas do Ministério da Cultura Técnico de Implementação do Software Livre, ór- O Ministério da Cultura (MinC) é fonte das ou- gão composto por diversos ministérios e coorde- tras principais iniciativas relacionadas à proprie- nado pelo Instituto Nacional de Tecnologia da dade intelectual desenvolvidas pelo Executivo. Em Informação (ITI). O fato de o ITI ser ligado à Casa maio de 2004, o Ministério lançou o Programa de Civil da Presidência da República pode, em parte, Informação e Difusão de Direitos Autorais, cujos ser considerado um sintoma importante do objetivos principais são facilitar o acesso e engajamento do governo federal com a intercâmbio de informação em matéria de implementação do software livre. Na prática, tal propriedade intelectual, condição primeira para se engajamento consiste no incentivo à adoção de criar uma massa crítica sobre como este sistema sistemas abertos pelo poder público, empresas e está consolidado; criar mecanismos legais que cidadãos, à formação de recursos humanos, à facilitem o acesso da maioria da população às disponibilização de verbas públicas para pesquisa obras intelectuais protegidas, de forma compatível em universidades e instituições e à concessão de com o estágio de desenvolvimento econômico e crédito para a formação e desenvolvimento de social do país; fomentar a cultura da propriedade micro e pequenas empresas de softwares. intelectual, em particular o ensino da propriedade Entretanto, dos quatro pontos apresentados, intelectual nas universidades e outros centros de somente o primeiro (e somente em relação ao educação (o Concurso Nacional de Monografias poder público) e o segundo (formação de recursos sobre Direitos Autorais, em curso atualmente, humanos) apresentavam resultados concretos (ou procura responder a esse objetivo); produzir pelo menos iniciativas concretas) até o fechamento eventos divulgadores dos princípios fundamentais deste relatório49. da propriedade intelectual e publicações Atualmente, seis ministérios (Minas e Energia, especializadas para distribuição gratuita junto ao Comunicações, Ciência e Tecnologia, Cidades, Edu- sistema de bibliotecas públicas. cação e Cultura) estão migrando para sistemas 47. A alegação da companhia, aceita pelo Tribunal, foi a de que nenhuma legislação pode regulamentar os tipos de produto a serem comprados pelo poder público. 48. Fonte: www.softwarelivre.gov.br: dia 2 de dezembro de 2003, foi anunciado, durante a II Rodada de Compartilhamento de Software Livre, a criação das licenças CC-GNU GPL e CC-GNU LGPL, (Licença Pública Geral GNU - Creative Commons e Licença Pública Geral Menor do GNU - Creative Commons), unindo assim as entidades Free Software Foundation (www.fsf.org) e a Creative Commons (http://creativecommons.org). A união inédita das duas licenças e entidades deveu-se à iniciativa do governo brasileiro em adotar o uso e o desenvolvimento de software livre. "Trata-se de um momento histórico. As licenças CC-GNU GPL e CC-GNU LGPL são produtos genuinamente brasileiros. O Brasil ensina assim a todos nós uma lição importante e útil", comentou Lawrence Lessig, professor de Direito da Universidade de Standford e presidente da Creative Commons. 49. Para saber mais sobre a disponibilização de verbas públicas para pesquisa e a concessão de crédito para a formação e desen- volvimento das micro e pequenas empresas, consultar o Pilar D deste relatório. 82
  • 85. O incentivo ao Creative Commons ras repassem 1% do valor de venda para a criação Em junho de 2004, o governo federal oficiali- de um Fundo Pró-Leitura. zou apoio ao Creative Commons50. A estratégia O Ministério da Cultura (MinC) planeja também revela que, diante da maneira pela qual a revolu- implantar 1,3 mil bibliotecas públicas até 2006. ção digital afeta a realidade de todos os bens in- O número representa o total de municípios brasi- telectuais, é preciso disponibilizar licenças jurídi- leiros que não possuem bibliotecas públicas. Por cas que permitam o acesso às obras pelo público meio do Projeto Fome de Livro, coordenado pela sob condições mais flexíveis. Fundação Biblioteca Nacional, o governo federal Na prática, além da criação de um instrumento vai celebrar convênios com prefeituras e entida- legal, busca-se a sensibilização dos titulares do des da sociedade civil para garantir que todos os direito autoral (os autores) para a necessidade de municípios – mesmo aqueles com menos de cinco circulação das criações. Substancialmente, procu- mil habitantes –, possuam pelo menos uma ra-se um incremento do significado da função so- biblioteca pública. Apesar das formas de cial do direito de autor e a criação de instrumen- implantação do projeto ainda permanecerem em tos legais para possibilitar a realização dessa “nova discussão no âmbito do MinC, os responsáveis cultura”. pelo projeto sustentam que a meta será cumprida. O Creative Commons não contradiz a legisla- ção existente e conviverá em harmonia com a le- Povos tradicionais gislação que regula os direitos autorais no Brasil. O patrimônio cultural dos povos tradicionais, Entretanto, as ações que buscarão incentivar os como danças, músicas, narrativas, grafismos e ar- autores a colocar suas obras sob o novo formato tesanato, apesar de possuir garantia constitucio- de licença de uso, apesar das declarações públicas nal, ainda não virou objeto de legislação específi- do ministro da Cultura, ainda não se concretiza- ca. Entidades indígenas, principalmente nos ram. últimos anos, têm defendido que este conheci- Outra proposta em gestação é o projeto Canto mento faça parte dos mecanismos de proteção da Livre, que prevê a criação de um novo modelo de propriedade intelectual, para que o patrimônio dos licenciamento musical para troca de músicas na povos tradicionais não seja fruto da exploração internet. A iniciativa envolve o Ministério da Cul- econômica predatória. A busca das entidades, em tura, a Fundação Getúlio Vargas (FGV), o Grupo especial do Instituto Indígena Brasileiro da CESAR (Centro de Estudos Avançados do Recife), a Propriedade Intelectual (Inbrapi), não é cercear o Universidade de Stanford e o Berkman Center (da acesso ao patrimônio intelectual indígena e dos Universidade de Havard), entre outros. Atualmen- povos tradicionais, mas garantir a integridade mo- te, a FGV está desenvolvendo o software do proje- ral dos povos e reconhecimento por sua produção to com recursos do Fundo Setorial de Tecnologia imaterial. da Informação51. A discussão sobre a proteção às manifestações e expressões dos povos tradicionais e do folclore Desoneração de livros e implantação de bibli- brasileiro tem crescido dentro do Ministério da otecas públicas Cultura, mas ainda é tímida sua inserção na agen- Em novembro de 2004, o governo federal en- da governamental. Dois grandes eventos promo- viou para aprovação no Congresso Nacional um vidos pelo governo em 2004 discutiram formatos projeto para regulamentar a lei que instituiu a Po- de legislação que garantam e zelem pelos direi- lítica Nacional do Livro (Lei 10.753/03), com o tos coletivos relativos aos saberes e modos de fa- objetivo de desonerar a produção de livros. Com zer das culturas populares. A implementação do a medida, que deve ser aprovada pelo Legislativo, Programa Nacional de Patrimônio Imaterial, insti- os livros de toda natureza deixam de pagar con- tuído em 2000, mas que nunca saiu do papel, tem tribuições como o PIS, Pasep e Cofins. Tais impos- sido objeto de pressão de entidades da sociedade tos representam juntos uma carga de 9,25% sobre civil e esteve presente nos debates promovidos o faturamento das editoras. A expectativa, segun- pelo Ministério da Cultura. do editoras e governo, é de que haja uma redução Estas iniciativas, porém, não se traduzem em de 10% sobre o preço do livro para o consumidor esforços do governo para a aprovação do Projeto em um prazo de até quatro anos. Além disso, o de Lei 2.057/91, que dispõe especificamente sobre projeto enviado ao Congresso prevê que as edito- os direitos autorais coletivos e tem como objetivo 50. Para saber mais sobre o Creative Commons no Brasil acesse www.direitorio.fgv.br/cts 51. Fonte: Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), empresa pública vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia 83
  • 86. preservar a cultura indígena e evitar sua tendia, segundo as suas primeiras versões, alterar apropriação por terceiros. Entretanto, o mesmo alguns dispositivos da Lei 9.610/98. projeto, cuja aprovação é reivindicada pela Inbrapi, Uma das mudanças mais importantes ligadas procura garantir os direitos de exploração econô- à questão do direito autoral era a transferência de mica dos bens culturais dos povos tradicionais nos responsabilidade sobre a regulamentação da ar- moldes da Lei 9.610/98. Nesse sentido, evitar a recadação de direitos autorais sobre obras apropriação por terceiros, questão urgente e ne- audiovisuais. Pela proposta, a regulamentação fi- cessária, tende a criar mecanismos igualmente caria a cargo da Agência Nacional Cinema e do perversos que cerceiam o acesso aos bens Audiovisual (Ancinav), e não mais sujeita ao Escri- imateriais dos povos tradicionais, seja para o co- tório Central de Arrecadação (Ecad). nhecimento público, seja para releituras criativas Além disso, a proposta de Lei Geral de das obras. Assim como nos outros campos do co- Audiovisual definia que os bens culturais produ- nhecimento e da cultura, deve-se procurar formas zidos com recursos públicos tornar-se-iam passí- de proteção ao patrimônio imaterial que sejam veis de uso após oito anos, sem autorização do eficazes, mas que evitem transformar tal conheci- titular do direito, por canais públicos e estatais mento em mercadoria, mesmo que coletiva. de radiodifusão, assim como em estabelecimen- tos públicos de ensino. Lei Geral do Audiovisual Essas propostas foram suprimidas quando a A proposta de Lei Geral do Audiovisual52, atu- abrangência da Ancinav foi consideravelmente re- almente em discussão pelo governo brasileiro, pre- duzida nas últimas versões tornadas públicas. 52. Para consultar as minutas do projeto e as contribuições da sociedade civil ver www.cultura.gov.br 84
  • 87. B 3: Todos os trabalhos financiados e produzidos de forma pública se tornam parte do domínio público. B 3.1 - Políticas públicas e medidas práticas para assegurar que todo o conhecimento apoiado por fundos públicos se torne imediatamente parte do domínio público. B 3.2 - (Ver A.3.3) O volume de informação mantida por órgãos públicos deve ser colocado sob domínio público. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL nhecimento – cultural e científico – produzido com o apoio de recursos públicos, se torne parte do Domínio público domínio público. A já citada proposta da Lei Geral Do ponto de vista legal, hoje só existem três do Audiovisual, se aprovada, viria a se tornar o circunstâncias pelas quais determinado conheci- único instrumento legal com essa perspectiva e, mento se torna de domínio público: mesmo assim, garantiria um uso limitado das • Vencimento dos prazos de proteção aos di- obras audiovisuais financiadas por verbas públi- reitos patrimoniais (estendidos para até 70 anos cas somente após oito anos de sua primeira após a morte do autor); no caso das obras veiculação. audiovisuais, o prazo de proteção é de 70 anos A única menção sobre este tema na legislação contados após o 1º de janeiro seguinte ao lança- brasileira atual refere-se à propriedade estatal (e mento da obra53; e, no caso de obras fotográficas, não ao domínio público) das obras produzidas com a partir de 1º de janeiro do ano seguinte à publi- verbas públicas e vai na direção contrária à cação; abertura. Nesse sentido, a Lei 9.610, em seu artigo • Falecimento do autor, sem deixar herdeiro 6º, afirma que “não serão de domínio da União, reconhecido; dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípi- • Autoria desconhecida, ressalvado quando se os as obras por eles subvencionadas”. tratar de conhecimento popular, folclórico ou na- As instituições de fomento à pesquisa mais tivo (de forma a proteger os povos tradicionais). importantes no Brasil, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) Usos alternativos têm de ser autorizados54 pelo e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de autor, de maneira explícita – caso contrário, a lei São Paulo (Fapesp), não mantêm esforços organi- assume que “todos os direitos estão reservados” zados para compartilhar o conhecimento produ- e qualquer uso (como cópia e adaptação sem ex- zido com seus recursos. Ao contrário, ambas as pressa autorização do titular do direto, por exem- instituições mantêm departamentos que auxiliam plo) decorre em infração do direito autoral, res- os pesquisadores a registrarem seus inventos e salvados os poucos, e restritos, casos previstos em obras para garantir sua exploração comercial. lei que permitem o uso lícito sem expressa autori- Entretanto, alguns aspectos das políticas de zação do titular. financiamento de pesquisas são de caráter essen- cialmente público e têm como fundamento a pro- dução de conhecimento que auxilie o poder público IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO a efetivar direitos humanos. Um bom exemplo dessas linhas de financiamento são as pesquisas Não há, no Brasil, qualquer dispositivo legal que visam ao aprimoramento da produção de cis- que garanta, ou pelo menos incentive, que o co- ternas, tecnologia de baixo custo que propicia o 53. Para que uma criação se torne de domínio público no Brasil, portanto, são necessários 20 anos a mais do que impõe o TRIPS, que estabelece que o tempo mínimo de proteção dos direitos do autor é de 50 anos. Na legislação aprovada em 1973, que antecedeu a Lei 9.610/98, o Brasil também garantia os direitos patrimoniais por 70 anos, 20 a mais do que prevê a Convenção de Berna. 54. Como veremos, algumas licenças como a GNU e a Creative Commons procuram flexibilizar as regras da Lei 9.610/98. 85
  • 88. armazenamento de água no semi-árido brasilei- triz de governo atual, que aponte para que o co- ro. Na área da Comunicação, o incentivo ao de- nhecimento financiado por órgãos públicos seja senvolvimento do software livre é a mais clara colocado sob domínio público. Contudo, é possí- iniciativa nesse sentido. Porém, o pequeno aporte vel afirmar que há uma tendência do poder públi- de recursos para a pesquisa acadêmica e científica co em disponibilizar para consulta56 e reprodução pelos sucessivos governos55, por melhores que se- (resguardada a citação da fonte), as informações jam as intenções dos gestores das verbas, preju- mantidas sob seu domínio. O pequeno número dica a promoção em grande escala desse perfil de de pessoas incluídas digitalmente é, por certo, financiamento. uma limitação a essa intenção de tornar acessí- Portanto, não há uma tradição, nem uma dire- veis essas informações ao conjunto da população. B 3.3 - Canais e empresas públicas devem colocar seus arquivos sob domínio público. Comunicação pública diatamente sob domínio público. Há, entretanto, Os serviços públicos de comunicação no Brasil mesmo entre os defensores de políticas mais fle- têm políticas distintas em relação ao uso de seus xíveis de direitos autorais, uma tendência em arquivos. A Fundação Padre Anchieta, entidade de apontar que a melhor solução seria a de assegu- direito privado mantenedora da TV Cultura, maior rar que o conhecimento mantido por verbas pú- televisão de caráter público do país, não blicas fosse disponibilizado em regimes que pos- disponibiliza a totalidade de seus documentos ao sibilitem a maior liberdade de acesso, como os público e a maior parcela da programação é pro- registros inspirados no Creative Commons. tegida por direitos autorais “convencionais”. Além Tal argumento sustenta-se na idéia de que um disso, para ter acesso a cópias de programas é sistema que obrigasse que o conhecimento pro- preciso pagar taxas que visam, além de cobrir o duzido com apoio de verbas publicas se tornasse custo das cópias, financiar a manutenção da emis- de domínio público stricto sensu poderia tornar o sora. regime de propriedade intelectual desequilibrado, Já a Radiobrás, vinculada ao governo federal, desestimulando a criatividade e a produção de mantém, historicamente, todo seu conteúdo conhecimento. Isso ocorreria, inclusive, na área disponibilizado para uso do público e para repro- cultural, onde boa parte das produções são dução em outros veículos de comunicação, tendo mantidas com verbas públicas, direta e indireta- como única exigência a citação da fonte. Da mes- mente, pelos mecanismos de renúncia fiscal. Por- ma maneira procedem as agências, rádios e tele- tanto, a questão da colocação em domínio públi- visões dos poderes Legislativo e Judiciário nacio- co de todo o conhecimento produzido com verba nais, e as mídias estatais regionais e locais, como pública deve estar subordinada à adoção de regis- as televisões dos Legislativos estaduais e munici- tros inspirados em iniciativas como a do Creative pais. Commons e do GNU-GPL, a fim de evitar que É importante ressaltar que juristas e pesquisa- empresas privadas e/ou governos de outros países dores sobre propriedade intelectual divergem so- se apropriem, na forma de propriedade intelectual, bre a necessidade de colocar todas as “categori- deste conhecimento. as” de conhecimento financiadas pelo Estado ime- 55. Fontes oficiais afirmam que o Brasil investe atualmente 1,05% do PIB em pesquisa. Desse montante, segundo a Fapesp, 63% têm origem estatal (o que corresponde a 0,66% do PIB). Entretanto, outras fontes ligadas ao próprio governo contestam esses números, afirmando que parcela significativa desses valores é “contingenciada”, ou seja, consta nos orçamentos, mas não é de fato executada. 56. Sobre acesso a informações públicas e governamentais, consultar o Pilar A deste relatório. 86
  • 89. B4: Participação efetiva da sociedade civil no processo de governança, inclusive em sua formulação, preparação, regulação, implementação e revisão, além de apoio para participação em nível internacional. B4.1 Um processo participativo de desenvolvimento de políticas, que inclua participação significativa da sociedade civil e os recursos necessários para que todos os parceiros dêem contribuições efetivas. B4.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas e atendidas. B4.3 Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais. B4.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo . BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL interlocução com a sociedade civil. Desde 2003, o IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO Ministério da Cultura vem promovendo encontros temáticos sobre direitos autorais e diversidade A participação da sociedade civil na formula- cultural para colher sugestões e apresentar suas ção, implementação e revisão dos mecanismos de propostas à sociedade. Da mesma forma, o gover- partilha do conhecimento em espaços no federal tem apoiado materialmente a realiza- institucionais praticamente inexiste57. Tampouco ção de eventos capitaneados por organizações ci- há mecanismos de participação permanente na vis. Foi exatamente num destes encontros, o 5º revisão e implementação das políticas e leis em Fórum Internacional de Software Livre de Porto curso, nacional e internacionalmente. A decisão Alegre, que o governo anunciou seu apoio ao do governo brasileiro de incorporar observadores Creative Commons. da sociedade civil na delegação que foi a Genebra O Instituto Nacional de Tecnologia da participar da primeira fase da Cúpula Mundial Informação (ITI) tem promovido consultas públicas sobre a Sociedade da Informação foi positiva, mas, para a confecção de materiais relacionados à pela forma como foi conduzida, a abertura não se difusão do software livre. As consultas, porém, são traduziu numa efetiva participação da sociedade realizadas pela internet e, mais uma vez, esbarram civil. Foram realizadas poucas reuniões, sem uma no acesso restrito da população brasileira às novas real abertura do governo para construir sua posição tecnologias. a partir desse diálogo. Essa participação não se refletiu, necessariamente, na incorporação de po- sições da sociedade por parte do governo. PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS Abertura circunstancial de espaços de interlocução Todavia, a recente postura de setores do go- A disponibilidade para o diálogo demonstra- verno brasileiro abriu canais de diálogo e da pelo governo que tomou posse em 2003, en- 57. Uma honrosa exceção é o Comitê Gestor da Internet no Brasil, criado pelo Decreto 4.829/03. Para saber mais, consultar os atributos A6, C5 e D4 deste relatório. 58. Exceto, e mais uma vez demonstrando as contradições internas do governo, pela criação do já citado Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos contra a Propriedade Intelectual, que reduz o tema à sua expressão penal. 87
  • 90. tretanto, não se traduz na institucionalização de propriedade intelectual. espaços de formulação e deliberação dos aspec- Se muitos artistas (músicos e escritores, princi- tos relacionados à propriedade intelectual no Bra- palmente) permanecem como porta-vozes da in- sil58. Nessa perspectiva, o esforço governamen- dústria do direito autoral, cobrando da popula- tal corre sérios riscos de ser perdido se as forças ção atitudes dentro da “legalidade”, um número políticas presentes no governo forem substituí- cada vez maior deles defende não só a livre circu- das por outras, com setores menos favoráveis à lação de suas obras pela internet como procura participação civil. encontrar meios para a produção de seus traba- É preciso reforçar que as entidades gestoras de lhos que não criem relação com a indústria do di- direitos autorais e, especialmente, a industria, reito do autor, principalmente no segmento musi- permanecem atuando no campo político. Tal cal. Nesse sentido, há que se ter como central o atuação é marcada por lobbies permanentes no papel dos criadores. Somente uma valorização da Congresso Nacional e pela constante presença de função social das obras por parte daqueles que peças publicitárias na grande mídia que difundem cedem os direitos patrimoniais de suas criações a o discurso do combate à pirataria e buscam terceiros é que pode tornar mais favorável a cor- criminalizar o usuário de cópias não autorizadas. relação de forças nas disputas sobre um regime Do outro lado, se o estudo da propriedade in- mais flexível de partilha do conhecimento. telectual é um dos temas centrais sobre o impac- Por fim, vale ressaltar que as ações do ITI e do to da revolução da internet na sociedade, há de se Ministério da Cultura, atualmente em curso – leia- destacar que ainda não há no conjunto da socie- se Software Livre e Creative Commons – são hoje dade a percepção de que a legislação e as políti- uma política estatal, mas surgiram e foram for- cas públicas relativas aos direitos autorais (que se muladas pela sociedade civil nacional e internaci- insere no tema da propriedade intelectual) são onal. Foi ela – a sociedade civil – que construiu as fundamentais para o desenvolvimento social e comunidades de desenvolvimento e compartilha- econômico do país. Sem medo de errar, podemos mento, mostrando ser possível uma nova forma afirmar que ainda prevalece na sociedade a idéia de organização e produção econômica que bus- de que a questão mais importante a ser resolvida que o desenvolvimento das nações a partir da cir- nesse tema é a pirataria. culação do conhecimento. Foi também a socieda- Entretanto, e isso é importante frisar, crescem de civil que desenvolveu as licenças que permi- os espaços de debate sobre propriedade intelec- tem a flexibilização dos direitos autorais. Portan- tual, possibilitando o amadurecimento de uma to, a apropriação dessas políticas pelo Estado só articulação da sociedade civil para a construção é possível porque são sustentadas pela sociedade de um regime de partilha de conhecimento mais civil. Sem o apoio efetivo da sociedade brasileira, justo. Um dos quatro temas escolhidos para a atu- iniciativas dessa natureza tendem a ser esmagadas ação da CRIS Brasil – Articulação Nacional pelo pelos lobbies da indústria do direito autoral. Direito à Comunicação é justamente o da 88
  • 91. Pilar C Liberdades civis e direitos políticos na Sociedade da Informação A existência de uma zona de transição com política pela desregulamentação do mercado como limites incertos entre o que é vida privada e o que forma de abertura e estímulo à competição. O é vida pública faz com que o conflito entre a governo Lula não interferiu, até agora, de maneira liberdade de informação e o direito à privacidade mais sensível nessa área. A única exceção é a seja o principal mote estudado sob este pilar. É reorganização do Comitê Gestor da Internet no possível depreender, a partir do quadro descrito a Brasil, que passou a ter caráter mais democrático seguir, que não existe marco regulatório (com eleição direta pelos pares) e plural (com consolidado na área – resultado tanto da representação da sociedade civil), assumindo um obsolescência da legislação quanto de uma opção papel mais ativo na gestão da rede no país. C1: Privacidade de informação e proteção de dados, atendendo ao direito de saber, acessar, corrigir e controlar o uso de toda informação pessoal mantida em forma digital por outrem. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL “quando necessário ao exercício profissional”. A Lei de Imprensa (5.250/67) também garante Toda a legislação sobre este atributo parte do liberdades civis (além da liberdade de expressão, artigo 5º da Constituição de 1988, referente às já tratada nesta pesquisa sob o Pilar A), ao garantias civis. De maneira geral, o inciso X desse determinar que “é livre a manifestação do pensamento artigo descreve o direito à privacidade de e a procura, o recebimento e a difusão de informações informação, ao determinar como “invioláveis a in- ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de timidade, a vida privada, a honra e a imagem das censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos pessoas, assegurado o direito à indenização pelo abusos que cometer”. Porém, a mesma legislação, dano material ou moral decorrente de sua redigida durante o período da ditadura militar, violação”. apresenta tópicos que chegam próximos de No que tange ao acesso à informação, é impor- legitimar práticas de censura. Por exemplo, o tante destacar o inciso XIV, que se refere especial- parágrafo 1° do artigo 1° define que “não será mente ao jornalismo e que assegura a todos o tolerada a propaganda de (...) processos de acesso à informação e resguarda o sigilo da fonte, subversão da ordem política e social”1. 1. Na prática, o Judiciário não tem aplicado a Lei de Imprensa, dada a sua natureza discricionária. Mas a simples existência de uma legislação do período da ditadura militar para a regulamentação do funcionamento da imprensa segue sendo um problema. 89
  • 92. C 1.1 - Leis que assegurem que dados pessoais são mantidos pelo mínimo período necessário, bem como utilizados apenas para os propósitos autorizados expressamente pela pessoa a qual se referem. Isto inclui dados pessoais fornecidos a serviços (saúde, finanças, compras etc.), atividades de segurança pública ou privada, material de vigilância em vídeo, informações inclusas em fichas de identificação (em eventos ou pedidos de emprego), e dados de funcionários mantidos por empregadores. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL LXXII - conceder-se-á hábeas-data: O artigo 5º da Constituição garante ao cidadão a) para assegurar o conhecimento de informações ou pessoa jurídica o pleno acesso a informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de de seu interesse e a gratuidade da emissão de tais registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público; informações, inclusive em relação a certidões. b) para a retificação de dados, quando não se prefira De outro lado, no que diz respeito a prazos fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou adminis- para atendimento, a Lei 9.051/95 dispõe sobre a trativo; expedição de certidões para a defesa de direitos ou esclarecimentos de situações, estabelecendo 15 Apesar da redação referente ao setor público, a dias como prazo improrrogável. lei que define o hábeas-data (Lei 9507/97), inclui É interessante notar que este dispositivo é va- uma abertura que lhe permite valer sobre bancos lido inclusive para a Agência Brasileira de de dados privados, ao definir que “considera-se de Informações (Abin – o serviço secreto do governo caráter público todo registro ou banco de dados federal). Se um cidadão quiser saber se existem contendo informações que sejam ou que possam ser informações a seu respeito no banco de dados da transmitidas a terceiros ou que não sejam de uso Abin pode requerê-las, pois a Constituição de privativo do órgão ou entidade produtora ou 1988, em seu artigo 5º, inciso XXXIII, prevê a depositária das informações”. obtenção, em órgãos públicos, de certidões de Sempre que dada empresa repassa informações registros pessoais, constantes em banco de dados, de sua posse, mesmo que de forma autorizada, para a defesa de direitos e esclarecimentos de referentes a uma ou mais pessoas, configura-se a situações de interesse próprio. Em cumprimento transmissão e, portanto, o caráter público dessas à legislação que regula a matéria, têm sido informações. Note-se que tal transmissão, obvia- atendidas solicitações dessa natureza, desde que, mente, só poderia ser feita mediante autorização para isso, o interessado envie um requerimento dessas pessoas. Caso contrário, já se figura a vio- dirigido ao Ministro-Chefe do Gabinete de lação da privacidade de informação. Segurança Institucional da Presidência da República Nenhum desses incisos, entretanto, é claro so- com dados pessoais (nome, filiação, identidade, bre as particularidades do uso da informação como CPF), anexando cópia da identidade. Esses tratada no quadro de referência genérico deste documentos podem ser enviados para o endereço relatório. Não se fala explicitamente de tempo de da sede da Abin, em Brasília, e o modelo do conservação, usos ou retransmissão. Nem Requerimento de Informações Pessoais está tampouco este instrumento jurídico prevê sanções disponibilizado na página da agência na internet. por mau uso ou a remoção da informação. O direito descrito no inciso XXXIII, citado acima, Neste ponto, a Política Nacional de Arquivos é regulamentado através de instrumentos jurídi- (Lei 8.159/91) é a que se mais aproxima de uma cos que visam à preservação da pessoa. A preser- especificação do assunto: vação de informações pessoais é comparada à pre- servação física da pessoa, através do instrumento Art. 2º - Consideram-se arquivos, para os fins desta jurídico do hábeas-data (análogo ao habeas Lei, os conjuntos de documentos produzidos e re- corpus), previsto na Constituição Federal, que ga- cebidos por órgãos públicos, instituições de cará- rante à pessoa física ou jurídica o direito de acessar ter público e entidades privadas, em decorrência e corrigir qualquer informação referente a si de do exercício de atividades específicas, bem como posse de terceiros. por pessoa física, qualquer que seja o suporte da 90
  • 93. informação ou a natureza dos documentos. Também na Lei 8.159, da Política Nacional de Arquivos, o texto é bastante específico quanto ao Art. 3º - Considera-se gestão de documentos o con- direito de todos ao acesso à informação de posse junto de procedimentos e operações técnicas refe- de órgãos públicos. Define-se ali, contudo, uma rentes à sua produção, tramitação, uso, avaliação ressalva em relação “àquelas cujo sigilo seja im- e arquivamento em fase corrente e intermediária, visando a sua eliminação ou recolhimento para prescindível à segurança da sociedade e do Esta- guarda permanente. do, bem como à inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas”. Nesta lei, vale ainda destacar o artigo 23: Os arquivos públicos estão claramente defini- dos nessa lei, com critérios de classificação da Art. 23 - Decreto fixará as categorias de sigilo que informação, de acordo com acesso e necessidade deverão ser obedecidas pelos órgãos públicos na de conservação, por exemplo. Já no caso de classificação dos documentos por eles produzidos. arquivos privados, a Política de Arquivos legisla § 1º - Os documentos cuja divulgação ponha em risco ao tratar de informação declarada “de interesse a segurança da sociedade e do Estado, bem como público e social”, passando a vigorar sobre estes aqueles necessários ao resguardo da inviolabilidade uma regulação comparável àquela do arquivo pú- da intimidade, da vida privada, da honra e da ima- blico. gem das pessoas são originariamente sigilosos. Os arquivos privados são tratados especifica- § 2º - O acesso aos documentos sigilosos referentes à segurança da sociedade e do Estado será restrito mente sob o Código de Proteção e Defesa do por um prazo máximo de 30 (trinta) anos, a contar Consumidor (Lei 8.078/90). O código define que o da data de sua produção, podendo esse prazo ser consumidor “terá acesso às informações existentes prorrogado, por uma única vez, por igual período. em cadastros, fichas, registros e dados pessoais e § 3º - O acesso aos documentos sigilosos referentes de consumo arquivados sobre ele, bem como à honra e à imagem das pessoas será restrito por sobre as suas respectivas fontes”. A lei prevê ainda um prazo máximo de 100 (cem) anos, a contar da o direito de exigir imediata correção no caso de data de sua produção. encontrar-se inexatidão nos dados. Também é relevante a definição prevista de que “os bancos No apagar das luzes do governo Fernando de dados e cadastros relativos a consumidores, os Henrique Cardoso, foi editado o Decreto 4.553, serviços de proteção ao crédito e congêneres são de 27 de dezembro de 2002, que buscava regula- considerados entidades de caráter público”. mentar o artigo acima da Lei 8.159/91. Nele, fica- Portanto, fica definido que quaisquer bancos va definido que determinados documentos, con- de dados privados que contenham informações siderados “ultra-secretos”, poderiam permanecer pessoais, colhidas com fins comerciais – seja um assim indefinidamente (“sigilo eterno”). serviço ou uma compra de fato –, ganham caráter Posteriormente, o governo Lula publicou o público, e são objeto de hábeas-data. Decreto 5.301, de 9 de dezembro de 2004, que O Código de Proteção e Defesa do Consumidor modificou o Decreto 4.553 e redefiniu a regula- ainda é complementado pela Portaria SDE nº 5, mentação para o artigo 23 da Lei 8.159/91. O de 27 de agosto de 2002, da Secretaria de Direito Decreto retoma os prazos anteriores, mas abre Econômico do Ministério da Justiça, que define uma possibilidade para a manutenção do “sigilo como abusiva, nos contratos de fornecimento de eterno”. produtos e serviços, a cláusula que “autorize o envio do nome do consumidor, e/ou seus garantes, Art. 5º A autoridade competente para classificar o a bancos de dados e cadastros de consumidores, documento público no mais alto grau de sigilo po- sem comprovada notificação prévia”. A portaria derá, após vencido o prazo ou sua prorrogação, previstos no § 2º do art. 23 da Lei nº 8.159, de 8 de também considera abusiva cláusula que “imponha janeiro de 1991, provocar, de modo justificado, a ao consumidor, nos contratos de adesão, a obri- manifestação da Comissão de Averiguação e Aná- gação de manifestar-se contra a transferência, one- lise de Informações Sigilosas para que avalie, pre- rosa ou não, para terceiros, dos dados cadastrais viamente a qualquer divulgação, se o acesso ao confiados ao fornecedor”. documento acarretará dano à segurança da socie- dade e do Estado. 91
  • 94. C 1.2 - Garantia do cumprimento de tais leis de modo acessível financeiramente, transparente e pró-ativo, e com o direito de revisão quando direitos tiverem sido violados. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL A atuação da sociedade civil neste campo é bas- tante limitada. Dada a natureza corretiva do No que se refere a todas as garantias civis, é hábeas-data e o acesso mais restrito a um dever do Ministério Público sua preservação, bem advogado e mesmo ao MP, grande parte da como das liberdades individuais e coletivas. O MP população fica excluída do acesso a estes direitos. não age apenas de maneira corretiva mediante Resta a opção de acionar o sistema de proteção ao ação, mas pode pró-agir em assuntos que lhe fo- consumidor, por meio da Procuradoria de Defesa rem pertinentes. “O MP tanto pode agir por sua do Consumidor (Procon), que existem em âmbito própria iniciativa, sempre que considerar que os estadual e municipal. Os Procons têm uma atuação interesses da sociedade estejam ameaçados, quan- ampla e muitas vezes eficiente, mas nem por isso to pode ser acionado por qualquer cidadão que chegam a ser pró-ativos no que tange à privacidade considerar que algum direito ou princípio jurídi- de informações. co esteja sob ameaça” (página do MPF, Há também a Delegacia de Meios Eletrônicos, www.mpf.gov.br). uma divisão da Polícia Civil especializada na in- Além disso, mesmo considerando-se a indepen- vestigação dos delitos cometidos especificamen- dência do MP, estabelecida pela Constituição de te através das tecnologias de informação e 1988, trata-se de uma parte do sistema de Justiça. comunicação (TICs). C 1.3 - Existência de uma cultura ampla e difundida de auto-regulação e códigos de conduta em termos de privacidade e proteção de dados, entre atores da sociedade civil, do governo e do setor privado. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL traz a informação sobre conteúdo com copyright, e quase todo site que coleta algum tipo de infor- Não existe, hoje, código de conduta consolida- mação inclui sua política de privacidade. do entre provedores de acesso, provedores de Estes componentes são sinais de que, apesar infra-estrutura e os diferentes atores que utilizam de não haver auto-regulação no sentido clássico, a internet. Existem, sim, componentes comuns às existe certa cultura comum, com princípios próxi- mais diversas políticas de privacidade, impostos mos – muitas vezes baseados, ou mesmo vincula- principalmente por tendências internacionais. Por dos, a referências externas, como leis norte-ame- exemplo, a grande maioria dos sites informativos ricanas e européias. IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO informação. Na prática, fica em aberto a C1.1, C1.2 E C1.3 possibilidade da guarda permanente de qualquer informação, por parte tanto de empresas quanto Há uma base legal relativamente frouxa acerca de órgãos públicos. da gestão da informação. A regulamentação do Não existe, portanto, uma regulamentação ge- Código de Proteção e Defesa do Consumidor ral que discipline a coleta de informações. Existe, equiparou os dados mantidos por entidades atualmente, uma tendência entre grandes empre- privadas com aqueles mantidos por entidades sas, ao colher dados na internet, de colocar em públicas, expandindo o acesso e o controle que o evidência sua política de privacidade, explicitando indivíduo pode ter sobre suas informações pessoais se repassam ou não os dados sem autorização. mantidas por terceiros. Essa regulamentação, O instrumento jurídico do hábeas-data é uma entretanto, não preenche alguns requesitos, entre ferramenta válida para resguardar a privacidade eles a informação sobre o tempo de manutenção de informação, mas é uma ferramenta corretiva, e regras claras para a eventual eliminação dessa não uma regra disciplinar da gestão da informa- 92
  • 95. ção. E também não prevê a definitiva remoção da De um lado, existem os usos já considerados informação sob guarda das empresas. criminosos: estelionatos e fraudes, utilizando se- Estes dispositivos constitucionais foram regu- nhas e números de cartões de crédito roubados. lamentados e, portanto, especificados em sua apli- De outro, a sofisticação da propaganda criou uma cação. É importante citar que nem todos os as- nova técnica: a modelagem de comportamento dos pectos necessários à garantia da privacidade de consumidores, que faz uso de questionários e informações estão aqui cobertos – especificamen- ferramentas estatísticas para direcionar te, o tempo durante o qual uma informação pode propagandas e outros tipos de ações de marketing. ser mantida, seja por ente público ou privado, Este tipo de modelagem consegue prever, com boa restrições quanto à venda e duplicação de bancos margem de sucesso, o comportamento dos de dados etc. usuários – ou clientes – de determinada empresa A aplicabilidade das leis em vigor fica especial- ou serviço. Isso permite às empresas direcionar mente a cargo do Ministério Público, conforme propagandas ou ações de marketing específicas. citado sob o item C 1.2. Alimentam estes bancos de dados, inclusive, informações pessoais de ex-usuários destes siste- mas. Não é prática comum a eliminação das infor- O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES mações após o término da contratação dos servi- C1.1, C1.2 E C1.3 ços, e esses dados acabam por continuar “sendo úteis” para as empresas. O Estado brasileiro já instituiu uma série de O cruzamento de informações – e a conseqüen- grupos de trabalho, alguns inclusive em nível te montagem de modelos e perfis – é uma ativi- interministerial, para tratar do assunto privacida- dade de inteligência que chegou ao setor privado de (em 1996, por exemplo). Não houve, entretan- há relativamente pouco tempo. Nenhuma legisla- to, lei, regulamentação ou decreto que atuasse ção regulamenta, hoje, o cruzamento de dados, como base legal ampla para a área, além do Códi- que já parece abusivo em sua definição. Esse uso go de Proteção e Defesa do Consumidor. mercantil, na prática, não tem encontrado limites. Entidades como o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) procuram desenvolver uma Sigilo perpétuo maior conscientização das pessoas, de forma a O mecanismo de “sigilo eterno” contido no cercear práticas de marketing agressivas, como Decreto 5.301 é um sério obstáculo ao esclareci- cartões não-solicitados e propaganda direcionada. mento público, especialmente em um país como Diversos atores têm se manifestado em favor o Brasil, que passou por mais de 20 anos de dita- da abertura dos arquivos da ditadura militar, que dura militar. Coincidentemente, este tipo de sigi- têm sido mantidos em segredo pelo governo bra- lo ganhou notoriedade pública com a publicação, sileiro. Entre eles estão o grupo Tortura Nunca pelo jornal Correio Braziliense, de fotos que se su- Mais, o Centro Santo Dias de Direitos Humanos, punha serem do jornalista Vladimir Herzog, tor- o Fórum de ex-Presos Políticos e a Pastoral Operá- turado e morto em 1975. A Abin e outras fontes ria Nacional. confirmaram, mais tarde, tratar-se de fotos do Além isso, o Congresso Nacional cuida da aná- padre canadense Leopold D’Astous. lise de uma série de projetos de lei que procuram Fotos como essas e outros documentos relaci- tratar mais especificamente da privacidade com onados, entretanto, ainda são segredo militar, e relação às TICs. Veja mais no item “Tendências poderiam muitas vezes ajudar a esclarecer o caso Atuais e Futuras”, abaixo. de mortos e desaparecidos políticos. Contudo, existe um receio, por parte dos militares especialmente, de que a abertura desse tipo de ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS arquivo possa exacerbar tensões que haviam sido C1.1, C1.2 E C1.3 “resolvidas” pela anistia, em 1979. Uma forte crítica feita ao atual governo – o pró- perfis Privacidade e per fis de consumo prio presidente e muitos ministros foram presos Este pilar, na forma como tem sido tratado em políticos – é a de que não houve uma política para termos de políticas públicas, focou-se em um viés revelar fatos relacionados à ditadura militar. de direito do consumidor – portanto, assumindo Diferentemente de países vizinhos, como Argen- que as informações pessoais, na prática, se tina e Chile, que também sofreram com ditaduras, transformaram-se em mercadorias, que têm preço mas onde está havendo um processo de investi- certo – e alto, em geral. gação e cassação de anistias. 93
  • 96. Ministério Público ações, não diretamente relacionadas ao serviço Ocorre hoje uma forte discussão a cerca do que motivou a coleta original da informação. Ministério Público. A principal polêmica fica em Segundo a proposta, dados pessoais devem ser torno da autonomia do órgão, que se tornou in- recolhidos para finalidade determinadas, explíci- dependente do Judiciário a partir da Constituição tas e legítimas, não podendo ser posteriormente de 1988. De um lado, críticos consideram que a tratados de forma incompatível com essas finali- atuação do MP precisa de um mínimo de restri- dades. Além disso, a proposta prevê a proibição ção, pois tem acabado por se prestar a usos políti- do tratamento de dados pessoais referentes a con- co-partidários. O caso Waldomiro Diniz é usado vicções filosóficas ou políticas, filiação partidária como exemplo, onde um Subprocurador da Repú- ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem ra- blica (José Roberto Santoro) “municiaria” a oposi- cial ou étnica, bem como o tratamento de dados ção (PSDB) com documentos para desestabilizar o relativos à saúde, à intimidade e à vida sexual, governo. De outro lado, o PSDB criticou inúmeras incluindo os dados genéticos. vezes o Procurador da República Luiz Francisco Nesta proposta, o deputado procura ir além da Fernandes de Souza por agir a favor do Partido legislação atual e se aproximar de modelos euro- dos Trabalhadores (PT). Ainda assim, os defenso- peus, como na Alemanha e na Inglaterra, onde já res do papel atual do MP garantem que a plena existem leis específicas sobre o tráfego de infor- autonomia é essencial para o Estado de Direito. mações, especificamente na internet. Este projeto, Está em tramitação no Senado o PL 65/99, apre- que se encontra desde 2002 sob exame na Comis- sentado pela Presidência da República, que “proíbe são de Constituição, Justiça e Cidadania da Câmara magistrados, membros do Ministério Público, dos Deputados, vai ao encontro das idéias integrantes do Tribunal de Contas, bem como autori- discutidas no quadro de referência genérico deste dades policiais e administrativas de revelarem ou relatório, e sua transformação em lei representaria permitirem, indevidamente, que cheguem ao um significativo avanço no trato das informações conhecimento de terceiro ou aos meios de comunica- pessoais no Brasil de hoje. ção fatos ou informações de que tenha ciência em razão O Projeto de Lei do Senado 95/03, proposto do cargo e que violem o sigilo legal, a intimidade, a pelo senador Valmir Amaral (PMDB-DF), procura vida privada, a imagem e a honra das pessoas (...)”. garantir a privacidade de informação da pessoa física na internet. No projeto, entende-se por Projetos de Lei informação pessoal “aquela, de qualquer natureza, Entre as propostas de lei que tratam de assun- pertinente à pessoa, tais como seus hábitos, seus tos correlatos, além do PL 65/99, citado acima, interesses, sua identificação, seus endereços físicos destaca-se o PL 6.981/02, do deputado Orlando e virtuais e seus meios financeiros”. Muito similar Fantazzini (PT-SP), que ”estabelece normas para a é o PL 3.360, de 2000, do deputado Nelson Proença proteção e tratamento dos dados pessoais e dá (PPS-RS), que está na Comissão de Ciência e outras providências”. Primeiramente, ele define o Tecnologia da Câmara desde abril de 2003. que é “tratamento de dados pessoais”, abrangen- Existe ainda o PL 123/03, proposto pelo depu- do todos os usos e campos hoje possíveis. Com tado Newton Lima (PTB-SP). Mais estreito no isso, seja o recolhimento de informação através escopo, este apenas veda a retransmissão ou ces- de robots, o preenchimento de um formulário ou são de informações pessoais. Este texto aguarda a transmissão através de rádio, IP ou meio físico, parecer do relator na Comissão de Constituição e todos os mecanismos estão cobertos de maneira Justiça da Câmara desde 2004. abrangente. O projeto também proíbe a Estes últimos projetos de lei citados se encon- interconexão de dados, entendida como o “relaci- tram englobados na proposta do deputado onamento dos dados de um sistema com dados Fantazzini, ainda que de maneira bem mais armazenados ou conservados com os dados de simplificada. A vantagem do PL do deputado um outro sistema, mantido por outro ou outros Fantazzini com relação aos demais é sua melhor responsáveis, contendo semelhantes ou diferen- definição das áreas abrangidas e das respectivas tes finalidades”. responsabilidades. O interessante dessas propos- Esta particularidade ganha destaque, visto que tas, em separado do Código de Proteção e Defesa uma das grandes possibilidades que empresas do Consumidor e suas regulamentações, é que elas vêem nos seus cadastros de clientes se encontra consubstanciam a noção de que não é a relação no desenvolvimento de perfis, de modo a prever comercial que estabelece as condições de comportamentos e definir públicos-alvos para de- tratamento dos dados, mas sim a inerência do terminadas campanhas de marketing ou outras direito constitucional da privacidade. 94
  • 97. C 2: O direito à privacidade na comunicação é um direito humano e é essencial para o desenvolvimento humano auto- determinado, em atividades tanto cívicas, políticas, sociais e econômicas como culturais C 2.1 - Leis e regulações que assegurem o direito à privacidade na comunicação, seja através da internet, telefonia ou outros meios eletrônicos, com exceções apenas em circunstâncias extremas e claramente definidas, e que valham em ambientes privados, públicos e comerciais. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses: No Estado brasileiro, toda comunicação I - não houver indícios razoáveis da autoria ou interpessoal tem a privacidade protegida, como participação em infração penal; expresso no inciso XII do artigo 5º da Constituição II - a prova puder ser feita por outros meios Federal, que determina ser “inviolável o sigilo da disponíveis; correspondência e das comunicações telegráficas, III - o fato investigado constituir infração penal de dados e das comunicações telefônicas, salvo, punida, no máximo, com pena de detenção. no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de A partir do momento em que se autoriza a es- investigação criminal ou instrução processual cuta, o Ministério Público pode acompanhar a ação penal”. da autoridade policial. Da mesma forma, a Lei Geral das Telecomuni- É importante citar que, ainda que o correio ele- cações (9.427/97) define em seu artigo 3º o direito trônico possa ser entendido como “fluxo de co- “à inviolabilidade e ao segredo de sua comunica- municações em sistemas de informática”, ainda ção, salvo nas hipóteses e condições constitucio- não há definição jurídica plena sobre este meio. nal e legalmente previstas”. “A natureza jurídica da mensagem eletrônica não Uma das hipóteses de violação está na Lei do se encontra definida e por esse motivo reside uma Grampo (9.296/96). Ela define as condições para tendência a equipará-la à correspondência, que interceptação de comunicações telefônicas, de sis- recebe proteção da inviolabilidade do sigilo”2. temas de informática e telemática, para prova em No entanto, há diferenças técnicas que confor- investigação criminal e em instrução processual mam diferentes tratamentos para correspondên- penal. De acordo com o artigo 2º, não será admi- cia por correio ou por e-mail, e que devem ser tida a interceptação de comunicações telefônicas levadas em conta na legislação3. 2. FERREIRA, Ana Amelia Menna Barreto de Castro, na página www.camara-e.net 3. As características que diferenciam o e-mail da correspondência postal por natureza se encontram nos protocolos de transmissão de e-mail (IMAP, POP3 para armazenagem, SMTP para transmissão, etc.), que não garantem, por si, o sigilo da mensagem. Uma analogia válida seria dizer que enviar um e-mail é como enviar um cartão postal; o conteúdo está à mostra, não pode ser ocultado dos mecanismos que o transportarão do remetente ao destinatário. A única alternativa viável para garantir este sigilo, hoje, é o uso de softwares de criptografia – existem milhares de sistemas de criptografia, muitos inclusive em uso por parte de agências de inteligência, outros para fins comerciais. A Infra-Estrutura de Chaves Públicas (ICP-Brasil) é, hoje, o sistema de chaves criptográficas em uso por órgãos oficiais, como a Presidência da República e a Receita Federal. Outra diferença com relação à correspondência postal é que a transmissão e recepção de e-mails não é atividade mediada por concessão ou empresa pública. Provedores de acesso ou empresas têm seus próprios servidores de mensagens, compatíveis entre si, mas com gerenciamento e controles diferentes e independentes. 95
  • 98. C 2.2 - Garantia do cumprimento de tais leis de modo transparente, não- partidário e pró-ativo, inclusive contra violações praticadas pelos Estados, e com o direito de revisão quando direitos tiverem sido violados. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL políticas. O Ministério Público, especificamente a Procuradoria dos Direitos do Cidadão, tem o de- O grampo, especificamente telefônico, é uma ver de apurar os abusos e fiscalizar o bom cumpri- das grandes polêmicas da sociedade brasileira. De mento das leis brasileiras. Segundo o artigo 127 tempos em tempos, vazam para a imprensa o con- da Constituição, “o Ministério Público - MP é uma teúdo de gravações telefônicas ou surgem denún- instituição permanente, essencial função jurisdicional cias de grampos realizados sem autorização judi- do Estado, que tem como atribuição a defesa da ordem cial. jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais Aqui, fica evidente a fraqueza do Estado brasi- e individuais indisponíveis”. leiro quando se trata da fiscalização das próprias C 2.3 - Leis para controlar SPAM (mensagens comerciais de correio eletrônico não solicitadas) e impedi-lo de inibir a capacidade geral de interação na internet. Não existe, hoje, legislação em efeito sobre o midor, que são garantidos pelo inciso XXXII do SPAM. Existem, sim, diversos projetos de lei em artigo 5º da Constituição, e pelo Código de tramitação no Congresso Nacional, que pretendem Proteção e Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90). regular – ou ao menos prever sanções – neste se- Em janeiro de 2005, o Comitê Gestor da Internet tor. no Brasil criou um grupo de trabalho para tratar Enquanto o Brasil é o quarto maior produtor do tema. O objetivo inicial não é o de propor uma mundial de SPAMs, os Estados Unidos, primeiro legislação específica para o assunto, mas de cons- do ranking, aprovaram em dezembro de 2003 a truir um pacto de conduta que envolva diversos CAN-SPAM, lei que tem por intenção controlar o setores envolvidos, como provedores de acesso e SPAM. É importante salientar que esta legislação fornecedores de infra-estrutura de transmissão de ainda não teve efeito sensível. dados (como as empresas de telecomunicações, Na falta de legislação específica, os SPAMs são por exemplo). encarados como violação dos direitos do consu- IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO Certificação Digital C 2.1, C 2.2 E C 2.3 A certificação é o processo usado para garantir a autenticidade e/ou a privacidade de uma mensa- A privacidade nos meios eletrônicos não é con- gem ou documento eletrônico. No caso da auten- solidada no tratamento da informação por parte ticidade, esta é garantida através de assinatura de agentes privados. Empresas monitoram cons- digital; já a privacidade é garantida através de tantemente os e-mails que criam para seus funci- criptografia. onários. Algumas vezes, o propósito é coibir prá- A certificação digital é a ferramenta mais utili- ticas como acesso a pornografia ou manter a pro- zada atualmente para contrabalançar um aspecto dutividade no escritório, mas existem casos de histórico da internet: o anonimato. Através dos interceptação de mensagens que levaram a demis- processos de autenticação e criptografia, é possí- sões por causas trabalhistas – por exemplo, um vel dar validade jurídica a um documento, ao caso em que houve perseguição a funcionários mesmo tempo em que o mesmo continua privati- devido a troca de mensagens organizando greve. vo de poucas pessoas. No caso das comunicações que circulam pela internet, especialmente e-mail, a ferramenta mais Como funciona utilizada para garantir privacidade nas comunica- O processo consagrado no Brasil e na internet ções é a certificação digital – e seu recurso de em geral é o da dupla de chaves pública e priva- criptografia. da. Todo usuário, seja pessoa física ou jurídica, ao 96
  • 99. conseguir a certificação digital, recebe dois códi- Vale a observação de que esta não é a única gos: um que deve ser mantido de posse da pessoa estrutura válida do ponto de vista jurídico no Bra- e outro que pode ser divulgado livremente. sil, visto que qualquer acordo entre partes, vali- Estas “chaves” são criadas através de operações dado em contrato, permite o uso de diferentes matemáticas complexas, e são utilizadas para estruturas de certificação. criptografar ou assinar uma mensagem ou docu- A ICP-Brasil é mantida pelo ITI, que é a Autori- mento. São ligadas uma a outra, mas não é possí- dade Certificadora Raiz da ICP-Brasil. Em outras vel deduzir uma a partir da outra4. Vale destacar palavras, é a partir das chaves do ITI que todas as que a criptografia garante a privacidade, não a outras chaves da estrutura serão criadas. Esta li- autenticidade, assim como a assinatura garante a gação garante a “legitimidade” das chaves, dado autenticidade, não a privacidade. São operações que a ICP-Brasil é avalizada por uma infra-estrutu- distintas e, caso necessárias, podem (e devem) ser ra oficial (o ITI é uma autarquia ligada à Casa Civil feitas uma por vez. da Presidência da República), bem como uma política mínima comum de uso das chaves. Usos e aplicações A ICP-Brasil é gerida pelo Comitê Gestor da ICP- A certificação digital está crescendo no momen- Brasil, composto por sete representantes de mi- to. Toda vez que um usuário acessa um site de um nistérios (Casa Civil, Fazenda, Justiça, Desenvolvi- banco ou de compras – ou seja, sempre que se mento e Comércio Exterior, Planejamento, Ciência estabelece o chamado “ambiente seguro” –, já há e Tecnologia, e Segurança Institucional) e cinco um tipo de certificado digital sendo utilizado, de representantes da sociedade civil, todos indicados forma licenciada pelos bancos para seus softwares pelo Presidente da República. A coordenação deste de internet banking. Da mesma forma, órgãos como comitê fica a cargo do representante da Casa Civil. a Receita Federal já aceitam operações em que os Atualmente, a ICP-Brasil já é utilizada pela Pre- usuários se identifiquem utilizando certificação sidência da República, pelo Sistema de Pagamen- digital – os chamados e-CPF e e-CNPJ, verdadeiras tos Brasileiro (SPB) e pela Receita Federal, além de carteiras de identidade digitais que utilizam bancos e outras entidades. certificação digital para garantir a autenticidade e a privacidade de comunicação entre seus usuários. O programa João de Barro “A assinatura digital é uma das condições ne- Toda a ICP-Brasil utiliza, hoje, tecnologia de cessárias para assegurar os direitos básicos de ci- certificação digital importada. Ou seja, a cada par dadania vinculados ao mundo virtual, como pri- de chaves pública/privada criado, seja pelo ITI ou vacidade, sigilo e confiabilidade das informações pelas outras Autoridades de Certificação (AC) e que trafegam no ciberespaço”, comenta Sérgio Autoridades de Registro (AR), é necessário o paga- Amadeu, presidente do Instituto Nacional de mento de royalties. O programa João de Barro, Tecnologia da Informação (ITI). composto pela Marinha Brasileira (MB) e pelo ITI Vale destacar que o principal estímulo ao uso visa criar uma tecnologia nacional alternativa, que dos e-CPF e e-CNPJ é de natureza econômica. Sem substituirá aquela atualmente utilizada na ICP-Bra- utilizá-los, bancos têm sofrido fraudes, lojas sofrem sil, com a vantagem adicional de ser auditável. inadimplência e roubos de identidade têm ocorri- De acordo com Paulo Sérgio Pagliusi, da Mari- do com freqüência cada vez maior. nha Brasileira, o programa visa à “construção e nacionalização de uma plataforma criptográfica ICP-Brasil aberta e auditável para a AC-Raiz da ICP-Brasil”. A ICP-Brasil, ou Infra-Estrutura de Chaves Pú- Ele explica: “A metodologia utilizada no Progra- blicas brasileira, é o sistema de certificação digi- ma ‘João-de-Barro’ prevê o desenvolvimento de tal oficial do país, responsável pelo e-CPF e e-CNPJ. sistemas baseados em software livre, com códi- 4. O sistema funciona da seguinte maneira: suponha os usuários João e Maria. João possui seu par de chaves, assim como Maria, e ambos querem trocar mensagens privadas, com a certeza de que ninguém poderá compreender o conteúdo, mesmo que a mesma seja interceptada. Os dois enviam um para o outro suas chaves públicas. De posse dela, por exemplo, João cria uma mensagem para Maria e, antes de enviá-la, criptografa a mesma utilizando a chave pública de Maria. Agora, a única chave capaz de decodificar a mensagem é a chave privada de Maria, que é de posse exclusiva dela. Dessa maneira, fica garantido que apenas Maria vai conseguir ler aquela mensagem. Da mesma forma, para Maria mandar uma mensagem privada para João, é preciso usar a chave pública dele. Mesmo que esta mensagem seja interceptada, ela será ilegível sem a chave privada de João. Agora, caso João e Maria queiram trocar mensagens com 100% de certeza de que são eles mesmos os autores, o procedimento é o seguinte: ao enviar uma mensagem para João, Maria assina digitalmente a mensagem usando sua chave privada. Esta assinatura só pode ser reconhecida com a chave pública do remetente. 97
  • 100. go-fonte aberto, para serem integrados na plata- privado, da comunidade científica e outros gru- forma criptográfica. É mandatório o uso de ambi- pos interessados. Cabe a ele “elaborar projetos e entes abertos (como o sistema Linux), evitando- recomendações que, levadas aos órgãos compe- se, assim, o desenvolvimento de softwares vincu- tentes, resultam em aperfeiçoamento de normas lados a ambientes fechados ou proprietários (‘cai- e da legislação, na adoção de padrões técnicos etc., xas-pretas’). Além disto, todos os sistemas desen- além de manifestar-se sobre as proposições do volvidos em software poderão ter seus códigos- público em geral”. fonte publicados na internet, para a disseminação Apesar do foco especificamente comercial, este dos conhecimentos e busca de críticas e suges- grupo deve ter impacto significativo sobre as for- tões da sociedade acadêmico-científica”. Essa ca- mas de funcionamento da internet de maneira racterística da plataforma em software livre e geral. auditável foi determinada pelo Comitê Gestor da ICP-Brasil. TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS ATUAIS O projeto teve início em novembro de 2003, C 2.1, C 2.2 E C 2.3 com a assinatura do convênio entre ITI e a Mari- nha Brasileira, e deve durar três anos. A expectati- SPAM SPAM va é de que a nova tecnologia tenha uma vida útil O SPAM tem sido o principal alvo de todas as de cerca de dez anos. propostas de lei e regulamentações, no que tange à comunicação eletrônica – tanto pelo seu poten- Roubo de identidade e afins cial de problema técnico (“congestionando” a Tem ocorrido, com freqüência cada vez maior, internet, por assim dizer), quanto pela quebra da o chamado “roubo de identidade”, expressão cu- confiança da rede como ambiente seguro para nhada nos EUA e que identifica o roubo e uso transações comerciais – não só no Brasil, mas glo- indevido de informações pessoais, sejam núme- balmente. Questiona-se, entretanto, a eficácia das ros de documentos, senhas pessoais, cartões de legislações já em vigor, como a americana CAN- crédito etc. SPAM, de dezembro de 2003. O volume de SPAM, Existem duas técnicas: uma delas é a invasão inclusive nos EUA, continua a crescer. Um exem- de bancos de dados de grandes empresas. A outra plo de proposta de regulamentação é o Projeto de é o chamado phishing, na qual o usuário é induzi- Lei do Senado 21/04, proposto pelo senador do a inserir seus dados pessoais em sites falsos de Duciomar Costa (PTB-PA), que incide apenas sobre empresas reconhecidas. as mensagens eletrônicas comerciais. Existe também o PL 2.186/03, do deputado Ronaldo O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES Vasconcelos (PTB-MG). Ambas as propostas usam C 2.1, C 2.2 E C 2.3 a sistemática OPT-OUT, na qual o destinatário da mensagem é quem deve solicitar o não- Existe um crescente movimento de busca pela recebimento de mensagens posteriores, uma regulamentação do tráfego de informações na prática pregada nos EUA e que não tem surtido internet – ao menos no que tange ao SPAM. Enti- efeito. dades como o Grupo Brasil AntiSPAM Há ainda outros projetos de lei acerca do tema, (www.brasilantispam.org) e o Movimento como o PL 2.423/03, que dispõe sobre Brasileiro de Combate ao SPAM procedimentos de invasão de computadores e (www.antispam.org.br), formadas principalmente envio de mensagem eletrônica não solicitada; o por provedores de acesso e outras entidades PL 279/03, que dispõe sobre a prestação dos interessadas no comércio eletrônico, procuram serviços de correio eletrônico; o PL 7.093/02, que coibir esse tipo de mensagem em benefício das dispõe sobre a correspondência eletrônica comerciais autorizadas e controladas. O SPAM vai comercial; e o PL 6.210/02, que limita o envio de contra o interesse destas empresas, tanto por mensagem eletrônica não solicitada. aumentar a desconfiança com o meio eletrônico quanto por representar significativo incremento Arapongagem no tráfego de dados entre as diversas redes que O governo federal está preparando a minuta integram a internet. de um novo projeto de lei que supere a Lei do O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Grampo (9.296/96), e que impeça, entre outras Comércio Exterior instalou, em 2004, o Comitê coisas, a divulgação de qualquer informação Executivo de Comércio Eletrônico (http:// captada de modo ilegal, seja por uma escuta ou ce.mdic.gov.br), com representação do setor interceptação de comunicações. 98
  • 101. C 3: Ausência de censura eletrônica. O direito de transmitir informação eletrônica sem censura ou controle por parte de agentes do Estado, judiciais, comerciais, empregadores ou outrem. C 3.1 - Leis de proteção contra censura na internet ou outros meios de publicação eletrônica, seja através de filtros, sites prescritos, sanções contra provedores de acesso ou conteúdo e a responsabilização dos provedores por conteúdo hospedado. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL censura é reafirmada no capítulo sobre Comuni- cação. Ainda o artigo 5º da Constituição diz que “é livre a manifestação do pensamento, sendo veda- Art. 220 - A manifestação do pensamento, a do o anonimato”. Cabe a observação de que a criação, a expressão e a informação, sob qualquer internet, em geral, é um ambiente de anonimato forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer por definição. Os usuários não são, geralmente, restrição, observado o disposto nesta Constituição. obrigados a se identificar de acordo com registros oficiais, como RG ou CPF, muito menos ao assinar §1° - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa documentos, textos ou transmissões feitas na constituir embaraço à plena liberdade de informação internet. jornalística em qualquer veículo de comunicação Também o mesmo artigo diz que é livre a ex- social, observado o disposto no art. 5°, IV, V, X, XIII e pressão da atividade intelectual, artística, científi- XIV; ca e de comunicação, independentemente de cen- §2° - É vedada toda e qualquer censura de nature- sura ou licença. Mais à frente, a não-existência de za política, ideológica e artística. C 3.2 - Leis ou regulações, inclusive auto-regulação por parte da indústria, que inclua obrigações para que operadores comerciais de publicações e difusão eletrônicas (provedores de acesso, mecanismos de busca, provedores de banda [infra-estrutura de internet, empresa de telefonia, internet a cabo ou via satélite]) ajam como operadores de rede (common carriers) para material juridicamente legal. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL Contudo, nenhum dos dois dispositivos foi re- gulamentado posteriormente e ambos seguem A Lei Geral de Telecomunicações (9.472/97) faz sem serem aplicados. menção à prática do unbundling (obrigação de Não há qualquer outro mecanismo que obri- concessionários de serviços públicos a ceder, ou gue provedores de acesso ou de infra-estrutura a partilhar, o uso de sua infra-estrutura instalada de oferecerem condições de transmissão para conteú- modo a estimular a competição). Também a Lei do que, na prática, não seja comercial. Sendo tra- da TV a Cabo (8.977/95) estipula que as redes tado do ponto de vista comercial, portanto, os físicas das operadoras de cabo, uma vez em provedores podem negar a prestar determinado funcionamento, têm caráter público e podem ser serviço, mesmo que seja de disponibilização de usadas para finalidades públicas (como, por exem- material judicialmente legal. plo, a criação de uma intranet pública). 99
  • 102. C 3.3 - Garantia do cumprimento de tais leis de modo acessível financeiramente, transparente e pró-ativo, e com o direito de revisão quando direitos tiverem sido violados. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL detalhado sob o atributo C5), que tem o potencial de influenciar positivamente esta área na criação Embora não haja legislação específica, cabe citar de canais de interlocução e resolução de disputas, o Comitê Gestor da Internet no Brasil (mais para garantir a liberdade de expressão na internet. IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO é o acesso a tais tecnologias (ver Pilar D). C 3.1, C 3.2 E C 3.3 O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES Hoje é a cobrada uma taxa de interconexão para C 3.1, C 3.2 E C 3.3 conectar um provedor de acesso ao backbone da internet 5 . Essa é uma forma de estimular a A convergência tecnológica apresenta um ce- competição, pois poupa o investimento altíssimo nário complexo, em constante mutação, que faz da criação de uma infra-estrutura de cabos telefô- das teles e dos provedores de TV por assinatura nicos, por exemplo, para as empresas-espelho de concorrentes em permanente disputa. No Brasil, telefonia fixa6. o setor de telecomunicações encontra marco Apesar da Constituição prever a liberdade de regulatório mais definido entre os três citados, mas expressão e manifestação do pensamento, o fato por enquanto não existe restrição à produção de de a internet depender de provedores privados faz conteúdo por parte dessas empresas, o que tem com que não haja garantia de hospedagem ou provocado disputas acirradas entre esses atores, transmissão de qualquer conteúdo. já que, de sua parte, as TVs por assinatura têm No tocante à comunicação de massa, não existe que seguir regras estabelecidas. Como conseqüê- a visão de que provedores de acesso e infra- ncia disso, na reformulação do Comitê Gestor da estrutura deveriam abrir canais que facilitassem a Internet no Brasil, os provedores do setor de TV participação de grupos de diferentes formas de por assinatura e os provedores do setor das teles expressão. O último movimento nesse sentido foi disputaram a vaga entre os provedores de infra- a Lei da TV a Cabo, que criou os canais de utilização estrutura. O eleito é do setor de telecomunicações, gratuita, como os comunitários, universitários e tendo ficado o representante do setor da TV por dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. assinatura com a suplência. Estes canais muitas vezes não são ocupados pela sociedade civil, por falta de condições técnicas ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS e/ou financeiras. Existem inclusive casos de ligação C 3.1, C 3.2 E C 3.3 entre canais “comunitários” e a grande mídia. No caso da internet, diferentes grupos têm se O governo anunciou no início de 2005 a inten- apropriado da rede como espaço para livre expres- ção de elaborar uma Lei Geral de Comunicação de são. Esse uso, atualmente, não é organizado, o Massa, visando à regulamentação de todos os ser- que pode ser entendido como um bom sinal, já viços ligados ao tema, incluindo infra-estrutura, que significa, em princípio, ausência de restrições, distribuição e produção de conteúdo. Não está cla- ao menos em âmbito nacional7. É importante ci- ro ainda se a internet será incluída na Lei, mas tar que no Brasil, como país em que há um qua- certamente ela será afetada pela regulamentação dro de enorme exclusão social, usar TICs como geral, já que a convergência tecnológica estabele- meio de expressão requer um passo anterior, que ce “comunicações” como um campo híbrido. 5. São as chamadas “teles fixas” que possuem a infra-estrutura de conexão da “última milha” que chega às casas dos assinantes residenciais e das pequenas empresas (as grandes empresas dispõem de várias opções de conexão). Os provedores são obrigados a pagar pelo uso desta infra-estrutura, mas o problema é que as teles fixas possuem seus próprios provedores, que terminam por auferir condições vantajosas do uso das redes, caracterizando concorrência desleal. 6. Para racionalizar o tráfego de dados na internet, está sendo proposto o PTT-Metro, projeto do Comitê Gestor da Internet no Brasil que promove e cria a infra-estrutura necessária (Ponto de Troca de Tráfego - PTT) para a interconexão direta entre as redes ("Autonomous Systems" - ASs) que compõem a internet brasileira. Dessa forma, racionalizam-se custos, uma vez que os balanços de tráfego são resolvidos direta e localmente e não através de redes de terceiros, muitas vezes fisicamente distantes. 7. Existem diversas restrições, mas todas de caráter internacional, como o Carnivore, o Echelon e a própria estrutura de nomes, números IPs e roteamento da internet. 100
  • 103. C 4. Liberdade de associação no meio eletrônico, para participar de protestos públicos ou debates online. C4.1Leis que salvaguardem contra vigilância em vídeo excessiva e seu possível efeito intimidante sobre a liberdade de associação. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL ATORES PAPEL DOS DIFERENTES ATORES O artigo 5º da Constituição prevê: Não há atores que tratem diretamente dessa questão, embora as entidades da sociedade civil XVII - é plena a liberdade de associação para fins que tratem do tema da internet (ver Pilar D) tam- lícitos, vedada a de caráter paramilitar; bém lidem com esse ponto. XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sen- do vedada a interferência estatal em seu ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS funcionamento. Vigilância não-autorizada Grampos e Vigilância não -autorizada Não há nenhuma legislação específica em Como citado anteriormente sob o atributo C2, âmbito nacional sobre liberdade de associação no o uso de grampos, gravações em vídeo vazadas e meio eletrônico. outras formas de controle são uma polêmica per- manente no Brasil. São preocupantes, entretanto, proposições IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO como o PL 700/03, do deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), que obriga estabelecimentos comerciais A vigilância não é disciplinada de forma algu- como shoppings a instalarem sistemas de ma, seja ela excessiva ou branda. Não há provisão vigilância por vídeo, mas não prevê formas de legal no Brasil que defina o que é legal, e o que é utilização deste material. Obrigatório ou não, a abuso, quem são os responsáveis e quais seus implantação desse tipo de recurso precisa ser dis- deveres. ciplinada, definindo tempo de guarda, acessibili- Assim, não há como dizer que não haja coibi- dade por parte do público, legalidade e responsa- ção de práticas associativas devido aos sistemas bilidade por uso e alteração. Não há, na lei brasi- de vigilância, quer em vídeo, quer em qualquer leira, regra que cumpra essa função. outra mídia. 101
  • 104. C 5. Participação efetiva da sociedade civil no processo de governança, incluindo sua formulação, projeto, regulação, implementação e avaliação. C 5.1 - Um processo participativo de desenvolvimento de políticas, que inclua participação significativa da sociedade civil e os recursos necessários para que todos os parceiros dêem contribuições efetivas. C 5.2 - Meios ativos e dinâmicos para que preocupações públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas e atendidas. C 5.3 - Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais. C 5.4 - Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo (ver C1.3). BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL V - articular as ações relativas à proposição de nor- mas e procedimentos relativos à regulamentação No que tange à internet, todo o campo deline- das atividades inerentes à Internet; ado por estes indicadores devem ser vistos do VI - ser representado nos fóruns técnicos nacionais e internacionais relativos à Internet; ponto de vista do Comitê Gestor da Internet no VII - adotar os procedimentos administrativos e Brasil, existente desde 1995, mas reformulado pelo operacionais necessários para que a gestão da Decreto 4.829/03. O comitê passou a ter as Internet no Brasil se dê segundo os padrões inter- seguintes atribuições: nacionais aceitos pelos órgãos de cúpula da Internet, podendo, para tanto, celebrar acordo, convênio, Art. 1o Fica criado o Comitê Gestor da Internet no ajuste ou instrumento congênere; Brasil - CGIbr, que terá as seguintes atribuições: VIII - deliberar sobre quaisquer questões a ele enca- I - estabelecer diretrizes estratégicas relacionadas ao minhadas, relativamente aos serviços de Internet uso e desenvolvimento da Internet no Brasil; no País. II - estabelecer diretrizes para a organização das re- lações entre o Governo e a sociedade, na execução O CGIBr é composto por 21 membros, sendo do registro de Nomes de Domínio, na alocação de oito representantes de ministérios e órgãos Endereço IP (Internet Protocol) e na administração federais, um representante do Fórum Nacional de pertinente ao Domínio de Primeiro Nível (ccTLD - country code Top Level Domain), ".br", no interes- Secretários Estaduais, um técnico especialista em se do desenvolvimento da Internet no País; assuntos relacionados à internet, quatro represen- III - propor programas de pesquisa e desenvolvimen- tantes do setor empresarial, três representantes to relacionados à Internet, que permitam a manu- do terceiro setor e três representantes da comuni- tenção do nível de qualidade técnica e inovação no dade científica e tecnológica. uso, bem como estimular a sua disseminação em Os representantes do empresariado, do tercei- todo o território nacional, buscando oportunidades ro setor e da comunidade científica e tecnológica constantes de agregação de valor aos bens e ser- foram escolhidos mediante um processo eleito- viços a ela vinculados; ral, no qual entidades votavam abertamente para IV - promover estudos e recomendar procedimentos, selecionar os conselheiros. Não há conhecimento normas e padrões técnicos e operacionais, para a segurança das redes e serviços de Internet, bem de qualquer entidade do tipo, no mundo, que assim para a sua crescente e adequada utilização adote tal prática. pela sociedade; 102
  • 105. IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO • coordenar a atribuição de endereços Internet, o registro de nomes de domínios, e a interconexão A primeira eleição para o órgão ocorreu em de espinhas dorsais; julho de 2004. Os representantes da sociedade • coletar, organizar e disseminar informações sobre os serviços Internet civil eleitos vêm de setores progressistas, o que (Site do CG-Br) pode possibilitar a presença de vozes pelo direito à comunicação no CGIBr. Até o momento, a abertura à participação da sociedade civil no comitê tem possibilitado o diálogo mais próximo em relação às questões da O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES internet no Brasil. No entanto, ainda se dá um tratamento eminentemente técnico a questões que O papel do CGIBR é descrito da seguinte forma: são, de fato, políticas. O Comitê Gestor da Internet do Brasil foi criado a par- tir da necessidade de coordenar e integrar todas as iniciativas de serviços Internet no país e com o ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS objetivo de assegurar qualidade e eficiência dos serviços ofertados, assegurar justa e livre compe- A reformulação do CGiBr mudou a lógica do tição entre provedores e garantir a manutenção de setor, mas ainda é necessário ver quais serão a adequados padrões de conduta de usuários e pro- conseqüências práticas dessa mudança. O CGiBr é vedores. um novo ator e, ao mesmo tempo, uma nova are- na de disputa – não só entre a representação dos O Comitê Gestor tem como atribuições principais: empresários, mas entre os interesses dos diferen- • fomentar o desenvolvimento de serviços Internet tes atores ali representados. É importante notar no Brasil; que a mudança no CGiBr inseriu a sociedade civil • recomendar padrões e procedimentos técnicos e operacionais para a Internet no Brasil; em um debate até então reservado para especia- listas, empresários e o governo. 103
  • 106. 104
  • 107. Pilar D Assegurando acesso eqüitativo e a preços razoáveis a TICs O acesso a tecnologias de informação e comu- outro –, os programas de universalização se dão nicação (TICs) no Brasil ainda é separado de forma de maneira isolada e os projetos que combinam estanque entre acesso às telecomunicações (no sen- as duas questões ainda estão no papel. Assim, tido clássico, de telefonia) e acesso à internet (bus- neste capítulo, trataremos sempre desse debate ca da inclusão digital). Apesar do processo de con- levando em conta tal realidade. vergência tecnológica – e do fato de um influir no D1: Acesso a TICs, inclusive à telefonia, à internet e a outros serviços, de modo econômico, igualitário e apropriado para todo o povo e suas comunidades. D 1.1 - Um quadro legal e regulatório que favoreça fortemente a extensão de modo universal dos serviços e do acesso a TICs como a prioridade para este setor. D 1.2 - Medidas políticas, convencionais e inovadoras, que vão além das abordagens mercadológicas e corporativas, para incluir, por exemplo, redes comunitárias, subsídios cruzados efetivos por parte de usuários mais ricos com fins de universalização do serviço, e assim por diante. Serão então considerados: - infra-estrutura fixa e telefonia; - telefonia móvel, inclusive em termos de custos; - telecentros comunitários; - licenciamento de provedores de acesso, portais de internet e medidas de apoio à internet; - links de satélite Vsat e de dados. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL Telefonia Telefonia D 1.1 E D1.2 O Brasil passou por uma mudança na legisla- ção e regulação do setor de telecomunicações a A discussão do acesso às TICs no Brasil passa partir do ano de 1995. Naquele momento, por essencialmente por dois vieses: o primeiro, as con- meio da Emenda Constitucional nº8, que dições para o acesso, como indivíduo, às redes de modificou o artigo 21 da Constituição Federal, comunicações, incluindo telefonia e internet, e aos quebrou-se o monopólio estatal nas equipamentos para utilização e desfrute da rede. telecomunicações e previu-se a constituição de um O segundo, as políticas de apoio ao acesso uni- órgão regulador para as telecomunicações. Mais versal, tanto às redes de telecomunicações como do que isso, a mudança já não previa como de dados. competência do Estado a exploração dos serviços de telecomunicações. 105
  • 108. Após a alteração do artigo 21, o governo bra- e Intelig. Tivemos, também, a implantação das sileiro aprovou a Lei Geral de Telecomunicações1 espelinhos, atuando em áreas menores. Este mo- (Lei 9.472), em 16 de julho de 1997, que autori- delo fracassou na sua intenção de criar concorrên- zou o governo federal, na época dirigido pelo cia nas áreas de concessão, e as empresas espelho presidente Fernando Henrique Cardoso, a iniciar têm se voltado essencialmente para o mercado o programa de privatização (veja mais no item corporativo. “Implementação”). A função da União já não se- A Lei Geral previa funções importantes para o ria mais a de controlar, mas sim a de organizar a poder público: exploração do setor. Essa organização passava a estar na mão de uma agência reguladora, fora Art. 2º O Poder Público tem o dever de: do Ministério das Comunicações, que ficou com função de regular e propor políticas para a radi- I - garantir, a toda a população, o acesso às teleco- odifusão. municações, a tarifas e preços razoáveis, em con- dições adequadas; Com isso abriu-se espaço para a privatização II - estimular a expansão do uso de redes e serviços de todo o sistema Telebrás, que incluía uma ope- de telecomunicações pelos serviços de interesse radora nacional, a Embratel, e diversos operado- público em benefício da população brasileira; res regionais, divididos por estados, além do Cen- III - adotar medidas que promovam a competição e a tro de Pesquisa e Desenvolvimento (CPqD) da diversidade dos serviços, incrementem sua oferta Telebrás, transformado em fundação privada. Essa e propiciem padrões de qualidade compatíveis com operação foi consumada em julho de 1998. Ao a exigência dos usuários; contrário da maioria dos países europeus, a IV - fortalecer o papel regulador do Estado; privatização brasileira significou a opção do país V - criar oportunidades de investimento e estimular o em não controlar diretamente nenhuma porção desenvolvimento tecnológico e industrial, em am- biente competitivo; das telecomunicações. Foi permitida ainda a en- VI - criar condições para que o desenvolvimento do trada de 100% de capital estrangeiro no setor. O setor seja harmônico com as metas de desenvolvi- Brasil foi dividido em três áreas, com concessões mento social do País. para exploração comercial leiloadas para três gru- pos: Brasil Telecom, de propriedade do Além disso, determinava os direitos dos usuá- Opportunity (que administra recursos do rios de serviços de telecomunicações em seu arti- Citibank), da Telecom Itália e de vários fundos de go 3º, incluindo questões como “acesso aos ser- pensão de estatais; Telefonica de España; e viços de telecomunicações, com padrões de quali- Telemar (capital nacional nas mãos de fundos de dade e regularidade adequados à sua natureza, pensão de estatais, Carlos Jereissati, Opportunity em qualquer ponto do território nacional” e “a e mais uma série de empresas). Além disso, a inviolabilidade e ao segredo de sua comunicação, operadora nacional, incluindo toda a rede de fi- salvo nas hipóteses e condições constitucional e bras óticas da Embratel, foi para as mãos da legalmente previstas”. empresa norte-americana WorldCom, depois MCI. A lei prevê, em seu artigo 5º, a observação, na Em 2004, a Embratel foi adquirida pela mexica- disciplina das relações econômicas, da redução das na Telmex. Além dessas quatro operações, oito desigualdades regionais e sociais, entre outros. operadoras regionais de telefonia celular foram Nos artigos 6º e 7º, busca-se preservar a livre con- leiloadas. Também tivemos a privatização da es- corrência, explicitando-se que haverá o controle tadual CRT pelo governo do Rio Grande do Sul e do Conselho Administrativo de Defesa Econômica da municipal Ceterp pelo ex-prefeito de Ribeirão (Cade) para prezar pela livre competição e evitar Preto, Antonio Palocci, hoje ministro da Fazen- concentração econômica nos processos de fusão da. Restou até hoje como estatal apenas a muni- ou incorporação de empresas. cipal Sercomtel, que atua em Londrina. Dentro do programa de desestatização das te- Tanto no caso da telefonia fixa como no da lecomunicações, a Lei Geral das Telecomunicações móvel, previu-se a entrada de empresas espelho (LGT) previa (artigo 17º, inciso V) que as empresas depois de um ano, e a futura abertura completa concessionárias vencedoras dos leilões deveriam do mercado para a livre concorrência. As empresas seguir “metas de progressiva universalização”, espelho são: GVT (de propriedade de fundos de acompanhadas e fiscalizadas posteriormente pela venture capital), Vésper (comprada pela Embratel) Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). 1. Leia a redação original da Lei Geral de Telecomunicações e sua posterior alteração (www.anatel.gov.br/biblioteca/Leis/LeiGeral/ leigeral.asp) 106
  • 109. Cerca de dois meses antes da privatização do de 100 habitantes deverá ter, ao menos, um tele- monopólio brasileiro, que aconteceu em junho de fone público. 1998, o governo aprovou o Decreto 2.592, que - O número de telefones públicos deverá aprovava o Plano Geral de Metas para triplicar, nos próximos cinco anos, passando de Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comu- pouco mais de 500 mil para cerca de 1,5 milhão. tado Prestado no Regime Público (PGMU)2. A reda- - A partir do próximo ano se iniciará a compe- ção do PGMU define universalização no artigo 1º: tição entre as empresas; os usuários passarão a escolher a companhia telefônica que lhes ofereça menores preços Art. 1º Para efeito deste Plano, entende-se por com serviços cada vez melhores. universalização o direito de acesso de toda pes- - Em até cinco anos, todo pedido de instalação soa ou instituição, independentemente de sua lo- de telefone terá que será atendido em, máximo, duas calização e condição sócio-econômica, ao Serviço semanas. Telefônico Fixo Comutado destinado ao uso do - A partir de 1999, nas localidades com rede público em geral, prestado no regime público, con- forme definição do art. 1° do Plano Geral de Ou- telefônica, todo bairro, quadra, conjunto residencial e torgas, aprovado pelo Decreto nº 2.534, de 2 de áreas com população de baixo poder aquisitivo terá abril de 1998, bem como a utilização desse servi- que ter, pelo menos, três telefones públicos para cada ço de telecomunicações em serviços essenciais de grupo de mil habitantes. interesse público, nos termos do art. 79 da Lei nº - Em menos de dois anos, as instituições de 9.472, de 16 de julho de 1997, e mediante o pa- ensino e de saúde serão atendidas em uma semana, gamento de tarifas estabelecidas na regulamen- com linhas telefônicas que lhes permitam ter acesso à tação específica. Internet. - Em menos de dois anos, as empresas de O detalhamento dos mecanismos de aumento telefonia deverão ter, à disposição de deficientes de tarifas ficou fora deste plano de metas. Ele tra- auditivos e da fala, centros de atendimento para tou especificamente dos percentuais mínimos obri- intermediar suas comunicações telefônicas. gatórios de instalação de acessos individuais e - Em menos de dois anos, não será necessário terminais públicos para os anos seguintes, cujos andar mais de 800 metros para encontrar um telefone custos relacionados ao cumprimento das metas público; Em 2003, essa distância será de, no máximo, seriam suportados pelas concessionárias (exceto 300 metros. em localidades onde o custo para o cumprimento das metas fosse superior ao retorno financeiro da As sanções previstas podem ser uma advertên- “exploração eficiente do serviço”). Segundo a LGT, cia, multa de até R$ 50 milhões ou até mesmo a a Anatel destinaria, nesses casos, verbas da União, cassação da concessão. estados, municípios ou de um fundo específico A própria LGT, aprovada dentro da concepção para essa finalidade. concorrencial pelo governo do então presidente O Programa de Recuperação e Ampliação do Fernando Henrique Cardoso, prevê a criação de Sistema de Telecomunicações e do Sistema Postal um fundo específico para garantir a universalização (Paste), na edição de 1997 (a primeira versão foi do serviço de telecomunicações para áreas não- anunciada ao final de 1985) previa: lucrativas. Cerca de dois anos depois da - Nos próximos cinco anos, o número de linhas privatização do setor, o governo então criou, pela telefônicas fixas deverá ser aumentado dos atuais 17 Lei 9.998/00, o Fundo de Universalização dos Ser- milhões para 40 milhões. viços de Telecomunicações (Fust)3, cuja receita - Até 2005, toda localidade brasileira com provém essencialmente de 1% sobre a receita mais de 300 habitantes deverá, obrigatoriamen- operacional bruta da prestação de serviços em te, ter rede telefônica. E toda localidade com mais telecomunicações, menos os impostos4. Esse mo- 2. Leia a íntegra do decreto que aprova o Plano Geral de Metas para Universalização do Serviço Telefônico Fixo Comutado Prestado no Regime Público (Pgmu), de 15/08/1998 (www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2592.htm) 3. Leia a íntegra da lei que institui o Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (www.mc.gov.br/fust/l_9998_17082000.htm) 4. Art. 6º Constituem receitas do Fundo: I - dotações designadas na lei orçamentária anual da União e seus créditos adicionais; II - cinqüenta por cento dos recursos a que se referem as alíneas c, d, e e j do art. 2º da Lei nº 5.070, de 7 de julho de 1966, com a redação dada pelo art. 51 da Lei nº 9.472, de 16 de julho de 1997, até o limite máximo anual de setecentos milhões de reais; III - preço público cobrado pela Agência Nacional de Telecomunicações, como condição para a transferência de concessão, de permissão ou de autorização de serviço de telecomunicações ou de uso de radiofreqüência, a ser pago pela cessionária, na forma de quantia certa, em uma ou várias parcelas, ou de parcelas anuais, nos termos da regulamentação editada pela Agência; 107
  • 110. delo exclui claramente a responsabilidade das Está previsto para 2006 o primeiro ano de im- operadoras de telefonia em garantir inclusão a plantação do serviço, que inicialmente será pres- grandes parcelas da população. tado em regime público, condicionado à obriga- A aplicação dos recursos do Fust contemplaria, ção do cumprimento de metas. O plano divide o entre outros objetivos: atendimento às localidades país em 11 áreas, destinadas a apenas uma con- com menos de cem habitantes, complementação cessionária. Os candidatos mais visíveis são as para atendimento de comunidades pobres, prestadoras de Serviço de Comunicação instalação de acessos individuais em escolas, Multimídia, de TV por assinatura/cabo e provedo- bibliotecas e hospitais e implantação da telefonia res de informática estaduais. A partir de 2009, essa rural. Além desses, está previsto o uso do Fust estrutura poderia ser utilizada pelas empresas para para "complementação de metas estabelecidas no exploração privada. Plano Geral de Metas de Universalização para O plano do SCD prevê a utilização, pela atendimento de comunidades de baixo poder prestadora, das redes da concorrente, sendo fir- aquisitivo", o que evidencia a inversão de atribui- mado, portanto, na lógica de desagregação das ções esperada de um serviço cuja concessão é redes (unbundling). pública. A própria lei prevê que as concessionárias não cumprirão as metas estabelecidas e traz para Internet e inclusão digital o Estado a atribuição de cumpri-las. À parte as questões do Fust, que pode ser usa- O Fust foi criado com a intenção de cumprir a do para busca de universalização do acesso à função exercida pelo subsídio cruzado que existia internet, não existe base legal específica para o antes da privatização do sistema Telebrás. No Bra- campo da inclusão digital. Isso não impede que sil, grande parte dos usuários não usa mais do haja programas em vias de implementação, inclu- que os pulsos mínimos já previstos na assinatura sive com dotação orçamentária própria, o que ve- mensal, em virtude do alto preço fixo cobrado por remos nos itens seguintes. essa assinatura. Sob controle da Telebrás, menos de 10% dos municípios geravam receitas maiores do que as despesas de manutenção, o que ensejava IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO uma política de subsídio cruzado. D1.1 E D1.2 Somente no início de 2004 surgiu uma pro- posta do governo brasileiro para utilização do Telefonia Telefonia Fust, que já acumulou mais de R$ 3 bilhões (mais A alteração do artigo 21 da Constituição gerou de US$ 1 bilhão). A sua aplicação se daria pelo uma separação entre telecomunicações e radiodi- Serviço de Comunicações Digitais (SCD), cujo fusão. Na época, essa foi a estratégia do governo projeto ainda pode sofrer alterações após a con- para poder abrir o mercado da telefonia sem ter sulta pública realizada em 2004 e o pedido de que mexer no complicado quadro da radiodifusão vistas do Ministério das Comunicações. O plano no país. Isso, no entanto, gerou uma situação em funcionará, na verdade, para permitir o acesso a que setores que não podem ser entendidos redes digitais, incluindo acesso à internet, a cerca separadamente passaram a estar sujeitos a de 260 mil escolas de ensino médio, bem como regulações distintas. Enquanto a Lei Geral das em instituições de ensino fundamental e Teles passou a regular o setor das telecomunica- profissionalizante (públicas ou privadas), além de ções, a radiodifusão continuava a ser controlada ambulatórios, postos de saúde, hospitais, biblio- pelo que restou do Código Brasileiro de tecas e órgãos de segurança pública, instituições Telecomunicações (Lei 4.117/62). As conseqüênci- de assistência a deficientes, deficientes carentes e as têm influenciado os dois setores. Por um lado, regiões remotas e de fronteiras. Não existe previs- a radiodifusão é uma área sem regulação to um conselho do Fust. Mantidas as condições consistente de limitações de propriedade e de toda previstas, a sociedade civil não deve participar da a parte de controle e gestão; por outro, a área de aplicação desses recursos, exceto através de telecomunicações não é legislada quanto à pro- entidades de deficientes ou bibliotecas. dução de conteúdo. IV - contribuição de um por cento sobre a receita operacional bruta, decorrente de prestação de serviços de telecomunicações nos regimes público e privado, excluindo-se o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transportes Interestadual e Intermunicipal e de Comunicações - ICMS, o Programa de Integração Social - PIS e a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins; V - doações; VI - outras que lhe vierem a ser destinadas. 108
  • 111. O processo de privatização das telecomunica- Projeto ambicioso conduzido durante o gover- ções não priorizou, como veremos, o maior aces- no Fernando Henrique Cardoso, o Programa Soci- so à população a preços razoáveis: os ganhos fi- edade da Informação (PSI) tinha como objetivo “in- nanceiros do governo brasileiro com o processo tegrar, coordenar e fomentar ações para a utiliza- são questionáveis, o Estado não manteve uma ção de tecnologias de informação e comunicação, presença mínima estratégica no setor e as tarifas de forma a contribuir para a inclusão social de subiram mais do que a inflação. Com relação a todos os brasileiros na nova sociedade e, ao mes- este último, o aumento das tarifas da telefonia mo tempo, contribuir para que a economia do país fixa foi de 611,03% nos últimos dez anos. Em 1994, tenha condições de competir no mercado global”. a assinatura residencial custava R$ 0,69. Hoje ela Coordenado por Tadao Takahashi, o programa custa na cidade de São Paulo R$ 34,29. Um foi desenvolvido pelo Ministério da Ciência e aumento de quase 5.000%, bem maior que a Tecnologia e lançado em 15 de dezembro de 1999 inflação no período, de 145,01%5. Apenas entre (pelo Decreto 3.294/99). O PSI contou inicialmente 1995 e 1997, no processo de preparação para as com a participação de cerca de 150 especialistas, privatizações, a assinatura subiu 2.172%. que se distribuíram em debates sobre os Grupos Os argumentos do governo federal para a Temáticos que compõem o programa. privatização eram que, além da possibilidade de Utilizando-se de uma metodologia internacio- arrecadar recursos para um Estado endividado e nal, já aplicada em outros países – entre os quais com metas econômicas acordadas com o Fundo Portugal –, o programa Sociedade da Informação Monetário Internacional (FMI), o processo iniciava-se com a publicação do Livro Verde (base aumentaria a oferta de serviços e, com a teórica) e avançaria para a elaboração do Livro concorrência decorrente da fragmentação do Branco (operacional), no qual as metas – inclusive sistema Telebrás, os preços seriam mais acessíveis. orçamentárias – seriam estabelecidas. No plane- A parte da LGT relativa ao processo de jamento original, essa etapa deveria ter se cum- desestatização (artigo 186) citava os objetivos prido em 2001. primordiais do governo mencionados no artigo O Livro Verde começou a ser distribuído à soci- 2º (ver acima): garantir acesso a todos por preços edade em setembro de 2000. No horizonte dos razoáveis, estimular a expansão do número de organizadores do PSI estava a perspectiva de cons- redes e serviços de telecomunicações e adotar trução de um projeto que articulasse todas as ini- medidas que promovam a competição e a diversi- ciativas do campo de Sociedade da Informação e dade dos serviços. Nova Economia, no qual todos os atores – setor Se analisarmos o que determinava o documen- privado, governo, sociedade civil e universidade to Paste e o Plano Geral de Metas para a – estivessem contemplados. De acordo com o pla- Universalização (PGMU), (citados em “Base nejamento original, a etapa de consolidação do Constitucional e Legal”), veremos que parte das projeto estava prevista para ocorrer no segundo metas não tem sido cumprida. Já no final de 2004, semestre de 2003. o Tribunal de Contas da União (TCU) exigiu da A troca de governo ocorrida em 2003 resultou Anatel um plano de reformulação de todos os no fim do Programa Sociedade da Informação, sem processos de fiscalização das obrigações de que mais informações fossem divulgadas pela nova universalização de telefonia fixa, a ser preparado gestão do Ministério da Ciência e Tecnologia. no prazo de 180 dias. Segundo o TCU, a agência vinha fazendo as análises por amostra, o que A política de inclusão digital geraria estimativas não confiáveis. Isso explicaria, Não há como tratar das políticas públicas de por exemplo, as diferenças de avaliação que o inclusão digital no Brasil sem fazer algumas op- próprio Conselho Consultivo já apontava em ções. Principalmente no que se refere ao “como relação às avaliações promovidas pela própria fazer”. Desde meados da década de 90, foram Anatel. Além disso, no início de 2005, estavam muitas as experiências que procuraram conter esse em consulta pública os indicadores de qualidade novo modelo de exclusão, agora digital, nascido para telefonia fixa. no seio da Sociedade da Informação. Desde projetos que procuravam facilitar a aquisição de Internet e inclusão digital computadores, passando pela possibilidade de as Programa Sociedade da Informação empresas de telefonia garantirem o acesso disca- 5. A tarifa de telefonia fixa foi a que mais subiu nos últimos dez anos (611,03%), seguida pelos aluguéis (544,1%). A inflação no período acumulou alta de 145,01% entre julho de 1994, início do Plano Real, e junho de 2004. (Globo Online, 05/07/2004). 109
  • 112. do à internet com pulso único (i00), até chegar- de 400 mil pessoas, em regiões de baixíssimo Ín- mos ao modelo mais amplo e democrático de in- dice de Desenvolvimento Urbano (IDH) – periferi- cluir digitalmente: o telecentro comunitário. as e favelas da capital paulista. Um telecentro comunitário é um espaço que Uma pesquisa de amostragem realizada em dez permite a apropriação social das tecnologias da telecentros pela Rede de Informações do Terceiro informação e da comunicação pela população Setor (Rits), que abrangeu um universo de 46.134 mais carente. Portanto, não oferece apenas usuários cadastrados, mostra que o programa tem conectividade à rede mundial de computadores, ampla aceitação da sociedade e promoveu, para mas também atua para promover a transforma- cerca de 70% dos ouvidos, mudanças considerá- ção social, posto que se insere (alterando) as di- veis em suas vidas. O que se traduz no fato de nâmicas de organização local e de ação comunitá- que para um quarto da população estudada, a ida ria. Nesse sentido, busca oferecer cursos de ao telecentro é uma prática diária. O porcentual capacitação, mecanismos que permitam aos usu- de pessoas que passaram a ter um e-mail após ários a geração de conteúdos próprios e técnicas freqüentarem o telecentro é de 68,83%. que facilitem a apropriação da tecnologia pela O número de usuários/as que têm até 19 anos população. Destaca-se no Brasil a opção feita pela de idade é muito próximo deste valor, um total de maioria das iniciativas de inclusão digital de uso 66,83%. Pessoas de terceira idade não aparecem do software livre, com diversas vantagens em re- com relevância na estatística: o número de lação à adoção de softwares proprietários. A mais respondentes acima de 60 anos fica abaixo de um imediata é o não pagamento de licenças às em- ponto percentual. O número de homens e presas proprietárias. Mas há outras. Ao utilizar mulheres usuários é praticamente o mesmo. “Com software livre, o usuário se familiariza com a lógi- relação à escolaridade, a maioria (47,32%) das ca dos programas, e não com uma formatação es- pessoas está cursando ou completou o Ensino pecífica. Além disso, ao permitir a verificação e a Médio, o que é justificado em função da faixa etária modificação do código fonte, o modelo pode ga- predominante na amostra. Apesar de 31,68% das rantir que homens e mulheres tornem-se, além de pessoas estarem na faixa etária de 20 a 49 anos, usuários, programadores; mais do que isso, que apenas 5,47% do universo total pesquisado têm trabalhem sob a lógica colaborativa. nível superior e 16,06% se declaram ocupadas – A experiência pioneira nesse sentido foi o pro- categoria que inclui atividade no mercado de grama Sampa.org, realizado pelo Instituto trabalho formal e/ou informal. Se formos definir Florestan Fernandes (IFF), ligado ao Partido dos um perfil majoritário no grupo pesquisado, Trabalhadores (PT) a partir de abril de 2000. No estamos falando de homens adolescentes, entanto, o programa, que serviu como piloto para estudantes, cursando o ensino médio. O perfil a ampla rede de telecentros que seria futuramente minoritário é composto por mulheres de terceira construída pela prefeitura paulistana, utilizava idade, aposentadas”, aponta a pesquisa. softwares proprietários. Esse modelo de inclusão digital – em que o Há também que se destacar o trabalho desen- acesso ao computador ocorre em espaços comu- volvido pela prefeitura do PT na capital do Rio nitários – não é contemplado pelo Mapa da Exclu- Grande do Sul, com o projeto Telecentros de Porto são Digital, elaborado pelo Comitê para a Demo- Alegre. Em outubro de 2003, havia na capital cratização da Informática (CDI) e o Centro de Polí- gaúcha 15 telecentros, com cerca de 12 ticas Sociais (CPS/Ibre/FGV), com apoio da Sun computadores cada. A opção foi a utilização do Microsystems e da Usaid. Baseado em sua maior dual boot: o usuário tem a opção de escolher, assim parte em levantamentos realizados pelo Instituto que iniciada a máquina, se pretende utilizar o Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sistema operacional proprietário (Windows) ou o principalmente a Pesquisa Nacional por Amostra livre (GNU/Linux). de Domicílios (PNAD), o mapa apresenta dados No entanto, o principal projeto de política pú- nacionais sobre a exclusão digital levando em blica de inclusão digital realizado no Brasil até conta o volume da população que possui hoje é o Projeto Telecentros, da Prefeitura de São computador em suas residências. Paulo, construído a partir de 2001, com o Isso significa que os 400 mil usuários de lançamento do Telecentro da Cidade Tiradentes telecentros comunitários da capital paulista e o (extrema Zona Leste de São Paulo). Hoje, o sem número de usuários de cybercafés e LAN houses programa possui 138 unidades6 e beneficia cerca não foram computados pelo mapa entre os 6. Fonte: Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits) 110
  • 113. “incluídos digitalmente”. Segundo o estudo (da- sores foram capacitados, além de 10.087 técni- dos de 2001), 16 milhões de brasileiros possuem cos de suporte e 2.169 professores que atuam acesso doméstico ao computador. Subtraindo o como multiplicadores. Segundo o MEC, de 1997 total da população brasileira (cerca de 170 milhões) a 2002, o programa atingiu seis milhões de alu- o volume de excluídos digitais chega a 153 milhões nos. O problema do Proinfo é que ele não está de brasileiros. Esse estudo, que pretende ser o preparado para lidar com ambientes escolares. mais abrangente do país, portanto, possui Assim, os computadores que poderiam se trans- problemas sérios de concepção e por isso não será formar em telecentros comunitários nas própri- mais utilizado neste levantamento. É importante as escolas terminam sendo apenas laboratórios destacar que, a partir de 2005, a PNAD, do IBGE, de informática. órgão oficial de pesquisas no Brasil, passará a con- tar com 20 perguntas específicas para definir o Pontos de Cultura (Ministério da Cultura) conceito de inclusão digital. E ainda que se trate Os pontos fazem parte do Programa Nacional da PNAD, os dados colhidos não dirão respeito de Cultura, Educação e Cidadania – Cultura Viva. exclusivamente ao acesso residencial. Esses pontos serão criados em espaços já No âmbito federal, não há políticas de inclu- existentes, públicos ou privados. O ministério irá são digital que se destaquem como consolidadas. repassar R$ 155 mil para cada um deles, distribu- O que há é a profusão de diferentes projetos, em ídos em cinco semestres. A cada seis meses, terão diferentes espaços do governo, com diferentes R$ 30 mil para colocar suas propostas em prática características. Muitos desses projetos obtiveram e no último semestre de 2006, R$ 35 mil. Cada algum tipo de resultado, os quais enumeraremos ponto será equipado com um estúdio digital para e comentaremos sob o item “Tendências Atuais e gravação de CDs, um computador que funcionará Futuras”. No último ano, iniciou-se o esforço de com software livre e uma câmera para gravações levar à frente uma política integrada de inclusão audiovisuais. O Ministério da Cultura e o digital. Ministério das Comunicações assinaram em março Iniciativas por parte de diferentes órgãos co- de 2005 uma parceria entre os Pontos de Cultura meçam a articular uma coordenação conjunta. A e o Gesac (ver abaixo), de modo a viabilizar o acesso estrutura do Governo Eletrônico brasileiro é cons- à internet em localidades remotas. tituída por oito comitês técnicos, sendo um deles o Comitê Técnico de Inclusão Digital, coordenado Gesac (MiniCom/Ministério da Educação) pela Secretaria de Logística e Tecnologia da Infor- O Programa Governo Eletrônico - Serviço de mação do Ministério do Planejamento (SLTI/MPOG). Atendimento ao Cidadão (Gesac), do governo Trata-se de uma estrutura política-administra- federal, conta com 3.200 unidades instaladas, tiva que não está amparada por um marco tendo como pontos de acesso especialmente regulatório que defina qual setor do governo fe- escolas públicas. Toda a conexão é feita por deral é o responsável pela política pública de in- satélite, possibilitando o alcance a regiões não clusão digital. Mesmo com este esforço inicial, cabeadas. São beneficiadas prioritariamente as atualmente ainda persiste o cenário de diversas comunidades que apresentam baixo Índice de iniciativas diferentes, com metodologias diferen- Desenvolvimento Humano (IDH) e que estão tes e que chegarão a resultados diferentes quanto localizadas em regiões onde as redes de ao que é, ou não, inclusão digital. telecomunicações tradicionais não oferecem acesso Algumas iniciativas em curso em âmbito fede- local à internet em banda larga. ral: De acordo com a Secretaria de Educação à Distância do Ministério da Educação, das 178 mil Programa Nacional de Informática na Educação - escolas públicas existentes no país, 20% possuem Proinfo (Ministério da Educação) computadores e apenas 10% possuem conexão O Proinfo foi criado em 1997. De acordo com com a internet. No ano passado, das antenas o ministério, até 2002, ano de encerramento do instaladas pelo Gesac, 2.400 foram ligadas em governo Fernando Henrique Cardoso, o total in- escolas públicas. vestido chegou a R$ 206 milhões. O número de Em 2004, os usuários do programa passaram computadores instalados no programa ficou bem a ter acesso a oito novos serviços. Os usuários abaixo das metas estabelecidas pelo próprio go- ganharam ainda o direito de possuir o seu próprio verno: apenas 51% dos 105 mil que se esperava e-mail e as comunidades, condições para criar sua atingir. Em relação à capacitação: nas 4.629 es- página na internet. colas atendidas pelo programa, 137.911 profes- O programa havia sido planejado no governo 111
  • 114. anterior a partir da noção de totens de acesso, dinação hierárquica, bem como mandato fixo e sem compreender necessariamente a noção de estabilidade de seus dirigentes”, além de defini- telecentros comunitários. Na revisão do progra- ção no artigo 19º que institui a prevalência da ma, o atual governo decidiu adotar essa noção, Anatel sobre qualquer outro órgão de defesa do com gestão democrática e acesso público, consumidor8. Estes dispositivos deverão mudar a instalando uma antena e cerca de dez partir da confecção de um marco regulatório úni- computadores em cada ponto. Também a largura co para todas as agências reguladoras, que está de banda aumentou, possibilitando plena sendo preparado pela Casa Civil (ver em capacidade de transmissão e recepção de dados “Tendências Atuais e Futuras”). por parte dos usuários. Para 2005, está prevista a A Anatel, como agência reguladora não subor- instalação de mais 1.200 telecentros Gesac. dinada a nenhum ministério, assume o papel prin- cipal na regulação e fiscalização do setor. É ela Rede Floresta (Eletronorte/ITI) quem regula o setor, fiscalizando metas de Projeto de inclusão digital para a Amazônia. universalização e concedendo ou não reajustes nas Perspectiva de construção de 20 unidades. Até tarifas das empresas que obtiveram as concessões agora, foram inaugurados quatro telecentros na de exploração do setor após a privatização do região Norte. Nos moldes do projeto de telecentros sistema Telebrás, antigo monopólio estatal nas te- da Prefeitura de São Paulo. lecomunicações (veja mais no item “Implementação”). O Ministério das Comunicações CorreiosNeT (Correios) transferiu ainda, por contrato, a tarefa de também Pontos de acesso nas agências dos Correios, regular o setor de radiodifusão, aumentando as com a proposta de que cada cidadão possa ter um atribuições da agência. endereço de e-mail. Na Lei Geral das Telecomunicações, o artigo 19º define que compete à Anatel “adotar as medidas Programa de Inclusão Digital de Pescadores (Se- necessárias para o atendimento do interesse pú- cretaria Nacional de Aqüicultura e Pesca) blico e para o desenvolvimento das telecomuni- cações brasileiras, atuando com independência, Telecentros de Informações e Negócios (Ministério imparcialidade, legalidade, impessoalidade e pu- do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) blicidade”. O Decreto 2.338 especificou, entre outras, as seguintes competências: PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES D 1.1 E D1.2 Art. 16º (...) I - implementar, em sua esfera de atribuições, a polí- Telefonia Telefonia tica nacional de telecomunicações fixada na Lei e A Anatel, assim como o Conselho Administrati- nos decretos a que se refere o art. 18 da Lei no. 9.472, de 1997; vo de Defesa Econômica (Cade), tem seus conse- (...) lheiros nomeados pelo governo, sem direito à voto IV - rever, periodicamente, os planos geral de outor- ou veto da sociedade civil. O artigo 8º cria a Anatel gas e de metas para universalização dos serviços como “entidade integrante da Administração Pú- prestados no regime público, submetendo-os, por blica Federal indireta, submetida a regime intermédio do Ministro de Estado das Comunica- autárquico especial e vinculada ao Ministério das ções, ao Presidente da República, para aprovação; Comunicações”. O Decreto 2.3387, assinado pelo V - exercer o poder normativo relativamente às tele- ex-presidente Fernando Henrique Cardoso em comunicações; outubro de 1997, aprova o regulamento da Agên- VI - editar atos de outorga e extinção do direito de cia e, no primeiro parágrafo do artigo 1º, diz que exploração de serviço no regime público; VII - celebrar e gerenciar contratos de concessão e a autarquia especial terá “independência adminis- trativa, autonomia financeira, ausência de subor- 7. Leia íntegra do decreto presidencial que aprova o regulamento da Anatel em 1997 www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D2338.htm 8. Art. 19. A Agência articulará sua atuação com a do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, organizado pelo Decreto nº. 2.181, de 20 de março de 1997, visando à eficácia da proteção e defesa do consumidor dos serviços de telecomunicações, observado o disposto nas Leis nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990, e nº. 9.472, de 1997. Parágrafo único. A competência da Agência prevalecerá sobre a de outras entidades ou órgãos destinados à defesa dos interesses e direitos do consumidor, que atuarão de modo supletivo, cabendo-lhe com exclusividade a aplicação das sanções do art. 56, incisos VI, VII, IX, X e XI da Lei nº. 8.078, de 11 de setembro de 1990. 112
  • 115. fiscalizar a prestação do serviço no regime público, a Fittel lembra que, mesmo com a expansão dos aplicando sanções e realizando intervenções; terminais instalados no país, houve redução do VIII - controlar, acompanhar e proceder à revisão de número de pulsos utilizados e o tempo de cada tarifas dos serviços prestados no regime público, ligação também caiu. podendo fixá-las nas condições previstas na Lei nº No mesmo contexto econômico, o Instituto de 9.472, de 1997, bem como homologar reajustes; (...) Defesa do Consumidor (Idec) apóia o projeto do XIX - atuar na defesa e proteção dos direitos dos deputado Marcelo Texeira (PMDB-CE), que prevê a usuários, reprimindo as infrações e compondo ou extinção da assinatura básica do telefone. arbitrando conflitos de interesses, observado o Do lado do empresariado, as operadoras se art. 19. reuniram na Associação Brasileira de Prestadoras de Serviço Telefônico Fixo Comutado. Em 2004, a Os recursos provenientes das taxas de fiscali- entidade já cobrou do Ministério das Comunica- zação e funcionamento da Anatel, além dos pro- ções uma posição mais forte contra os projetos venientes do acompanhamento das concessões, que pretendem cancelar a cobrança da assinatura serão destinados para o Fundo de Fiscalização das mensal. Existem também associações de empre- Telecomunicações (Fistel), criado em 19669 para sários em outros setores, como a Neotec para o fiscalizar o setor e redirecionado pela LGT para MMDS (que, com o wimax, passam a ser operado- suprir os recursos da agência. Esse mecanismo ras de telecomunicações, também), a Associação concede à Anatel independência financeira de qual- Brasileira de Indústria Elétrica e Eletrònica (Abinee), quer ministério ou outro órgão governamental. para o hardware, e a Associação Nacional das O comando da Anatel é exercido pelo Conse- Operadoras Celulares (Acel). lho Diretor, composto de cinco membros com mandato de cinco anos. A escolha dos conselhei- Internet e inclusão digital ros resulta da nomeação direta do Presidente da A sociedade civil brasileira desempenhou pa- República, conforme artigo 23 da LGT. Também pel fundamental na formulação e implementa- cabe exclusivamente ao Presidente a nomeação do ção das políticas públicas de inclusão digital. presidente deste conselho, que tem por função Entre essas entidades, está a Rede de Informa- comandar administrativamente a agência e presi- ções para o Terceiro Setor (Rits) e o Instituto Bra- dir as sessões com os demais conselheiros. Há tam- sileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), bém na Anatel um Conselho Consultivo, que aca- entidade pioneira no que se refere à internet bra- ba recebendo mais empresários do setor do que sileira. Além dela, há um sem fim de ONGs que, representantes da sociedade civil (ver mais sobre durante os anos 90 e, principalmente, no início o Conselho Consultivo no indicador D4). desta década, passaram a desenvolver atividades Em relação aos atores da sociedade civil que de inclusão digital. interferem no debate, o principal na área de Outro ator de destaque é o PT, que em duas de telecomunicações é a Federação Interestadual dos suas principais administrações municipais nos Trabalhadores de Telecomunicações (Fittel). A sua últimos anos (São Paulo e Rio Grande do Sul) proximidade com o atual governo fez com que o assimilou as principais políticas públicas indicado, em 2003, para a presidência da Anatel, formuladas pela sociedade civil e as amplificou tenha sido Pedro Ziller, ex-dirigente da federação. consideravelmente (ver mais em “Implementa- A sociedade civil e o movimento sindical da ção”). área das telecomunicações têm se mobilizado des- É preciso, no entanto, apontar algumas dife- de a época das privatizações para enfrentar o au- renciações. Se a concepção de telecentro com a mento abusivo dos preços, a ocorrência massiva qual se trabalha aqui depender da adoção de de problemas técnicos e a necessidade da softwares e sistemas operacionais livres, o núme- universalização. A Fittel questiona a ausência de ro de atores de destaque nos últimos anos reduz- participação popular nas decisões dos critérios das se drasticamente. concessões públicas e, sobretudo, quanto ao Se foram importantes para a consolidação de acompanhamento da agência reguladora do setor, um modelo de inclusão digital no país, entidades a Anatel. A federação critica ainda o atual preço bem intencionadas da sociedade civil também têm das tarifas telefônicas no país e a legislação que servido como abrigo para projetos apoiados por permite o reajuste regular dos preços. Diante disso, fabricantes de softwares. Esses projetos servem 9. Lei 5.070, de 16 de julho de 1966. 113
  • 116. aos interesses de monopólios internacionais ao valor adicionado, como, por exemplo, a internet. realizar a formação de consumidores para software Ainda que tenha sido apresentada a questão proprietário. Recentemente, por exemplo, iniciou- do SCD como caminho para a utilização das ver- se um projeto conduzido pelas ONGs Sampa.org bas do Fust, o Ministério das Comunicações tem e Cemina para a instalação de 18 telecentros no defendido uma mudança na lei, de forma a trans- país, financiados pela Microsoft. O programa ferir ao governo a gestão dos recursos do fundo, custará R$ 145 mil e a Microsoft abriu mão do hoje a cargo da Anatel, garantindo ao Executivo a pagamento das licenças de uso de seus softwares. necessária liberdade para implantar uma política Destaca-se também o Comitê para Democra- de inclusão digital. tização da Informática (CDI) que atua montando Escolas de Informática e Cidadania (EICs) em par- Internet e inclusão digital ceria com associações e entidades locais. O CDI O governo e o Estado brasileiro não possuem, está representado em comitês regionais em 35 nesse momento, uma política unificada de inclu- cidades em 20 estados brasileiros. Hoje, a Rede são digital. O desafio de garantir o acesso à CDI inclui 863 EICs, contando com 1.726 educa- internet aos milhões de brasileiros sem-computa- dores, mais de 635 mil educandos formados, dor, no entanto, vem sendo enfrentado em diver- mais de 4,3 mil computadores instalados e 1.036 sas frentes, ainda que carentes de coordenação. A voluntários. O programa também conta com o prova dessa assertiva é o próprio movimento de apoio da Microsoft. setores do governo para garantir a formulação de uma política para a inclusão digital. Há um forte movimento dentro do governo ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS para a construção de uma política para o setor. D 1.1 E D 1.2 Uma prova disso é o documento “Programa Brasileiro de Inclusão Digital e Estratégia de Telefonia Telefonia Governo”, em sua versão preliminar de 26 de julho Os trabalhadores em telecomunicações ainda de 2004. Esse trabalho é resultado de uma síntese pressionam o governo e a Anatel a renegociar a de outros seis documentos produzidos no âmbito concessão das operadoras de telefonia, reajustan- do governo federal, por ministérios e autarquias do valores e obrigações. Todas as outorgas conce- que desenvolvem atividades de combate à exclusão didas na época das privatizações findam em 2005 digital: e precisam ser renovadas para 2006. Esta é a opor- 1) Política Estratégica de Governo Federal para tunidade, segundo a Fittel, para alterar regras do a Inclusão Digital (Ministério do Planejamento) contrato entre iniciativa privada e governo. 2) Sugestões para a qualificação das iniciativas Além do Serviço de Comunicações Digitais de Inclusão Digital (Instituto Nacional de (SCD), o governo federal acena com a idéia de Tecnologia da Informação) utilizar os recursos do Fust para criar um novo 3) Construindo um mapa conceitual para um serviço de telefonia fixa para as pessoas de baixa projeto nacional de infoinclusão (Ministério da renda. A principal vantagem do serviço estaria Educação) justamente no preço acessível da assinatura básica. 4) Programa Casa Brasil (Banco do Brasil) Existe, contudo, uma decisão do Tribunal de 5) Inclusão Digital e Estratégia de Governo Contas da União (TCU) que não é clara sobre a (Ministério das Comunicações) possibilidade de se criar um novo serviço que 6) Ata da 1ª reunião de integração dos proje- utilizasse, em sua implantação e manutenção, os tos de Inclusão Digital do Governo Federal, de 16 recursos do Fust. Além disso, os recursos do fundo de julho de 2004 vêm sendo contingenciados pelo governo para fins Esse esforço converge para o projeto Casa Bra- de superávit primário. sil. Sobre o projeto do SCD, foi realizada uma consulta pública pela Anatel. Embora haja avanços Projeto Casa Brasil no que tange a conciliação de pacotes de outorgas É carro chefe do Programa Brasileiro de Inclusão envolvendo regiões lucrativas e não lucrativas, a Digital. Trata-se, na teoria, de um programa de proposta do SCD contraria a própria LGT quando articulação dos serviços e informações oferecidos prevê que as operadoras poderão fornecer a rede pelo governo em meio digital. Cada Casa Brasil, e o acesso nas localidades em que não houver pro- no geral, terá: vedores. Isso é proibido pela LGT, que impede as 1. Telecentro operadoras de serem fornecedoras de serviços de 2. Rádio Comunitária 114
  • 117. 3. Espaço Multimídia apenas 90 unidades. 4. Centro de reparo de computadores Além disso, há mais três ações previstas para Será, de acordo com o documento “um ponto 2005 dentro do PBID. de convergência para as ações do governo de in- - aumento de escolas públicas ligadas na clusão digital, inclusão social, no mercado de tra- internet. Atualmente, das 173 mil escolas do en- balho, desenvolvimento da cidadania, desenvol- sino fundamental, apenas 20 mil possuem com- vimento local e regional sustentável, geração de putadores. emprego e renda e a disseminação do software - massificação do acesso à internet em todo o livre”. país, com ações do governo que permitam me- lhorar a infra-estrutura de telecomunicações no Programa Brasileiro de Inclusão Digital país. Para a execução do PBID, serão criadas novas - Centro de Reciclagem de Computadores (CRC). estruturas de coordenação. Uma delas, a Coorde- O governo federal descarta aproximadamente 200 nação Nacional do Programa de Inclusão Digital, mil computadores por ano. A proposta é direcionar sob responsabilidade da Casa Civil da Presidência todos os computadores para vários centros de da República. Também serão criadas, em nível local, reciclagem de computadores e esses centros unidades de gestão, “com base nas diretrizes de recolocarem esses computadores para uso da participação comunitária, sustentabilidade, acom- inclusão digital. panhamento e avaliação”. Também o grupo Internet Acess for Everyone A política do governo para o setor prevê cinco (Acesso à Internet para Todos), que reúne empresas ações diferenciadas, que combinam a idéia de aces- do ramo de informática como a BMC Software, so em espaços públicos e acesso domiciliar. A ava- Global Learning Venture, Philipe Eletronics, Dell e liação do governo é de que essa política deve estar Intel, escolheu o Brasil para desenvolver uma focada especialmente nas classes D e E. Para a clas- espécie de "ecossistema" de inclusão digital para se C, o governo identifica o preço do computador famílias que possuem renda inferior a três salários como o maior empecilho para o acesso às mínimos. tecnologias. A meta prevista no Plano Plurianual 2004-2007 Para atingir esse público, o governo pretende é de chegar a sete mil telecentros no Brasil, até o tirar do papel este ano o programa PC Conectado, final do período. De acordo com o boletim Em que vai permitir a aquisição de computadores para Questão, produzido pela Secretaria de Comunica- famílias que ganham acima de cinco salários mí- ção e Gestão Estratégica do governo federal, “a nimos. Segundo Rogério Santanna, secretário de partir de 2006, está prevista a abertura de três Logística e Tecnologia da Informação do Ministé- mil novos telecentros a cada doze meses, o que rio do Planejamento, a proposta é chegar a um PC incluirá nove milhões de brasileiros das classes D que custe aproximadamente R$ 50 por mês e que e E no mundo digital anualmente”. A perspectiva possa ser pago em um período de 24 meses, com do programa é dobrar, em 2007, o número de juros mais baixos e com subsídio governamental internautas no Brasil (o programa utiliza como no montante dos impostos envolvidos. Seria uma dado o Mapa da Exclusão Digital e estima que hoje máquina em torno de R$ 1,2 mil para o haja 16 milhões de brasileiros incluídos consumidor dessa classe. digitalmente10). Outra meta do governo seria construir mil Vale destacar que todas essas questões apre- unidades das Casas Brasil em 2005, e para isso sentadas estão, por enquanto, apenas no papel. foram aprovados R$ 224 milhões no orçamen- Apesar da declarada intenção, que também se re- to. No entanto, após o corte da equipe do Mi- flete na alocação de recursos no orçamento da nistério da Fazenda, sobraram apenas R$ 24 União, ainda não há nada que garanta que esses milhões, que serão suficientes para construir planos se consolidem na prática. 10. Como foi afirmado anteriormente, esse mapa de exclusão digital leva em conta apenas o acesso residencial, portanto é questionável do ponto de vista quantitativo, por não incluir os números dos telecentros de acesso público, dos locais de trabalho, ou mesmo de LAN houses e cybercafes. 115
  • 118. D 1.3 - Apoio ao desenvolvimento de indústrias locais ao longo dos setores relacionados a TICs, tais como incentivos específicos, períodos de transição para a criação de companhias locais etc. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO Na Constituição Federal, o artigo 219 afirma Os descontos tributários previstos para os pro- que o “mercado interno integra o patrimônio na- dutos fabricados na Zona Franca de Manaus ge- cional e será incentivado de modo a viabilizar o ram um quadro de atração de empresas estran- desenvolvimento cultural e sócio-econômico, o geiras que promovem a montagem dos produtos bem-estar da população e a autonomia tecnológica por lá, mas que desenvolvem toda sua tecnologia do País, nos termos da lei federal”. em seus países de origem. Ainda que haja fabri- Há vinte anos, ainda durante o regime militar cantes nacionais de produtos e componentes ele- brasileiro, foi lançado o Plano Nacional de trônicos, de modo geral, ao Brasil é reservado o Informática pela Lei 7.232/84. A legislação atribuía papel de mão-de-obra montadora na cadeia pro- ao governo a responsabilidade de orientar, dutiva, estando o desenvolvimento dos produtos coordenar e estimular atividades de informática, locados nos países de origem das transnacionais. seja na participação em conjunto ou substituição Uma das políticas propostas pelo presidente à própria iniciativa privada ou na intervenção para Fernando Collor, consolidada na Lei 8.387, de assegurar proteção à produção nacional. A política 1991, foi a substituição dos índices de nacionali- prevê a “proibição de situações monopolísticas, zação pelo Processo Produtivo Básico, que permi- de direito ou de fato”. te à indústria de eletro-eletrônicos importar CKD A Lei 8.387, de 30 de dezembro de 1991, con- (kits desmontados) e/ou SKD (kits semi-desmon- cede descontos tributários (IPI e IR) para os pro- tados) para usufruir de descontos na Zona Franca dutos produzidos na Zona Franca de Manaus, in- de Manaus e apenas montar os itens aqui. cluindo bens para informática. Essa lei inverteu a Em relação à política industrial no setor de prioridade do país no setor. Se o Plano Nacional software, a Agência de Promoção de Exportações de Informática visava produzir ciência e tecnologia do Brasil (Apex), órgão vinculado ao Ministério do no país, a lei de 1991 acaba com isso, e propõe Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que empresas estrangeiras venham montar seus em conjunto com a Sociedade para a Promoção produtos em território nacional. da Excelência de Software Brasileiro (Softex), vão Em 2004, o governo anunciou sua política in- investir cerca de R$ 11,8 milhões no Projeto dustrial, na qual aponta como opções estratégi- Setorial Integrado para Exportação de Software e cas softwares, semi condutores, fármacos e serviços correlatos. A meta é exportar US$ 16 mi- medicamentos e bens de capital. Especialmente o lhões em um ano. setor de softwares, mas também o de A Apex e a Softex selecionaram setores de atu- semicondutores, tem influência direta no campo ação, como gestão eletrônica de documentos e da comunicação. automação bancária, telecomunicações, governo Nos documentos que definem a política in- eletrônico, internet, saúde, gestão empresarial e dustrial, estão previstos quatro focos: inovação segurança. Hoje qualquer empresa pode procurar e desenvolvimento tecnológico; inserção exter- a Softex e passar por uma avaliação para partici- na; modernização industrial e capacidade e es- par do projeto, que envolve a capacitação, a gera- cala produtiva. ção de contatos qualificados e prospecção de mer- Para o campo da telefonia, no processo de cados. privatização não houve nenhum estímulo à ma- nutenção de uma operadora nacional, ainda que renovada. Diferentemente da Europa, não PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES há no Brasil uma companhia equivalente à France Telecom, British Telecom, Telefonica de Da parte do governo, os principais atores para Espanha etc. o desenvolvimento de indústrias locais são o Mi- nistério do Desenvolvimento, Indústria e Comér- cio Exterior e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ligado ao Ministério do Planeja- 116
  • 119. mento, ambos responsáveis pelo desenvolvimen- das universidades) trabalha em design de compo- to da política industrial. Os dois atores citados, a nentes. A capacitação nessa área possibilitaria o Apex e a Softex, têm, por sua vez, trabalhado desenvolvimento de componentes como os SOCs juntos pelo fortalecimento de uma política para (system-on-chip), por exemplo, que integram vários softwares. Além deles, também atuam sobre a sistemas num único chip, e, segundo o próprio questão o Ministério da Ciência e Tecnologia e o governo “tendem a ser um ponto crítico em novas Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico áreas, como a TV digital”. Nesse campo, o foco da e Social (BNDES). política industrial é tanto atração de investimento A coordenação e operacionalização da política quanto desenvolvimento de competências e industrial será exercida por grupos de trabalho de formação de pessoal qualificado. natureza interministerial, que se reportarão a Em relação a softwares, o Brasil tem hoje o colegiado de ministros. Segundo o documento do sétimo maior mercado do mundo, com vendas de governo “esses grupos vão acompanhar e US$ 7,7 bilhões em 2001. Dados do governo monitorar mercados, empresas, setores, cadeias, federal apontam que as importações equivalem a arranjos produtivos, redes de empresas e firmas US$ 1 bilhão e as exportações estão em torno de no cumprimento dos compromissos assumidos no US$ 100 milhões. O setor de software é uma das âmbito dos programas”. áreas prioritárias da política industrial do gover- no brasileiro. O ministério tem como meta expor- tar US$ 2 bilhões em 2007. As cifras indicam a TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS intenção de crescimento da participação do Brasil nesse setor, mas não chegam a alcançar as de Em relação a tendências, é possível apresentar países como Israel, Irlanda e Índia. Esta última a expectativa em relação à inclusão de chega a contabilizar, segundo dados do próprio semicondutores e softwares como prioridades para governo, receitas da ordem de US$ 8 bilhões com a política industrial. Os semicondutores são a venda de licenças, produtos embarcados e componentes essenciais na composição de serviços para o exterior. aparelhos eletrônicos, especialmente os Segundo o documento de política industrial, relacionados à informática. Nos anos 70, o país a ausência de uma estratégia industrial focada, a contava com um laboratório de classe mundial, e falta de uma imagem do software brasileiro re- estava entre os países líderes na pesquisa e conhecida no mercado internacional e dificulda- desenvolvimento de circuitos integrados. No final des de financiamento são algumas das barreiras dos anos 80, havia 23 empresas no Brasil; hoje, à aquisição de competitividade da indústria no esse número está limitado a quatro. Quase todas plano internacional, conforme recente estudo elas trabalham no encapsulamento (ou back-end), comparativo entre os mercados brasileiro, india- a parte de menos valor agregado. Não há foundries no e chinês. (fabricantes de chips), e apenas a Motorola (fora 117
  • 120. D1.4 Estatísticas e indicadores que demonstrem que o efeito cumulativo das políticas implementadas está realmente reduzindo a exclusão em termos de acesso, disponibilidade, acessibilidade econômica, acessibilidade e uso, e na promoção do bem-estar público. Internet público, o acesso dos locais de trabalho etc. Mes- Dados da Agência Nacional de Telecomunica- mo assim, ajudam a identificar o quadro da reali- ções (Anatel), de 2002, mostram que: dade brasileira. De acordo com a PNAD 2003 do IBGE, 15,3% dos domicílios brasileiros têm com- - 6,7% dos pulsos do serviço de tarifas fixas putadores. 11,4% dos domicílios têm acesso à comutadas são utilizados para conexão a prove- internet. Esse número vem crescendo numa pro- dores de internet. A Anatel justifica esse dado pelo porção próxima a 10% ao ano. O IBOPE Net Ratings, fato de que o serviço telefônico fixo comutado principal instituto de pesquisas brasileiro, avali- (STFC) permite o acesso à internet por meio de ando os usuários residenciais de internet, anun- pulso único (ou seja, o internauta navega na ciou que o número de usuários domiciliares cres- internet por tempo indeterminado e paga apenas ceu cerca de 20% em 2004 e chegou a 5,3 milhões, um pulso telefônico) de um total de 18,6 milhões com acesso à internet. - No Brasil, existem cerca de 1.241 provedores Assim, os usuários de banda larga representam de acesso à internet. cerca de 28,5% dos usuários domiciliares. - Eles estão distribuídos em apenas 360 muni- Já no tocante aos indicadores de políticas pú- cípios. Com isso, apenas 845 municípios (cerca de blicas, faltam dados que permitam avaliar o im- 15% do total de cidades do país) conseguem que pacto das políticas de inclusão digital tanto das seus habitantes se conectem à internet pagando prefeituras quanto do governo federal. pulso local. No caso da internet, além da exclusão econô- - 58% desses provedores concentram-se na re- mica, outros fatores contribuem para o baixo gião Sudeste, a mais rica e industrializada. Entre índice de acesso. São questões culturais (como a os demais, 19% estão na região Sul; 11%, no usabilidade de computadores) e educacionais Nordeste; 7%, no Centro-oeste; e 5%, no Norte. (como o grau de instrução), entre outras. - Ainda assim, a concentração populacional garante que 62% da população brasileira sejam Telefonia Telefonia “cobertos” por provedores de internet. Impacto no orçamento familiar Os dados de acesso residencial à internet não O acesso aos serviços de telecomunicações está devem ser tomados como base da análise da in- diretamente ligado aos preços oferecidos e à ca- clusão digital, por excluir os centros de acesso pacidade de consumo da população. Despesa* média mensal familiar do brasileiro (R$) Classificação por rendimento mensal familiar em salários mínimos** Tipo Até Entre Entre Entre Entre Entre Entre Entre Entre Mais Total 2*** 2e3 3e5 5e6 6e8 8 e 10 10 e 15 15 e 20 20 e 30 de 30 Telefone 4,15 9,31 17,52 26,68 35,36 41,64 54,79 66,64 82,51 105,64 31,86 fixo**** Telefone 0,74 1,30 3,21 4,63 6,75 10,43 13,81 26,15 42,42 106,38 11,29 celular Quantidade de 7.949.351 6.747.421 10.181.484 3.528.908 5.086.643 3.349.073 4.571.410 2.416.195 2.236.892 2.467.262 48.534.638 famílias Tamanho 3,34 3,53 3,68 3,73 3,72 3,70 3,80 3,72 3,72 3,63 3,62 médio da família Fonte: Pesquisa de Orçamentos Familiares 2002-2003 (IBGE) * O coeficiente médio de variação da despesa total em relação à amostra da pesquisa é de 2% para telefone fixo e 4,5% para telefone celular ** Salário mínimo de R$ 200, vigente durante o período a realização da pesquisa do IBGE *** Inclusive os que não possuem rendimentos **** Não inclui gastos com telefone público 118
  • 121. No Brasil, em que grande parte da população ventiva quanto de reparos, mas boa parte dos cus- está abaixo da linha de pobreza, a situação torna tos da rede física já estão amortizados. necessária a criação de medidas voltadas para as Algumas Câmaras Municipais e Assembléias classes mais desfavorecidas e, conseqüentemente, Estaduais já aprovaram projetos de lei que derru- uma maior participação do Estado na garantia da bavam a cobrança a taxa. A argumentação era de universalização do acesso à telefonia. que a Constituição brasileira, em seu artigo 24, A última pesquisa sobre os orçamentos famili- permite uma competência corrente à União e a ares do IBGE aponta o impacto dos gastos da po- estados sobre a legislação de consumo e produ- pulação com telefonia fixa e móvel (veja tabela na ção, embora o artigo 22 diga que compete ape- página anterior). Os quase 120 milhões de nas à União legislar sobre telecomunicações. Todos brasileiros que recebem menos de oito salários os projetos foram derrubados após decisões mínimos – que, na época da pesquisa, era de R$ judiciais. 200 – gastam, em média por mês, cerca de R$ 36 com telefone fixo e menos de R$ 7 com celulares. área teleco- Mapeamento do setor privado na área de teleco - Os últimos anos mostram que o número de municações telefones celulares em funcionamento ultrapassou o número de linhas fixas. Desses, mais de 80% são Telefonia fixa de telefones pré-pagos (ver mais dados abaixo). Desde 2001, a média brasileira de Isso evidencia a opção que vem sendo feita por teledensidade (quantidade de acessos por cada 100 muitos consumidores de substituir a linha fixa pelo mil habitantes) é praticamente a mesma. Em 2003, telefone pré-pago. A média de gastos, no entan- quando o último levantamento foi feito, esse ín- to, evidencia que os telefones ainda têm um pa- dice foi de 29%, exatamente o mesmo de 2002 e pel de recepção muito maior do que de ligações. apenas dois pontos percentuais a mais do que o O que faz com que ainda sejam os telefones pós- registrado em 2001. Isso significa que, a despeito pagos os que sustentam as operadoras móveis. do incentivo à competição de mercado almejada Repetindo o que já foi apontado nos atributos pelo processo de privatização das empresas de D1.1 e D1.2, o processo de privatização das tele- telecomunicação de meados dos anos 90, a utili- comunicações não priorizou o maior acesso à po- zação do serviço de telefonia fixa no Brasil está pulação a preços razoáveis: os ganhos financeiros praticamente estabilizada. do governo brasileiro com o processo são A Telemar é a maior operadora brasileira, com questionáveis, o Estado não manteve uma presen- cerca de 17,4 milhões de linhas instaladas em ça mínima estratégica no setor e as tarifas subi- 2.975 localidades que cobrem 94,6 milhões de ram a números superiores aos da inflação brasileira. brasileiros e brasileiras. A Telefônica vem em se- Com relação a este último, o aumento das tarifas guida com 14,8 milhões de linhas instaladas, em da telefonia fixa foi de 611,03% nos últimos 10 622 municípios (38 milhões de pessoas). Na se- anos. Em 1994, a assinatura residencial custava qüência, aparece a Brasil Telecom com 10,7 mi- R$0,69. Hoje ela custa na cidade de São Paulo R$ lhões de linhas instaladas em 1.798 cidades (po- 34,29. Um aumento de quase 5.000%, bem maior pulação atendida de 40,8 milhões). que a inflação no período: de 145,01%11. Apenas O serviço de telefonia chega praticamente a entre 1995 e 1997, a assinatura subiu 2.172%, no todos os 5,5 mil municípios do Brasil, mas o pata- processo de preparação para as privatizações. mar da universalização dos serviços ainda está A assinatura básica acaba por ser um dos mai- distante. A utopia da plena concorrência que re- ores limitadores do acesso e, ao mesmo tempo, sultaria em um melhor atendimento dos cidadãos uma grande fonte de receita para as operadoras brasileiros tampouco se concretizou. A competi- de telefonia fixa. Cerca de 40% do faturamento das ção ainda está restrita às empresas, ao mercado empresas se baseiam na arrecadação desta taxa corporativo. No entanto, o mercado de telefonia mensal. Entretanto, a constitucionalidade da co- está às vésperas de mudanças drásticas com a in- brança da assinatura básica é questionada na trodução da telefonia por Internet Protocol (IP) e o Justiça e nas instâncias legislativas do país. A con- uso da tecnologia IEEE 802.16 (wi-max). Os tinuidade da cobrança seria abusiva, pois deveria impactos atuais ainda são pequenos, mas as pers- cobrir essencialmente os custos de instalação. pectivas são enormes. Existe ainda um custo de manutenção, tanto pre- As empresas-espelho, como a Vésper (compra- 11. A tarifa de telefonia fixa foi a que mais subiu nos últimos dez anos (611,03%), seguida pelos aluguéis (544,1%). A inflação no período acumulou alta de 145,01% entre julho de 1994, início do Plano Real, e junho de 2004. (Globo Online, 05/07/2004). 119
  • 122. da pela Embratel) e a GVT, não cumprem a função 90% do Índice Potencial de Consumo (IPC), de disponibilizar serviços concorrentes para loca- parâmetro calculado pela empresa Target que lidades com poder de consumo significativo, até mede percentual que cada município tem no con- por não serem obrigadas por lei a cumprir o Plano sumo nacional. Fica claro, portanto, que a compe- Geral de Metas de Universalização, e seguem tição na telefonia móvel se dá dentro do imperati- cambaleantes. vo da lógica de mercado. Das cerca de 1 milhão de linhas instaladas pela GVT, 70% estão em serviço. Já a Vésper, Infra-estrutura de telecomunicações (fibras ópticas) apesar de ter o maior potencial de mercado, tem A capacidade ociosa do setor de fibras ópticas cerca de seis milhões de linhas instaladas, mas chega a 90% no país e não há novas demandas. apenas 500 mil assinantes, número que não os- Em 2001, por exemplo, foram vendidos no Brasil cila há anos. Ou seja, não basta potencial para 2,5 milhões de quilômetros de cabos; em 2003, crescer. A sua compra pela Embratel indica a esse número não passou de 100 mil. Também em intenção desta em alcançar a última milha. Re- 2003, 250 mil quilômetros de fibras ópticas foram centemente, já tem sido anunciada pela empre- instaladas. Em 2001, foram mais de 2 milhões de sa a possibilidade do consumidor adquirir um quilômetros. Na média mundial, a diferença de telefone fixo sem assinatura básica. A Telmex, 2001 para 2003 caiu de 90 para 50 milhões de dona da Embratel, adquiriu também a NET Ser- quilômetros instalados. viços, possibilitando o provimento de acesso A novidade no mercado foi o investimento pe- telefônico domiciliar via cabo. sado da Telmex, que comprou a AT&T Latin A experiência de maior fracasso no modelo bra- America por US$ 205 milhões no final de 2003. Já sileiro é a das espelhinhos, previstas para fortalecer a Telemar e a Embratel, também em 2003, a concorrência em âmbito local. Apesar de ter au- venceram a última grande licitação de terceirização torização para atuar em 344 municípios (já de rede do Banco do Brasil, com um lance de R$ chegaram a quase 600), poucas delas estão em 311 milhões e R$ 316 milhões, respectivamente. operação. Satélites Telefonia móvel Este é outro setor em que a oferta hoje é mai- O número de linhas celulares em operação vem or do que a demanda, em cerca de 20%. Os ope- crescendo em altas proporções. O ano de 2004 radores de satélite esperam que as condições fechou com 65.605.577 acessos em operação, um negativas do setor passem por mudanças a par- crescimento de 41,47% em relação a 2003. Des- tir de 2008, quando a troca dos satélites hoje ses, 80,47% são linhas pré-pagas, que cresceram em órbita deve impor um ciclo de em participação em relação às linhas pós-pagas. reestruturações e consolidações no mercado. As A teledensidade (número de celulares em ser- transmissões de TVs abertas e por assinatura viço para cada 100 habitantes) do país subiu de representam mundialmente cerca de 70% da re- 26,22 (2003) para 36,63 (2004) ceita dos satélites. Nesse contexto, a tecnologia TDMA, embora mantenha 35,53% do mercado, vem perdendo Banda larga market share para a tecnologia GSM, sobretudo pela Há cerca de 250 municípios onde o serviço é sua flexibilidade territorial e pela maior segurança disponibilizado. A tecnologia ADSL é a líder abso- proporcionada, diminuindo os riscos de clonagem. luta do mercado no Brasil. Até o final de 2003, a Celulares GSM já representam 34,18% do mercado. Telefônica possuía 383 mil assinantes do Speedy Enquanto isso, a tecnologia CDMA, ainda concentrados no Estado de São Paulo; a Telemar concentrada nos grandes conglomerados urbanos, tinha 217 mil assinantes do Velox e a Brasil mantém uma faixa de 29,67% do mercado. Telecom, 195 mil assinantes do BRTurbo em di- O mercado de telefonia móvel praticamente versos estados (AC, DF, GO, MS, MT, PR, RO, RS, SC desistiu de expandir a sua cobertura com o intui- e TO). A tecnologia cable modem é operada pela to de atingir uma quantidade maior de municípi- NET, com o Virtua, e pela TVA, com o Ajato. os. Cerca de três mil municípios brasileiros (25,8 No Brasil, como dito acima, no final de 2004 o milhões de pessoas) não têm cobertura. número de usuários residenciais com banda larga Existem, porém, 1.492 municípios em que há era de 5,3 milhões, representando 28,5% dos 18,6 duas ou mais operadoras de telefonia móvel, mas milhões usuários domiciliares de internet. que representam 135,5 milhões de habitantes e 120
  • 123. 6) TV por assinatura Pelas redes de cabo ou MMDS, a TV chega hoje a 508 municípios do Brasil. A negociação da Telmex com a NET serviços, operadora de TV a cabo per- tencente ao conglomerado das Organizações Glo- bo, é a grande novidade do setor. Com a opera- ção, toda a rede de infra-estrutura da NET passa a ser controlada pelo grupo mexicano. Na TV por satélite, foi anunciada a fusão da Sky com a DirecTV, o que deixa 95% desse mercado (e cerca de 30% do mercado total de TV por assinatura) na mão do mesmo grupo. 121
  • 124. D2: Disponibilidade de conteúdo relevante para todas as comunidades lingüísticas e grupos marginalizados D2.1 Ações de apoio para produção de conteúdo por e para todas as comunidades lingüísticas. D2.2 Apoio ao desenvolvimento de software lingüísticos técnicos e interfaces de hardware. É possível identificar dois tipos de comunida- comunidades lingüísticas marginalizadas. Mais do des lingüísticas ou grupos marginalizados. O pri- que isso, não existe nenhuma base legal que meiro são os indígenas, sendo 235 povos no Bra- garanta ou sustente ações para o desenvolvimento sil, segundo o Conselho Indigenista Missionário de conteúdos, hardware e software para (Cimi). O total de indígenas de todos os povos, comunidades lingüísticas. segundo o Censo 2000, são 734.131, vivendo em No tocante às pessoas portadora de deficiên- 825 terras pelo país. Apenas 37% dessas terras cia, a Lei 10.098, de 2000, estabelece: tiveram seu procedimento de demarcação concluído. Art. 17. O Poder Público promoverá a eliminação de Além do português, falado por alguns povos, barreiras na comunicação e estabelecerá mecanis- 180 línguas diferentes são faladas por essas co- mos e alternativas técnicas que tornem acessíveis munidades, muitas dessas línguas em processo os sistemas de comunicação e sinalização às pes- soas portadoras de deficiência sensorial e com di- acelerado de extinção. Todo o restante da popula- ficuldade de comunicação, para garantir-lhes o di- ção brasileira fala o português. reito de acesso à informação, à comunicação, ao O outro grupo marginalizado são as pessoas trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao portadoras de deficiência. Segundo estimativa da esporte e ao lazer. Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 10% dos brasileiros – 18 milhões de habitantes – Art. 18. O Poder Público implementará a formação de são portadores de algum tipo de deficiência. Se- profissionais intérpretes de escrita em braile, lin- gundo a Rede Saci, especializada na questão, “acre- guagem de sinais e de guias-intérpretes, para faci- dita-se que esse número possa ser ainda maior, litar qualquer tipo de comunicação direta à pessoa uma vez que o Brasil é campeão em acidentes de portadora de deficiência sensorial e com dificulda- de de comunicação. trânsito e trabalho e tem índices crescentes de violência urbana”. Segundo o censo realizado pelo Art. 19. Os serviços de radiodifusão sonora e de sons IBGE, em 2000, são 24,5 milhões de brasileiros, e imagens adotarão plano de medidas técnicas com ou seja, 14,5% da população, com algum tipo de o objetivo de permitir o uso da linguagem de sinais deficiência. ou outra subtitulação, para garantir o direito de acesso à informação às pessoas portadoras de deficiência auditiva, na forma e no prazo previstos BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL em regulamento. Tradicionalmente, as línguas indígenas não são O Decreto 5.296, que regulamenta a lei, foi pu- levadas em conta na elaboração de políticas pú- blicado em 2004, e estabelece em seu capítulo VI blicas. A maior ameaça à cultura indígena, no en- uma série de obrigações para permitir acesso à tanto, está na ausência de políticas para demarca- informação e comunicação por parte das pessoas ção de terras e nas condições políticas e portadoras de deficiência, entre elas: socioeconômicas para sua sobrevivência. Segun- - portais e sítios da administração pública na do o Cimi, “para garantir a diversidade cultural, é internet com acessibilidade garantida; necessário garantir as condições de reprodução - telecentros públicos devem possuir instala- dessa cultura”. A inexistência, portanto, de base ções plenamente acessíveis e, pelo menos, um legal nesse sentido acaba prejudicando as computador com sistema de som instalado, para condições para produção de conteúdo por uso preferencial por pessoas portadoras de defici- 122
  • 125. ência visual; PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES - as empresas de telefonia fixa devem instalar telefones públicos adaptados e garantir a dispo- O Cimi atua na luta pela garantia dos direitos nibilidade de instalação de telefones para uso de dos povos indígenas. A entidade age para unificar pessoas portadoras de deficiência auditiva, entre a ação missionária junto aos índios, “intervindo outras ações; nas ações do Executivo, Legislativo e Judiciário que - empresas de telefonia móvel devem garantir atinjam os interesses dos índios e estimulando os interoperabilidade para possibilitar o envio de diversos setores sociais para que se solidarizem mensagens de texto (SMS) entre celulares de dife- com a causa indígena”. Assim, trabalha pela rentes empresas; manutenção e reprodução da cultura indígena. - deve haver incentivo da oferta de aparelhos Atuando na área da deficiência, a Rede Saci de televisão equipados com recursos tecnológicos partiu da Universidade de São Paulo (USP) e reúne que permitam sua utilização de modo a garantir diversas universidades para atuar como o direito de acesso à informação às pessoas porta- facilitadores da comunicação e da difusão de in- doras de deficiência auditiva ou visual, entre elas formações sobre o tema. Segundo a sua página legenda oculta (closed caption), tecla SAP e fones web, suas principais ferramentas de trabalho são de ouvido; a internet e os Centros de Informação e Convivên- - as emissoras de TV ficam obrigadas a trans- cia (CICs). “Por meio da internet, disponibiliza aos mitir utilizando sistemas de reprodução das men- seus usuários endereço eletrônico, suporte técni- sagens veiculadas para as pessoas portadoras de co, softwares adaptados para deficientes, além de deficiência auditiva e visual, como legendas ocul- bases de dados, listas de discussão, agenda de tas, janela com intérprete de Linguagem Brasileira eventos, entre outros serviços. Já os CICs são lo- de Sinais (Libras) e descrição e narração em voz cais de fácil acesso, abertos a portadores de defi- de cenas e imagens; ciência, onde são ministrados cursos gratuitos de - o projeto de desenvolvimento e implementa- capacitação para o uso da internet e da ção da televisão digital no país deverá contem- informática”. plar obrigatoriamente os três tipos de sistema de A Rede Saci conta com cerca de três mil usuários acesso à informação citados acima. cadastrados, e atua também em parceria com o poder público, como no caso dos telecentros de São Paulo. Outra entidade que lida com o tema é IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO a Escola de Gente, com projetos e ações que colo- cam a comunicação a serviço da inclusão de gru- No caso da disponibilização de conteúdo em pos vulneráveis na sociedade, principalmente de línguas indígenas, não há nenhum exemplo nesse pessoas portadoras de deficiência. sentido, até pela ampla maioria da população, inclusive parte dos indígenas, ter o português como língua-mãe. Contudo, sem ações efetivas ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS para a reprodução da cultura indígena, não há nenhum estímulo à permanência dessas culturas, A ser mantida essa política de não reconheci- e já há várias línguas que desapareceram. mento dos direitos dos índios, as 180 línguas ain- Na questão da acessibilidade, o decreto que da existentes devem diminuir em quantidade, já regulamenta a lei ainda é muito recente, e torna- que os esforços em preservar as línguas têm par- se difícil mensurar os efeitos de sua promulgação. tido apenas dos próprios indígenas. A Universidade Federal do Rio de Janeiro se tor- Já no campo das pessoas portadoras de nou referência mundial ao desenvolver o DOX VOX, deficiência, parece difícil descrever tendências. Por um software para pessoas portadoras de deficiên- um lado, a legislação é muito evoluída, e garante cia visual. No entanto, é possível notar que ainda a acessibilidade aos meios de comunicação, de são poucos os sítios acessíveis a portadores desse massa ou não. Por outro, a plena acessibilidade, tipo de deficiência. Já no tocante aos telecentros, para além dos sítios do poder público, depende vários deles já contam com condições plenas de de disposição particular dos sítios em assumir as acessibilidade, até pelo envolvimento de atores condições para alcançar essa acessibilidade, o que que lidam com essa questão, como a Rede Saci. parece impossível prever nesse momento. 123
  • 126. D3: Competências e habilidades disseminadas que permitam ao povo e suas comunidades fazerem uso das TICs para atingir seus objetivos individuais e coletivos. D3.1 Apoio para desenvolvimento de competências e habilidades, como treinamentos, programas de intercâmbio, módulos curriculares formais etc., amplamente disponíveis em estabelecimentos de ensino comuns, como escolas, bibliotecas, centros comunitários etc. BASE CONSTITUCIONAL E LEGAL produção de conteúdos escritos e visuais sobre temas relevantes e atuais da sua própria comuni- Não há base legal que sustente o apoio para dade. desenvolvimento de competências e habilidades. Apesar de demonstrarem intenções relevantes, essas são iniciativas isoladas, não necessariamente fruto de política pública planejada. Dependem IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO puramente, portanto, da boa vontade dos gestores que as aplicam. Embora não esteja consagrada por lei, a idéia do desenvolvimento de competências e habilida- des para a população lidar e se apropriar das O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES PAPEL ATORES tecnologias de informação e comunicação (TICs) está presente em algumas políticas públicas. O fato de nenhum dos programas de inclusão Em alguns programas de inclusão digital, como digital por parte do poder público estar consoli- os telecentros da Prefeitura de São Paulo, o deba- dado em bases legais torna frágeis as condições te sobre acessibilidade tem sido feito buscando para aprofundamentos, tais como o apoio a trei- fortalecer a produção de conteúdo próprio pelos namentos e educação. usuários. Um programa de oficinas de criação de Por parte do governo federal, o programa sites chegou a ser disponibilizado para os usuári- Gesac, coordenado pelo Ministério das Comuni- os em 2004. cações, e as Casas Brasil (ver a seguir em Também o programa Governo Eletrônico - “Tendências Atuais e Futuras”), coordenadas pela Serviço de Atendimento ao Cidadão (Gesac) tem Casa Civil da Presidência da República, são os buscado fortalecer a produção de conteúdo próprio principais espaços em potencial para a realização pelos usuários. A homepage do Gesac mantém no desse tipo de atividade. Também as escolas públi- ar o seguinte chamado: “O Gesac lança um desafio! cas de todo o país, a partir de políticas próprias e Convida a todos os usuários dos pontos de de sua integração ao Gesac, podem se tornar im- presença a produzirem sites das suas respectivas portantes agentes desse processo. comunidades, divulgando sua cultura, seus negócios, além da própria cidade. Participe! Organize-se em seu Centro Comunitário e publique ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS seu website!” Segundo o sítio, haveria a possibilidade de As Casas Brasil têm sido previstas não apenas desenvolver projetos como a construção de uma como telecentros, mas como uma central pública página da comunidade na internet, a redação de em que o cidadão poderá usufruir de diversos ser- um jornal eletrônico, a produção de áudios viços e se apropriar de tecnologias nas suas diver- comunitários locais (rádios e ilhas multimídias), a sas formas, como rádio comunitária e programa- tradução de softwares livres educacionais e a ção de sítios. Assim, ela se mostra como o espaço montagem de cursos educacionais à distância. ideal para o desenvolvimento de competências e A terceira fase do programa Gesac é a que con- habilidades por parte da população. templa o treinamento dos multiplicadores. O ob- Além disso, as discussões sobre diretrizes jetivo é que esses multiplicadores possam promo- curriculares no Ministério da Educação (MEC) já ver o uso intensivo das TICs disponibilizadas e a buscam opções para lidar com TICs no programa 124
  • 127. das escolas. No entanto, ainda há questões que antecedem ao desenvolvimento de capacidades. Segundo o próprio MEC, apenas 10% das escolas públicas têm acesso à internet e, em várias delas, há apenas um computador, vinculado à diretoria. As poucas escolas que possuem laboratório de informática têm a oportunidade de oferecer trei- namentos específicos, mas falta também uma po- lítica que proponha metodologias e dinâmicas para esse fim. 125
  • 128. D4. Participação efetiva da sociedade civil no processo de governança, incluindo sua formulação, projeto, regulação, implementação e avaliação. D4.1 Um processo participativo e multilateral de desenvolvimento de estratégias, que inclua participação significativa da sociedade civil e os recursos necessários para que todos os participantes dêem contribuições efetivas. Isto inclui infra- estrutura (seja fixa, sem-fio ou outros) e serviços (como telefonia, celulares, transmissão de dados e internet); e a natureza da compreensão e planejamento estratégicos por parte de todos. D4.2 Meios ativos e dinâmicos para que preocupações públicas com relação a governança e políticas sejam ouvidas e atendidas. D4.3 Mecanismos permanentes para participação pública na revisão e implementação de políticas em curso, de modo descentralizado quando apropriado, inclusive em relação aos acordos internacionais. D4.4 Mecanismos e instrumentos de auto-governança, desenvolvidos e utilizados pela sociedade civil, reconhecidos ou não pelo governo. BASE CONSTITUCIONAL LEGAL empresarial (provedores de acesso, conteúdo, infra- estrutura, indústria de telemática e usuários em- Repetindo o que já foi exposto em detalhes no presariais) e seus respectivos suplentes; quatro atributo A6, o principal espaço de participação da representantes do terceiro setor e seus respecti- sociedade civil nas questões de acesso às TICs é vos suplentes e três representantes da comunida- hoje o Comitê Gestor da Internet no Brasil. de científica e tecnológica e seus respectivos su- Inicialmente criado pela portaria interministerial plentes. 147, de 31 de maio de 1995, o CGIBr foi alterado Já no campo da telefonia, a criação da Agência por inúmeras normas até a atual forma, dada pelo Nacional de Telecomunicações (Anatel) não previu Decreto 4.829/03. Originalmente, o comitê foi a participação da sociedade civil no principal vinculado a dois ministérios: das Comunicações espaço de decisão da Agência, o Conselho Diretor. e de Ciência e Tecnologia. Hoje ele assumiu A Lei 9.472, intitulada Lei Geral de Telecomuni- personalidade jurídica própria, e tem na escolha cações (LGT) prevê que esse tipo de inserção se dá democrática de seus integrantes uma das marcas no Conselho Consultivo, como se vê abaixo. mais positivas. Sua função é coordenar e implementar todas Art 33. O Conselho Consultivo é o órgão de participa- as atividades necessárias à gestão eficiente e qua- ção institucionalizada da sociedade na Agência. lificada dos serviços de internet. Isso significa operar desde a atribuição de endereços e registro Art 34. O Conselho será integrado por representantes indicados pelo Senado Federal, pela Câmara dos de nomes de domínios até a recomendação de Deputados, pelo Poder Executivo, pelas entidades padrões e procedimentos técnicos para o desen- de classe das prestadoras de serviços de teleco- volvimento do setor, entre muitas outras tarefas. municações, por entidades representativas dos usu- Em julho de 2004 foi realizada a primeira ários e por entidades representativas da socieda- eleição direta dos integrantes do CGIBr. A compo- de, nos termos do regulamento. sição do Comitê visa contemplar diversos setores Parágrafo único. O Presidente do Conselho Consultivo da comunidade brasileira intrinsecamente relaci- será eleito pelos seus membros e terá mandato de onada à internet: quatro representantes do setor um ano. 126
  • 129. Art 35. Cabe ao Conselho Consultivo: PAPEL ATORES O PAPEL DOS DIFERENTES ATORES I - opinar, antes de seu encaminhamento ao Ministé- Tanto no campo da telefonia como da internet, rio das Comunicações, sobre o plano geral de ou- são poucos os atores da sociedade civil que traba- torgas, o plano geral de metas para universalização lham ativamente pela participação nas decisões de serviços prestados no regime público e demais políticas governamentais de telecomunicações; desses setores. II - aconselhar quanto à instituição ou eliminação da Em relação à telefonia, a Federação Interesta- prestação de serviço no regime público; dual de Trabalhadores em Telecomunicações III - apreciar os relatórios anuais do Conselho Diretor; (Fittel) atua buscando interferir nas decisões do IV - requerer informação e fazer proposição a respei- setor, por meio de espaços como o Conselho Con- to das ações referidas no art. 22. sultivo da Anatel. Há também órgãos de defesa do consumidor que trabalham para que as empre- Art 36. Os membros do Conselho Consultivo, que não sas cumpram as metas e parâmetros de qualida- serão remunerados, terão mandato de três anos, de, encaminhando as queixas e cobrando soluções vedada a recondução. por parte das operadoras. Destacam-se especial- § 1º Os mandatos dos primeiros membros do Conse- lho serão de um, dois e três anos, na proporção de mente o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) um terço para cada período. e a Procuradoria de Defesa do Consumidor § 2º O Conselho será renovado anualmente em um (Procon). Da parte do Estado, o principal ator é terço. mesmo a Anatel, que, como foi apontado, regula e fiscaliza o setor. Na questão da internet, duas instituições IMPLEMENTAÇÃO IMPLEMENTAÇÃO da sociedade civil tiveram papel marcante na atuação para democratização do Comitê Gestor A falsa oposição entre “técnico” e “político” tem da Internet no Brasil. A Rede de Informações marcado o discurso que sustenta as agências re- para o Terceiro Setor (Rits) atuou junto com a guladoras no país. Até mesmo a indicação de um Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) para ex-sindicalista para a presidência da Anatel que se determinasse a independência e se ado- provocou reações na grande mídia, evidenciando tasse o modelo de eleição direta para o comi- a dificuldade de se aceitar a proposta de controle tê. Outros atores, como o Projeto Software Li- público para as comunicações. Da maneira como vre Brasil, também têm buscado interferir nas está hoje, o Conselho Consultivo, espaço em que decisões desse campo, atuando pela amplia- há participação da sociedade civil, acaba tendo ção da democratização. pouca interferência e visibilidade. Da parte do governo, destacam-se três ato- No caso do CGIBr, não é possível fazer julga- res. O primeiro é a própria Anatel, diretamente mento de sua eficácia com o novo modelo, já que responsável pela regulação, já que a internet é sua instalação se deu ao final de 2004. serviço de valor adicionado. Em segundo lugar, A realização de consultas públicas têm ocorri- o Instituto Nacional de Tecnologia da Informa- do por vezes, ainda que não haja uma divulgação ção (ITI), Autoridade Certificadora Raiz da infra- ampla nem um acompanhamento sistemático de estrutura de chaves públicas brasileira. O ITI é suas decorrências para que se possa afirmar que uma autarquia vinculada à Casa Civil da Presi- elas são eficazes. No caso do Serviço de Comuni- dência da República, responsável por estimular e cações Digitais, por exemplo, os documentos de articular projetos de pesquisa científica e de de- Plano de Outorgas e de Metas de Universalização senvolvimento tecnológico voltados à ampliação foram colocados em consulta. Se isso demonstrou da cidadania digital. Há ainda o Serviço Federal uma disposição ao diálogo, reforçada pela marca- de Processamento de Dados (Serpro), empresa pú- ção de uma agenda de audiências públicas em seis blica de prestação de serviços em tecnologia da capitais de estados brasileiros, por outro, o prazo informação, responsável por boa parte das de 18 dias para a consulta dificultou manifesta- interfaces para e-gov, que também busca interfe- ções mais aprofundadas. rir nas decisões do setor. Há, portanto, uma propensão a mecanismos formais de diálogo, mas sem que haja participa- ção efetiva da sociedade civil na definição e acom- ATUAIS TENDÊNCIAS ATUAIS E FUTURAS panhamento de políticas, com exceção do caso do Comitê Gestor da Internet no Brasil. Está para ser votado no Congresso Nacional um projeto de lei que modifica o papel das agências 127
  • 130. reguladoras e sua relação com o governo. A pro- posta foi apresentada pelo próprio governo (e agora tramita na forma de substitutivo), e dimi- nui a independência das agências tornando-as mais ligadas ao governo. A proposta obriga a Anatel a assinar um contrato de gestão com o Ministério das Comunicações e transfere a responsabilidade das concessões do regulador para o Executivo. O substitutivo da Lei das Agências amplia a sujeição da agência, até então independente, ao Executivo e ainda dá direito ao Ministério de edi- tar regulamentos. Além disso, tira da Anatel a res- ponsabilidade de instruir processos sobre condu- ta anticompetitiva no setor no Conselho Adminis- trativo de Defesa da Concorrência (Cade). 128
  • 131. Referências Legislação e instrumentos regulatórios nacionais e internacionais Toda a legislação nacional consultada foi obtida em: - Presidência da República – http://www.planalto.gov.br - Senado Federal – http://www.senado.gov.br Destacam-se, entre outros, os seguintes textos: - Constituição Federal da República Federativa do Brasil, 1988; - Lei 4.117, de 1962 (Código Brasileiro de Telecomunicações); - Decreto Lei 236, de 1967, que regulamenta o Código Brasileiro de Telecomunicações; - Lei 8.977, de 1995, que trata da cabodifusão no Brasil; - Lei 9.472, de 1997, Lei Geral das Telecomunicações; - Lei 9.612, de 1998, que regula a radiodifusão de sons de caráter comunitário no Brasil; - Decreto 4.829, de 2003, que dispõe sobre o Comitê Gestor da Internet no Brasil. Os Projetos de Lei foram obtidos em: - Câmara dos Deputados – http://www.camara.gov.br - Senado Federal – http://www.senado.gov.br Outros documentos e instrumentos regulatórios foram obtidos em páginas de instituições do Estado na internet: - Agência Brasileira de Inteligência – http://www.abin.gov.br - Agência Nacional de Cinema – http://www.ancine.gov.br - Agência Nacional de Telecomunicações – http://www.anatel.gov.br - Comitê Executivo de Comércio Eletrônico – http://ce.mdic.gov.br - Comitê Gestor da Internet no Brasil – http://www.cg.org.br - Conselho de Comunicação Social – http://www.senado.gov.br/ccs - Conselho Nacional de Arquivos – http://www.arquivonacional.gov.br - Empresa Brasileira de Comunicação – http://www.radiobras.gov.br - Financiadora de Estudos e Projetos – http://www.finep.br - Fundação PROCON-SP – http://www.procon.sp.gov.br - Governo Eletrônico – Serviço de Atendimento ao Cidadão (Gesac) – http://www.gesac.gov.br - ICP Brasil – http://www.icpbrasil.gov.br - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – http://www.ibge.gov.br - Instituto Nacional da Propriedade Industrial – http://www.inpi.gov.br - Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) – http://www.iti.br - Interlegis – Comunidade Virtual do Poder Legislativo – http://www.interlegis.gov.br - Ministério da Ciência e Tecnologia – http://www.mct.gov.br - Ministério da Cultura – http://www.cultura.gov.br - Ministério da Justiça – http://www.mj.gov.br - Ministério das Comunicações – http://www.mc.gov.br - Ministério Público Federal – http://www.mpf.gov.br - Ministério Público Federal – Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) – http://www.pgr.mpf.gov.br/pfdc - Portal Software Livre – http://www.softwarelivre.gov.br - Presidência da República – http://www.presidencia.gov.br - Receita Federal – Ministério da Fazenda – http://www.receita.fazenda.gov.br - SERPRO – http://www.serpro.gov.br 129
  • 132. - Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi) http://www.tesouro.fazenda.gov.br/siafi/ - Tribunal de Contas da União – http://www.contaspublicas.gov.br Fontes internacionais consultadas: - Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (CMSI) – http://www.cmsi.org.br - Organização das Nações Unidas – www.un.org - Organização Mundial do Comércio – http://www.wto.org - Organização Mundial de Propriedade Intelectual - www.wipo.org - UNESCO - Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento da Ciência, da Educação e da Cultura – www.unesco.org Entidades empresariais e da sociedade civil PIL AR A PILAR - ABONG - Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais – http://www.abong.org.br - Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI) - http://www.andi.org.br - Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão - http://www.abert.org.br - Associação Brasileira de Emissoras Públicas, Educativas e Culturais (Abepec) - http://www.abepec.com.br - Associação Brasileira de Imprensa - http://www.abi.org.br - Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo – http://www.abraji.org.br - Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço) - http://www.abraconet.org.br - Associação Brasileira de Televisão Universitária (ABTU) - http://www.abtu.org.br - Associação Brasileira de TVs Comunitárias (Abccom) - http://www.abccom.com.br - Associação Nacional de Editores de Revistas - http://www.aner.org.br - Associação Nacional de Jornais - http://www.anj.org.br - Campanha Quem Financia a Baixaria é Contra a Cidadania - http://www.eticanatv.org.br - Centro de Mídia Independente (CMI) - http://www.midiaindependente.org - Congresso Brasileiro de Cinema (CBC) - http://www.congressocinema.com.br - Conselho Nacional de Auto-Regulamentação Publicitária (Conar) - http://www.conar.org.br - DireitoNet - http://www.direitonet.com.br - Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação Social (Enecos) - http://www.enecos.org.br - Federação Interestadual dos Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel) - http://www.fittel.org.br - Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) - http://www.fenaj.org.br - Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC) – http://www.fndc.org.br - Freedom House - http://www.freedomhouse.org - Globopar, Holding do Grupo Globo de Comunicação – http://globopar.globo.com - Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) - http://www.inesc.org.br/pt/index.php - Informativo Eletrônico SETE PONTOS - http://www.comunicacao.pro.br/setepontos - Instituto Ethos http://www.ethos.org.br - Instituto Gutenberg http://www.igutenberg.org - Instituto da Sociedade Civil para o Controle da Administração Pública (Fisccal) - http://www.fisccal.org.br - Jurista online http://www.juristaonline.com.br - Jus Navigandi http://www.jus.com.br - Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH) http://www.mndh.org.br - Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) – http://www.mst.org.br - Movimentos de Rádios Livres - http://www.radiolivre.org 130
  • 133. - Observatório da Imprensa - http://www.observatoriodaimprensa.com.br - Ordem dos Advogados do Brasil - http://www.oab.org.br - Parem as máquinas - http://www.paremasmaquinas.com.br - Rede Brasileira de Comunicação Cidadã (RBC) – http://www.rbc.org.br - Rede de informações para o Terceiro Setor (Rits) – http://www.rits.org.br - Rede Direitos Humanos e Cultura http://www.dhnet.org.br - Rede em Defesa da Liberdade de Imprensa - http://www.liberdadedeimprensa.org.br/ - Revista Iberoamericana de Arbitraje y Mediación - http://www.servilex.com.pe/arbitraje - SOS Imprensa - http://www.unb.br/fac/sos - TV Cultura de São Paulo – http://www.tvcultura.gov.br - TV Educativa do Rio Grande do Sul – http://www.tve.com.br PIL AR B PILAR - Associação Brasileira de Autores, Compositores, Intérpretes e Músicos – http://www.abrac.org.br - Associação Brasileira de Direitos Reprográficos – http://www.abdr.org.br - Associação Brasileira de Empresas de Software – http://www.abes.org.br - Associação Brasileira de Escritores – http://www.abe.org.br - Associação Brasileira de Música – http://www.abramus.org.br - Associação Brasileira dos Autores de Livros Educativos – http://www.abrale.org.br - Associação Brasileira dos Direitos de Autores Visuais – http://www.autvis.org.br - Associação Brasileira dos Produtores de Discos – http://www.abpd.org.br - Associação de Compositores e Intérpretes Musicais do Brasil – http://www.acimbra.org.br - Associação de Defesa da Propriedade Intelectual – http://www.adepi.org.br - Associação de Músicos, Arranjadores e Regentes – http://www.amar.org.br - Associação Defensora de Direitos Autorais Fonomecânicos - http://www.addaf.org.br - Associação dos Titulares de Direitos Autorais – http://www.atida.org.br - Associação Nacional de Autores, Compositores, Intérpretes e Músicos – http://www.anacim.org.br - Creative Commons – http://www.creativecommons.org - Escritório Central de Arrecadação e Distribuição – http://www.ecad.org.br - Faculdade Getúlio Vargas – http://www.diretorio.fgv.br/cts - Instituto de Direito do Comércio Internacional e Desenvolvimento – http://www.idcid.org.br - Instituto Indígena Brasileiro para Propriedade Intelectual – http://www.inbrap.org.br - IP Justice – http://www.ipjustice.org.br - Projeto Inter-meios – http://www.projetointermeios.com.br - Projeto Software Livre Brasil – http://www.softwarelivre.org.br - Rede Brasileira pela Integração dos Povos – http://www.rebrip.org.br - Sociedade Administradora de Direitos de Execução Musical do Brasil - www.sadembra.org.br - Sociedade Brasileira de Administração e Proteção de Direitos Intelectuais – http://www.socimpro.org.br - Sociedade Brasileira de Autores, Compositores e Escritores de Música – http://www.sbacem.org.br - Sociedade Independente de Compositores e Autores Musicais – http://www.sicam.org.br - The Free Software Foundation - http://www.fsf.org - União Brasileira de Compositores – www.ubc.org.br PIL AR PILAR C - Grupo Brasil AntiSPAM - http://www.brasilantispam.org/ - Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) – http://www.idec.org.br - Instituto de Estudos e Projetos em Comunicação e Cultura (Indecs) – http://www.indecs.org.br - Movimento Brasileiro de Combate ao SPAM - http://www.antispam.org.br - Privacy International – http://www.privacyinternational.org 131
  • 134. - The Coalition Against Unsolicited Commercial Email - http://www.cauce.org - The European Coalition Against Unsolicited Commercial Email -http://www.euro.cauce.org/ PIL AR D PILAR - Cemina – http://www.cemina.org.br - Centro Indigenista Missionário (Cimi) – http://www.cimi.org.br - Comitê pela Democratização da Informática (CDI) – http://www.cdi.org.br - Federação Interestadual de Trabalhadores em Telecomunicações (Fittel) – http:/// www.fittel.org.br - Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase) – http://www.ibase.org.br - IBOPE Net Ratings – http://www.ibope.com.br - Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) – http://www.idec.org.br - Instituto Florestan Fernandes – http://www.iff.org.br - Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits) – http://www.rits.org.br - Rede Saci – http://www.redesaci.org.br - Sampa.org – http://www.sampa.org.br Documentos, livros, notícias e artigos FONTES GERAIS DE NOTÍCIAS Agência Carta Maior - http://www.agenciacartamaior.com.br/ Globo On line – http://www.globoonline.com.br Jornal Brasil de Fato http://www.brasildefato.com.br/ Portal dos Jornalistas http://www.jornalistas.com/ Portal Terra – http://www.terra.com.br Primeira Leitura – http://www.primeiraleitura.com.br/ Folha online – http://www.folha.uol.com.br/ IDG Now – http://www.idgnow.com.br Tela Viva/Pay TV – http://www.paytv.com.br PIL AR A PILAR - Relatório Anual sobre Liberdade de Imprensa no Brasil, organizado pela ANJ - período de agosto de 2002 a agosto de 2003 - Relatório Repórteres Sem Fronteiras sobre liberdade de imprensa – ano 2004 - Third Annual Worldwide Press Freedom Index - Ranking 2004 de Liberdade de Imprensa publicado pela organização não governamental Freedom House - Relatório Caminhos da Transparência, realizado pela Organização Transparência Brasil - Relatório final do Seminário Internacional sobre Direito de Acesso a Informações Públicas - setembro de 2003 - “Conselho Federal de Jornalismo – Ética e Liberdade” – Publicado pela Fenaj em setembro de 2004 - POSSEBOM, Samuel Lamoglia. Globo e Abril diante de um novo paradigma comunicacional: a Internet. Dissertação para obtenção de título de mestrado no Programa de Pós-graduação da Universidade de Brasília, Brasília, 2002. - SALVATI, Ideli. A Tela é Nossa. Artigo publicado no jornal O Globo em 30 de agosto de 2004. Disponível em www.cultura.gov.br/projetoancinav/materia/materia.php?codigo=34. - Palestra do Ouvidor da Anatel no Conselho de Comunicação Social. Disponível em www.senado.gov.br/web/comissoes/ccs/palestra.asp - Teses à IX Plenária do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação sobre o processo de instalação do Conselho de Comunicação Social. Disponível em http:// www.fndc.org.br/IX_plenaria/data/Lista_de_Teses.html. - Conferência Municipal de Comunicação de Porto Alegre. Disponível em www.portoalegre.rs.gov.br/conf_comunicacao/ 132
  • 135. default.asp?proj=460&secao=1327&m1=11519. PIL AR B PILAR - BASSO, Maristela. O Direito Internacional da Propriedade Intelectual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2000. - BITTAR, Carlos Alberto. Os Direitos da Personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1989. - CARBONI, Guilherme C. Direito de autor na multimídia. São Paulo , Quartier Latin, 2003. - CHAVES, Antonio. Nova Lei Brasileira de Direito de Autor: estudo comparativo com o projeto que lhe deu origem. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1975. - CHAVES, Antonio. Obra criada no âmbito de um contrato de trabalho - obra sob encomenda. in Revista dos Tribunais 491/11 - DANTAS, Marcos. A Lógica do Capital Informação. Rio de Janeiro. 2002 - GINDRE, Gustavo. Comunicação nas Sociedades em Crise. Rio e Janeiro. 2002 - MANSO, Eduardo Vieira. Direito Autoral. São Paulo: José Bushasky, 1980 - NETTO, José Carlos Costa. Direito Autoral no Brasil. São Paulo: FTD, 1998. - SOARES, Guido F.S. O tratamento da propriedade intelectual no sistema da organização mundial do comércio: uma descrição geral do acordo "TRIPS". in Revista de Direito Civil 74/ 98, Revista dos Tribunais. - SOUZA, Carlos Fernando Mathias de. Direito Autoral. Brasília:Brasília Jurídica,1998. PIL AR PILAR C - Brasil é o quarto no ranking mundial do spam, IDG Now!, 1/7/2004 - Cartilha Anti-SPAM (http://www.brasilantispam.org/main/cartilha.htm) - Censura na Internet. Mário Antônio Lobato de Paiva. (http://www.mundojuridico.adv.br). 01/ 7/2004 - Certificação Digital: Entenda e use. ICP-Brasil. - Código de Ética AntiSPAM e Melhores Práticas de Uso de Mensagens Eletrônicas. Grupo Brasil Anti-SPAM. (http://www.brasilantispam.org/main/codigo.htm) - Comissão de Justiça aprova "Lei da Mordaça". Jornal do Senado, 5/12/2002 - Em manchete, ‘Lei da Mordaça’ acende nova polêmica no Senado, Agência Carta Maior, 6/12/ 2002 - Leis anti-SPAM ainda não surtiram efeito. IDG Now!, 21/5/2004 - NIC BR Security Office. Cartilha de Segurança para Internet (http://www.nbso.nic.br/docs/ cartilha) - O que diz a lei brasileira sobre o spam. Giordani Rodrigues. Portal Terra (www.terra.com.br) 4/7/2004 - Projetos de lei em andamento no Congresso Nacional, FERREIRA, Ana Amelia Menna Barreto de Castro, Site http://www.camara-e.net/ - Sociedade civil definirá gestão e políticas para Internet no Brasil, Bia Barbosa, Agência Carta Maior, 13/04/2004 - Tecnologia, democracia e liberdade em reciprocidade, Marcelo Thompson Mello Guimarães (procurador-chefe do ITI) PIL AR D PILAR - Plano Plurianual 2003-2007, Governo Federal - Boletim Em Questão, Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica do Governo Federal - Pesquisa Nacional por Amostra Domiciliar (PNAD) 2003 – IBGE - Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2002-2003 - IBGE 133
  • 136. Entrevistas e colaboração PIL AR PILAR A - Venício Artur de Lima - Professor aposentado da Universidade de Brasília - Murilo César Ramos - Professor da Universidade de Brasília - Edson Duarte – Deputado Federal - PV-BA - ONG Transparência Brasil PIL AR PILAR B - Alessandra Nilo - Gestos - Guilherme Alberto de Almeida - IDCID - Gustavo Gindre - Indecs - Pablo de Camargo Cerdeira - IDCID - Pedro de Paranaguá Moniz - CTS/FGV-RJ PIL AR C PILAR - Pablo de Camargo Cerdeira – IDCID - Marcelo Thompson – ITI PIL AR PILAR D - Sérgio Amadeu – presidente do ITI - Gustavo Gindre – INDECS - Paulo Lima – Rits - José Zunga – Fittel 134
  • 137. Projeto de Governança Global REALIZAÇÃO Campanha CRIS – Communication Rights in the Information Society COORDENAÇÃO INTERNACIONAL Sean O’Siochrú O direito à comunicação no Brasil REALIZAÇÃO Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social PESQUISADORES REVISÃO TÉCNICA Pilar A Gustavo Gindre Adriano de Ângelis Jonas Valente REVISÃO Rogério Tomaz Bia Barbosa Pilar B Oona Castro Diogo Moysés Pilar C DIAGRAMAÇÃO Marcio Kameoka Marcio Kameoka Pilar D Aloísio Milani APA C APA Rodrigo Savazoni Rodrigo Murtinho Ilustração: Vicente Mendonça COORDENAÇÃO DA PESQUISA João Brant Marcio Kameoka PAR TICIPANTES DO PROCES SO DE PARTICIP TICIPANTES PROCESSO ALIDAÇÃO V ALID AÇÃO Adaucto Rodrigues – Federação das Rádios Elisa Monteiro – Executiva Nacional dos Estu- Comunitárias do RJ (Farc) dantes de Comunicação Social (Enecos) Adilson Cabral – Sete Pontos Eula Tavares Cabral – Sete Pontos Adriano de Angelis – Intervozes Fausto Oliveira – Fase Alessandra Nilo – Gestos PE/Abong-NE1/Fopecom Graciela Selaimen – Rits Aline Lucena – Sinos/Fopecom Ivan Moraes Filho – CCLF/MNDH-PE/Fopecom Ana Lúcia de Castro – Imagens e Vozes da James Görgen – Epcom Esperança (IVE) João Brant – Intervozes Ana Toni – Fundação Ford Jonas Valente – Intervozes Bia Barbosa – Intervozes José Arnaldo de Oliveira – Rede GTA (Grupo de Carlos Moreira – Engenharia Social (3 setor) Trabalho Amazônico) Corinto Meffe – Ministério do Planejamento Julia Hoffmann – Universidade de Amsterdam Cunca Bocayuva – Fase Luciana Peregrino – Grupo Origem/Abong NE1/ Diogo Moysés – Intervozes Fopecom Douglas Soares Vieira – Criar Brasil Lucio Pereira Mello – Intervozes Edgar Rebouças – Núcleo de Políticas e Estraté- Magaly Pazello – DAWN/Socid gias da Intercom Marcia Correa e Castro – Bem TV 135
  • 138. Marcia Evangelista de Souza – Folha de Xerém/ Paulo Lima – Rits Associação dos Moradores de Xerém Priscila D. Carvalho – Cimi Marcio Alexandre – Rits Regina dos Santos – Dombali e Fonacor Marcus Aurelio – Unirr Rodrigo Murtinho – Comunicação UFF Marcus Azaziel – consultor Rodrigo Savazoni – Intervozes Maria das Graças de O. Nascimento – MIR/ISER/ Rosário de Pompéia – CCLF/Abong-NE1/Fopecom IVE Taís Ladeira – Amarc Mauro Vianna – Jornal Inverta Tiago Quiroga - UFRJ Michelle Prazeres – Ação Educativa – Observató- Tori Holmes – Open Knowledge Network rio da Educação Venicio A. De Lima – UnB Neuza Regina Carneiro – Imac Viviane Brochardt – Articulação do Semi-árido Nilza Iraci – Geledés Brasileiro (ASA) Orlando Tavares - PPGCOM-UFF Wallace Hermann – Ponto Com Saúde Pablo Camargo Cerdeira – IDCID William Dias Braga – ECO/UFRJ e ULEPICC Brasil realização VALID ALIDAÇÃO: Agradecimentos pelo apoio para a r ealização da OFICINA DE VALID AÇÃO: Rede de Informações para o Terceiro Setor (Rits) Associação Brasileira de Imprensa (ABI) Fundação Ford Copyleft. Permitida a reprodução sem fins comerciais, desde que citada a fonte. Brasil. Junho de 2005 Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social 136