Mesas tem�ticas coordenadas

CONTROLE DO CAPITAL SOBRE O TRABALHO E O TELETRABALHO COMO NOVA FORMA DE CONTROLE

Gabriele Faria
Prefeitura de Arma��o dos B�zios, Brasil
Sandra Gon�alves
Instituto Federal de Goi�s - IFG, Brasil
Laryssa Gabriella G. dos Santos
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Brasil
F�bio dos S. Barbosa
Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, Brasil

CONTROLE DO CAPITAL SOBRE O TRABALHO E O TELETRABALHO COMO NOVA FORMA DE CONTROLE

Revista de Pol�ticas P�blicas, vol. 26, Esp., pp. 263-278, 2022

Universidade Federal do Maranh�o

Recepci�n: 14 Febrero 2022

Aprobaci�n: 01 Julio 2022

Resumo: O presente artigo analisa o controle do trabalho como uma dimens�o inerente ao modo de produ��o capitalista e que se transforma nas diferentes fases do sistema burgu�s. Assim, o estudo problematiza o gerenciamento e o controle do trabalho na sociabilidade do capital, considerando as m�ltiplas determina��es no contexto de transforma��es societ�rias, que integram uma nova din�mica tecnol�gica-organizacional e do Teletrabalho como uma forma de controle. Entre as mudan�as decorrentes da reconfigura��o no mundo do trabalho, o teletrabalho � abordado como modalidade implementada em per�odos hist�ricos e determinados de crise, sobretudo, a partir de 1970. Para desvendar as contradi��es do tema proposto, as reflex�es s�o fundamentadas no materialismo-hist�rico, com autores da tradi��o marxista que dialogam com o assunto, por meio de pesquisa bibliogr�fica.

Palavras-chave: Tecnologias, controle do trabalho, teletrabalho.

Abstract: This article analyzes the control of work as an inherent dimension of the capitalist mode of production and that is transformed in the different phases of the bourgeois system. Thus, the study problematizes the management and control of work in the sociability of capital, considering the multiple determinations in the context of societal transformations, which integrate a new technological-organizational dynamics and Telework as a form of control. Among the changes resulting from the reconfiguration in the world of work, telework is approached as a modality implemented in historical and certain periods of crisis, especially after 1970. To unravel the contradictions of the proposed theme, the reflections are based on historical-materialism, with authors of the Marxist tradition who dialogue with the subject, through bibliographic research.

Keywords: Technologies, work control, telework.

1 INTRODU��O

O controle do capital sobre o trabalho � dimens�o fundamental para o desenvolvimento das rela��es capitalistas de produ��o e reprodu��o, cuja finalidade � intensificar a explora��o da for�a de trabalho dos trabalhadores com vistas � crescente extra��o de mais-valor Tal controle se transforma e ganha novos contornos a cada nova fase de desenvolvimento e amadurecimento do modo de produ��o capitalista. Assim, o presente artigo constitui-se do esfor�o investigativo deste/as pesquisador/as[1] em refletir sobre as transforma��es no mundo no trabalho, tendo como objetivo apreender as novas formas de gerenciamento e o controle do processo de trabalho na sociabilidade do capital, seus nexos contempor�neos, considerando as m�ltiplas determina��es no contexto de mudan�as societ�rias, tecnol�gica-organizacional e as repercuss�es dessas no tempo de trabalho e de n�o-trabalho. Ao discutirmos sobre quest�es relativas ao controle do trabalho na contemporaneidade consideram-se algumas media��es, como as mudan�as na base t�cnica da produ��o e a expans�o das Tecnologias da Informa��o e Comunica��o (TIC), as quais acarretaram novas formas de organiza��o do trabalho. Entre as novas formas de controle do trabalho na atualidade, o Teletrabalho se destaca tamb�m pelo car�ter econ�mico rebaixador do custo da for�a de trabalho e recente expans�o em escala global, decorrente da crise pand�mica da Covid-19[2].

Se no n�vel da apar�ncia, as vers�es hist�ricas e embrion�rias do teletrabalho se mostram como alternativa �s quest�es de cada �poca, em ess�ncia, se revela e se desenvolve carregado de contradi��es. Se engendra no modo de produ��o capitalista assumindo, por consequ�ncia, caracter�sticas determinadas. Foi inserida no processo de reestrutura��o produtiva do capital, subjacente � crise estrutural que se arrasta dos anos 1970 at� o tempo presente, pelas possibilidades de flexibilizar a realiza��o do trabalho e dinamizar tanto a produ��o quanto os custos desta. Como modalidade resultante do desenvolvimento das for�as produtivas no capitalismo, o teletrabalho est� direcionado para aumentar a produtividade a todo custo, entre outras fun��es. Ultrapassar a apar�ncia deste fen�meno e alcan�ar a sua ess�ncia sup�e compreender como a modalidade se engendra e � envolvida entre as alternativas de recupera��o da crise capitalista. Desse modo, a perspectiva te�rico-metodol�gica fundamentou-se na teoria social cr�tica de Marx, bem como em autores da tradi��o marxista que dialogam com o tema proposto, por meio de pesquisa bibliogr�fica.

2 O CONTROLE DO CAPITAL SOBRE O TRABALHO NO CAPITALISMO

O controle do capital sobre o trabalho tem como alicerce a constitui��o do trabalho livre, condi��o essencial da rela��o de assalariamento quando o trabalhador passa a vender a sua for�a de trabalho em troca de um sal�rio. O trabalho assalariado �, pois, para a produ��o capitalista “uma forma socialmente necess�ria do trabalho, assim como o capital, valor elevado a uma pot�ncia, � uma forma necess�ria que deve adotar as condi��es objetivas do trabalho para que este �ltimo seja trabalho assalariado.” (MARX, 1969, p. 73). Assim, o controle ocorre atrav�s da subordina��o formal[3] e real[4] do trabalho ao capital, o qual, em conformidade com a din�mica hist�rica, vem mudando para garantir a extra��o do excedente.

Com isso, est� posta a possibilidade de o capital controlar o trabalho, sendo a coopera��o simples a sua fase inicial, quando os trabalhadores s�o reunidos em um mesmo lugar, sob controle e supervis�o, constituindo a for�a de trabalho coletiva, respons�vel por ampliar a produtividade. A capacidade de produzir coletivamente possibilitou ao capital adentrar em outro est�gio de produ��o, sedimentando o solo para a manufatura e a maquinaria. Na coopera��o, o capital insere em um mesmo ambiente in�meros trabalhadores assalariados, sob supervis�o dos capitalistas. J� na manufatura, cada trabalhador especializa-se na execu��o de um ou de um pequeno n�mero de opera��es, introduzindo na produ��o a divis�o do trabalho. No que se refere � base t�cnica, n�o h� modifica��es, pois, a opera��o continua manual e artesanal, ou seja, dependendo significativamente de for�a de trabalho quantitativa (ARANHA, 1999). Com a grande ind�stria, a m�quina passa a ditar o ritmo do trabalho, o trabalhador passa a ser um ap�ndice da m�quina, consolida-se a divis�o entre concep��o e execu��o. Nesse sentido, “o trabalhador torna-se um mero objeto de extra��o de mais trabalho atrav�s do uso intensivo de maquinaria e eleva��o da intensidade do trabalho pela redu��o da jornada de trabalho.” (CARNEIRO, 2005, p. 79).

O desenvolvimento da grande ind�stria propiciou ao capital alcan�ar outro patamar de produ��o e reprodu��o social, aumentando o controle sobre o trabalho por meio da disciplina, consenso, coer��o, atividade repetitiva, entre outros aspectos, que se consolidaram no taylorismo/fordismo. Raz�es pelas quais, para avan�ar nas reflex�es sobre as formas de gerenciamento e controle do tempo de trabalho e do n�o-trabalho faz-se necess�rio retomar, ainda que nos limites deste artigo, o estudo de Harry Braverman (2015). Para o autor o controle �, de fato, o conceito fundamental dos sistemas gerenciais. Aliado � ger�ncia cientifica[5], significou o empenho de aplicar m�todos da ci�ncia e princ�pios referentes a organiza��o do processo de trabalho, �s rela��es sociais de produ��o e a um sistema de remunera��o que associa rendimento � produ��o. Inicialmente aplicado � ind�stria, rapidamente se difundiu por praticamente as �reas de atividades. O taylorismo se universalizou, n�o se restringindo � produ��o industrial - abarca indistintamente o trabalho de escrit�rio, como as atividades administrativo, burocr�ticas, comercial, financeiras:

O taylorismo expandiu-se velozmente neste setor porque adapta-se �s grandes estruturas de comercializa��o e financiamento, pr�prias da �poca monopolista. A “ger�ncia cientifica” se apresenta como uma forma de organizar a massa de controladores e o ex�rcito de papel requeridos para a contabiliza��o do valor. Esta fun��o � vital em um per�odo de aumento do peso do cr�dito em rela��o � massa de bens produzidos (KATZ, 1995, p. 21).

O capitalismo busca incessantemente o aperfei�oamento tecnol�gico-organizacional e, para tanto, recorre �s teorias e �s pr�ticas de gest�o com o intuito de promover a reorganiza��o do trabalho. Essa necessidade requer a aplica��o da ci�ncia � produ��o. Por isso, para entender o surgimento e a utiliza��o dessas teorias e pr�ticas � preciso aprend�-las como integrantes de momentos do desenvolvimento capitalista no s�culo XX, e ainda, como respostas ao atendimento das necessidades da produ��o capitalista a cada ciclo hist�rico. Elas n�o s�o neutras, pois buscam atender �s determina��es do capitalismo na busca de solu��es, no �mbito da empresa, a cada desafio suscitado pelo conflito entre capital e trabalho. Portanto, as teorias e pr�ticas gerenciais s�o formuladas tendo como pressuposto as determina��es, que no desenvolvimento capitalista, lhe s�o institu�das e/ou impostas. Neste sentido, o taylorismo � uma refer�ncia b�sica por ter sido o expoente da teoria e das pr�ticas gerenciais que lan�ou as bases para o tratamento cient�fico do trabalho. Converteu-se na ess�ncia da ger�ncia moderna[6].

Ressalte-se que Taylor foi o propositor da racionalidade do trabalho assentada na Organiza��o Cient�fica do Trabalho (OCT) e estruturada no pensamento utilitarista, funcionalista e positivista, materializado em t�cnicas que se resumiam em: estudo de tempos e movimentos; prescri��o de tarefas; individualiza��o do trabalho; padroniza��o de tarefas; qualifica��o e pagamento individualizado; sistema de supervis�o; media��o do trabalho com utiliza��o de cron�metro[7] como parte de um sistema de controle propagado como racional, cient�fico e estrat�gico na busca de efici�ncia nas empresas. Naquele contexto, o processo de trabalho passa por profundas transforma��es que visou o aperfei�oamento t�cnico-cient�fico como uma estrat�gia de redu��o do tempo socialmente necess�rio com a redu��o do trabalho vivo sobre o trabalho morto. Assim, verifica-se que a categoria tempo torna-se fundamental para Taylor no enfrentamento do d�ficit de efici�ncia nas empresas capitalistas. Ele cria um sistema de controles onde a cronometragem do tempo e do ritmo s�o pedras angulares de seu sistema de racionaliza��o do trabalho.

Com isso ele consegue viabilizar, portanto, os objetivos a partir de duas determina��es necess�rias � produ��o capitalista: “a gera��o de valor excedente e a circula��o do valor, sob a forma de mercadorias a custos baixos e consequentemente a pre�os baixos” (GURGEL; JUSTEN, 2015, p. 205). Gaulejac (2007) apreende o gerenciamento da gest�o como tecnologias de poder. O gerenciamento[8] das contradi��es e antagonismo entre capital e trabalho “� a garantia da organiza��o concreta da produ��o, ou seja, da concilia��o dos diferentes elementos necess�rios para fazer a empresa viver” (GAULEJAC, 2007, p. 43). Dessa forma, no cotidiano da gest�o, o gerenciamento produz media��es entre esses diferentes elementos e com isso busca a integra��o entre l�gicas funcionais contradit�rias (GAULEJAC, 2007). Contudo, na sociabilidade burguesa a caracter�stica predominante da gest�o e do gerenciamento � de preocupar-se e, especialmente, de se apresentar a servi�o do poder financeiro e com isso,

[...] canalizar as necessidades dos clientes sobre os produtos da empresa e de transformar os trabalhadores em agentes sociais de desempenho. O trabalhador � considerado se for rent�vel. O cliente � o rei se for solv�vel. A gest�o comercial e a gest�o dos recursos humanos se desdobraram �s exig�ncias da gest�o financeira. A obsess�o de resultados se imp�es a servi�o do share holder volue – o valor para o acionista (GAULEJAC, 2007, p. 43).

Ainda sobre a gest�o e o gerenciamento, Gaulejac (2007) enfatiza que a gest�o vem invadindo n�o s� os espa�os organizacionais, como a esfera estatal, mas tamb�m espa�os da vida cotidiana e o pr�prio indiv�duo cada vez mais � solicitado a ser gestor de si. Depreende-se que nesses espa�os de estabelecimento de rela��es sociais v�o se constituindo rela��es de poder e mecanismos materiais e ideol�gicos que determinam estruturas de domina��o e controle. Na sociedade capitalista as horas laborais constituem ess�ncia do valor. O tempo � cada vez mais domado pelo complexo sistema de medidas, divis�es e rela��es que buscam incessantemente a defini��o e a organiza��o de normas, controles e m�todos, elementos essenciais de racionaliza��o da vida (DAL ROSSO, 2017). O controle no fordismo foi uma ferramenta fundamental para ampliar os processos de valoriza��o e explora��o do trabalho, mas tal cen�rio come�a a mudar no final dos anos 1960, quando o fordismo deu sinais de esgotamento, e o mundo capitalista entrou numa recess�o generalizada. A d�cada de 1970 foi marcada por uma crise estrutural, de dimens�o global, e n�o meramente conjuntural, resultante de um processo de crises que s�o inerentes ao sistema, assumindo formatos distintos em cada momento hist�rico.

2 NOVA FASE DE RECONFIGURA��O DO CAPITALISMO EM CRISE E O TELETRABALHO COMO EXPRESS�O DE NOVA FORMA DE CONTROLE DO TRABALHO

O capitalismo tem em sua ess�ncia uma historicidade de car�ter processual, cujo Modo de Produ��o hoje dominante em escala planet�ria, tem no lucro sua for�a motriz. Ou seja, na raz�o de ser de capitalistas e empresas capitalistas, o ponto de partida � o dinheiro e o ponto de chegada � mais dinheiro, sendo este o sentido espec�fico da sua a��o (BRAZ; NETTO, 2011). Nesse movimento, h� crises, que nada mais s�o do que a interrup��o do processo de movimento do capital (D – M – D�). As mercadorias n�o s�o consumidas na mesma propor��o, n�o se convertem em mais dinheiro. E a eclos�o deste processo n�o possui uma causa �nica.

Para Braz e Netto (2011, p.170-171) entre as m�ltiplas causas das crises capitalistas, as mais determinantes se expressam na anarquia da produ��o – que, sem obedecer um planejamento espec�fico, inunda o mercado de mercadorias imposs�veis de serem consumidas em sua totalidade; a queda do lucro – que contribui de modo intencional para as crises e sendo demandat�ria de respostas, em geral, variadas; e o subconsumo das massas – que limita o poder de compra dos trabalhadores, eclodindo num descompasso entre produ��o e consumo.

H� de se ponderar que cada contexto hist�rico cria a probabilidade de um novo ciclo com possibilidades de reinven��o e restaura��o do Modo de Produ��o Capitalista (MPC), afinal nem todos os capitalistas quebram. Entre eles, h� grupos que enxergam neste momento de crise a possibilidade de ascens�o, diferentemente do caso dos trabalhadores em que a pen�ria � maior.

O panorama de crise registrou uma recess�o generalizada, envolvendo todas as grandes pot�ncias capitalistas, a onda longa expansiva deu lugar a um processo de estagna��o. Como sa�da para a crise se configura um conjunto de mudan�as que envolvem: financeiriza��o da economia, projeto neoliberal, reestrutura��o produtiva, acumula��o flex�vel, nova divis�o internacional do trabalho, altera��es nos processos, rela��es e formas de gest�o do trabalho e introdu��o de inova��es tecnol�gicas (ARANHA, 1999). Sob o novo padr�o denominado reestrutura��o produtiva p�s-fordista a organiza��o do trabalho sofrer� mudan�as em seus fundamentos, sobretudo com a utiliza��o das tecnologias de informa��o e comunica��o e a financeiriza��o do capital.

A racionalidade algor�tmica conjugada com a racionalidade neoliberal tem agudizado sobremaneira o controle, a vigil�ncia e, sobretudo, o gerenciamento de uma s�rie de aspectos da vida sob “a promessa de ampliar a velocidade, de precis�o e/ou efic�cia e de ampla objetividade e neutralidade tanto nos mecanismos de entendimento/conhecimento quanto nos processos de tomada de decis�o” (BRUNO, 2021, p. 156). Diferentes modos de mobiliza��o industrial e de reorganiza��o do trabalho; flexibiliza��o nas rela��es trabalhistas, fragmenta��o do tempo do trabalhador; novo reordenamento do tempo e do espa�o; de r�gido e fixo para flex�vel, instituindo-se processos de trabalho conforme a din�mica da rela��o capital e trabalho. Na base dessa transforma��o em que o trabalho transitou do padr�o keynesiano/fordista para o padr�o flex�vel, prevalece uma estrutura organizacional do trabalho com o intuito de ampliar a base de acumula��o de riqueza.

Nesse contexto as mudan�as se evidenciam na intensa agilidade do ritmo da produ��o, n�o h� longo prazo para a produ��o e circula��o do capital, n�o h� a rotina, tudo se transforma, rapidamente. O mercado tem fome de mudan�a e desejo r�pido de retorno financeiro. Na acumula��o flex�vel, depara-se com o “capital impaciente”, de curto prazo (SENNETT, 2001). Assim, o que se tem de “novo � o amplo abandono da pretens�o de que o tempo possa estar acoplado a quaisquer tarefas de longo prazo” (CRARY, 2014, p. 6) como em outras formas de produ��o capitalista precedentes na hist�ria, j� exposta anteriormente.

Al�m disso, a reestrutura��o produtiva modificou as rela��es de poder ao criar novas formas de controle, como, por exemplo, teletrabalho, altera-se do controle, antes face-a-face, na atualidade, por meios tecnol�gicos. Com o uso do computador e outros dispositivos tecnol�gicos – tanto hardware como softwares altamente sofisticados – ao us�-los como forma de gerenciamento acirra-se o controle e a vigil�ncia sobre o tempo de trabalho e de n�o trabalho. Tem-se que o teletrabalho possibilitou ao trabalhador de alguma forma o controle do local do trabalho, mas n�o o controle do processo de trabalho, que � uma determina��o fundante da sociabilidade burguesa.

Os resultados de pesquisas sugerem que a supervis�o se tornou intensa para os ausentes do local tanto quanto para os presentes. A reflex�o de Sennett (2001, p. 68) � exemplar sobre essas mudan�as quando adverte, “o controle passou do rel�gio de ponto para a tela do computador”. E, ao analisar as reflex�es do autor, apreende-se um paradoxo ao relacionar as formas atuais com as precedentes, verifica-se que as modalidades de trabalho fisicamente descentralizado, por exemplo, o teletrabalho, tem, cada vez mais, sofrido press�es intensas do poder institucional que utiliza plataformas digitais e tecnologias de informa��o para aprimoramento do gerenciamento[9] digital do trabalho (SENNETT, 2001).O gerenciamento n�o se restringe ao tempo de trabalho, ele ultrapassa barreiras materiais e imateriais alcan�ando a totalidade da vida social. Quanto mais o avan�o tecnol�gico-organizacional se concretiza, mais constata-se nesses avan�os determina��es do modo de produ��o capitalista: a subsun��o real dos trabalhadores aos imperativos do capital. Como parte desta din�mica, � composi��o org�nica do capital implicar� adequa��es de car�ter cientifico-tecnol�gico com vistas � redu��o do trabalho necess�rio e amplia��o do trabalho excedente, dentre as artimanhas imprescind�veis � expans�o dos lucros.

Para Mandel (1982, p.135), o investimento em ci�ncia destinada ao progresso tecnol�gico envolveu a cria��o de m�quinas a vapor e, posteriormente, a ind�stria automotiva, substituindo o trabalho manual por m�quinas. Ou seja, produzindo superlucros alavancados pela explora��o do trabalho em face dos avan�os t�cnicos. Estes foram acompanhados do deslocamento de processos produtivos, constitui��o de novos bens e produtos para a gera��o e acumula��o de riquezas. Trata-se de novas tecnologias que tiveram seu desenvolvimento direcionado para promover a redu��o dos custos salariais, aumentar o desemprego e as desigualdades, resultando no fortalecimento do dom�nio do capital sob o trabalho. Para o autor, o progresso tecnol�gico subordina-se ao imperativo de mudan�a na opera��o do modo de produ��o e valoriza��o do capital, bem como � necessidade de encontrar sa�das �s graves contradi��es produzidas pelo sistema, constru�das sem o aval das massas e sob destrui��o de povos.

Enquanto movimento pr�prio da expans�o capitalista que, recorrentemente, emprega contratend�ncias �s suas crises e contradi��es, as inova��es tecnol�gicas, organizacionais, sociopol�ticas, culturais s�o desenvolvidas preconizando o controle e a redu��o de custos para deter o decl�nio e/ou reverter a queda da lucratividade. Por�m, segundo Mandel (1982), s�o mecanismos que atuam como alternativas a uma din�mica que pode ser freada, mas n�o evitada, j� que � a busca incessante pelo lucro que provoca a tend�ncia inerente � sua queda.

Em fun��o deste cen�rio contradit�rio e c�clico, o capital concentra-se sob a batuta daqueles que possuem grandes massas de capital, a fim de produzir mais-valor. Com isso, a tend�ncia de fus�o de v�rios capitais imponentes ao operar concentra��o e centraliza��o cria monop�lios que controlam a economia estabelecendo a domina��o constru�da por pa�ses colonialistas, cujo discurso � de uma “vida melhor”. Assim, por meio de tais inova��es al�m do aval � centraliza��o de capital, segundo Harvey (2018) se coloca a possibilidade de disciplinar e desempoderar os trabalhadores, bem como garantir maior rotatividade ao capital.

Essa din�mica se assevera no s�culo XXI sob novas condi��es, donde processos e fen�menos antes inexistentes dinamizam condi��es renovadas que aprofundam e diversificam as rela��es de compra e venda da for�a de trabalho. S�o condi��es facilitadas por infraestruturas tecnol�gicas que permitem novas formas de explora��o do trabalho como, por exemplo, atrav�s de aparelhos que mediam as atividades laborativas ou por meio de sistemas informacionais e aplicativos de Smartphones, Intelig�ncia artificial. Nessas novas modalidades, a a��o do trabalhador nem sempre se d� de modo especializada porque � conectada pelas TIC e t�m avan�ado, sobretudo, em territ�rios onde as pol�ticas de desregulamenta��o do trabalho tomam corpo. A substitui��o de parte do trabalho vivo no chamado universo maqu�nico-digital-informacional (ANTUNES, 2018) ocorre tamb�m pelos sistemas de informa��o que incorporam tarefas antes realizadas pela atividade humana (SANTOS, 2018).

Junto a esse novo patamar de desenvolvimento tecnol�gico erige-se, segundo Antunes (2020), uma nova Era de precariza��es com extens�o da jornada, redu��o de sal�rios, cerceamento das liberdades, mecanismos diversificados de controles individuais sobre o tempo e a produ��o do trabalhador, inclusive, no p�s-expediente de trabalho. Sem eliminar qualquer contradi��o do MPC, as conduz ao n�vel m�ximo. Exige a conforma��o de um Estado part�cipe dos processos de desregulamenta��o das legisla��es protetivas do trabalho, com uma racionalidade estrat�gica que o sujeita a um controle subordinado ao capital e que, parceiro da financeiriza��o econ�mica predadora de conquistas hist�ricas, evidencia a incompatibilidade entre capitalismo e democracia na era neoliberal[10].

Este est�gio donde o capital financeiro ganha centralidade via a��o concentradora da economia, chama a aten��o pela sofistica��o da aliena��o, e pelo alto grau de desconforto no que tange � democracia que, se em algum momento foram f�rmulas de paz (STREECK, 2018) exigindo sacrif�cios dos lucros, na atualidade, se apresentam como um inc�modo � disciplina regressiva exigida.

Dito isto, no ambicionar de uma valoriza��o r�pida e sem limites, o capital fict�cio aparelhado por institui��es com grande expertise, dentre elas, os bancos, grandes corpora��es tecnol�gicas, despontam � expans�o do capital financeiro mundializado, donde a expropria��o do trabalho contribuir� de forma decisiva nesta nova etapa predat�ria e desumanizante para preserva��o e amplia��o do lucro.

Esta op��o pelo capital financeiro se assevera com a crise capitalista aberta nos Estados Unidos em 2008 irradiada em per�odos distintos para muitos pa�ses do globo, entre eles, o Brasil. Neste, a radicaliza��o e perversidade das contrarreformas estatais nos �ltimos anos concretizam de forma vil as desregulamenta��es dos direitos como nunca antes visto[11] e manifesta o atual momento de avan�o do neoliberalismo para o ultraliberalismo. Incute no bojo desse processo os recursos tecnol�gicos difundidos pela chamada Ind�stria 4.0 ou Quarta Revolu��o Industrial (ANTUNES, 2020, p.15) como essenciais � renova��o de mecanismos de expropria��o do trabalho via a integra��o entre processo produtivo e servi�os, demandando a��o ativa do Estado frente �s barreiras para o mercado.

Nessa busca por valoriza��o de enorme voracidade se p�e: a exig�ncia do trabalho polivalente; o aumento das jornadas e a intensifica��o do ritmo; a retirada ou relativiza��o dos direitos; o l�xico do empreendedor; a busca por mat�rias-primas mais baratas. Por isso, a descartabilidade, deslocaliza��o e barateamento da for�a de trabalho; a polariza��o do desemprego e o espraiar de vulnerabilidade lida como problemas individuais que se intensificam ao lado de um capitalismo de plataforma que convoca todos a estarem em rede. Sob esta condi��o, faz circular os signos que complexificam a explora��o do trabalho, hoje de similitude �s protoformas do capitalismo de horas extenuantes e com ilegalidades naturalizadas, patrocinadoras da domina��o com apoio do Estado. Uma inst�ncia que atua muito mais como comit� executivo da burguesia, como diria Marx, porque age direta e indiretamente como garantidor e planejador econ�mico e financeiro das economias monopolistas. Sem qualquer constrangimento, desconsiderar suas consequ�ncias nas rela��es sociais e pol�ticas, revelando o car�ter de classe destes mecanismos, tratados de modo fetichizado na modernidade. Por meio das novas tecnologias, sob a �gide do capital financeiro, estabelece e exerce novas formas de controle do trabalho, a exemplo do teletrabalho.

2.1 Teletrabalho como express�o de nova forma de controle

As necessidades colocadas pela crise estrutural e sist�mica do capitalismo na d�cada de 1970[12] requisitaram para manuten��o do seu funcionamento sociometab�lico[13] o desenvolvimento das for�as produtivas de forma permanente e acelerada. O modelo r�gido taylorista/fordista utilizado para promover a produ��o em massa para o consumo de massa, preponderante no per�odo p�s-Segunda Guerra Mundial, j� n�o se adequava �s demandas do mercado em crise. Este n�o conseguia mais absorver o n�vel da produ��o das d�cadas de ouro da acumula��o capitalista. Apesar de n�o ser extinto, o taylorismo/fordismo foi substitu�do em grande escala ou combinado ao modelo toyotista japon�s.

O novo modelo era considerado mais adapt�vel � produ��o flex�vel, combinando a demanda com o alto n�vel de controle, produtividade e parcializa��o do trabalho. Envolvia tamb�m a possibilidade de conex�o ininterrupta nos processos produtivos, resultante do desenvolvimento das infovias e recursos tecnol�gicos informacionais, como as TIC. Estas, ao romper continuamente as barreiras naturais, principalmente, de tempo e espa�o, s�o inseridas de modo diversificado nos processos de trabalho e na produ��o de novas mercadorias e novas necessidades de maneira constante.

A incorpora��o das TIC aos processos de trabalho foi importante para tornar a produ��o cont�nua, sem intervalos, altamente eficiente e mais suscet�vel a mudan�as. Permitiu maior centraliza��o do planejamento e da ger�ncia, sendo fundamental no controle do processo de descentraliza��o territorial da produ��o, monitoramento institucional de qualquer lugar do globo com sinal de sat�lite, telefone, internet ou fibra �ptica.

Nascia o trabalho de base microeletr�nica de novo tipo, intermediado por meios telem�ticos como o computador[14] – instrumento cl�ssico para sua realiza��o – e que abriga sistemas de controle informacionais flex�veis, embora, padronizados pelos algoritmos[15]. O investimento em tecnologias tornou aqueles instrumentos mais complexos ou determinadas atividades manuais e intelectuais mais simples, influenciando na altera��o das formas de explora��o do trabalho. Entre as mudan�as, dentro do novo regime de acumula��o flex�vel (tamb�m chamado de reestrutura��o produtiva), incluem-se:

[...] novos padr�es de turnos de trabalho; contratos com horas anuais; acordos sobre multitarefas; contratos tempor�rios ou com prazos fixados; trabalhos em meio per�odo; terceiriza��es (no setor p�blico isso foi encorajado por meio da privatiza��o e das Licita��es Competitivas Compuls�rias); aumento do uso de trabalhadores em meio per�odo; e uso de trabalhadores domiciliares. O teletrabalho foi entendido simplesmente como uma dessas op��es (HUWS, 2017, p.123).

O teletrabalho � gradativamente incorporado aos processos de trabalho no momento em que a mundializa��o do capital pretendia a retomada e expans�o dos investimentos em escala global independentemente dos limites territoriais inclu�dos novos padr�es de consumo da for�a de trabalho.

A modalidade passa a ter destaque importante diante da sua vis�vel expans�o a partir de 2020, com a experi�ncia da pandemia de Covid-19, vivenciada em larga escala nos dois hemisf�rios do globo. Sobre o teletrabalho, h� distintas formula��es e at� disputas te�ricas pela sua conceitua��o, sobretudo, diante das metamorfoses sofridas a cada realidade e experi�ncia hist�rica. Em geral, � caracterizado pelo trabalho mediado e intermediado por meios telem�ticos desenvolvidos e controlados a partir das TIC. Muitas vezes, mediado por sistemas informacionais que funcionam como mecanismo de controle para refor�ar e facilitar a centraliza��o do planejamento e da administra��o dos processos de trabalho concentrados na ger�ncia. Como a ger�ncia cient�fica continua tendo papel preponderante tamb�m nessa modalidade “[...] o controle [...] [continua sendo], o conceito fundamental de todos os sistemas gerenciais” (BRAVERMAN, 2015, p.68).

A modalidade aparece como mecanismo que corrobora com uma ambi�ncia mais estimulante � criatividade para qualifica��es que requisitam essa habilidade, principalmente, as novas profiss�es, resultantes das novas necessidades do mercado de trabalho – a exemplo daquelas vinculadas ao marketing, publicidade ou ligadas ao desenvolvimento das TIC. Parte-se do pressuposto de que � poss�vel desenvolver um trabalho mais inspirador pela probabilidade de ser realizado “onde quiser”, “como quiser” e sob condi��es supostamente autodeterminadas pelo/a trabalhador/a. No Brasil, vem reverberando positivamente entre os apologistas do empreendedorismo e algumas profiss�es liberais. No entanto, apresentam altera��es significativas e revelam tend�ncias socialmente regressivas do ponto de vista pol�tico, econ�mico, de classe e de g�nero que merecem aten��o.

As tend�ncias que desvelam o car�ter socialmente regressivo do teletrabalho s�o quase sempre convergentes com a apropria��o privada do produto social coletivo e com a conserva��o das rela��es sociais desiguais e opressoras no �mbito da produ��o e reprodu��o da vida material.

O impacto da inser��o tecnol�gica e do teletrabalho atua sobre as profiss�es feminilizadas consideradas aut�nomas, refor�a a divis�o sociossexual, de g�nero e as opress�es patriarcais, conforme aponta Huws (2017). Os estudos da autora destacam que o incremento do uso do computador incidiu no emprego das mulheres, a exemplo das secret�rias, e foi utilizado como meio de substitui��o do trabalho vivo, aumentando a press�o no ambiente laboral e intensificando o processo de fragmenta��o e rotiniza��o das atividades[16] (HUWS, 2017).

O endurecimento da agenda neoliberal, decorrente desta fase hist�rica do capitalismo, impulsionou tend�ncias antifeministas numa dire��o quase reacion�ria na qual a microeletr�nica, disseminada pela reestrutura��o produtiva, possibilitaria reunir novamente a fam�lia (supostamente atingida pela chamada sociedade industrial) “dentro de casa”.

Naquele per�odo, dado o alto desenvolvimento tecnol�gico e de centraliza��o da ger�ncia administrativa e financeira nos Estados Unidos, 60% do trabalho se realizou nos escrit�rios. Trabalho este que poderia ser levado para casa dos pr�prios trabalhadores e fortalecer os v�nculos familiares. Por tr�s do incentivo ao teletrabalho nesses moldes estava o fim do chamado WelfareState e a press�o para devolver �s fam�lias (particularmente, �s mulheres) as responsabilidades estatais e do cuidado com idosos e pessoas com defici�ncias (PCD).

A generaliza��o e agravamento da precariza��o das condi��es de trabalho presentes desde as protoformas do teletrabalho implicaram gradativamente no rebaixamento do custo da for�a de trabalho, dos custos da produ��o e dos direitos trabalhistas, bem como na invisibilidade do trabalho e dos/as trabalhadores/as em rela��o �s institui��es empregadoras.

Vale dizer que a pr�tica da modalidade se torna mais intensa a partir dos anos 1980, quando ganha significado instrumental dentro do processo de reorganiza��o do trabalho e da flexibiliza��o do regime de acumula��o e da produ��o de mercadorias. Afinal, as modalidades de trabalho flex�vel al�m de servir de mecanismo para enxugar recursos humanos nas empresas, torna-as mais adapt�veis ao mercado.

A mudan�a provocava uma nova divis�o internacional do trabalho e revelava, por exemplo, porque, no Brasil, as primeiras empresas privadas a implementar o teletrabalho s�o estrangeiras e privilegiavam os cargos de maior qualifica��o t�cnica (SOBRATT, 2013). N�o se tratava apenas de criar uma modalidade em que o trabalho pode ser mais c�modo e que poderia reaproximar os trabalhadores de suas fam�lias. Mas, sim, de simplificar os processos da atividade laborativa para reduzir o valor da for�a de trabalho, incluindo a transfer�ncia da produ��o para pa�ses onde h� maior massa de trabalhadores dispon�veis, e, consequentemente, onde os sal�rios s�o mais baixos. A dispers�o da produ��o em escala global reduzia a capacidade organizativa, incidia fortemente sobre o poder associativo e dos Sindicatos porque pulverizava a massa de trabalhadores contratados direta ou indiretamente.

Sabemos que o regime de acumula��o flex�vel (HARVEY, 2017) implicava na flexibiliza��o dos processos de trabalho e na diversifica��o dos modelos de contrata��o e subcontrata��o por pe�as, pessoa f�sica ou jur�dica. Ocorria tamb�m atrav�s da terceiriza��o (e quarteiriza��o) de trabalhadores regulares, irregulares, aut�nomos e/ou informais. Em decorr�ncia do crescimento da superpopula��o relativa, a l�gica da lei coercitiva da concorr�ncia (MARX, 2017) se impunha agora entre trabalhadores/as aut�nomos/as e informais na disputa pelo acesso ao trabalho. Estes dois segmentos ampliam-se tanto como resultado do desemprego estrutural, como pelas mudan�as nas legisla��es nacionais protetivas do trabalho – supostamente necess�rias para atrair investimento internacional e incluir os pa�ses em condi��es de concorr�ncia global.

O que poderia tornar o trabalho mais aut�nomo e menos alienado, � usado para torn�-lo mais intenso, controlado e menos regulado. Abre espa�o para o rompimento dos limites da jornada de trabalho no qual a experi�ncia brasileira de teletrabalho, a partir da contrarreforma trabalhista de 2017, tamb�m � exemplo. Nos termos da nova legisla��o, o contrato de trabalho � firmado de acordo com a produtividade e n�o com a carga hor�ria despendida na realiza��o da atividade laboral. Ao eliminar a jornada do processo de negocia��o e da rela��o de compra e venda da for�a de trabalho, tende a controlar e intensificar a produ��o pelo descontrole do tempo, al�ando a subsun��o formal e real do trabalho ao capital a n�veis mais profundos atrav�s do teletrabalho – pelo menos, na forma assumida pela modalidade no capitalismo.

3 CONSIDERA��ES FINAIS

Ap�s esses apontamentos, depreende-se que o controle do capital sobre o trabalho tem o objetivo de ampliar os processos de explora��o da classe trabalhadora. As mudan�as na base t�cnica da produ��o e a expans�o das Tecnologias da Informa��o e Comunica��o (TIC) acarretaram novas formas de organiza��o do trabalho que seriam imposs�veis sem a incorpora��o de uma racionalidade estreita � l�gica neoliberal e empresarial instaurada em contexto de crise capitalista profunda, cuja imprescindibilidade estatal � prec�pua.

A sociabilidade burguesa recorre �s teorias e pr�ticas gerenciais a fim de aperfei�oar e “modernizar” formas de controle do processo de trabalho em seus elementos constitutivos excluindo dos produtores a possibilidade de participa��o, tomada de decis�o na esfera da produ��o e reduzindo a capacidade de auto-organiza��o. Nesse bojo, conquistas hist�ricas resultantes de lutas seculares da classe trabalhadora encontram-se frontalmente amea�adas, como estabelecimento do limite da jornada de trabalho e o direito ao sal�rio m�nimo. Novas modalidades de explora��o, como o teletrabalho ou trabalho de plataforma, impelem ao conjunto dos/as trabalhadores/as rever as formas de organiza��o para resistir e lutar por novos avan�os coletivos, como o direito � desconex�o dos equipamentos de trabalho – uma realidade recentemente alcan�ada na Fran�a, It�lia e Argentina (CUT, 2021).

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Notas

[1] Este artigo � parte das discuss�es do doutorado em andamento dos/as pesquisadores/as do Programa de P�s-gradua��o em Servi�o Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro (PPGSS-UFRJ). Assim, o presente trabalho � resultante da combina��o dos artigos apresentados na mesa tem�tica “Tecnologias, Controle do Trabalho e Transforma��es Contempor�neas”, na Jornada Internacional de Pol�ticas P�blicas (JOINPP), 2021.
[2] “A COVID-19 � uma doen�a causada pelo coronav�rus SARS-CoV-2, que apresenta um quadro cl�nico que varia de infec��es assintom�ticas a quadros respirat�rios graves. De acordo com a Organiza��o Mundial de Sa�de (OMS), a maioria dos pacientes com COVID-19 (cerca de 80%) podem ser assintom�ticos e cerca de 20% dos casos podem requerer atendimento hospitalar por apresentarem dificuldade respirat�ria e desses casos aproximadamente 5% podem necessitar de suporte para o tratamento de insufici�ncia respirat�ria (suporte ventilat�rio).” (BRASIL, 2020, n.p.).
[3] Em Marx (1969, p.94): “Denomino subsun��o formal do trabalho no capital � forma que se funda na mais-valia absoluta, pois se diferencia formalmente dos modos de produ��o anteriores sobre cuja base surge (ou � introduzida) diretamente, seja porque o produtor (producer. Ing.) atua como empregador de si mesmo (self-employing. Ing), seja porque o produtor direto tem que fornecer sobretrabalho a outrem”. (grifos do autor).
[4] Em Marx (1969, p.104): “[...] a subsun��o real do trabalho no capital – o modo de produ��o capitalista propriamente dito - s� entra em cena quando se apoderaram da produ��o capitais de certa grandeza, seja porque o comerciante se transforma em capitalista industrial, seja porque, com base na subsun��o formal, se constitu�ram capitalistas industriais mais fortes. A subsun��o real do trabalho no capital desenvolve-se em todas as aquelas formas que produzem mais-valia relativa, ao contr�rio de absoluta”. (grifos do autor).
[5] Conforme Holzmann; Cattani (2011), a ger�ncia cientifica foi concebida por Frederick W. Taylor, engenheiro norte-americano, a partir do final do s�c. XIX. “Trata-se de uma proposta de racionaliza��o da produ��o que integra a Organiza��o Cient�fica do Trabalho (OCT) aprofundando a divis�o t�cnica do trabalho e a separa��o entre concep��o e execu��o e levando � obsolesc�ncia dos of�cios” (HOLZMANN; CATTANI, 2011, p. 383).
[6] “O surgimento de novas formas de gest�o da for�a de trabalho a partir da d�cada de 1970 n�o deve ser entendido como a supera��o da organiza��o cientifica do trabalho, cujos princ�pios continuam sendo aplicados, configurando um quadro de perman�ncias entremeadas �s inova��es nos mais diferentes ambientes laborais” (HOLZMANN; CATTANI, 2011, p. 384-385).
[7] � interessante a reflex�o de Wajcman (2021) sobre a rela��o que faz sobre tecnologia e tempo a partir de uma perspectiva sociomaterial.
[8] “O termo gerenciamento em franc�s - managemen - evoca a ideia de arranjar, instalar e providenciar. A provid�ncia consiste em organizar em vista de uma produ��o coletiva, de uma tarefa a cumprir, de uma obra a realizar. O arranjo ou ordena��o consiste em prestar aten��o ao conjunto daqueles que contribuem para essa miss�o, a fim de melhor mobiliz�-la em vista de um fim comum, para o proveito de todos (GAULEJAC, 2007, p. 51).
[9] O Software ActivTrak, InterGuard, Time Doctor, Teramind, VeriClock, entre outros, s�o algumas formas de gerenciamento. Dispon�vel em: https://software.com.br/p/activtrak?gclid=Cj0KCQjw3f6HBhDHARIsAD_i3D_d4yGrgHJDU8Zuz372px0zvNmED5icB6RS1GHqR8fmakmeG_7gcyQaApcVEALw_wcB>, Acesso em 27/07/2021.
[10] Partimos do suposto da ideia de Braga (1996) de que o Neoliberalismo corresponderia ao processo de passiviza��o do aparelho do Estado, de suas interven��es ao lado a reestrutura��o produtiva em nome de uma “hegemonia do mercado”, posta enquanto estrat�gia universalizante da classe burguesa, portanto, uma resposta do capitalismo em crise.
[11] Como express�o das desregulamenta��es podemos exemplificar com a nova lei da terceiriza��o (lei 13.429 de mar�o de 2017); a contrarreforma trabalhista (Lei 13.467, de 2017); a Emenda Constitucional, aprovada em 16 de dezembro de 2016, institui um novo regime fiscal para vigorar nos 20 anos seguintes; a contrarreforma previdenci�ria que alterou a forma de aposentadorias impondo s�rios limites a pol�tica de Previd�ncia Social.
[12] Caracterizada como uma crise universal e de alcance global (dado o est�gio de mundializa��o do capital) combinada � condi��o de crise permanente e rastejante (j� que vem se arrastando h� um longo per�odo com pequenos regurgitos de recupera��o), intensifica��o e expans�o das formas de extra��o de mais-valor por meio da inser��o de novas t�cnicas e maquin�rios, a destrui��o de legisla��es protetivas do trabalho e o aprofundamento da barb�rie social (MESZAROS, 2002).
[13] O sistema sociometab�lico do capital pode ser definido a partir de M�szaros (2011) como aquele cujo n�cleo central � constitu�do pela intr�nseca e inelimin�vel rela��o entre capital, trabalho assalariado e Estado.
[14] Na an�lise de Bittencourt (1996, p.18-19) “o computador moderno nasce das ideias sobre algoritmos [...] para uma nova m�quina de calcular que pela primeira vez inclui, al�m de c�lculos matem�ticos, o processo l�gico de informa��es”.
[15] Os algoritmos s�o combina��es num�ricas dispostas de forma l�gica, numa sequ�ncia detalhada passo a passo e destinada a resolver um problema na linguagem de programa��o do computador (FARRER et al, 2015; MEDINA; FERTIG, 2006).
[16] Nesse per�odo se verificou uma significativa sindicaliza��o das mulheres dada a necessidade de protegerem suas condi��es de trabalho, realizar acordos e negocia��o coletiva (HUWS, 2017).
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