Relatório - A6-0013/2008Relatório
A6-0013/2008

RELATÓRIO sobre o Tratado de Lisboa

29.1.2008 - (2007/2286(INI))

Comissão dos Assuntos Constitucionais
Relatores: Richard Corbett e Íñigo Méndez de Vigo

Processo : 2007/2286(INI)
Ciclo de vida em sessão
Ciclo relativo ao documento :  
A6-0013/2008

PROPOSTA DE RESOLUÇÃO DO PARLAMENTO EUROPEU

sobre o Tratado de Lisboa

(2007/2286 (INI))

O Parlamento Europeu,

–   Tendo em conta o Tratado de Lisboa que altera o Tratado da União Europeia e o Tratado que institui a Comunidade Europeia, assinado em 13 de Dezembro de 2007,

–   Tendo em conta o Tratado da União Europeia e o Tratado que institui a Comunidade Europeia com as alterações introduzidas pelo Acto Único Europeu e pelos Tratados de Maastricht, Amesterdão e Nice,

–   Tendo em conta a Carta dos Direitos Fundamentais, de 12 de Dezembro de 2007[1],

–   Tendo em conta a Declaração de Laeken, de 15 de Dezembro de 2001, sobre o Futuro da União[2],

–   Tendo em conta o Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa, assinado em Roma, em 29 de Outubro de 2004,

–   Tendo em conta a sua resolução, de 7 de Junho de 2007, sobre o roteiro para o processo constitucional da União Europeia[3], e a sua resolução, de 11 de Julho de 2007, sobre a convocação da Conferência Intergovernamental[4],

–   Tendo em conta o artigo 45º do seu Regimento,

–   Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Constitucionais e os pareceres da Comissão do Desenvolvimento Regional, da Comissão dos Assuntos Externos, da Comissão do Desenvolvimento, da Comissão do Comércio Internacional, da Comissão dos Orçamentos, da Comissão da Indústria, da Investigação e da Energia e da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos (A6‑0013/2008),

Considerando o seguinte:

A. Nos últimos 50 anos, o desenvolvimento da União Europeia foi fundamental para o estabelecimento de um espaço de paz e estabilidade num continente anteriormente devastado pela guerra, para a consolidação da democracia, da liberdade e dos direitos dos cidadãos, para o reforço da prosperidade, da solidariedade e do bem-estar, através da criação do maior mercado único do mundo com regras comuns aplicáveis às normas sociais, ambientais e de protecção do consumidor, e concorrência leal e com uma união económica e monetária, para permitir uma cooperação entre Estados­Membros com vista à resolução conjunta de questões que transcendem as fronteiras nacionais e para dotar a Europa de uma voz mais forte nos assuntos internacionais.

B.  Existe, reconhecidamente, a necessidade de reformar e reforçar as estruturas da União, a fim de consolidar estas conquistas e melhorar a eficácia do funcionamento de uma União de vinte e sete Estados-Membros, e eventualmente mais, de modo a poder dar resposta aos novos desafios comuns e a garantir uma responsabilização democrática acrescida.

C. Esta necessidade esteve na origem de sucessivas reformas que, desde o Tratado de Maastricht – que marcou uma viragem na integração Europeia, com a criação de uma União Económica e Monetária e a passagem de uma comunidade essencialmente económica para uma união política –, procuraram estabelecer a estrutura institucional da União e conduziram à Declaração de Laeken, o que abriu igualmente caminho a um processo de reformas diferente, baseado no método da Convenção e já não exclusivamente nas conferências intergovernamentais.

D. O Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa foi elaborado por uma Convenção, composta por dois representantes de cada parlamento nacional, dezasseis deputados ao Parlamento Europeu, dois representantes da Comissão Europeia e um representante de cada governo nacional, os quais prepararam um projecto em deliberação pública, produzindo um consenso que, no essencial, não foi alterado pela Conferência Intergovernamental de 2004, enquanto que o subsequente Tratado de Lisboa, que suprimiu alguns dos elementos da Constituição, resultou de métodos de trabalho intergovernamentais mais tradicionais, se bem que com a plena participação de três representantes do Parlamento Europeu.

E.  O anterior esforço de reforma da União através da substituição dos Tratados por uma Constituição foi aprovado por uma vasta maioria dos representantes eleitos dos cidadãos europeus no Parlamento Europeu[5] e ratificado por 2/3 dos Estados‑Membros, embora rejeitado por dois (França e Países Baixos), e, após um período de reflexão que deixou clara a impossibilidade de obter a necessária aprovação por parte da totalidade dos Estados-Membros, esta abordagem foi abandonada a favor da alteração dos Tratados anteriormente existentes.

F.  Esta mudança metodológica e processual, embora mantendo, sob uma nova forma, muitos dos ajustamentos práticos à estrutura institucional da União, implicou uma menor ambição e o abandono de vários elementos da Constituição, a prorrogação da entrada em vigor de alguns dos seus novos mecanismos e a incorporação nos Tratados de medidas particulares específicas a vários Estados-Membros.

G. No entanto, a aprovação do Tratado por parte de cada um dos governos nacionais da União demonstra que os todos os governos eleitos dos Estados-Membros consideram que este compromisso constitui a base sobre a qual desejam edificar a sua futura colaboração, requerendo, de cada um deles, o máximo empenhamento político, a fim de garantir a ratificação antes de 1 de Janeiro de 2009.

H. É desejável que o Tratado de Lisboa seja ratificado por todos os Estados­Membros até finais de 2008, a fim de permitir que os cidadãos votem nas eleições de 2009, no pleno conhecimento do novo quadro institucional da União.

Uma medida positiva para o futuro da União

1.  Conclui que, no seu todo, o Tratado de Lisboa representa uma melhoria substancial dos actuais Tratados, que implicará mais responsabilidade democrática para a União e reforçará o seu processo decisório (através do reforço dos papéis do Parlamento Europeu e dos parlamentos nacionais), reforçará os direitos dos cidadãos europeus face à União e melhorará a eficácia do funcionamento das Instituições da União;

Mais responsabilidade democrática

2.  Congratula-se com o reforço da responsabilidade democrática e dos poderes decisórios, o que permitirá aos cidadãos o exercício de um maior controlo da acção da União, devido, nomeadamente, às seguintes melhorias:

(a)  a adopção de toda a legislação da União Europeia será sujeita a um nível de controlo parlamentar que não existe em nenhuma outra estrutura supranacional ou internacional:

–  toda a legislação europeia será sujeita, com algumas excepções, à dupla aprovação, em termos de igualdade, do Conselho (composto por ministros nacionais que respondem perante os respectivos parlamentos) e do Parlamento Europeu (composto por deputados ao Parlamento Europeu directamente eleitos);

–  o controlo prévio por parte dos parlamentos nacionais de toda a legislação da União será reforçado, na medida em que aqueles receberão todas as propostas legislativas europeias a tempo de as poderem debater com os seus ministros, antes de o Conselho adoptar uma posição, assistindo também aos parlamentos o direito de requerer a reapreciação de uma proposta, caso considerem que a mesma não respeita o princípio da subsidiariedade;

(b)  o Presidente da Comissão será eleito pelo Parlamento Europeu, sob proposta do Conselho Europeu, tendo em conta os resultados das eleições para o Parlamento Europeu;

(c)  o Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança será nomeado pelo Conselho Europeu e pelo Presidente da Comissão e, como membro da Comissão, deverá submeter-se ao mesmo processo de investidura no Parlamento, a que está sujeito qualquer outro Comissário;

(d)  é instituído um novo processo orçamental mais simples e democrático, com uma única leitura: a distinção entre despesas obrigatórias e despesas não obrigatórias é abolida, sendo, assim, inteiramente assegurada a plena paridade entre o Parlamento e o Conselho na aprovação de todo o orçamento anual, e o Parlamento passa também a dispor do direito de aprovação do Quadro Financeiro Plurianual, juridicamente vinculativo;

(e)  o controlo democrático relativamente aos poderes legislativos delegados na Comissão será reforçado através de um novo sistema de controlo, em virtude do qual o Parlamento Europeu ou o Conselho poderão avocar decisões da Comissão ou revogar a delegação de tais poderes;

(f)   a aprovação do Parlamento Europeu será requerida para efeitos de aprovação de uma vasta panóplia de acordos internacionais assinados pela União, incluindo os que se referem a domínios sujeitos ao processo legislativo ordinário na esfera interna da União;

(g)  o Conselho reunir-se-á em sessão pública quando deliberar ou proceder à votação de projectos de actos legislativos, o que permite dar a conhecer aos cidadãos a actuação dos seus governos em sede de Conselho;

(h)  as agências, nomeadamente a Europol e a Eurojust, serão sujeitas a um maior controlo parlamentar;

(i)   o Comité das Regiões adquirirá a possibilidade de recorrer ao Tribunal de Justiça, o mandato dos seus membros será aumentado para 5 anos e as suas relações com o Parlamento Europeu serão definidas de forma mais clara;

(j)   o procedimento aplicável à revisão dos Tratados passará a ser mais aberto e democrático, uma vez que o Parlamento Europeu adquirirá também o poder de apresentar propostas para esse efeito, sendo que o controlo de qualquer proposta de revisão terá de ser levado a cabo por uma Convenção, que incluirá representantes dos parlamentos nacionais e do Parlamento Europeu, a menos que o Parlamento o considere desnecessário, e são introduzidos novos processos de revisão simplificados para alterar, por decisão unânime, determinadas disposições do Tratado, com a aprovação dos parlamentos nacionais;

Afirmação dos valores, reforço dos direitos dos cidadãos, melhoria da clareza

3.  Congratula-se com o facto de os direitos dos cidadãos serem reforçados em resultado das seguintes melhorias:

(a)  a Carta dos Direitos Fundamentais da UE, que consagra uma lista completa e actualizada dos direitos civis, políticos, económicos e sociais, tornar-se-á juridicamente vinculativa; propiciará segurança jurídica aos cidadãos da União, garantindo que todas as disposições da legislação da UE e todas as acções tomadas pelas Instituições da UE ou assentes em legislação da UE sejam consentâneas com aquelas normas, respeitando, simultaneamente, o princípio da subsidiariedade;

(b)  a União deverá requerer a adesão à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ficando, assim, sujeita à mesma apreciação externa do respeito dos direitos dos cidadãos que os seus Estados‑Membros;

(c)  novas disposições facilitarão a participação dos cidadãos e das associações representativas da sociedade civil nas deliberações da União; o diálogo com os parceiros sociais e o diálogo com igrejas, comunidades religiosas e organizações não confessionais será encorajado;

(d)  a introdução de uma iniciativa de cidadãos da UE permitirá a estes apresentarem propostas sobre questões relativamente às quais considerem"necessário um acto jurídico da União para aplicar os Tratados";

(e)  reforço da protecção judicial dos cidadãos, uma vez que a jurisdição do Tribunal de Justiça da União Europeia será extensível às matérias que se inscrevem nos domínios da liberdade, segurança e justiça, bem como a actos do Conselho Europeu, do Banco Central Europeu e dos órgãos da União, prevendo-se paralelamente maiores possibilidades de acesso aos processos por parte das pessoas singulares e das pessoas colectivas;

4.  Congratula-se com o facto de o Tratado estabelecer, de forma mais clara e visível, os valores, comuns a todos os Estados-Membros, em que se funda a União, bem como os objectivos da União e os princípios aplicáveis à sua acção e às suas relações com os Estados-Membros:

(a)  uma clara delimitação das competências da União face aos Estados‑Membros, ao abrigo do princípio de que todas as competências não conferidas pelos Tratados à União continuarão a ser atributo dos Estados-Membros;

(b)  uma maior ênfase nas políticas que beneficiam visivelmente os cidadãos: novas disposições de aplicação geral relativas à promoção de um elevado nível de emprego, à garantia de adequada protecção social, ao combate à exclusão social, a um elevado nível de educação, formação e saúde, à eliminação de todos os tipos de discriminação e à promoção da igualdade entre mulheres e homens; novas disposições reforçam a promoção do desenvolvimento sustentável e a protecção do ambiente, incluindo a luta contra as alterações climáticas e o respeito dos serviços de interesse geral; a coesão económica e social e a coesão territorial são reafirmadas como sendo um objectivo da União;

(c)  a confusão entre "Comunidade Europeia" e "União Europeia" deixará de se verificar, uma vez que a União Europeia passará a ser uma única entidade e estrutura jurídica;

(d)  uma cláusula de solidariedade entre os Estados-Membros permite aos cidadãos beneficiarem do apoio de todos os Estados-Membros da União em caso de atentado terrorista ou de catástrofe natural ou antropogénica;

(e)  é confirmada a especificidade da organização institucional da União, à qual os Estados-Membros confiam algumas das suas competências que considerem mais bem exercidas por via de mecanismos comuns, propiciando, em simultâneo, para evitar quaisquer dúvidas, garantias suficientes de que a União não se transformará num "super-Estado” omnipotente centralizado :

–  a obrigação de "respeitar as identidades nacionais dos Estados-Membros, intrínsecas às suas estruturas fundamentais, tanto políticas como constitucionais, incluindo os governos autónomos regionais e locais", bem como "as funções essenciais do Estado, nomeadamente as que se destinam a garantir a integridade territorial, a manter a ordem pública e a salvaguardar a segurança nacional";

–  o princípio das competências atribuídas (segundo o qual a União apenas detém as competências que lhe são cometidas pelos Estados-Membros), o princípio da subsidiariedade e o princípio da proporcionalidade;

–  a participação dos próprios Estados-Membros no processo decisório da União e na aprovação de quaisquer alterações ao mesmo;

–  o reconhecimento do direito de qualquer Estado-Membro a abandonar a União, se assim o entender;

Maior eficácia

5.  Regozija-se com o facto de o novo Tratado reforçar a capacidade das Instituições da União para levarem a cabo as suas missões com maior eficácia, graças ao seguinte:

(a)  aumento significativo do número de matérias sobre as quais os governos, no seio do Conselho, deliberarão por maioria qualificada e não por unanimidade, o que permitirá à União de vinte e sete Estados-Membros funcionar em mais áreas sem ser bloqueada pelo veto;

(b)  um novo sistema de votação por "dupla maioria" facilitará a tomada de decisões no seio do Conselho;

(c)  o Conselho Europeu tornar-se-á uma Instituição de pleno direito da União Europeia e a sua Presidência rotativa de seis meses será substituída por um Presidente eleito pelos seus membros por um período de dois anos e meio, permitindo, desta forma, uma maior coerência na preparação e na continuidade do seu trabalho;

(d)  o número de membros da Comissão será reduzido, a partir de 2014, para 2/3 do número de Estados­Membros, o que aumentará a capacidade de acção da Comissão e mostrará mais claramente que os comissários representam os interesses europeus e não os do seu país de origem, enquanto que um sistema de rotação continuará a garantir uma participação igualitária dos Estados­Membros;

(e)  a visibilidade e a capacidade da União como actor na esfera mundial serão significativamente reforçadas:

–  o Alto Representante da União Europeia para a Política Externa e o Comissário das Relações Externas - dois cargos que causam duplicação e suscitam confusão - serão fundidos, dando lugar a um Vice-Presidente da Comissão/Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, que presidirá ao Conselho dos Ministros dos Negócios Estrangeiros e estará habilitado a pronunciar-se, em nome da União, sobre os assuntos que sejam objecto de uma posição comum do Conselho, assegurando, assim, maior coerência na acção externa da União;

–  haverá um Serviço para a Acção Externa único, composto por funcionários da Comissão e do Conselho e dos serviços diplomáticos nacionais, que apenas poderá ser instituído pelo Conselho com a aprovação da Comissão após consulta do Parlamento; este serviço externo será dirigido pelo Vice-Presidente da Comissão/Alto Representante e permitirá conferir maior coerência à elaboração e aplicação da política externa da União;

–  a capacidade da União para desenvolver estruturas comuns no domínio da política de segurança e defesa será reforçada, inter alia, através da inserção de uma cláusula de ajuda e assistência mútua em caso agressão armada, reforçando, assim, o sentimento de segurança dos cidadãos, e garantindo, ao mesmo tempo, a flexibilidade necessária para contemplar diferentes abordagens dos Estados‑Membros nessas matérias;

(f)   a distinção entre instrumentos legislativos e instrumentos de execução será clarificada e uma nova definição de actos delegados permitirá simplificar e racionalizar a legislação da União;

(g)  a estrutura de pilares é abandonada, permitindo a unidade de acção nos diferentes domínios de actividade da União, com instrumentos e mecanismos simplificados, muito embora a natureza específica da política externa e de segurança implique procedimentos específicos nestes domínios;

(h)  a acção no domínio do Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça incluirá metas mais ambiciosas e procedimentos mais eficazes, abandonando procedimentos e instrumentos intergovernamentais independentes, e será sujeita a revisão judicial, o que é promissor de progressos concretos em matéria de justiça, de segurança e de imigração;

(i)   os objectivos e competências da União nos domínios das alterações climáticas, dos direitos das crianças, da Política Europeia de Vizinhança, da ajuda humanitária, da energia (incluindo uma referência, no Tratado, à solidariedade entre os Estados‑Membros neste domínio), do espaço, investigação, turismo, desporto, saúde pública e protecção civil são definidos com maior clareza; a política comercial comum é reconhecida como competência exclusiva da União:

(j)   no que respeita a toda uma série de outros assuntos, será possível a aplicação de métodos mais eficazes para o processo decisório, logo que exista uma vontade política nesse sentido;

(k)  são maiores as possibilidades de recorrer a acordos flexíveis, quando nem todos os Estados-Membros estejam dispostos ou habilitados a implementar, em simultâneo, determinadas políticas;

Preocupações

6.   Está ciente da decepção generalizada por, na sequência dos resultados dos referendos em França e nos Países Baixos, e a fim de assegurar um novo acordo entre os 27 Estados‑Membros, ter sido necessário:

–    abandonar a abordagem constitucional e algumas das suas características, como, por exemplo, a noção de uma União assente na vontade dos seus cidadãos e Estados‑Membros, um texto único e estruturado, uma terminologia mais clara para designar os instrumentos legislativos, a consagração da bandeira e do hino no Tratado e a utilização do título de “Ministro dos Negócios Estrangeiros” em vez da de Alto Representante;

–    adiar a implementação de elementos importantes do novo Tratado, tais como a entrada em vigor do novo sistema de votação no seio do Conselho (acompanhado de disposições especiais para o adiamento da votação conhecido como o “compromisso de Ioannina”), e introduzir mecanismos restritivos como os "travões de emergência " no processo legislativo ordinário em algumas áreas de competência;

–    incorporar no Tratado medidas específicas relativamente a determinados Estados-Membros, tais como o alargamento do regime de “opt-in” (inclusão) à cooperação em matéria policial e penal, no caso de dois Estados-Membros, o protocolo que limita o efeito da Carta no direito nacional de dois Estados-Membros, e o mandato parlamentar suplementar atribuído a um Estado-Membro em derrogação do princípio da proporcionalidade degressiva;

–    modificar a redacção de vários passos do Tratado, ou dos protocolos e declarações anexos ao mesmo, introduzindo, assim, um tom negativo que não se justifica e que gera uma desconfiança relativamente à União e às suas Instituições, enviando, dessa forma, um sinal errado ao público;

Conclusões

7.  Aprova o Tratado e salienta a necessidade de todos os Estados­Membros da União o ratificarem a tempo da respectiva entrada em vigor em 1 de Janeiro de 2009;

8.  Considera que o Tratado de Lisboa proporcionará um quadro estável, que permitirá o desenvolvimento futuro da União;

9.  Está ciente de que um Tratado reformador é inevitavelmente menos claro e legível do que um Tratado codificado; solicita, por conseguinte, a rápida publicação dos Tratados consolidados, com a redacção que lhes foi dada pelo Tratado de Lisboa, o que facultará aos cidadãos um texto de base da União mais claro;

10. Solicita reiteradamente que sejam envidados todos os esforços, quer pelas Instituições da UE, quer pelas autoridades nacionais, de acordo com o princípio de uma cooperação franca com vista a informar os cidadãos europeus mais clara e objectivamente sobre o conteúdo do Tratado;

11. Incumbe a sua comissão competente quanto à matéria de fundo de preparar as necessárias alterações ao seu Regimento e de avaliar a necessidade de subsequentes medidas de execução;

12. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução e o relatório da Comissão dos Assuntos Constitucionais aos parlamentos nacionais dos Estados-Membros, ao Conselho e à Comissão, bem como aos ex-membros da Convenção sobre o Futuro da Europa, e de garantir que os serviços do Parlamento, incluindo os seus gabinetes externos, divulguem ampla informação sobre a posição do Parlamento relativamente ao Tratado.

  • [1]  Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, de 7 de Dezembro de 2000, proclamada em Estrasburgo, em 12 de Dezembro de 2007
  • [2]  Conselho Europeu de Laeken, Declaração de Laeken sobre o Futuro da União, SN 273/01, 15.12.2001
  • [3]  Textos Aprovados, P6_TA(2007)0234
  • [4]  Textos Aprovados, P6_TA(2007)0328
  • [5]  Por 500 votos a favor, 137 contra e 40 abstenções [Resolução do Parlamento Europeu, de 12 de Janeiro de 2005, sobre o Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa – (Relatório Corbett/Méndez de Vigo), JO C 247 E, de 6.10.2005, p. 88]

EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS

There is a tide in the affairs of men,

Which, taken at the flood, leads on to fortune;

Omitted, all the voyage of their life

Is bound in shallows and in miseries.

On such a full sea are we now afloat;

And we must take the current when it serves,

Or lose our ventures.

William Shakespeare. Julius Caesar.

I.    Antecedentes

1.   O processo da construção europeia é o que menos se assemelha a um "longo rio tranquilo": em 2004, coube aos co-relatores a honra de elaborar o relatório do Parlamento Europeu sobre o Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa; três anos volvidos, enfrentamos uma responsabilidade análoga relativamente ao Tratado de Lisboa, que substitui o anterior.

Encontramo-nos, pois, perante uma situação singular, que nos levará a retomar a discussão clássica sobre a possibilidade de nos banharmos duas vezes nas águas de um mesmo rio. A nossa resposta será afirmativa; só assim poderemos orientar o Parlamento sobre o modo de "aproveitar a corrente enquanto esta flúi", em vez de "nos conformarmos a ver malogrado o nosso empreendimento", no espírito dos versos de Shakespeare que antecedem a presente exposição de motivos.

A tarefa de que os co-relatores foram incumbidos impõe uma inelutável orientação pedagógica: à semelhança do modo como procedemos em 2004, propomo-nos hoje comparar os Tratados em vigor com o Tratado assinado em Lisboa em 13 de Dezembro de 2007 e cujo processo de ratificação está em curso nos 27 Estados-Membros.

A fim de saber para onde vamos, convém saber de onde vimos: Há mais de meio século, a Declaração de Robert Schuman constituiu o ponto de partida de um projecto ambicioso: unir os cidadãos europeus, dilacerados durante séculos por lutas fratricidas, em torno de um projecto comum.

Desde a fundação da primeira Comunidade Europeia (do Carvão e do Aço: Tratado de Paris de 18.4.1951[1]), que reunia seis países da Europa Ocidental[2], a construção comunitária estendeu‑se a 27 Estados europeus[3], tendo alargado o seu campo de acção a novos domínios, mediante a Comunidade Económica e a da Energia Atómica /Euratom (Tratados de Roma de 25.3.1957[4]) e, em seguida, a União Europeia (Tratado de Maastricht de 7.2.1992).

2.      Desde a sua eleição por sufrágio universal, em 1979, o Parlamento Europeu sempre procurou democratizar e tornar mais eficaz e transparente o funcionamento do que viria a tornar‑se a União Europeia. Adoptando, em 14.2.1984, o primeiro projecto de Tratado institutivo da União Europeia (projecto de tratado dito "Spinelli", do nome do seu relator), o Parlamento iniciou um movimento de reformas que iriam suceder‑se durante os vinte anos subsequentes e viriam a traduzir‑se no Acto Único Europeu[5], no Tratado de Maastricht[6], no Tratado de Amesterdão[7], no Tratado de Nice[8], no Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa[9] e, hoje, no Tratado de Lisboa[10].

Em cada uma destas fases, sob o impulso da sua Comissão dos Assuntos Institucionais, que se tornou posteriormente, em 1999, Comissão dos Assuntos Constitucionais, o Parlamento Europeu participou activamente na reflexão preparatória e procedeu à avaliação do resultado das diferentes conferências intergovernamentais (CIG)[11].

Desde o início deste processo que o Parlamento defendeu o projecto de clarificar e melhorar a base constitucional da União Europeia, exigência que cada vez mais se impunha sob a pressão dos sucessivos alargamentos, susceptíveis de pôr em perigo a dimensão política da integração.

Para tal, o Parlamento perseguiu três objectivos distintos, mas interrelacionados:

Em primeiro lugar, pretendeu clarificar e, quando necessário, reforçar as competências e responsabilidades da própria União Europeia. O Parlamento sempre defendeu que os poderes atribuídos à União e por ela exercidos deveriam ter por base o "princípio da subsidiariedade", isto é, a União deveria exercer as responsabilidades – mas apenas essas – que pudessem ser levadas a cabo de forma mais eficaz pelas políticas comuns do que pelos Estados‑Membros agindo separadamente.

Em segundo lugar, o Parlamento defendeu que as responsabilidades exercidas a nível europeu deviam ser assumidas de forma mais eficaz. Foi particularmente crítico no respeitante à prática da unanimidade no Conselho, alegando que, se existe acordo quanto à necessidade de conduzir uma política em comum, não faz sentido dar um poder de bloqueio a cada um dos Estados que compõem a União. O Parlamento advogou igualmente um papel mais forte para a Comissão na condução das políticas, uma vez aprovadas, sujeitas a um escrutínio e controlo apropriados.

Em terceiro lugar, o Parlamento manifestou‑se a favor do aperfeiçoamento do controlo democrático e de um alargamento da responsabilidade a nível europeu. As responsabilidades que os parlamentos nacionais, ao ratificarem os tratados, transferiram para a União, não deveriam ser exercidas unicamente pelo Conselho (i. e., os ministros nacionais). A perda de poderes parlamentares a nível nacional deveria ser compensada por um aumento do poder parlamentar a nível europeu.

Face aos resultados modestos e manifestamente insuficientes dos Tratados de Amesterdão e de Nice relativamente ao repto não só da duplicação do número de Estados‑Membros, mas também da prossecução da consolidação da União, verificou‑se cada vez mais claramente que o método utilizado para a revisão dos tratados já não era susceptível de responder adequadamente à evolução da Europa.

O Parlamento enunciara‑o já claramente em 1997, na sua Resolução de 19 de Novembro (relatório Íñigo Méndez de Vigo e Dimitris Tsatsos, cf. supra nota de rodapé n.º 7), que lançou de facto a reflexão política que conduziria, em 1999, à elaboração, por iniciativa da Presidência alemã do Conselho, do modelo da Convenção – aplicado, em primeiro lugar, à redacção da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Os signatários do Tratado de Nice, conscientes das suas imperfeições, anexaram‑lhe, aliás, uma Declaração n.º 23 "respeitante ao futuro da União"[12], que abriu a via a uma nova revisão dos Tratados, inicialmente prevista para 2004. Essa revisão deveria ser preparada mediante um "amplo debate que associe todas as partes interessadas: representantes dos parlamentos nacionais e do conjunto da opinião pública (...), representantes da sociedade civil, etc.", o qual deveria desenrolar‑se em 2001, tendo por objectivo a aprovação de uma declaração contendo "as iniciativas apropriadas para dar seguimento a este processo", aquando do Conselho Europeu de Laeken.

3. Por seu turno, depois de ter procurado trabalhar em parceria com os parlamentos nacionais na fase preparatória das CIG[13], o Parlamento Europeu foi o primeiro a propor[14], com base no precedente criado aquando da elaboração da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia[15], a convocação de uma Convenção composta por representantes dos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados‑Membros, dos parlamentos nacionais, do Parlamento Europeu e da Comissão, e à qual foram igualmente associados, como membros de pleno direito, os representantes dos governos e dos parlamentos dos Estados candidatos à adesão.

Com efeito, a Convenção sobre a Carta dos Direitos Fundamentais demonstrara que um órgão desse tipo era capaz de elaborar um projecto susceptível de receber a aprovação dos Chefes de Estado ou de Governo. O carácter aberto e transparente de que se revestiu, bem como a qualidade dos intercâmbios nela realizados, haviam favorecido o surgimento de um consenso originado pela possibilidade, em primeiro lugar, de cada um expressar a sua opinião e, em segundo lugar, de compreender a posição dos outros.

Ao adoptar a "Declaração de Laeken sobre o futuro da União Europeia"[16], o Conselho Europeu de Laeken, de 14 e 15 de Dezembro de 2001, deu seguimento a essa iniciativa, definindo as modalidades de organização e de trabalho da Convenção e, sobretudo, estabelecendo os termos do respectivo mandato e as questões que deveria debater. Desse modo, a Convenção sobre o Futuro da Europa foi encarregada, sob a presidência de Valéry Giscard d'Estaing e a vice‑presidência de Giuliano Amato e Jean‑Luc Dehaene, de redigir um anteprojecto de Constituição que deveria servir de base aos trabalhos subsequentes da CIG.

O resultado a que chegou a Convenção sobre o Futuro da Europa confirmou o acerto da escolha deste método, dado que pôde apresentar um texto consensual ao fim de dezasseis meses de debates intensos, alimentados também por um diálogo estreito com a sociedade civil.

O Parlamento Europeu, por seu turno, graças aos trabalhos da sua Comissão dos Assuntos Constitucionais, influenciou grandemente o conteúdo do projecto de Tratado Constitucional,[17] que a CIG tão‑só modificaria num número muito limitado de pontos. O Parlamento foi igualmente, e pela primeira vez, plenamente associado aos trabalhos dessa CIG na pessoa do seu Presidente, Pat Cox, e dos seus dois representantes, Iñigo Méndez de Vigo, substituído posteriormente por Elmar Brok, e Klaus Hänsch.

4. Infelizmente, o processo de ratificação não decorreu como seria de esperar; os resultados negativos dos referendos realizados em França e nos Países Baixos obrigaram a uma reformulação..

O Conselho Europeu de Junho de 2005 decretou um período de reflexão (com a duração mínima de um ano), que seria aproveitado para realizar um amplo debate em todos os Estados‑Membros "ao qual serão associados os cidadãos, a sociedade civil, os parceiros sociais e os parlamentos nacionais, e bem assim os partidos políticos".

As instituições europeias eram igualmente convidadas a dar o seu contributo. Entretanto, as ratificações prosseguiram, incluindo por via de referendo.

5. O Parlamento, por seu turno, cumpriu plenamente o seu papel na matéria. Desde a primeira hora apoiou o lançamento de um diálogo público aprofundado a nível europeu sobre as principais questões em jogo na integração europeia e rejeitou quaisquer tentativas de aplicação selectiva do Tratado Constitucional ("cherry picking"). O Parlamento deu um contributo particular para o debate público, lançando a ideia dos "fóruns interparlamentares" para discutir temas‑chave para o futuro da Europa. No total, foram organizados três fóruns até ao Conselho Europeu de Junho de 2007, que decidiu convocar novamente a CIG[18]. Os fóruns em causa contribuíram para fortalecer, entre os representantes eleitos dos cidadãos de toda a União, a convicção de que os problemas a que o Tratado Constitucional visava dar resposta não desapareceram com o malogro da respectiva ratificação, bem como da importância vital das inovações institucionais nele previstas, sem prejuízo de uma sua eventual reformulação, para habilitar a União a enfrentar os desafios com que se debate num mundo cada vez mais globalizado.

A Presidência alemã marcou o regresso do dossier institucional à ordem do dia da União. O procedimento seguido não poderia, naturalmente, agradar àqueles que viveram a atmosfera de diálogo e de transparência da Convenção, que aliás produzira um efeito de "contágio" na CIG 2004. Assim, para assegurar possibilidades sérias de sucesso, as discussões referentes ao relançamento da reforma dos Tratados desenvolveram‑se inicialmente a nível bilateral, entre a Presidência e cada um dos Estados‑Membros. Registe‑se que o PE participou desde o primeiro momento nas consultas a nível de "sherpas" [19] e pôde, assim, dar o seu contributo para a elaboração do mandato que a Presidência alemã submeteu ao Conselho Europeu de Junho de 2007. Uma vez que esta representação era assegurada ao nível do secretariado mediante nomeação directa do Presidente do Parlamento, foi estabelecido um procedimento ad hoc de informação/consulta entre o Presidente, o presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais e os coordenadores dos Grupos Políticos na mesma comissão.

6.   Estes trabalhos preparatórios permitiram ao Conselho Europeu de Junho de 2007 convocar uma nova CIG, a fim de retomar a reforma dos Tratados e também de definir um mandato muito claro, preciso e circunstanciado, o qual permitiu à Presidência Portuguesa conduzir os trabalhos da CIG de modo eficaz e rápido.

Aberta em 23 de Julho, aquando da reunião do Conselho dos Assuntos Gerais, a CIG funcionou fundamentalmente a dois níveis: a nível ministerial, em que o Parlamento era representado por três membros - Elmar Brok, Enrique Barón Crespo e Andrew Duff; a nível do grupo de especialistas juristas, cujo trabalho era preparado pelo Serviço Jurídico do Conselho e no qual o PE e a Comissão se encontravam igualmente representados.

O trabalho deste grupo de especialistas juristas revelou-se determinante para que a CIG lograsse um acordo em tão pouco tempo. A nível político, a CIG apenas se reuniu de facto três vezes antes do Conselho Europeu de Lisboa. Foi-lhe dado, todavia, resolver ou superar um número considerável de questões sensíveis - a Presidência Portuguesa havia, com efeito, imposto com sucesso o princípio de não reabertura do mandato, salvo se se tratasse das questões que constituíam objecto de unanimidade entre os Estados-Membros - de tal modo que, em Lisboa, os Chefes de Estado ou de Governo apenas tinham na mesa das negociações duas questões fundamentais, uma das quais decorria do próprio Tratado: a definição do novo sistema de votação por maioria qualificada no Conselho, face à persistente insatisfação da Polónia relativamente, não só ao acordo obtido em 2004, mas também ao compromisso que havia sido laboriosamente alcançado no Conselho Europeu de Junho de 2007, em Bruxelas. A outra questão fundamental ainda por resolver era a referente à composição do PE a partir da legislatura de 2009, que, embora não decorrendo directamente do Tratado, se havia tornado uma das principais ameaças à conclusão de um acordo, uma vez que a Itália se opunha determinantemente à proposta de decisão elaborada pelo PE a pedido do Conselho Europeu.

As outras questões ainda em discussão - os opt-out/opt-in britânico e irlandês em matéria de ex‑Terceiro Pilar, a salvaguarda do papel do PE no respeitante à nomeação do Vice‑Presidente/Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, etc. - haviam sido praticamente todas resolvidas nos últimos dias que precederam o Conselho Europeu, em particular aquando da reunião da CIG a nível ministerial, durante o Conselho dos Assuntos Gerais, realizado no Luxemburgo, em 15 de Outubro.

Sendo assim, em Lisboa os Chefes de Estado e de Governo puderam chegar rapidamente a acordo: cerca da 1 hora da manhã de sexta-feira, 19 de Outubro de 2007, a CIG estava concluída.

São as implicações e os méritos (ou desméritos) do Tratado de Lisboa, cuja cerimónia de assinatura teve lugar em 13 de Dezembro de 2007, em Lisboa, que nos propomos analisar na segunda parte da presente exposição de motivos.

II. O que traz de novo o presente Tratado relativamente aos Tratados em vigor

O Tratado de Lisboa encerra um grande número de reformas e aperfeiçoamentos significativos relativamente aos actuais tratados. Trata‑se, como é óbvio, de um compromisso, que, lamentavelmente, na opinião do Parlamento, implica o abandono de determinados elementos consagrados na Constituição, bem como o adiamento da entrada em vigor de outros elementos e a adopção de medidas específicas destinadas a satisfazer os pedidos de alguns Estados‑Membros. Era o preço político a pagar para sair da crise em que o "não" dos referendos francês e neerlandês havia feito mergulhar a União.

1. O regresso à revisão tradicional dos Tratados e o abandono da ideia de Constituição

1.1 O regresso ao método tradicional de revisão dos Tratados, mediante a adopção de um novo Tratado que altera os actuais tratados, que permanecem em vigor, implica o abandono da Constituição, como um único Tratado consolidado, que substituiria os actuais na íntegra. Assim, a questão, que tanta controvérsia gerou, de saber se se tratava de uma verdadeira Constituição ou de um Tratado fica sem objecto. Deste modo, evita‑se um debate estéril sobre uma falsa questão: nunca houve qualquer dúvida de que, formalmente, se estava perante um Tratado, que deveria ser adoptado e ratificado de acordo com as regras vigentes em matéria de modificação dos Tratados. Nem poderia ser de outro modo. Mas é verdade também que, pela sua natureza e conteúdo, o Tratado Constitucional estabelecia uma "Constituição" mais visível. Com o regresso ao método tradicional, abandona‑se a própria designação de Constituição, pondo politicamente termo à polémica.

Esta abordagem implica ainda o sacrifício do princípio da unicidade do texto e a recusa do próprio conceito de um texto único de índole constitucional, que alguns reputaram demasiado próximo do modelo estatal para ser passível de ser aplicado à União.

1.2 Por outro lado, o novo Tratado clarifica de forma substancial a definição dos valores, princípios e objectivos por que se rege a acção da União Europeia (UE), descreve as competências da União, estabelece as suas instituições, apresenta os processos de decisão, precisa os actos, define os direitos dos cidadãos face à UE, estatui as regras da sua revisão, inter alia. Nessa medida, pode dizer‑se que os Tratados em que se funda a UE estabelecem, de alguma forma, a sua "Constituição", tomando o termo "Constituição" na sua acepção material. Afinal, a função de uma Constituição é, justamente, definir as condições e os limites do exercício do poder no quadro de uma entidade política e garantir os direitos dos cidadãos, que é o que faz o novo Tratado. Mas o facto de a tentativa de formalizar essa noção material ter sido objecto de rejeição significa que não se quis dotar a União de uma "Constituição" no seu sentido formal ou solene, ou seja, no sentido político mais corrente. Tal representa uma diferença relativamente ao Tratado Constitucional.

1.3 Na realidade, em termos substanciais, com os Tratados actuais a União – como qualquer outra entidade política – dispõe já de uma "Constituição", ínsita nos Tratados que lhe deram vida. Simplificando‑os, dando‑lhes uma estrutura mais inteligível, dá‑se pois um passo importante no sentido de clarificar o sistema, de o tornar mais transparente e compreensível aos olhos dos cidadãos. Mas o método escolhido – um Tratado contendo por alterações aos dois Tratados em vigor – torna o seu texto ilegível para aqueles. Impõe-se a elaboração de uma versão consolidada.

1.4 É, por conseguinte, evidente que os Estados‑Membros pretenderam conjurar todos os receios, por mais infundados que fossem, de que dotar a União de uma Constituição pudesse equivaler a lançarmo‑nos na via da criação de um "super‑Estado" centralizado, que acarretaria inelutavelmente o fim dos Estados nacionais e modificaria a natureza da União Europeia. O Parlamento, que se tem batido desde o início do processo pela "constitucionalização" da União, está consciente de que esse receio não tem verdadeiramente em conta o significado de uma Constituição enquanto lei fundamental, que disciplina o exercício do poder no quadro de qualquer entidade política (a menos que se queira negar a natureza "política" da União). Aliás, não faltam exemplos de organizações internacionais cujo pacto fundador tem, precisamente, a designação de Constituição, como são os casos da Organização Mundial do Trabalho (OIT) e da Organização Mundial de Saúde (OMS), ou da União Postal Universal (UPU). Visto por este prisma, o conceito de "Constituição" assumiria mesmo foros de uma garantia formal para os Estados‑Membros e os cidadãos contra eventuais derrapagens da União na sua acção. Por conseguinte, reconhecendo embora a sua necessidade, à luz da situação política existente nos Estados‑Membros, para a superação do impasse institucional criado, o PE não pode deixar de lamentar o abandono da abordagem constitucional.

1.5. Do mesmo modo, os co-relatores não podem deixar de lamentar que os símbolos da União - a bandeira, o hino, a divisa e o dia da Europa - não tenham sido retomados no novo Tratado, como era o caso no Tratado Constitucional. Embora tal não signifique que estes símbolos deixaram de existir - existiam já há muito tempo sem jamais terem sido mencionados, como tal, nos Tratados e continuarão a existir da mesma forma – seria inteiramente lógico que os textos que definem o estatuto jurídico-político da União os mencionassem. Este abandono foi imposto por certos Estados-Membros a pretexto de que o reconhecimento dos símbolos nos Tratados permitiria amálgamas relativas à pretendida natureza "estadual" da União. O facto de este ponto de vista estar longe de ser objecto de unanimidade parece provado pela Declaração sobre os símbolos da União, que dezasseis Estados-Membros anexaram ao Tratado (Declaração nº 52 relativa aos símbolos da União), reafirmando que os símbolos mencionados "continuarão a ser, para eles, os símbolos do vínculo comum dos cidadãos à União Europeia e dos laços que os ligam a esta". Assim, é com entusiasmo que os co-relatores acolhem a iniciativa da Comissão dos assuntos Constitucionais, que está justamente a preparar um relatório sobre a utilização dos símbolos da União, em cujo âmbito se deverá propor alterações ao Regimento do PE, a fim de reforçar a utilização destes símbolos pelo Parlamento[20].

2.   Uma só entidade: a União Europeia

2.1. Não obstante continuarem a existir dois Tratados distintos, um grande progresso em termos de transparência e de perceptibilidade da realidade europeia do ponto de vista dos cidadãos é o introduzido pela fusão numa única entidade, dotada de personalidade jurídica, a União Europeia[21]., das diferentes entidades até aqui sobrepostas (União Europeia, Comunidade Europeia). Isto aumentará a eficácia e a visibilidade da acção da União no domínio internacional, pondo fim a uma situação confusa em que a União Europeia é reconhecida como a entidade comum por todos, quando na realidade quem goza de personalidade jurídica explícita[22] é a Comunidade Europeia, que integra apenas uma parte das funções da União.

2.2. Isto significa ainda que o Tratado que institui a Comunidade Europeia se transmuta agora em Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia. Assim, ambos os Tratados passam a versar sobre a mesma entidade política: a União Europeia. O primeiro concentra‑se nos princípios, valores e aspectos organizacionais fundamentais da União. O segundo trata em detalhe da organização e funcionamento da União, bem como da definição dos princípios e objectivos que norteiam a acção da União em cada uma das suas políticas sectoriais, precisando a extensão e os limites das suas competências em cada uma das suas áreas de actuação. A excepção, que, na realidade, representa uma entorse substancial à lógica de separação entre os dois Tratados, reside no facto de o TUE incluir um título integralmente dedicado à acção externa da União, o qual regula em pormenor tudo o que diz respeito à Política Externa e de Segurança Comum.

2.3 Esta fusão numa única entidade é acompanhada pela supressão da estrutura em três pilares [Política Externa e de Segurança Comum (PESC), Justiça e Assuntos Internos (JAI) e Comunidade Europeia], os quais se fundem no corpus único da União, com um único quadro institucional e a generalização do método comunitário, sendo porém de ressalvar que, no domínio da Política Externa e de Segurança Comum (incluindo a defesa), se prevêem processos de decisão especiais, como o exige a natureza específica da matéria.

3.   Uma definição clara dos valores, princípios e objectivos da União

O novo Tratado prevê que a parte introdutória do TUE seja constituída por artigos que definem a natureza, os valores e os princípios em que se funda a União, assim como os objectivos que esta deve visar na sua acção.

3.1. No seu artigo primeiro, o TUE revisto estabelece as bases em que se funda a construção europeia: define a União como uma União instituída pelos Estados‑Membros, à qual estes "atribuem competências para atingirem os seus objectivos comuns". Esta definição afasta‑se, assim, da Constituição, que consagrava uma dupla legitimidade da União, assente na vontade dos cidadãos e dos Estados. A Constituição valoriza a pessoa individual, ou seja, homens e mulheres, titulares de direitos e obrigações, que são cidadãos da União Europeia por o serem de um Estado‑Membro e que, graças a isso, dispõem de um conjunto adicional de direitos que lhes concede a cidadania europeia. Não obstante a supressão do reconhecimento formal da dupla legitimidade da União, as respectivas expressões materiais não deixam de aflorar aqui e ali no texto dos Tratados, como emanações de um movimento que remonta, no mínimo, à instituição da eleição por sufrágio universal do Parlamento Europeu.

3.2 Esta União Europeia deve estar solidamente ancorada nos valores que a fundamentam e que devem orientar toda a acção das suas instituições.

Nos termos do artigo 2.º do TUE revisto, esses valores, sobre os quais se articula toda a construção europeia, são a dignidade humana, a liberdade, a democracia, a igualdade, o Estado de direito e os direitos do Homem, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias. Estes valores constituem, aliás, o critério de referência para futuras adesões e podem servir de base à aplicação de sanções aos Estados‑Membros que os violem de forma grave e persistente.

O mesmo artigo define igualmente os princípios que guiam a acção da União: o pluralismo, a não discriminação, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a igualdade entre mulheres e homens.

Importa salientar que, nesta matéria, o Tratado de Lisboa seguiu de perto o Tratado Constitucional, dado o consenso existente entre os Estados‑Membros em relação ao património de valores comuns em que assenta a União, que não foi verdadeiramente objecto de contestação ao longo de todo o processo de discussão sobre o futuro da União.

3.3 Quanto aos objectivos da União, que actualmente estão dispersos pelos artigos 2.º do TUE e 3.º do TCE, o novo Tratado concentra‑os no TUE, logo após a enumeração dos valores. A definição dos objectivos da União foi algo modificada em relação à Constituição. Assim, de acordo com o disposto no artigo 3.º do TUE, a União persegue objectivos políticos, que justificam a sua existência. Estes são, em síntese, a paz, a promoção dos seus valores e o bem‑estar dos povos. Concretizam‑se no terceiro artigo do TUE mediante objectivos políticos, económicos e sociais, tanto a nível interno da União como a nível das relações externas.

Assim, a nível interno, a União oferece aos seus cidadãos um espaço de liberdade, de segurança e de justiça em que a livre circulação das pessoas é assegurada e acompanhada por medidas adequadas em matéria de controlo das fronteiras externas, de asilo, de imigração e de prevenção e combate à criminalidade. Estabelece um mercado interno[23]. A União empenha‑se no desenvolvimento sustentável da Europa, assente num crescimento económico equilibrado e na estabilidade dos preços, e na consecução de uma economia social de mercado altamente competitiva que tenda para o pleno emprego e para o progresso social, e de um nível elevado de protecção e de melhoria da qualidade do ambiente. Promove o progresso científico e tecnológico. Combate a exclusão social e as discriminações, promove a justiça e a protecção sociais, a igualdade entre homens e mulheres, a solidariedade entre as gerações e a protecção dos direitos da criança. Promove a coesão económica, social e territorial e a solidariedade entre os Estados‑Membros. Respeita a riqueza da sua diversidade cultural e linguística e vela pela salvaguarda e pelo desenvolvimento do património cultural europeu. Por último, estabelece uma união económica e monetária (cuja moeda é o euro).

A nível internacional, em que promove os respectivos valores e interesses, a União contribui para a paz, a segurança e o desenvolvimento sustentável do planeta e para a solidariedade e o respeito mútuo entre os povos. Contribui para o comércio livre e equitativo, para a erradicação da pobreza e a protecção dos direitos do Homem, em especial os das crianças, bem como para o respeito e o desenvolvimento do direito internacional, nomeadamente da Carta das Nações Unidas.

Estes objectivos constituem, pois, um programa político de base que está na origem da criação da União. Incumbe a esta persegui‑los por meios adequados, utilizando as competências que lhe são atribuídas nos Tratados.

3.4 Os princípios que regem as relações entre a União e os Estados‑Membros são igualmente enunciados nos primeiros artigos do TUE revisto: a União compromete‑se a respeitar a identidade nacional dos Estados‑Membros, ou seja, os elementos fundamentais da sua estrutura política e constitucional. Assim sendo, a União manifesta o seu respeito pelas decisões que cada Estado-Membro possa tomar relativamente à repartição territorial do poder (desde a fixação das suas fronteiras até à autonomia regional e local), à manutenção da ordem pública e à defesa da segurança nacional. Aliás, o acordo alcançado em Lisboa sublinha que "a segurança nacional continua a ser da exclusiva responsabilidade de cada Estado-Membro"[24]. Por último, o TUE revisto consagra ainda, no mesmo artigo, o princípio da cooperação leal entre a União e os Estados‑Membros para a consecução de objectivos comuns.

O TUE revisto consagra também, nas suas disposições introdutórias, o princípio da atribuição das competências (a União dispõe unicamente das competências que lhe são atribuídas pelos Estados‑Membros nos Tratados), bem como os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, princípios que disciplinam o exercício das competências da União, embora o capítulo atinente à definição das competências da União esteja, de facto, inscrito no TFUE.

Para satisfazer o desejo de certos Estados‑Membros, cuja grande preocupação é demonstrar que o Tratado Reformador não é uma "Constituição II", o princípio do primado do direito da União sobre o direito nacional não foi, lamentavelmente, mantido de forma visível, mas é objecto de uma declaração (Declaração n.º17), em que se recorda a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça no tocante ao primado do direito comunitário e se perfilha um parecer do Serviço Jurídico do Conselho que classifica o referido princípio como um princípio fundamental do direito comunitário e propugna que a sua omissão no texto do futuro Tratado "em nada prejudica a existência do princípio nem a actual jurisprudência do Tribunal de Justiça".

3.5 Os valores e princípios constituem, consequentemente, o fundamento ético da União, concretizado nomeadamente na Carta dos Direitos Fundamentais, a qual não se encontra integrada nos Tratados, ao invés do que sucedia no caso da Constituição, mas é objecto de uma norma de recepção que lhe confere força vinculativa ao reconhecer‑lhe valor igual ao dos próprios Tratados.

Os objectivos que lhe são confiados justificam a existência da União e são o motivo pelo qual os Estados‑Membros decidiram constituir a União. Uns e outros governam toda a sua acção. Embora os valores, princípios e objectivos definidos nestes artigos não sejam novos, alguns deles nunca haviam sido enunciados claramente e nunca tinham sido objecto de sistematização. Estamos perante um passo importante para dar aos cidadãos uma imagem clara e altamente simbólica do que significa a União.

4.   Os cidadãos no cerne da construção europeia: a cidadania europeia e o novo estatuto da Carta dos Direitos Fundamentais

O TUE reconhece também, nas suas disposições iniciais, a cidadania europeia, que complementa, e não substitui, a cidadania de cada Estado‑Membro (na realidade, a cidadania nacional é a base do reconhecimento da cidadania europeia). Não obstante, os artigos relativos ao conteúdo concreto dos direitos dos cidadãos europeus são remetidos para o TFUE[25]. Mas esta lamentável separação redaccional não invalida o facto de, cada vez mais, os Tratados colocarem no cerne da construção europeia as pessoas, ou seja, homens e mulheres, titulares de direitos e obrigações, que são cidadãos da União Europeia por o serem de um Estado‑Membro e que, graças a isso, dispõem de um conjunto adicional de direitos que lhes concede a cidadania europeia.

4.1. A Constituição integrara a Carta dos Direitos Fundamentais na sua Parte II. Tal integração, vivamente desejada pelo Parlamento Europeu, significava o pleno reconhecimento do papel central das pessoas na construção europeia. Na CIG de 2007, em virtude da oposição de certos Estados‑Membros, foi necessário abandonar a referida integração. Contudo, a grande maioria dos Estados‑Membros secundou o Parlamento na rejeição dessa concessão caso não fosse acompanhada pelo reconhecimento pelos Tratados da força jurídica vinculativa da Carta. É o que faz o artigo 6.º do novo TUE, que reza, "A União reconhece, os direitos, as liberdades e os princípios enunciados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, de 7 de Dezembro de 2000, com as adaptações que lhe foram introduzidas em 12 de Dezembro de 2007, em Estrasburgo, e que tem o mesmo valor jurídico que os Tratados." Mediante esta recepção formal, a Carta adquire força jurídica obrigatória e um valor igual ao dos Tratados (o que constituía, aliás, o único meio susceptível de lhe permitir servir de critério de aferição da validade dos actos da União), impondo‑se assim, por um lado, às instituições europeias, actuando no âmbito das suas competências respectivas e, por outro lado, aos Estados‑Membros, mas tão‑só na medida em que actuem na qualidade de executores do direito comunitário. Trata‑se, consequentemente, de uma garantia suplementar de protecção dos direitos fundamentais proporcionada aos cidadãos relativamente à União.

4.2 Isto não significa de forma alguma que se ponha em causa a protecção dos direitos fundamentais garantidos pelo direito nacional aos seus cidadãos relativamente ao seu Estado, nem a atribuição encoberta de novas competências à União, que, segundo algumas opiniões, poderia, por essa via, impor orientações em matéria de política económica e social aos Estados‑Membros. A afirmação, ínsita no texto da própria Carta, de que a mesma não torna o âmbito de aplicação do direito comunitário extensivo a competências que não sejam as da União, não cria qualquer nova competência nem qualquer nova atribuição para a União e não modifica as atribuições e competências que lhes são atribuídas nos Tratados (artigo 52.º, n.º2 da Carta) é particularmente clara a esse respeito.

4.3 O facto de a Carta já não integrar os Tratados levou a CIG 2007, para satisfazer os pedidos dos Estados‑Membros mais recalcitrantes, a reiterar essas garantias no próprio artigo do TUE que reconhece a Carta.

Porém, isso não foi suficiente ainda para convencer alguns Estados‑Membros. Assim, por insistência do Reino Unido, a que se juntou à última hora a Polónia, a CIG acrescentou um Protocolo (n.º 9) sobre a aplicação da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia à Polónia e ao Reino Unido, no qual se precisa que a Carta "não alarga a faculdade do Tribunal de Justiça da União Europeia, ou de qualquer tribunal daqueles dois países, de considerar que as leis, os regulamentos, ou as disposições, práticas ou acção administrativas destes países são incompatíveis com os direitos, as liberdades e os princípios fundamentais que nela são reafirmados". Em particular no que diz respeito aos direitos sociais (Título IV da Carta), o protocolo especifica que a Carta não cria direitos susceptíveis de serem invocados perante os tribunais e que se apliquem à Polónia ou ao Reino Unido, salvo na medida em que as respectivas legislações nacionais o prevejam (o que constitui, além disso, a regra geral no tocante a este título da Carta).

Em larga medida, as disposições em questão mais não fazem dos que reiterar os princípios já estabelecidos na Carta. No entanto, o PE só pode lamentar, se se revelar ser esse o caso, que os cidadãos de dois Estados‑Membros venham, eventualmente, a ver‑se privados pelos seus Estados do pleno gozo da protecção dos direitos fundamentais reconhecidos pela Carta, a qual, saliente‑se, tem como primeiros destinatários as instituições da União e só vincula os Estados‑Membros nos casos em que eles actuem como órgãos de aplicação do direito comunitário.

4.4. Importa notar que os direitos enunciados na Carta correspondem, de um modo geral, à base comum dos direitos fundamentais que a União já reconhecia e que se inspiravam nas tradições constitucionais dos Estados‑Membros ou na Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem.

      O TUE modificado prevê um passo adicional na via da protecção dos direitos fundamentais ao nível da União ao determinar que a União aderirá à Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem (na qual todos os Estados‑Membros são partes), como o Parlamento há muito propugnava, o que se concretizará mediante um acordo com o Conselho da Europa. A decisão de celebração desse acordo deverá ser adoptada por unanimidade pelo Conselho (quando a Constituição previa uma maioria qualificada), após a aprovação do Parlamento Europeu.

4.5. Por outro lado, poder‑se‑iam ainda referir outros aspectos do novo Tratado que reforçam os direitos de participação dos cidadãos no processo político europeu (como a iniciativa legislativa popular ou iniciativa dos cidadãos: n.º 4 do artigo 11.º do TUE revisto), ou que contribuem para melhorar a protecção jurisdicional dos seus direitos, facilitando o acesso ao Tribunal de Justiça. O Parlamento não pode deixar de regozijar‑se com estes passos essenciais para fazer da União uma verdadeira união dos Estados e dos cidadãos.

5.   Uma delimitação clara e compreensível das competências da União:

5.1. Uma das mais questões mais momentosas que se levantavam no processo de reforma que conduziu ao Tratado de Lisboa era a de saber "quem faz o quê" na Europa. Tal clarificação é indispensável para permitir aos cidadãos entenderem bem as responsabilidades políticas a nível europeu. Ela contribuirá para um aumento da eficácia da acção da União, fornecendo igualmente uma garantia adicional a todos aqueles que receiam excessos de intervenção da União.

5.2. O Tratado Reformador mantém, nas suas grandes linhas, as disposições da Constituição relativas à delimitação das competências da União, ela própria assente na dos Tratados existentes. Todavia, a opção pela conservação dos dois actuais Tratados modificados implicou o sacrifício da unidade conceptual por que se pautava o capítulo sobre as competências da União na Parte I da Constituição. Com efeito, enquanto os princípios que regem o exercício das competências da União são previstos nas disposições gerais do TUE, a enumeração dos diferentes tipos de competências figura no TFUE, no Título I, referente às "categorias e domínios de competência da União". Embora os dois Tratados tenham o mesmo valor jurídico, esta abordagem não pode deixar de prejudicar o objectivo de assegurar a sua clareza para os cidadãos.

O novo Tratado estabelece uma definição das competências da União, que são distribuídas em três categorias distintas, cujo estatuto jurídico e grau de intervenção da União é diferenciado: as competências exclusivas da União, as competências partilhadas com os Estados‑Membros e as acções de apoio ou complementares da acção dos Estados‑Membros. Pela sua natureza específica, a política externa e de segurança comum e a coordenação das políticas económicas e de emprego merecem disposições particulares que escapam a esta classificação tripartida (cf. Anexo 1).

Essa definição das competências da União obedece ao princípio de base da atribuição das competências, isto é, a União apenas dispõe das competências que lhe são atribuídas pelos Estados‑Membros nos Tratados, com vista a atingir os objectivos por estes estabelecidos. Este princípio impede, por si só, a emergência de um qualquer super-Estado centralizado, pois implica que todas as competências cabem aos Estados, salvo se estes as transferirem para a União.

5.3. O Tratado de Lisboa não aumenta as competências da União: as "novas" competências já especificadas correspondem sobretudo a domínios em que a União já intervinha mediante artigos existentes, nomeadamente o artigo 308.º do Tratado CE, limitando‑se o novo texto a estabelecer uma base jurídica precisa para essa intervenção. Com efeito, as modificações introduzidas no TFUE correspondem, de um modo geral, à necessidade de adaptar as suas disposições aos novos procedimentos de decisão e aos novos instrumentos jurídicos (ver infra, ponto 7).

5.4. Por outro lado, o Tratado de Lisboa reforça a obrigação de a União respeitar os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade no exercício das suas competências, cuja garantia, de resto, incumbe já aos governos, a nível do Conselho, e ao Parlamento. Se a definição desses princípios retomada no novo Tratado corresponde à já existente nos Tratados em vigor, o Protocolo relativo à Aplicação dos Princípios da Subsidiariedade e da Proporcionalidade prevê novos mecanismos destinados a garantir o respeito desses princípios, nomeadamente mediante o reforço sensível do papel dos parlamentos nacionais.

5.5. Estes adquirem sobretudo o direito a ser informados em tempo útil sobre todos os projectos de actos legislativos da Comissão, os quais devem ser fundamentados relativamente aos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade. Isto dá‑lhes condições para exercerem melhor os seus direitos a nível nacional e reforça nomeadamente a sua capacidade para influenciar a acção dos respectivos governos a nível do Conselho dos Ministros. Acresce que, nos termos de um protocolo anexo ao Tratado[26], no que se refere em particular à subsidiariedade, os parlamentos nacionais podem, num prazo de oito semanas a contar da data de transmissão de um projecto, dirigir directamente às instituições da União – que os devem ter em conta – pareceres fundamentados em que exponham as razões pelas quais consideram que um projecto não obedece ao princípio da subsidiariedade. Um mecanismo dito de alerta precoce obriga mesmo a Comissão a reanalisar o seu projecto, caso um terço dos parlamentos nacionais considere que o mesmo não respeita o princípio da subsidiariedade.

A esse mecanismo, previsto já na Constituição, acrescentou a CIG de 2007 uma disposição, nos termos da qual, no quadro do processo legislativo ordinário, quando o número de pareces fundamentados corresponda a pelo menos metade dos parlamentos nacionais, a Comissão, após a reanálise, caso entenda manter o projecto, é obrigada também a justificar a sua decisão por meio de parecer fundamentado. Todos esses pareceres são, então, transmitidos aos dois ramos da autoridade legislativa, PE e Conselho, que devem apreciar a questão da subsidiariedade antes da primeira leitura. Se o PE, por maioria dos seus membros, ou o Conselho, por maioria de 55% dos Estados‑Membros, decidir apoiar a objecção dos parlamentos nacionais, o processo legislativo não avança.

Por último, o mesmo protocolo prevê também a possibilidade de os Estados‑Membros, em nome do seu Parlamento nacional ou de uma das suas câmaras (se a ordem jurídica nacional o permitir), interporem recurso perante o Tribunal de Justiça contra um acto legislativo com fundamento em violação do princípio de subsidiariedade. O Comité das Regiões adquire igualmente o direito de interpor recursos contra os actos legislativos para cuja adopção a sua consulta esteja prevista nos Tratados.

Estes mecanismos constituem importantes garantias adicionais contra o eventual exercício inconsiderado das competências da União e contribuem em larga medida para aprofundar o controlo democrático da legislação comunitária. Representam também, em particular, um reforço substancial do papel dos parlamentos nacionais.

5.6. Muito embora, para se dispor de uma visão completa das modalidades específicas de aplicação dessas competências, seja necessário conjugar esta definição com as disposições específicas das partes III e IV do TFUE, através da simples leitura das mesmas disposições os cidadãos europeus podem ter já uma noção bastante clara de quem faz o quê na Europa. Isto representa uma certa melhoria em termos de transparência, que, no entanto, poderia ser mais marcada, se o conjunto das disposições referentes às competências da União estivesse reunido num único Título do TUE, a exemplo do que se fez na Parte I da Constituição.

5.7. Pode ainda ser realçado, entre os elementos positivos, o facto de o novo Tratado assegurar a necessária flexibilidade do sistema através de uma cláusula semelhante à do actual artigo 308.º TCE (a do novo artigo 352.º do TFUE), que permite ao Conselho, se for caso disso, adoptar disposições nos domínios em que a União não dispõe explicitamente de poderes de acção. Essa cláusula de flexibilidade dá todas as garantias aos Estados‑Membros: decisão por unanimidade, e utilização tão‑só no quadro das políticas definidas nos Tratados e para produção dos fins estabelecidos nos Tratados. O seu procedimento de aplicação torna‑se mais democrático, na medida em que é submetido à aprovação do Parlamento Europeu e em que deve ser comunicado atempadamente aos parlamentos nacionais antes da adopção da decisão. Acresce que a CIG 2007 precisou ainda que as medidas fundadas nesta cláusula não podem comportar harmonização legislativa nos domínios em que os Tratados excluem essa mesma harmonização. O artigo referido não pode tão‑pouco ser utilizado na consecução de objectivos do domínio da Política externa e de segurança comum.

6.   Um quadro institucional renovado para uma União mais forte, democrática e transparente

Uma das questões essenciais que o novo Tratado deveria regular era a da adaptação das instituições da União a fim de lhes permitir fazer face à nova situação decorrente do alargamento. Com efeito, há cerca de 50 anos que a organização institucional da União continua a assentar essencialmente nas mesmas estruturas, enquanto as suas tarefas aumentaram e o número de Estados‑Membros passou de 6 para 27. Apesar das sucessivas conferências intergovernamentais, as principais questões institucionais mantinham‑se em aberto, não tendo as soluções encontradas em Nice sido satisfatórias para alguns dos que as haviam negociado. Por seu turno, o Parlamento nunca deixou de chamar a atenção da opinião pública e das autoridades dos Estados‑Membros para a necessidade de uma reforma institucional profunda, que dotasse a União de instituições eficazes, democráticas e transparentes, preservando embora o equilíbrio institucional e o método comunitário: a Comissão que propõe, o Conselho e o Parlamento que decidem, o Tribunal de Justiça que garante a aplicação dos textos adoptados.

A Constituição continha já importantes alterações institucionais que respondiam a esse propósito e que, no fundamental, não haviam sido postas em causa aquando do processo de ratificação.

Excepção feita a certas alterações, que são um corolário directo do abandono da figura de Constituição e da alteração e manutenção dos dois Tratados actuais, bem como do abandono dos elementos simbólicos ou lexicais passíveis de encerrar conotações de ordem estadual, não era de esperar que as questões institucionais viessem a estar no âmago das negociações de 2007. Com efeito, não só essas questões não haviam estado no centro dos debates públicos, designadamente nos Estados‑Membros onde o "não" triunfara, como a grande maioria dos Estados‑Membros não desejava reabrir as discussões sobre o "pacote" institucional, cientes como estavam de que tal significaria pôr em questão todo o processo. Contudo, algumas dessas questões estiveram no centro das negociações da CIG de 2007, ainda que se possa afirmar que, no essencial, o acordo estabelecido em 2004 se manteve firme.

6.1. Parlamento Europeu

(1)  O Tratado de Lisboa reforça de forma significativa o papel do Parlamento Europeu, única Instituição europeia directamente eleita pelos cidadãos:

‑ o seu papel de co‑legislador é plenamente reconhecido, não só mediante a generalização da actual co‑decisão, que se elevou à posição de processo legislativo ordinário, mas também mediante o reforço da sua participação nos processos legislativos especiais. Doravante, os cidadãos poderão ver claramente que os actos legislativos europeus são adoptados pela câmara que os representa, bem como pela câmara que representa os Estados; paralelamente, no domínio dos acordos internacionais, a sua aprovação torna‑se também uma regra geral;

‑ adquire um direito de iniciativa de revisão dos Tratados e participa no processo através da sua participação na Convenção, à qual incumbe preparar a revisão ( o Conselho só pode decidir não convocar a referida Convenção com a aprovação do Parlamento);

‑ as suas competências em matéria orçamental, que partilha em condições de igualdade com o Conselho, são alargadas à totalidade das despesas da União;

‑ as suas funções de controlo político são aprofundadas, nomeadamente através da eleição do Presidente da Comissão;

‑ diversas decisões de grande importância na vida da União, até hoje da responsabilidade exclusiva do Conselho, passam a ser submetidas à aprovação do Parlamento: a decisão de lançar uma cooperação reforçada; a utilização da cláusula de flexibilidade, que permite à União tomar medidas não previstas nos Tratados para atingir os fins que estes prescrevem; a decisão relativa à utilização das cláusulas‑ponte gerais da passagem da unanimidade à maioria qualificada ou de processos legislativos especiais ao processo legislativo ordinário; certas decisões que permitem alargar o campo de aplicação de bases jurídicas previstas nos Tratados, como as que se referem à Procuradoria Europeia ou à cooperação judiciária em matéria penal;

‑ mesmo no sector da política externa e de segurança comum, em que não tem poderes de decisão, o Parlamento Europeu adquire o direito geral a ser informado e consultado.

(2)  Em conclusão, pode dizer‑se que, apesar de persistirem alguns domínios em que se poderia ter ido mais longe, o Parlamento Europeu torna‑se um "co-decisor" em quase todos os domínios da política da União. Trata‑se, efectivamente, de concretizar a dupla legitimidade da União enquanto União de Estados e de cidadãos, que se encontra na base da construção europeia, não obstante a ausência de um reconhecimento explícito nos novos Tratados,

(3)  O número de deputados ao Parlamento Europeu foi limitado a 751[27]. O TUE revisto não prevê a repartição dos lugares por Estado‑Membro, mas encarrega o Conselho Europeu, sob iniciativa do Parlamento, e após a sua aprovação, de decidir, até às eleições de 2009, essa repartição, com base no princípio de representação degressivamente proporcional com um limite mínimo de 6 lugares e um limite máximo de 96 lugares por Estado‑Membro (a Convenção propunha um mínimo de 4 e não propunha número máximo). Trata se de uma solução que permite fazer face, com maior flexibilidade, à futura evolução da União, preservando ao mesmo tempo os interesses de cada Estado-Membro, embora, a prazo, o aumento do número mínimo para 6 venha a ser problemático.

6.2. Conselho Europeu

O Conselho Europeu é reconhecido como instituição autónoma com um papel de impulso político, mencionando o TUE expressis verbis que não exerce funções legislativas [28]. A mais importante inovação do Tratado de Lisboa, seguindo aliás a Constituição, consiste na supressão da sua Presidência rotativa de 6 meses e na sua substituição por um Presidente eleito pelos membros do Conselho Europeu por um período de 30 meses, renovável uma vez. Este Presidente terá funções de preparação e direcção dos trabalhos do Conselho Europeu, mas também de representação externa da União, a fim de melhorar a visibilidade, a continuidade e a coerência da representação da União, tanto no plano interno como externo. Certas disposições visam assegurar que o Presidente do Conselho Europeu não exerça funções executivas e evitar eventuais conflitos com o Presidente da Comissão ou com o Vice-Presidente/Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança. Só a prática mostrará se essas disposições são suficientes.

6.3. Conselho

(1)  Uma questão-chave do processo de reforma era a do processo de votação no seio do Conselho, quando este delibera por maioria qualificada. O insucesso da Cimeira de Bruxelas de Dezembro de 2003 foi, em parte, causado pelas divergências entre Estados‑Membros sobre esta questão. Para um dos relatores, a introdução do critério da população, tanto para a repartição de lugares no Parlamento Europeu como para as votações no Conselho de Ministros, encerra o risco de não garantir um sistema equilibrado, pelo que advogava o sistema de ponderação de votos para o Conselho. Contudo, na sequência do relatório Dimitrakopoulos/Leinen[29], o Parlamento Europeu optou, por larga maioria, por um sistema de dupla maioria. Assim, desde o início da Conferência Intergovernamental de 2004, que o Parlamento insistiu no facto de que uma solução aceitável aos seus olhos implicava que se aprovasse o princípio da dupla maioria dos Estados‑Membros e da população, a fim de tornar evidente a dupla legitimidade que subentende a construção da União – a que é conferida pelos Estados‑Membros e a que é conferida pelos cidadãos ‑, e que o novo procedimento torna a tomada de decisão mais fácil do que o sistema consagrado no Tratado de Nice.

(2)  O mecanismo adoptado acabou por ser o da dupla maioria, proposto pela Convenção, em vez do da ponderação dos votos. Pode também considerar‑se que, apesar do aumento dos limiares que haviam sido propostos pela Convenção (55% dos Estados, em vez de 50%, e 65% da população, em vez de 60%), o novo sistema facilita a tomada de decisão, uma vez que o sistema de ponderação em muitas combinações implicava limiares de população muito mais elevados para que a decisão fosse aprovada. Além disso, o requisito de, pelo menos, quatro Estados‑Membros para a existência de uma maioria de bloqueio tem por efeito, em muitos casos, diminuir sensivelmente o limiar dos 65% da população[30].

(3)  Infelizmente, o acrescentamento de mecanismos que tendem a retardar a entrada em vigor do novo sistema e a conceder alegadas salvaguardas a alguns Estados‑Membros que receiam que o novo sistema enfraqueça a sua posição levou a que os progressos em termos de transparência e legibilidade do sistema deixem muito a desejar... É certo que a lógica da dupla maioria é muito mais fácil de entender do que a de qualquer ponderação dos votos. Corre‑se, porém, o risco de que os cidadãos considerem os limiares fixados bastante arbitrários, além de que o aditamento dos critérios complementares atenua em grande medida os ganhos em termos de simplificação e compreensão do sistema.

(4)  A CIG de 2007 aditou mecanismos suplementares, visando vencer as resistências da Polónia à introdução do sistema acordado em 2004. Por um lado, o acordo alcançado prevê o adiamento da entrada em vigor para Novembro de 2014. Consequentemente, o sistema de Nice será aplicável até esta data. Por outro lado, um protocolo anexo ao novo Tratado prevê que, até 31 de Março de 2017, quando uma decisão deva ser adoptada por maioria qualificada, se um Estado-Membro o solicitar, o sistema de votação previsto no Tratado de Nice, actualmente em vigor, será, de qualquer modo aplicável. Ademais, a CIG de 2007 logrou igualmente um acordo tendente a reforçar o dito compromisso de Ioannina revisto por um período transitório, que havia sido já adoptado em 2004 (Declaração n° 7 à Acta Final da CIG): nos termos da Declaração de 2004, se os membros do Conselho que representem, pelo menos, ¾ do número dos Estados-Membros ou do nível da população necessários para bloquear uma decisão manifestarem a sua oposição à adopção de um acto pelo Conselho por maioria qualificada, o Conselho continuará a debater a matéria em causa, a fim de alcançar, num prazo razoável, um acordo mais lato. Prevê-se agora que este acordo, cuja duração se previa, em 2004, durasse até 2014, se aplique durante o período compreendido entre 1 de Novembro de 2014 e 31 de Março de 2017. A partir desta data, os limiares necessários para desencadear o mecanismo são reduzidos para 55% dos Estados-Membros ou da população necessária para bloquear uma decisão. Este acordo encontra-se formalizado num projecto de decisão que o Conselho Europeu aprovou e que deverá produzir efeitos no dia da entrada em vigor do novo Tratado. Na sua versão de 2004, a decisão deveria permanecer em vigor pelo menos até 2014, podendo, então, ser revogada pelo Conselho (por maioria qualificada, que se torna a regra geral de decisão no Conselho); na versão de 2007, segundo um novo protocolo, é aquela mantida por um período indeterminado, apenas podendo ser ab-rogada ou alterada após realização de um debate no Conselho Europeu, o qual deve pronunciar-se favoravelmente por consenso.

(5)  Deplorando o abandono do compromisso elaborado pela Convenção e o adiamento das decisões tomadas em 2004, afigura‑se necessário recordar que a solução alcançada foi obtida após uma discussão renhida entre os Estados‑Membros cujo objecto não deixou de suscitar algumas perplexidades: a contabilidade dos pontos de percentagem, a mais ou a menos, no peso relativo de cada Estado-Membro no sistema de voto ocultou o facto de que, na realidade, são praticamente inexistentes divisões entre todos os "grandes" Estados, por um lado, e todos os "pequenos" Estados, pelo outro. Muitas vezes, a mesma diligência visava simultaneamente objectivos contraditórios, como salvaguardar as próprias possibilidades de bloqueio, pretendendo, ao mesmo tempo, reduzir as possibilidades de bloqueio dos outros ... E, acima de tudo, todo este debate foi levado a cabo esquecendo que, afinal, a dinâmica da negociação comunitária sempre demonstrou que só muito raramente se chega a uma votação. Sendo a realidade política o que é, o Parlamento pode, no entanto, aceitar o acordo obtido pelos chefes de Estado e de Governo, não ocultando, porém, que o deplora.

(6)  Seja qual for o método de decisão, importa que seja aplicável. Daí a importância da questão do âmbito de aplicação do voto por maioria qualificada. O Tratado de Lisboa realiza progressos sensíveis nesta matéria: podem contar‑se cerca de 44 novos casos de votação por maioria qualificada em diferentes domínios (cf. Anexo 2). Em contrapartida, a unanimidade é ainda exigida em 72[31] casos. Se a tendência geral deve considerar‑se positiva, não é possível deixar de deplorar que, em certos casos, não se tenha ido mais longe.

(7)  Outra importante melhoria introduzida no Tratado de Lisboa em termos de transparência é o requisito de que as reuniões das diferentes formações do Conselho devam ser divididas em duas partes, segundo se trate de exercer a função legislativa ou outras funções, com o corolário de que, quando o Conselho delibera ou vota sobre actos legislativos, as suas reuniões são públicas. Embora tenhamos de constatar que os Estados‑Membros não seguiram a proposta da Convenção de criação de um verdadeiro Conselho legislativo autónomo, pode, no entanto, considerar‑se que o aspecto essencial dessa proposta, a garantia da publicidade e da transparência da actividade legislativa do Conselho, foi preservada.

(8)  A nível das formações e do funcionamento do Conselho, a principal inovação é a criação de um Conselho dos Negócios Estrangeiros autónomo, que será presidido pelo Alto Representante/Vice-Presidente da Comissão. Juntamente com o Conselho dos Assuntos Gerais, trata‑se das duas únicas formações do Conselho cuja existência está prevista pelo novo Tratado, que remete para uma decisão do Conselho Europeu, deliberando por maioria qualificada, o estabelecimento de outras formações.

(9)  Os esforços tendentes a modificar o actual sistema das Presidências rotativas do Conselho, por forma a assegurar uma maior visibilidade e também a coerência e a continuidade dos seus trabalhos, tiveram fracos resultados: os Estados‑Membros afastaram‑se da proposta da Convenção e acabaram por apoiar o princípio de uma rotatividade igual no interior de um sistema de Presidência por equipas fixado por decisão do Conselho Europeu, deliberando por maioria qualificada, cujos benefícios efectivos não podem exactamente prever‑se[32]. Apenas o Conselho dos Negócios Estrangeiros (e o Conselho Europeu) têm uma presidência estável.

6.4. Comissão

(1)  Outra das questões institucionais que esteve no centro dos debates, tanto da Convenção como da Conferência Intergovernamental, foi a da composição da Comissão. A solução alcançada, diferida no tempo, afasta‑se da proposta da Convenção, mas corresponde melhor à realidade política e pode considerar‑se positiva: permite respeitar a aspiração dos novos Estados‑Membros no sentido de estarem representados na Comissão nos primeiros anos da sua adesão, prevendo, num prazo razoável (2014), a indispensável redução do número de comissários (a 2/3 do número dos Estados‑Membros, o que, numa União a 27, significará já uma redução do actual número de comissários). Com base num sistema de rotação que preserva a igualdade entre os Estados‑Membros (e que deve reflectir o leque demográfico e geográfico da União), esta solução permitirá conter em limites aceitáveis a dimensão da Comissão. A frequência do período durante o qual cada Estado-Membro não designará comissário será de uma vez em três mandatos.

(2)  O Tratado de Lisboa introduz igualmente progressos importantes no que respeita à nomeação do Presidente da Comissão, que passará a ser eleito pelo Parlamento Europeu sob proposta do Conselho Europeu, deliberando por maioria qualificada. Isto constitui mais um passo na legitimação política da Comissão, mormente na medida em que o Conselho Europeu tem de ter em conta os resultados das eleições para o Parlamento Europeu e proceder "às consultas apropriadas" antes de designar o seu candidato. Posteriormente, toda a Comissão, Presidente, Alto Representante, nomeado segundo um procedimento específico (cf. infra), e os Comissários, escolhidos pelo Conselho de acordo com o Presidente designado, é submetida, enquanto colégio, a uma votação de aprovação pelo Parlamento Europeu[33]. Todo este procedimento demonstra claramente à opinião pública que a Comissão é um executivo político que necessita da confiança do Parlamento e não os "burocratas anónimos e incontrolados", como alguns pretendem.

(3)  Note‑se igualmente o reforço do papel do Presidente da Comissão, nomeadamente no que respeita à organização interna da Comissão e ao direito de solicitar a demissão de um comissário, o que vai no sentido de uma maior eficácia da Comissão.

6.5. Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança/ Vice-Presidente da Comissão

(1)  Uma das principais inovações institucionais do Tratado de Lisboa é a criação do lugar de Alto Representante da União para os Assuntos Externos e a Política de Segurança, fundindo num só lugar os já existentes de Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e de Comissário responsável pelas relações externas. Esta inovação responde ao objectivo de assegurar a coerência e a visibilidade do conjunto da acção externa. O Alto Representante tem uma dupla pasta institucional, assumindo a condução da política externa e de segurança comum da União: é nessa qualidade que preside ao Conselho dos Assuntos Externos, apresenta propostas e assegura a execução das decisões do Conselho, e, ao mesmo tempo, é Vice-Presidente da Comissão, assumindo as responsabilidades desta instituição no domínio das relações externas e coordenando todos os aspectos da acção externa da União. Será assistido por um Serviço Europeu para a Acção Externa composto por pessoal da Comissão, do Secretário-Geral do Conselho e dos serviços diplomáticos nacionais e que será criado por decisão do Conselho após parecer do Parlamento Europeu e aprovação da Comissão.

(2)  O Alto Representante é, consequentemente, Vice-Presidente da Comissão, mas tem um estatuto especial que se traduz a nível dos processos da sua nomeação e da sua demissão: é nomeado pelo Conselho Europeu, deliberando por maioria qualificada, com o acordo do Presidente da Comissão; pode ser demitido pelo Conselho Europeu segundo o mesmo processo e apresenta a sua demissão caso o Presidente da Comissão o solicite. Enquanto Membro da Comissão, deve também ser submetido à votação de investidura do colégio pelo Parlamento Europeu e à demissão colectiva, caso este último aprove uma moção de censura[34].

(3)  Estas disposições correspondem ao que o Parlamento Europeu há muito defendia: com efeito, o Alto Representante poderá reforçar a coerência e a eficácia da acção internacional da União, favorecer a emergência de uma verdadeira política externa comum, melhorar a visibilidade da União a nível internacional, dando‑lhe uma face. A tripla responsabilidade política do Alto Representante, em relação ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Presidente da Comissão é positiva. No entanto, mantém‑se a possibilidade de surgirem conflitos entre o Alto Representante e o Presidente da Comissão ou o Presidente do Conselho e o seu estatuto híbrido pode colocá‑lo em situação de conflito de lealdade entre o Conselho e a Comissão.

6.6. O Tribunal de Justiça da União Europeia

O Tratado de Lisboa reforça igualmente o papel do órgão jurisdicional da União, que designa por "Tribunal de Justiça da União Europeia", composto pelo Tribunal de Justiça, pelo Tribunal Geral e por eventuais tribunais especializados que podem ser criados por meio de regulamento[35]. Embora não haja grandes modificações no que respeita à composição e à organização do Tribunal de Justiça e do Tribunal Geral no que respeita ao processo de nomeação dos juízes e dos advogados gerais, cumpre notar a introdução de uma fase preliminar: antes de ser nomeados pelos Estados‑Membros, os candidatos indicados pelos governos serão ouvidos por um comité encarregado de avaliar a adequação dos candidatos ao exercício das suas funções. Este comité será composto por 7 membros (ex-membros do Tribunal de Justiça ou dos supremos tribunais nacionais e juristas com notórias competências), dos quais um é proposto pelo PE.

Doravante, os actos do Conselho Europeu e das agências serão submetidos a um controlo jurisdicional de legalidade. São facilitadas as condições de admissibilidade dos recursos das pessoas singulares e colectivas contra actos regulamentares. Os actos adoptados no domínio da cooperação judiciária em matéria penal e da cooperação policial podem ser objecto de recurso jurisdicional, excepto no que respeita ao controlo da validade e da proporcionalidade de operações policiais, bem como ao exercício, pelos Estados, das suas responsabilidades em matéria de manutenção da ordem pública e de protecção da segurança interna. Por último, embora os actos adoptados no domínio da política externa e de segurança comum não possam ser objecto de tal recurso, o Tribunal é, no entanto, competente para se pronunciar sobre a legalidade das decisões europeias que prevejam medidas restritivas relativamente a pessoas singulares e colectivas.

Pode igualmente pronunciar-se sobre a questão de saber se uma medida se insere no âmbito de aplicação da PESC ou releva das outras competências da União.

6.7. Outras instituições e órgãos consultivos

(1)  As disposições relativas ao Banco Central Europeu (elevado à posição de instituição da União) e do Tribunal de Contas praticamente não são alteradas, havendo, todavia, uma inovação relativamente à constituição, que reside no facto de estas duas instituições figurarem agora na lista das instituições incluídas no novo artigo 13.º do TUE revisto. Notar‑se‑á, além disso, que os membros do directório do banco passarão a ser nomeados pelo Conselho, deliberando por maioria qualificada, e não por unanimidade.

(2)  Relativamente ao Comité das Regiões e ao Comité Económico e Social, assinale-se que o Comité da Regiões adquire um direito de recurso jurisdicional por violação do princípio da subsidiariedade contra actos legislativos para cuja adopção o Tratado de Lisboa preveja a sua consulta.

* * *

Pode, assim, concluir‑se que, apesar de certos aspectos relativamente aos quais não é possível apreciar com antecedência a eficácia das modificações propostas, o Tratado de Lisboa consegue uma clarificação e um reforço da capacidade das instituições, preservando o "método comunitário" e o equilíbrio institucional, o que deverá permitir à União responder à nova situação resultante do alargamento e afirmar‑se no contexto internacional.

7.   Actos e procedimentos: um sistema mais coerente, preciso e compreensível, mas não perfeito

7.1. O novo Tratado realiza importantes progressos em termos de simplificação e racionalização dos processos de decisão e dos instrumentos de acção. São evidentes os ganhos em matéria de eficácia dos processos e de legitimação democrática. Infelizmente, os Estados‑Membros decidiram, por esse mesmo facto, deixar cair as modificações terminológicas introduzidas pela Constituição, as quais eram importantes para permitir aos cidadãos compreenderem melhor quem decide e o quê na União, e de que forma. O PE não pode deixar de lamentar este recuo, que implica uma perda significativa em termos de transparência.

7.2. A tipologia dos instrumentos jurídicos é mantida praticamente na sua forma actual, apesar de uma ligeira simplificação: são consagrados cinco tipos de instrumentos jurídicos: o regulamento, a directiva, a decisão, a recomendação e o parecer.

É mantida a distinção feita na Constituição entre actos legislativos e actos de execução, o que é muito positivo, mas a terminologia do Tratado Constitucional para os actos legislativos, lei e lei-quadro, foi, portanto, abandonada, facto que não abona a favor da transparência. Passaremos a ter actos legislativos denominados regulamentos, ou directivas, ou decisões ... e actos de execução também denominados regulamentos e directivas (ou decisões) ... sendo a ideia de uma hierarquia clara das normas, por conseguinte, abalada.

Os termos previstos na Constituição eram, com efeito, termos simples, claros, cujo qualificativo europeu/europeia aposto a cada uma das categorias permitiria aos cidadãos compreenderem do que se trata, pois têm correspondência na terminologia utilizada na maior parte dos Estados‑Membros (uma lei é um acto normativo emanado do Parlamento, o regulamento é um acto normativo do Executivo ou da administração local), pondo fim à confusão e à imprecisão terminológica até hoje reinantes. Em vez disso, para designar os actos legislativos, manter‑se‑ão os termos "regulamentos" e "directivas", que também serão utilizados para os actos não legislativos, acrescentando‑lhes o qualificativo "de execução" (ou "delegados") para os distinguir dos actos legislativos. Mantém‑se, por conseguinte, uma linguagem obscura, susceptível de comunicar ao cidadão uma noção de emanação de um poder burocrático e não transparente, além de enganoso, cujo paradoxo mais evidente (pelo menos, para os países que utilizam esta terminologia) é o de designar regulamento um acto legislativo!

7.3. O novo Tratado, apesar das dificuldades terminológicas mencionadas, estabelece igualmente uma hierarquia das normas. É claramente enunciada a supremacia dos actos legislativos sobre os actos executivos. E, embora a regra geral seja a de que a execução das decisões europeias cabe aos Estados‑Membros, a Comissão é claramente reconhecida como o Executivo europeu, ao qual incumbe tomar as medidas necessárias para a execução dos actos legislativos a nível europeu, assumindo o Conselho apenas excepcionalmente funções executivas, caso o Tratado expressamente o determine, ou quando os actos legislativos o especifiquem e o fundamentem.

7.4. A criação de uma categoria de regulamentos delegados, confiados à Comissão pela autoridade legislativa (Parlamento Europeu e Conselho), poderá contribuir para a eficácia da acção pela União, pois permitirá libertar o legislador de pormenores de natureza técnica que o Executivo tem maior capacidade para tratar de forma rápida e adequada. Acresce que é acompanhada pelas indispensáveis garantias de controlo por parte da autoridade legislativa (nomeadamente, através de dois mecanismos que lhe permitem, quer bloquear a adopção de uma medida pela Comissão, quer revogar a delegação dos poderes), assegurando‑se a total paridade entre o Parlamento Europeu e o Conselho[36].

Encontramo‑nos, assim, perante uma hierarquia normativa em que os regulamentos, as directivas e as decisões (propriamente ditos) são actos legislativos, os regulamentos e as directivas de execução são actos normativos do Executivo, que dão execução aos actos legislativos, enquanto as decisões podem ser também quer actos de natureza eminentemente política (a decisão do Conselho de recorrer a uma cláusula de "passerelle", por exemplo), quer actos individuais de execução.

7.5. Os novos processos legislativos: o Tratado de Lisboa destaca claramente o processo legislativo ordinário (que corresponde à actual co-decisão). Trata‑se do processo legislativo por excelência, sendo os outros concebidos como excepções ("processos legislativos especiais") que devem ser expressamente previstas nos Tratados. Este processo define‑se pela iniciativa da Comissão (excepto em certas matérias do domínio do espaço de liberdade, de segurança e de justiça em que a partilha com ¼ dos Estados‑Membros, no mínimo) e a co-decisão do Parlamento Europeu e do Conselho (algumas modificações de pouco alcance introduzidas no anterior processo de co-decisão visam justamente sublinhar a paridade total entre estas duas instituições), deliberando o Conselho por maioria qualificada.

7.6. O âmbito de aplicação do processo legislativo ordinário foi sensivelmente alargado: cerca de cinquenta novas bases jurídicas (elevando‑se, assim, o número total a 86), algumas de enorme importância como as referentes ao espaço de liberdade, segurança e justiça, as políticas agrícolas e da pesca, o espaço de investigação europeu, a definição das competências de execução (até hoje regulada pela decisão-quadro relativa à comitologia) ou o actual "regulamento financeiro" (cf. Anexo 3). Em todos estes domínios, o Conselho deixa de poder decidir só, mas tão‑só de acordo com o Parlamento.

7.7. São ainda pouco numerosos os casos de processos legislativos especiais em que uma das instituições adopta o acto com a participação de outra instituição ‑ que pode ir da aprovação ao simples parecer ‑ e, por vezes, não é possível compreender a escolha deste tipo de processo senão como resultado de concessões feitas durante as negociações das Conferências Intergovernamentais. Recenseamos 3 casos de actos legislativos (regulamentos) do Parlamento Europeu que são adoptados com a aprovação do Conselho[37]. Por seu turno, os casos de actos legislativos do Conselho elevam‑se a 28[38]. O acto legislativo que contém o orçamento anual é objecto de um processo especial de decisão conjunta do Parlamento Europeu e do Conselho (cf. infra, ponto 8).

7.8. Apesar destas excepções, é inegável que o Tratado de Lisboa introduz progressos nítidos em termos de eficácia e de legitimação democrática da legislação europeia. Aliás, a estes progressos vêm acrescentar‑se progressos muito semelhantes em matéria de adopção dos acordos internacionais celebrados pela União, graças à extensão do processo de votação por maioria qualificada no Conselho e ao requisito da aprovação do Parlamento Europeu (por exemplo, no que respeita aos acordos de aplicação da política comercial comum).

8.   As finanças da União

8.1. Uma das questões mais polémicas, tanto na Convenção como na Conferência Intergovernamental de 2004, foi a reforma do sistema das finanças da União e, designadamente, o processo orçamental. Tratava‑se de institucionalizar um sistema que permitisse, no futuro, financiar a União de forma adequada, transparente e democrática e, em especial para o Parlamento Europeu, de consolidar as suas competências na qualidade de ramo da autoridade orçamental, dando‑lhe uma palavra decisiva relativamente à totalidade do orçamento da União, incluindo as despesas até hoje designadas "obrigatórias", como, por exemplo, as despesas relativas às políticas comuns da agricultura e da pesca. O resultado definitivo, embora globalmente positivo, foi um pouco contrariado pela Conferência Intergovernamental de 2004, que não seguiu completamente as propostas da Convenção. Em contrapartida, este tema nunca foi submetido a discussão nas negociações de 2007.

8.2. A Convenção havia proposto um modelo de três "patamares", simples e equilibrado:

‑   o Conselho continuaria a adoptar, por unanimidade (com a aprovação subsequente dos Estados‑Membros, em conformidade com as respectivas normas constitucionais), os elementos essenciais e o limite máximo dos recursos próprios[39]; O PE apenas tem o poder de emitir parecer;

‑   o Parlamento Europeu e o Conselho adoptariam em conjunto as Perspectivas Financeiras, que seriam constitucionalizadas sob a designação de "quadro financeiro plurianual" (o Conselho deliberaria por maioria qualificada a partir do primeiro quadro financeiro posterior à entrada em vigor da Constituição);

‑   as duas instituições adoptariam em conjunto o orçamento anual: após uma primeira leitura em cada instituição que poderia levar à convocação de um comité de conciliação, o Parlamento teria a última palavra em caso de desacordo, desde que reunisse uma ampla maioria, na falta da qual a posição do Conselho teria prevalência.

8.3. Isto significava que os Estados‑Membros continuavam a deter a chave essencial da definição do montante e da natureza das receitas da União, que os dois ramos da autoridade orçamental deveriam procurar chegar a um acordo sobre a programação das despesas e que, em caso de desacordo relativamente ao orçamento anual, o Parlamento Europeu poderia ter a última palavra relativamente à totalidade das despesas (sendo suprimida a distinção entre despesas obrigatórias e despesas não obrigatórias), dentro das balizas dos limites máximos do quadro financeiro. Na prática, as duas instituições eram muito incitadas à conciliação.

8.4. Uma grande parte dos Estados‑Membros pôs em causa este sistema equilibrado, tendo‑se assistido, ao longo da Conferência Intergovernamental de 2004, à apresentação de propostas que chegavam a pôr gravemente em causa os actuais poderes do Parlamento Europeu neste domínio, sendo mesmo susceptíveis de destruir a ideia da democracia financeira na União. Graças designadamente aos esforços dos representantes do Parlamento Europeu e das Presidências italiana e irlandesa, foi possível chegar a um compromisso que preserva, no essencial, os direitos do Parlamento na matéria. Este compromisso não foi posto em causa em 2007. As únicas alterações introduzidas neste capítulo resultam do lamentável abandono da terminologia relativa aos actos legislativos prevista na Constituição[40]:

‑   mantiveram‑se as propostas da Convenção no que diz respeito aos recursos próprios;

‑   o quadro financeiro continua a ser adoptado pelas duas instituições, mas o Conselho deliberará por unanimidade até que o Conselho Europeu, por unanimidade, decida que o Conselho pode deliberar por maioria qualificada;

‑   o orçamento anual é, também ele, adoptado conjuntamente pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho, mas, em caso de desacordo entre as duas Instituições, o processo deverá recomeçar com a apresentação, pela Comissão, de um novo projecto de orçamento[41].

8.5. Esta solução preserva, conforme referido, o essencial dos poderes orçamentais do Parlamento Europeu, ao qual é reconhecida uma palavra decisiva sobre a totalidade do orçamento devido ao abandono da distinção entre despesas obrigatórias e despesas não obrigatórias. No entanto, a manutenção da unanimidade para a adopção do quadro financeiro plurianual complica seriamente as futuras negociações e enfraquece o incitamento à concertação orçamental entre as instituições que a proposta da Convenção pressupunha.

9.   Progressos nas políticas sectoriais

As disposições relativas às alterações introduzidas nas políticas da União estão contidas no TFUE (à excepção das regras gerais relativas à acção externa e das disposições relativas à PESC, que se encontram consignadas no TUE). A Parte III contém as disposições relativas às "Políticas e acções internas da União", a Parte IV "A associação dos Países e Territórios Ultramarinos" e a Parte V "A acção externa da União". O novo Tratado limita‑se praticamente a introduzir alterações processuais às disposições dos actuais Tratados relativamente à definição e à aplicação das políticas sectoriais e, em especial, as bases jurídicas para a acção da União em cada domínio. Pode eventualmente considerar‑se que muitas dessas disposições poderiam ter sido simplificadas ou adaptadas às mudanças verificadas desde a sua redacção. Mas a verdade é que o mandato que o Conselho Europeu havia conferido na altura à Convenção não a habilitava para proceder a uma revisão em profundidade dessas disposições. A CIG de 2004 não o fez, e no processo de reinício das negociações em 2007 não existiam, na realidade, condições políticas para reabrir esse pesado dossiê.

Assim, as modificações introduzidas nas políticas da União decorrem essencialmente das alterações estruturais, institucionais e processuais introduzidas pelo novo Tratado, como as que respeitam à supressão dos "pilares", à definição das competências da União, às instituições, aos processos de decisão e aos instrumentos jurídicos. A nível do conteúdo das políticas, não há muitas novidades propriamente ditas, sendo o domínio do espaço de liberdade, segurança e justiça (grosso modo, o ex‑"terceiro pilar") e as relações externas, em especial a Política Externa e de Segurança Comum, os sectores relativamente aos quais as modificações são mais sensíveis. Nas demais políticas sectoriais elas dizem essencialmente respeito aos processos aplicáveis e à repartição das bases jurídicas entre actos legislativos e não legislativos, o que, em si, pode constituir uma garantia de maior eficácia, legitimação democrática e transparência da acção da União, tendo em conta o carácter positivo das modificações que analisámos anteriormente. É verdade que algumas das novas bases jurídicas pareciam reconhecer, na Constituição, competências aparentemente novas, mas tratava‑se sobretudo de domínios em que a União já actuava mediante a utilização de outros artigos, incluindo o artigo 308.º, tratando‑se assim, essencialmente, de clarificar o modo como a União utiliza as suas competências (nomeadamente nos domínios da energia, da saúde, do espaço, do desporto, do turismo, etc.). Estas novas disposições foram mantidas com algumas modificações. Além disso, foram introduzidas duas importantes inovações relativas à luta contra as alterações climáticas e à solidariedade no domínio da energia, dois problemas que afectam particularmente os cidadãos europeus e nos quais a acção da União poderá ter um valor acrescentado evidente. Mais do que de novas competências, trata-se, neste contexto, de novos objectivos. Por outro lado, cabe referir a introdução de um capítulo inicial que agrupa as "cláusulas horizontais" aplicáveis transversalmente a todas as políticas. Passaremos em revista os aspectos principais dessas modificações a fim de compreender se permitem à União agir de forma mais eficaz e mais democrática nos domínios em causa.

9.1. Espaço de liberdade, segurança e justiça

(1)  Em termos de políticas internas, é no domínio do espaço de liberdade, segurança e justiça que o Tratado de Lisboa é mais inovador, nomeadamente graças à supressão da estrutura por pilares e à integração da cooperação judiciária em matéria penal e da cooperação policial (que se integravam até hoje no "terceiro pilar") na lógica "comunitária", mediante a generalização do processo legislativo ordinário e da votação por maioria qualificada. Era já o caso no Tratado Constitucional, mas o Tratado de Lisboa veio ainda alterar sensivelmente este domínio, doravante essencial da construção europeia.

A comunitarização do ex‑"terceiro pilar não impede que persista um certo particularismo institucional: a definição, pelo Conselho Europeu (por consenso), das orientações estratégicas da programação legislativa e operacional, sem que o Parlamento seja associado, a partilha da iniciativa legislativa entre a Comissão e um quarto dos Estados‑Membros (e não um só Estado‑Membro como actualmente) no domínio da cooperação judiciária em matéria penal e da cooperação policial, o reforço do papel dos Parlamentos nacionais, nomeadamente quanto ao controlo do respeito do princípio de subsidiariedade (um quarto dos parlamentos nacionais para lançar o alerta precoce, em vez de um terço) à avaliação da execução das políticas da União neste domínio e ao controlo da actividade da Eurojust e da Europol.

(2)  Os objectivos das políticas neste domínio são clarificados, tendo a sua definição sido aprofundada. A acção da União na matéria é explicitamente subordinada aos direitos fundamentais. O acesso à justiça é consagrado como objectivo geral. O reconhecimento mútuo dos diferentes sistemas e a aproximação das legislações são reconhecidos como dois meios justapostos para a realização das políticas.

As políticas de asilo e de imigração, de controlo nas fronteiras e de vistos são reconhecidas como políticas comuns da União e regem‑se por princípios de solidariedade e de partilha equitativa das responsabilidades entre os Estados‑Membros.

O novo Tratado consagra igualmente notáveis avanços em matéria de cooperação judiciária em matéria civil e de cooperação judiciária em matéria penal, bem como em matéria de cooperação policial, graças sobretudo à aplicação do processo legislativo ordinário.

(3)  Assim sendo, a cooperação judiciária civil é alargada a todas as matérias com incidência transfronteiriça e baseia‑se no reconhecimento mútuo das decisões judiciárias e extrajudiciárias, aplicando‑se o processo legislativo ordinário às eventuais medidas de aproximação das legislações, excepto em matéria de direito da família em que a unanimidade é a regra (regulamento do Conselho com simples parecer do Parlamento Europeu). Contudo, o Conselho, mediante o parecer do PE, pode decidir, por unanimidade, alargar o processo legislativo ordinário a certos aspectos do direito de família que tenham incidência transfronteiriça, se nenhum Parlamento nacional manifestar oposição.

(4)  Em matéria de cooperação judiciária em matéria penal, a grande inovação é o facto de se prever o processo legislativo ordinário (maioria qualificada) para a aproximação das legislações, tanto no âmbito processual (regras mínimas para permitir o reconhecimento mútuo dos julgamentos e das decisões judiciárias, etc.) como no âmbito do direito penal material: regras mínimas para a definição de certos crimes graves e de dimensão transfronteiriça enumerados no TFUE, bem como das sanções. O novo Tratado prevê mesmo que o Conselho, por unanimidade, com a aprovação do PE, possa identificar outros domínios do processo penal, bem como outros domínios da criminalidade, nos quais se possa aplicar o processo legislativo ordinário.

Esta evolução suscitou fortes resistências por parte de certos Estados‑Membros, apesar da garantia de que a legislação europeia neste domínio deve respeitar os aspectos fundamentais do sistema jurídico dos Estados‑Membros. Assim, a fim de permitir chegar a um acordo, a Conferência Intergovernamental de 2004 havia previsto um mecanismo de "travão de emergência", que ainda foi reformulado durante as negociações de 2007, susceptível de dar todas as garantias requeridas aos Estados‑Membros que sintam dificuldades na matéria, sem, contudo, bloquear completamente as possibilidades de evolução: caso um Estado‑Membro considere que uma proposta legislativa afecta "aspectos fundamentais do seu sistema de justiça penal", pode solicitar a consulta do Conselho Europeu. O Conselho Europeu dispõe de um prazo de quatro meses para, por consenso, submeter a questão ao Conselho a fim de que o processo continue. Se o desacordo persistir no final deste período de 4 meses, será imediatamente lançada uma cooperação reforçada nesta matéria, com base na proposta legislativa em causa, caso 9 Estados‑Membros o desejem.

(5)  O Parlamento Europeu pode igualmente regozijar‑se com o facto de o novo Tratado ter aprovado a proposta da Convenção no sentido da criação de uma Procuradoria Europeia competente para lutar contra as infracções lesivas dos interesses financeiros da União e que poderá perseguir os responsáveis pelas mesmas, apesar da veemente oposição de várias delegações durante a CIG 2004. Continua a ser requerida a unanimidade para a aprovação do regulamento europeu que a institui, após a aprovação do Parlamento Europeu, tal como na Constituição, mas nas negociações de 2007 foi introduzida uma cláusula simétrica à mencionada no parágrafo anterior, que se poderá designar de "acelerador de urgência": na ausência de unanimidade no Conselho, um grupo de 9 Estados‑Membros, no mínimo, pode solicitar que o projecto seja apresentado ao Conselho Europeu; caso se forme um consenso no seio do Conselho Europeu, este reenviará o projecto ao Conselho para que o processo prossiga; se, ao fim de 4 meses, não se tiver formado consenso no Conselho Europeu, 9 Estados‑Membros, no mínimo, podem solicitar que se passe automaticamente a uma cooperação reforçada.

Por outro lado, uma cláusula "passerelle" prevê a possibilidade da extensão das atribuições da Procuradoria Europeia à luta contra a criminalidade grave de dimensão transfronteiriça, mediante uma decisão europeia adoptada pelo Conselho por unanimidade, após aprovação do Parlamento Europeu.

(6)  Por último, em matéria de cooperação policial verifica‑se também a introdução do processo legislativo ordinário, muito embora a unanimidade continue a ser regra para a cooperação operacional e para a intervenção das autoridades competentes de um Estado‑Membro no território de outro Estado‑Membro. Tal como no caso da Procuradoria Europeia, a CIG 2007 acrescentou um "acelerador de urgência" que, em caso de bloqueio do processo, abre caminho a uma cooperação reforçada se 9 Estados‑Membros, no mínimo, o desejarem.

(7)  Para concluir, importa ainda recordar que, por iniciativa sobretudo do Reino Unido, cuja posição especial em matéria de justiça e assuntos internos já era anteriormente reconhecida (tal como a da Irlanda e, em diferente medida, a da Dinamarca[42], foram introduzidas, através de protocolos, medidas específicas que confirmam este estatuto especial. Com efeito, como contrapartida do seu acordo, o Reino Unido exigiu a introdução de alterações aos dois protocolos que reconhecem a especificidade da situação do Reino Unido e da Irlanda (que, de certo modo, é obrigada a seguir aquele Estado, dado o conteúdo dos acordos particulares que ligam os dois Estados‑Membros nesta matéria), no que diz respeito ao desenvolvimento do espaço de liberdade, segurança e justiça e, em especial, às medidas de desenvolvimento do acervo de Schengen.

A posição destes dois Estados-Membros decorre de factores especiais, a saber: são ilhas, não têm bilhete de identidade para os seus residentes e têm um sistema de "common law".

Assim, o regime derrogatório já existente para o Reino Unido e a Irlanda no domínio da política de imigração, de asilo e de vistos, bem como da cooperação judiciária civil, foi alargado à cooperação judiciária em matéria penal e à cooperação policial[43]. No que respeita ao acervo de Schengen, em relação ao qual o Conselho aceitara que o Reino Unido e a Irlanda participem numa base casuística, desde que participem também no desenvolvimento destas medidas parciais, os dois Estados‑Membros não serão obrigados a participar nessas medidas de desenvolvimento se não o desenharem. No entanto, podem ver‑se afastados de todo ou parte do domínio de Schengen em causa, se o Conselho, o Conselho Europeu ou, em última análise, a Comissão assim o decidirem[44].

Por outro lado, no que diz respeito à transição para o novo regime jurídico dos actos do ex‑terceiro pilar, nomeadamente a sua submissão ao controlo jurisdicional do Tribunal de Justiça e ao controlo da Comissão, o Reino Unido obteve um aditamento ao protocolo relativo às disposições transitórias, que especificava que as medidas nos domínios da cooperação em matéria penal e policial já existentes à data da entrada em vigor do novo Tratado fiquem isentas deste requisito durante um período que pode ir até 5 anos (ou até que estes actos sejam modificados segundo os novos processos). O Reino Unido pode mesmo, antes de expirado este período de 5 anos, optar por não aceitar o novo regime destes actos, mas, nesse caso, todos os actos existentes neste domínio deixam de ser aplicáveis ao Reino Unido, que poderá mesmo ser obrigado a suportar as consequências financeiras "que decorram, necessária e inevitavelmente, da cessação da sua participação nos referidos actos", se o Conselho assim o decidir[45].

9.2. Outras políticas internas

(1)  Para além da introdução de algumas bases jurídicas novas correspondentes às "novas" competências ‑ ou melhor definidas ‑ na Parte I, as modificações introduzidas pelo novo Tratado no âmbito das demais políticas sectoriais surgem sobretudo em consequência da consagração da co-decisão (e, consequentemente, da votação por maioria qualificada) como processo legislativo ordinário e da "repartição" entre actos legislativos e executivos como actualmente definidos.

(2)  Entre as mudanças mais significativas ressaltam as atinentes à política agrícola e à política da pesca: aplicar‑se‑á o processo legislativo ordinário à adopção dos actos legislativos que estabelecem as regras das organizações comuns dos mercados agrícolas, bem como as outras disposições necessárias à prossecução dos objectivos da política comum da agricultura e da pesca (actualmente, o Parlamento Europeu apenas dispõe do direito a ser consultado). Isto significa que as linhas de orientação das políticas comuns da agricultura e da pesca passarão igualmente a ser definidas pelo Parlamento Europeu, e não deixadas apenas aos ministros da agricultura. Em contrapartida, a definição dos preços, dos direitos niveladores, das ajudas e das limitações quantitativas, bem como a repartição das quotas de pesca, inserem‑se nos actos executivos, sendo da responsabilidade do Conselho através de regulamentos ou de decisões de execução.

(3)  À política de investigação e desenvolvimento tecnológico vem acrescentar‑se um novo vector, a política espacial. O programa‑quadro de investigação, doravante um acto legislativo, será adoptado por maioria qualificada. Será simultaneamente criado um espaço de investigação europeu ‑ em que os investigadores, os conhecimentos científicos e as tecnologias poderão circular livremente ‑ cuja aplicação se processará através de regulamentos adoptados segundo o processo legislativo ordinário. Um programa espacial europeu poderá ser igualmente adoptado segundo o processo legislativo ordinário.

(4)  O novo título referente à energia visa, entre outros, o objectivo de assegurar o funcionamento do mercado da energia e a segurança do abastecimento, bem como promover a eficácia energética e o desenvolvimento de energias renováveis. Contudo, o novo Tratado introduziu uma limitação à acção da União que não poderá afectar o direito de um Estado‑Membro a determinar as condições de exploração dos seus recursos energéticos, a sua escolha entre diferentes fontes de energia e a estrutura geral do seu abastecimento energético. Por outro lado, embora o processo legislativo ordinário e a votação por maioria qualificada sejam a regra neste domínio, a CIG prevê que qualquer medida, mormente de natureza fiscal, deve ser tomada por lei do Conselho, adoptada por unanimidade, após consulta do Parlamento. No entanto, o Conselho pode, por unanimidade, tomar uma decisão que torne o processo legislativo ordinário aplicável a esses domínios. Por fim, na sequência do debate público que decorreu nos últimos dois anos, a CIG de 2007 introduziu uma referência específica a solidariedade entre os Estados‑Membros no domínio da energia, tal como desejado pelo PE.

(5)  Na CIG 2007, os Estados‑Membros chegaram igualmente a acordo sobre a necessidade de acrescentar uma referência específica à luta contra as alterações climáticas, dando assim à União uma base jurídica mais específica, que lhe permite empreender acções vinculativas nesta matéria.

(6)  Em matéria de saúde pública, o novo Tratado acrescenta à luta contra os grandes flagelos transfronteiriços: a vigilância, o alerta e a luta contra as ameaças transfronteiriças graves para a saúde. Entre outros aspectos, a União deve igualmente estabelecer medidas que fixem normas elevadas de qualidade e segurança dos produtos médicos, assim como medidas de protecção da saúde pública no que se respeita ao tabaco e ao álcool. Sublinhe‑se que o novo Tratado precisa que a acção da União neste domínio é conduzida no respeito das responsabilidades dos Estados‑Membros em matéria de definição da sua política de saúde, que incluem a gestão dos serviços de saúde e dos cuidados médicos, bem como a atribuição dos recursos que lhes são afectados.

(7)  É de deplorar que o texto finalmente adoptado não consagre modificações mais substanciais em termos de política social, nomeadamente no que respeita à extensão da maioria qualificada (não há modificações relativamente à situação actual). Contudo, não seria exacto afirmar que o Tratado de Lisboa contém recuos em matéria social. Pelo contrário, observam‑se alguns progressos. Assim, para além de classificar a política social entre as competências partilhadas e de indicar expressamente que a União pode tomar iniciativas de coordenação das políticas sociais dos Estados‑Membros, o novo Tratado dá alguns passos em frente em matéria de:

‑ o reconhecimento do "pleno emprego" e do "progresso social", entre os objectivos da União consagrados no preâmbulo da Constituição;

‑ a introdução, entre as "disposições de aplicação geral" (na Parte I do TFUE), de uma "cláusula social" de carácter horizontal, segundo a qual a União tem de ter em conta, na definição e aplicação de todas as políticas, as exigências ligadas à promoção de um nível de emprego elevado e à garantia de uma protecção social adequada, à luta contra a exclusão social, bem como um "nível elevado de educação, de formação e de protecção da saúde humana";

‑ a criação de uma base jurídica que permite o reconhecimento e a preservação dos serviços de interesse económico geral; além disso, a CIG 2007 veio acrescentar, neste contexto, um protocolo relativo aos serviços de interesse económico geral, que precisa a especificidade do regime destes serviços, além de precisar claramente que nada nos Tratados contraria as competências dos Estados‑Membros no que respeita à prestação de "serviços não económicos de interesse geral", ou seja, os serviços públicos em sentido estrito;

‑ o reconhecimento explícito no TFUE do papel dos "parceiros sociais" e nomeadamente da cimeira social tripartida para o crescimento e o emprego, que contribui ao diálogo social.

(8)  Note‑se, enfim, que o processo legislativo ordinário será aplicado relativamente às medidas de segurança social que visam o direito às prestações para os trabalhadores migrantes, assalariados e não assalariados. Isto será combinado com um outro "travão de emergência": caso um Estado‑Membro considere que essas medidas podem afectar "aspectos importantes do seu sistema de segurança social, nomeadamente no que diz respeito ao seu campo de aplicação, ao seu custo ou à sua estrutura financeira ou afecta o equilíbrio financeiro", pode solicitar que o Conselho Europeu seja consultado sobre a questão (o que implica a suspensão do processo legislativo). O Conselho Europeu deve, no prazo de quatro meses, enviar a questão ao Conselho para que o processo continue ou solicitar à Comissão a apresentação de uma nova proposta. Neste caso, tal como em caso de não actuação, considera‑se que o acto inicialmente proposto não foi adoptado.

(9)  Paralelamente, verifica‑se que o Tratado Reformador não introduz alterações em matéria de fiscalidade, mantendo‑se a unanimidade a regra geral nesse domínio, embora as passagens, bastante limitadas, ao processo legislativo ordinário (e, consequentemente, à maioria qualificada) propostas pela Convenção em matéria de medidas de cooperação administrativa e de luta contra a fraude e a evasão fiscal ilegal (mediante constatação pelo Conselho, por unanimidade, de que as medidas propostas se enquadrariam nesse âmbito) não tenham sido aprovadas pela CIG.

(10) Outro domínio que esteve no centro das discussões, mas cujas modificações são mais modestas, é o da governação económica. No entanto, sublinhe‑se a confirmação, a nível das competências da União, da coordenação das políticas económicas e do emprego (embora a CIG 2004 tenha modificado o texto da Convenção por forma a realçar o facto de que são os Estados‑Membros que coordenam as suas políticas segundo modalidades definidas no seio da União), acompanhada de um ligeiro reforço da posição da Comissão, e o reforço das disposições específicas nos Estados‑Membros cuja moeda é o euro: por exemplo, a decisão do Conselho relativa à adopção do euro por novos Estados‑Membros (proposta pela Comissão) deve ser precedida de uma recomendação aprovada por maioria qualificada pelos Estados‑Membros cuja moeda é já o euro.

Por outro lado, as modalidades de funcionamento do Eurogrupo são precisadas num Protocolo em anexo. O novo Tratado contém igualmente uma declaração sobre o Pacto de Estabilidade e Crescimento. O Pacto deu, aliás, origem a veementes discussões entre certas delegações, no decurso da CIG de 2004, que conduziram à adopção de algumas modificações ao texto da Convenção, que se traduzem, nomeadamente, na atenuação do papel proposto para a Comissão no que respeita ao procedimento relativo aos défices excessivos (devendo as recomendações dirigidas pelo Conselho ao Estado‑Membro interessado ser tomadas com base numa simples recomendação da Comissão, como actualmente, e com base não numa proposta, como propunha a Convenção).

9.3. A política externa e de segurança comum

(1)  O campo de acção externa da União sofreu igualmente profundas modificações, nomeadamente no plano institucional. No entanto, este é também um domínio no qual, no que respeita à estrutura, o Tratado de Lisboa se distancia muito do texto do Tratado Constitucional.

Com efeito, a CIG de 2004 seguira a Convenção no que respeita à unidade estrutural da totalidade das disposições respeitantes à acção externa da UE, as quais, à excepção dos dois artigos que definem princípios gerais contidos na Parte I, haviam sido reunidas no Título V da Parte III da Constituição intitulado "Acção Externa da União". No entanto, o Tratado de Lisboa reuniu no Título V do TUE as disposições gerais relativas a acção externa da União, bem como a totalidade das disposições respeitantes à PESC, incluído as relativas à defesa, sendo o restante das disposições relativas aos outros sectores da acção externa (política comercial comum, cooperação com países terceiros, ajuda humanitária...) integradas na Parte V do TFUE. O facto de ambos os Tratados possuírem o mesmo valor jurídico – como ambos o recordam nos seus primeiros artigos[46] ‑ parece salvaguardar os progressos resultantes da supressão da estrutura de pilares e limitar a eventual perda de coerência das suas disposições, assim como o perigo de o domínio intergovernamental da PESC "vir contaminar" o domínio mais "comunitarizado" do resto das relações externas; contudo, será necessário um esforço constante de interpretação de conjunto de ambos os Tratados para assegurar aqueles progressos e evitar estes perigos. Viva a clareza!

Em contrapartida, o Tratado de Lisboa conservou, se não na forma, pelo menos, na substância, a principal inovação de carácter institucional que o Tratado Constitucional trouxera: cria um Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, que substitui o Ministro dos Negócios Estrangeiros previsto no Tratado Constitucional, deixando praticamente intactas as suas funções e competências (cf. supra, ponto 6.5.). Este Alto Representante, com uma "dupla pasta" institucional e ao qual cumpre dirigir a Política Externa e de Segurança Comum e coordenar todas as relações externas da União, constitui a principal inovação trazida pelo novo Tratado ao nível das relações externas da União. O Parlamento espera que este novo cargo possa, de facto, contribuir para garantir uma maior coerência e eficácia da acção externa da União; porém, muito dependerá das relações que se venham a estabelecer entre o Alto Representante, o Presidente da Comissão e o novo Presidente eleito do Conselho.

No que respeita à Política Externa e de Segurança Comum, que continua a ser fundamentalmente um domínio de acção intergovernamental no qual o papel do Conselho Europeu é preponderante, a unanimidade permanece a regra, sendo a maioria qualificada de aplicação apenas no que respeita à execução das decisões tomadas pelo Conselho Europeu (ou de propostas apresentadas pelo Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, a pedido do Conselho Europeu) ou pelo Conselho. Mesmo neste caso, está previsto um "travão de emergência" nos casos em que um Estado se oponha à aprovação de uma decisão por maioria qualificada por "razões políticas vitais". Aquando da CIG de 2004, várias foram as propostas que visavam ir mais longe em matéria de maioria qualificada, mas nenhuma, nem as da Convenção (maioria qualificada para as propostas apresentadas pelo Alto Representante com o apoio da Comissão), nem as da Presidência italiana (maioria qualificada para todas as propostas do Alto Representante) conseguiram vencer a oposição de um certo número de Estados‑Membros. No entanto, o novo Tratado conserva uma "passerelle" específica no domínio da PESC, já prevista na Constituição, que confere ao Conselho Europeu a possibilidade de decidir por unanimidade aplicar a maioria qualificada noutros casos (excepto no que se refere a decisões que tenham implicações militares ou a decisões no domínio da defesa).

É fácil compreender que a aplicação desta "passerelle" enfrentará grandes dificuldades.

Por seu turno, o Parlamento Europeu adquire, de um modo geral, o direito de ser informado, ou mesmo consultado, bem como o direito de controlo (perguntas, debates) e, ainda, o de aprovar o orçamento PESC. A competência do Tribunal de Justiça em matéria de Política Externa e de Segurança Comum está limitada à delimitação entre a PESC e os restantes sectores de acção da UE, bem como à fiscalização da legalidade das decisões que estabeleçam medidas restritivas contra pessoas singulares.

Em suma, embora se possa lamentar que não se tenham dado passos suplementares, nomeadamente em matéria de decisão por maioria qualificada, importa compreender, de forma realista, que, no estado actual da integração europeia, a política externa está de tal forma ligada ao núcleo fundamental das competências nacionais que não será possível esperar que exista uma verdadeira política externa comum sem que todos os Estados‑Membros manifestem essa vontade política. O grande contributo do novo Tratado é sobretudo a criação das condições institucionais para incitar os Estados‑Membros à concertação, tentar definir uma abordagem comum para os problemas internacionais que a exijam e a consultar‑se reciprocamente antes de levarem a cabo acções unilaterais que possam prejudicar os interesses comuns.

(2)  É no domínio específico da política de segurança comum que o novo Tratado permite maiores progressos, tendo a Conferência Intergovernamental de 2004 consagrado importantes avanços que foram mesmo além do proposto pela Convenção e que foram praticamente retomados nas negociações de 2007.

Assim, a perspectiva de uma defesa comum ou, pelo menos, a definição de uma política de defesa comum, cujos princípios haviam já sido consagrados no Tratado de Maastricht, torna‑se mais realista[47]. Esta política comum de defesa confere à União uma capacidade operacional com base em meios civis e militares. As principais inovações neste domínio são as seguintes:

‑ actualização dos objectivos das "missões de tipo Petersberg"[48];

‑ criação de uma Agência Europeia da Defesa ("Agência no domínio do desenvolvimento das capacidades de defesa, da investigação, da aquisição e do armamento")[49];

‑ possibilidade de criação, por decisão do Conselho, por maioria qualificada, de uma cooperação estruturada permanente em matéria de defesa entre os Estados‑Membros que dispõem de capacidades militares e vontade política de a ela aderir (um Protocolo anexo à Constituição define as condições de aplicação dessa cooperação estruturada);

‑ definição da obrigatoriedade de ajuda e da assistência mútua entre os Estados‑Membros, por todos os meios, caso um Estado‑Membro seja objecto de uma agressão armada no seu território, em conformidade com a Carta da Organização da Nações Unidas e no respeito dos compromissos da Organização do Tratado do Atlântico Norte para os Estados‑Membros que lhe pertencem. O novo Tratado sublinha que essa obrigatoriedade não põe em causa o carácter específico da política de segurança e de defesa de certos Estados‑Membros, o que constitui uma garantia importante para os Estados tradicionalmente "neutros";

‑ possibilidade, para o Conselho, de confiar a um grupo de Estados a realização de uma missão para a preservação dos valores da União;

‑ criação de um fundo de lançamento constituído por contribuições dos Estados‑Membros para as despesas militares que não estão a cargo do orçamento da União;

‑ definição de um processo de acesso rápido às dotações da União.

(3)  O Tratado da UE modificado prevê ainda uma cláusula de solidariedade entre os Estados‑Membros, segundo a qual estes prestam assistência, a pedido, a um Estado‑Membro que seja objecto de um ataque terrorista ou de uma catástrofe natural. As condições de aplicação desta cláusula serão adoptadas por decisão do Conselho, sob proposta conjunta da Comissão e do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança. O Conselho decide por unanimidade caso essa decisão tenha implicações em termos de defesa. O Parlamento é informado destas questões.

(4)  Estes progressos são, por conseguinte, significativos e não põem em causa nem especificidades da política de segurança e de defesa de certos Estados‑Membros, nem os compromissos dos Estados‑Membros pertencentes à Organização do Tratado do Atlântico Norte. Tão‑pouco são susceptíveis de transformar a União num bloco militar agressivo, como alguns receiam. Haverá certamente quem tivesse desejado ir mais longe, sobretudo em termos de maioria qualificada. No entanto, tendo em conta a natureza eminentemente intergovernamental deste domínio e a realidade política em que Conferência Intergovernamental se inscreve, pode considerar‑se o resultado final bastante positivo. Porém, durante as negociações de 2007, sob pressão de alguns Estados‑Membros, a redacção de algumas disposições sofreu diferentes modificações que têm a ver com uma vontade de assegurar – mesmo nas circunstâncias em que isso se revela totalmente supérfluo – que a União se limitará, no domínio da PESC, a actuar estritamente dentro das competências que lhe são conferidas pelos Tratados... Para além disso, o novo Tratado foi "complementado" por uma série de declarações[50] igualmente supérfluas, que reiteram, de forma por vezes gratuita, essa ideia. Se é verdade que esta não é verdadeiramente nociva, uma vez que se limita a reiterar de uma forma algo "lapalissiana" o conteúdo das disposições do Tratado, não deixa de ser o reflexo de uma perspectiva assaz negativa da construção europeia e de enviar uma mensagem errada à opinião pública.

9.4. Outros domínios das relações externas

(1)  Para além disso, em matéria de relações externas, cumpre sublinhar as modificações positivas introduzidas em matéria de política comercial comum. O seu campo de aplicação é alargado no que respeita ao comércio de serviços e à propriedade intelectual. O papel do Parlamento Europeu é reforçado: prevalecerá o processo legislativo ordinário no estabelecimento das medidas de aplicação da política comercial comum; ser‑lhe‑ão regularmente apresentados relatórios sobre as negociações de acordos comerciais; estes só poderão ser celebrados com a sua aprovação. De notar, a confirmação, pelo Tratado de Lisboa, do que se designa por "excepção cultural"[51] , alargada a outros domínios.

(2)  Por último, em matéria de ajuda humanitária o Parlamento Europeu pode regozijar‑se com a criação de uma base jurídica específica, submetida ao processo legislativo ordinário, que prevê a criação de um Corpo Europeu de Voluntários para a Ajuda Humanitária.

(3)  Note‑se também que o Tratado de Lisboa conserva as disposições específicas relativas ao desenvolvimento da política de vizinhança da União, nomeadamente, a base jurídica que lhe permite concluir acordos nesta matéria com os países em causa. Porém, de uma forma mais coerente, integra essas disposições no Título I do TUE ("Disposições comuns" do TUE...)

10. Importantes elementos de flexibilidade

Outra questão fundamental consiste em saber se o novo quadro institucional é suficientemente flexível para permitir à União adaptar‑se à evolução das circunstâncias e responder aos novos desafios que poderão surgir no futuro.

A resposta a esta questão pode ser procurada a dois níveis diferentes: por um lado, o da revisão dos Tratados e, por outro, o das possibilidades de evolução do sistema no âmbito do quadro institucional, sem necessidade de revisão dos Tratados.

(1)  No que se refere ao processo de revisão, o novo Tratado propõe melhorias evidentes: em primeiro lugar, a atribuição ao Parlamento Europeu de um direito de iniciativa de revisão, ao mesmo título que os Estados‑Membros ou a Comissão, mas também a institucionalização da Convenção como instância de preparação da revisão. Trata‑se do reconhecimento do papel absolutamente decisivo da Convenção na elaboração da Constituição e das limitações inerentes ao método intergovernamental. O Parlamento Europeu, que primeiro propôs o recurso ao método da Convenção, não pode deixar de se regozijar com esta modificação, que contribuirá para a transparência e a democratização do processo de revisão, bem como para lhe conferir maior eficácia.

Particularmente positivo é igualmente o facto de a aprovação do Parlamento Europeu ser exigida para que o Conselho possa decidir não convocar uma Convenção, caso a dimensão das modificações propostas não o justifique.

(2)  Lamentavelmente, o novo Tratado não vai tão longe como o Parlamento desejava no que respeita à simplificação do processo de revisão. Com efeito, o texto do artigo 48.º do TUE revisto prevê um processo simplificado de revisão do conteúdo das disposições da Parte III do TFUE, relativa às acções e políticas internas da União ‑ na condição de essa revisão não aumentar as competências atribuídas à União ‑, mas essa simplificação consiste simplesmente em permitir ao Conselho Europeu não ter de recorrer à Convenção (sem ter necessidade, para tal, da aprovação do Parlamento Europeu), mantendo, de qualquer forma, o requisito da unanimidade e da ratificação por todos os Estados‑Membros, de acordo com as respectivas regras constitucionais O Parlamento Europeu e a Comissão são consultados.

(3)  Assim, a revisão dos Tratados continuará a exigir, em todos os casos, a unanimidade e a ratificação por todos os Estados‑Membros. Todavia, durante a Convenção, haviam sido formuladas outras propostas, que tiveram amplo apoio do Parlamento Europeu e dos Parlamentos nacionais, que teriam permitido flexibilizar um pouco mais este requisito no que respeita à revisão das disposições relativas às políticas internas da União, respeitando simultaneamente o princípio essencial de que todo o aumento suplementar das competências da União exigiria a unanimidade dos Estados‑Membros.

(4)  Em contrapartida, o Parlamento Europeu não pode deixar de congratular‑se com a manutenção das "passerelles" propostas pela Convenção para a passagem da unanimidade à maioria qualificada do Conselho ou do processo legislativo especial ao processo legislativo ordinário. O facto de tal decisão só poder ser adoptada pelo Conselho Europeu deliberando por unanimidade, com a aprovação do Parlamento Europeu, e só se nenhum Parlamento nacional se opuser no prazo de seis meses, constitui uma garantia suficiente do ponto de vista do respeito dos direitos de cada Estado-Membro e da transparência e legitimação democrática da decisão. Registe‑se, no entanto, que para além destas "passerelles" gerais, existem outras específicas, que, em geral, ou exigem a aprovação do PE (alargamento das competências da Procuradoria Europeia), ou conferem a qualquer parlamento nacional a possibilidade de bloquear a decisão do Conselho.

(5)  Outro aspecto positivo do novo texto diz respeito às melhorias introduzidas em matéria de cooperações reforçadas, cuja importância poderá crescer no futuro, tendo em conta o aumento substancial do número de Estados‑Membros. Preservando as condições necessárias para garantir a coesão do conjunto da União e a sua unidade institucional, o novo Tratado alarga o campo das cooperações reforçadas (podem aplicar‑se a todos os domínios não cobertos pelas competências exclusivas da União, quando, actualmente, o domínio da defesa está excluído) e facilita o seu lançamento: devem reunir pelo menos 9 Estados‑Membros, adoptando o Conselho uma decisão por maioria qualificada, excepto em matéria de Política Externa e de Segurança Comum, domínio em que continua a ser requerida a unanimidade (quando actualmente estas estão interditas neste domínio). A exigência da aprovação do Parlamento Europeu (excepto no domínio da Política Externa e de Segurança Comum) reforça também a legitimação democrática da decisão de lançamento de uma tal cooperação.

(6)  Por último, é igualmente positivo o facto de o novo Tratado ter mantido uma disposição "passerelle" para maioria qualificada ou para o processo legislativo ordinário no âmbito das cooperações reforçadas, como a Convenção havia proposto.

(7)  Note‑se igualmente que o Tratado de Lisboa modifica as disposições relativas ao processo de alargamento da União, especificando que o PE e os parlamentos nacionais serão informados de qualquer novo pedido de adesão e fazendo referência expressa "aos critérios de elegibilidade aprovados pelo Conselho Europeu" (actualmente designados por "critérios de Copenhaga"), que deverão ser tidos em consideração na decisão do Conselho, por unanimidade, como acontece actualmente, após aprovação do PE por maioria dos deputados que o compõem.

(8)  A saída voluntária da União: pela primeira vez nos Tratados constitutivos das Comunidades Europeias e, posteriormente, da União, que ‑ com excepção do primeiro, que instituía a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço ‑ eram expressamente celebrados por uma duração ilimitada, mas sem que se previsse qualquer processo de denúncia colectiva ou de um só Estado-Membro, o TUE consagra, no seu artigo 50.º um mecanismo de "saída voluntária da União". É certo que, de todas as formas, na ausência de uma disposição particular, o Direito Internacional dos Tratados consagrava já essa possibilidade. Contudo, a sua inserção explícita no próprio texto do TUE, além de prever as modalidades precisas de gestão de tal eventualidade, constitui igualmente um sinal claro e forte de que nenhum Estado‑Membro é obrigado a prosseguir na aventura comum, se deixar de o desejar. Isto demonstra, juntamente com as disposições relativas às cooperações reforçadas e estruturadas, que a adesão à União e ao desenvolvimento das suas políticas é um acto de livre escolha, baseado num compromisso político efectivo.

11. A entrada em vigor do novo Tratado

Visto que o novo Tratado se insere na tradição dos tratados que alteram os Tratados em vigor, que continuarão a existir tal como modificados, e não tem a prevenção de anular e substituir na íntegra os Tratados actuais, as regras relativas à sua entrada em vigor são as regras habituais que presidem à entrada em vigor de novos Tratados. Deste modo, o próprio Tratado de Lisboa prevê (n.º 2 do artigo 6.º), que entrará em vigor no dia 1 de Janeiro de 2009, se tiverem sido depositados todos os instrumentos de ratificação ou, na falta desse depósito, no primeiro dia do mês seguinte ao do depósito do instrumento de ratificação do Estado signatário que proceder a esta formalidade em último lugar. O Protocolo (n.º 10) relativo às disposições transitórias prevê os eventuais ajustamentos necessários durante o período de transição.

III. Avaliação de conjunto

1.   Tendo em conta a análise apresentada, a opinião de conjunto da Comissão dos Assuntos Constitucionais sobre os resultados da CIG, concluída em Outubro de 2007, e o Tratado de Lisboa, não pode deixar de ser absolutamente positiva. Permitiu, em primeiro lugar, o desbloqueio de uma situação extremamente preocupante para a Europa. A sua adopção permitirá o relançamento do processo de ratificação em França e na Holanda e facilitará a utilização da via parlamentar para alcançar a entrada em vigor do novo texto.

2.        Trata-se certamente de um compromisso que, no entender do Parlamento, acarreta concessões dolorosas: o abandono da própria ideia de Constituição e de certos elementos consagrados no Tratado Constitucional, a previsão de adiamentos lamentáveis na entrada em vigor de determinados elementos e medidas específicas para satisfazer os pedidos de alguns Estados-Membros. Foi o preço político a pagar para sair da crise em que o "não" nos referendos francês e holandês haviam mergulhado a União. Todavia, comporta aquele um grande número de reformas e melhorias significativas relativamente aos Tratados actuais. E o essencial das inovações propiciadas pela Constituição foi salvaguardado. Cumpre, sobretudo, salientar que o novo Tratado introduz maior democracia na União Europeia, promove uma maior eficácia na tomada de decisões, assegura uma maior clarificação para a maior compreensão de quem faz o quê na União e o nível de responsabilidade que cabe, por um lado, à União e, por outro, aos Estados‑Membros.

Considerações adicionais do co-relator Íñigo Méndez de Vigo

3.   O método intergovernamental de revisão dos Tratados demonstrou, uma vez mais, as suas carências. Não há um único avanço no respeitante ao conteúdo do Tratado Constitucional, mas, sim, retrocessos. Em suma, "muita parra e pouca uva". Houve, inclusivamente, Governos que, numa atitude de manifesto desprezo pelos compromissos já obtidos, lograram alterar o previamente acordado, obter derrogações particulares ou interpretações que se acomodavam aos seus interesses. O caso da Grã-Bretanha, que viu aceites todas as "linhas vermelhas" avançadas pelo Governo Blair constitui o melhor exemplo.

4.   Nunca como hoje foi tão patente a notória falta de visão e ambição dos dirigentes nacionais na política europeia. É inegável que o Tratado de Lisboa revela uma atitude timorata, inclusive de desconfiança, face à União e respectivas Instituições. Assim sendo, não é de estranhar a amargura visível entre muitos europeus perante o ocorrido com o Tratado Constitucional, semelhante à amargura de Altiero Spinelli quando comparava o Tratado da União Europeia aprovado no Parlamento Europeu com o Acto Único adoptado pelo Conselho. Mas a verdade é que muitos dos progressos consagrados naquele projecto estão hoje em vigor. Algo semelhante sucederá quando o Tratado de Lisboa entrar em vigor: os progressos do Tratado Constitucional passarão a fazer parte do direito primário comunitário.

5.   Neste momento, deveremos utilizar as suas instituições, dar um conteúdo aos seus instrumentos e activar as suas potencialidades, a fim de estarmos mais presentes na vida quotidiana dos europeus. A Europa deverá fazer face ao aumento dos riscos estratégicos relacionados com o terrorismo e a proliferação nuclear, deverá abordar a nova situação criada no mundo pela globalização e a revolução tecnológica. A Europa encontra-se perante uma conjuntura face à qual a política da avestruz não é adequada: ou aposta no crescimento económico, na reforma dos seus mercados e na obtenção de uma maior competitividade, ou será incapaz de enfrentar com êxito a pujança da economia norte-americana e os novos ventos provenientes da China ou da Índia. Assente nos princípios e valores que unem os Europeus, a União deverá salvaguardar um modelo social que, com as suas imperfeições, representa inúmeras vantagens. Como diria Santo Agostinho "se penso em mim, valho pouco, se me comparo, muito".

6.   A Europa deverá igualmente enfrentar a     questão das relações de vizinhança. O Tratado de Lisboa contém a base jurídica para acometer esta tarefa, intimamente relacionada com a questão dos limites da União. Ainda que já não conste do Tratado de Lisboa, a divisa proclamada no Tratado Constitucional "Unida na diversidade" deve nortear a acção europeia em matéria de educação e de defesa do nosso património histórico. A Europa deve procurar novas formas de governação para implicar directamente os cidadãos nas questões europeias: mais democracia deliberativa a nível local, a e-democracia, os orçamentos participativos e as arbitragens para resolução de litígios. A governação económica e, em particular, as relações entre o Eurogrupo e o Banco Central Europeu, deverá constituir objecto de um debate em profundidade, que resolva as cada vez mais frequentes escaramuças dialécticas.

7.   Devemos estar conscientes de que avançar juntos a vinte e sete não será fácil; se a Europa pretende cumprir os seus objectivos, não pode navegar ao ritmo do barco mais lento, pelo que o instrumento da cooperação reforçada deverá passar a ser mais utilizado.

8.   A Europa não deve nem pode enclausurar-se em si mesma, deleitar-se nas suas crises, espera por um mundo que não irá parar, para que a Europa supere as suas dúvidas e hesitações. Para o efeito, conta com os progressos consagrados no Tratado de Lisboa. Este, e não outro, deve ser o caminho da esperança. Porque sucede com a União o mesmo que, segundo Paul Valéry , acontece com todo o poema "Nunca se termina; apenas se abandona". Aí estará o Parlamento Europeu para retomar o caminho.

  • [1]  Data de entrada em vigor: 23.7.1952
  • [2]  A Bélgica, a Alemanha, a França, a Itália, o Luxemburgo e os Países Baixos.
  • [3]  Juntaram‑se aos primeiros a Dinamarca, a Irlanda e o Reino Unido, em 1973, a Grécia, em 1981, a Espanha e Portugal, em 1986, a Áustria, a Finlândia e a Suécia, em 1995, a República Checa, a Estónia, Chipre, a Letónia, a Lituânia, a Hungria, Malta, a Polónia, a Eslovénia e a Eslováquia, em 2004, a Bulgária e a Roménia, em 2007.
  • [4]  Data de entrada em vigor: 1.1.1958
  • [5]  Tratado do Luxemburgo, de 17.2.1986 - Data de entrada em vigor: 1.7.1987
  • [6]  Assinado em 7.2.1992. Data de entrada em vigor: 1.11.1993
  • [7]  Assinado em 2.10.1997 - Data de entrada em vigor: 1.5.1999
  • [8]  Assinado em 26.2.2001 - Data de entrada em vigor: 1.2.2003
  • [9]  Assinado em Roma em 29.10.2004, e cuja entrada em vigor estava prevista para 1.11.2006 (cf. art. IV‑447º), sem prejuízo do depósito de todos os instrumentos de ratificação antes dessa data
  • [10]  Assinado em Lisboa em 13-12-2007
  • [11]  Indicam‑se, por um lado, as resoluções preparatórias da CIG, por outro, as resoluções que avaliam os seus resultados.
    ‑ Acto Único Europeu:
    . resolução de 14.2.1984: relatório e projecto de tratado Spinelli (JO C 77 de 19.3.1984, p.33)
    . resoluções de 16.1.1986: relatório Planas (JO C 36 de 17.2.1986, p.144)
                            e de 17.4.1986 (JO C 120 de 20.5.1986, p.96)
    ‑ Tratado de Maastricht
    . resoluções sobre o relatório D. Martin, de
                            14.3.1990 (JO C 96 de 17.4.1990, p.114)
                            11.7.1990 (JO C 231 de 17.9.1990, p.97)
                            e 22.11.1990 (JO C 324 de 24.12.1990, p.219)
    . resolução de 7.4.1992: relatório D. Martin (JO C 125 de 18.5.1992, p.81)
    ‑ Tratado de Amesterdão
    . resoluções de 17.5.1995: relatório D. Martin/Bourlanges (JO C 151 de 19.6.1995, p.56)
                            e 13.3.1996: relatório Dury/Maij‑Weggen (JO C 96 de 1.4.1996, p.77)
    . resolução de 19.11.1997: relatório Méndez de Vigo/Tsatsos (JO C 371 de 8.12.1997, p.99)
    ‑ Tratado de Nice
    . resoluções sobre o relatório Dimitrakopoulos/Leinen, de 18.11.1999 (JO C 189 de 7.7.2000, p.222)
                            3.2.2000 (JO C 309 de 27.10.2000, p.85)
                            e 13.4.2000 (JO C 40 de 7.2.2001, p.409)
      . resolução de 31.5.200: relatório Méndez de Vigo/Seguro (JO C 47E de 21.2.2002, p.108)
      Tratado que institui uma Constituição para a Europa
      . resolução de 24.9.2003: relatório Gil Robles/Tsatsos (JO C 77E de 26.3.2004, p.255)
      . resolução de 12.1.2005: relatório Corbett/Mendez de Vigo (JO C 247E de 6.10.2005, p.88)
  • [12]  JO C 80 de 10.3.2001, pp. 85 e 86
  • [13]             Basta recordar a Conferência (Assises) de Roma com os Parlamentos nacionais (Conferência dos Parlamentos da Comunidade Europeia, realizada de 27 a 30.11.1990), as conferências interinstitucionais organizadas paralelamente às CIG sobre a União económica e monetária e a União política, que levaram ao Tratado de Maastricht, a participação de representantes do Parlamento Europeu no Grupo de Reflexão que precedeu a CIG de Amesterdão, bem como a sua associação aos trabalhos da CIG propriamente ditos e, por último, a sua integração, na qualidade de observadores, no Grupo preparatório da CIG de Nice.
  • [14]  Resolução de 25.10.2000 (relatório de Olivier Duhamel sobre a constitucionalização dos tratados), confirmada pela Resolução de 31.5.2001 (relatório Méndez de Vigo/Seguro sobre a avaliação do Tratado de Nice e o futuro da União Europeia).
  • [15]  A ideia de aprovação desse documento, que posteriormente se tornou a Parte II do Tratado Constitucional, cabe à Presidência alemã do Conselho, que a fez aceitar pelo Conselho Europeu de Colónia de 3 e 4.6.1999. A sua modalidade de elaboração foi igualmente decidida por ocasião deste Conselho, e precisada em seguida por ocasião da reunião que se seguiu em Tampere em 15 e 16.10.1999. Foi então decidido constituir uma "enceinte", a seguir designada "Convenção", associando os quatro componentes que se encontram já na Convenção sobre o futuro da Europa, mas sem participação dos Estados candidatos.
  • [16]  Doc. SN 300/1/01 REV 1, Anexo 1, p. 19
  • [17]  . Resolução de 16.3.2000: relatório Duff/Voggenhuber, sobre a elaboração de uma Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (JO C 377, de 29.12.2000, p.329)
      . Decisão de 14.11.2000: relatório Duff/Voggenhuber, que aprova a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (JO C 223, de 8.8.2001, p.74)
      . Resolução de 23.10.2002: relatório Duff, sobre o impacto da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e o seu futuro estatuto (JO C 300E, de 11.12.2003, p.432)
      . Resolução de 29.11.2001: relatório Leinen/Méndez de Vigo, sobre a preparação do Conselho Europeu de Laeken e o futuro da União (JO C 153, 27.6.2002, p.310 (E))
      . Resolução de 25.10.2001: relatório Poos, sobre a reforma do Conselho (JO C 112, 9.5.2002, p.317 (E))
      . Resolução de 14.3.2002: relatório Carnero González, sobre a personalidade jurídica da União Europeia (JO C 47, 27.2.2003, p.594 (E))
      . Resolução de 7.2.2002: relatório Napoletano, sobre as relações entre o Parlamento Europeu e os parlamentos nacionais no âmbito da construção europeia (JO C 284, 21.11.2002, p.322 (E))
      . Resolução de 16.5.2002: relatório Lamassoure, sobre a delimitação das competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros (JO C 180, 31.7.2003, p.493 (E))
      . Resolução de 17.12.2002: relatório Bourlanges, sobre a tipologia dos actos e a hierarquia das normas na União Europeia (JO C 31, de 5.2.2004, p.126)
      . Resolução de 14.1.2003: relatório Napoletano, sobre o papel das autoridades regionais e locais na construção europeia (JO C 38E, de 12.2.2004, p.167)
      . Resolução de 24.9.2003: sobre o projecto de Tratado que institui uma Constituição para a Europa, e que contém o parecer do Parlamento Europeu sobre a convocação da Conferência Intergovernamental (CIG) (JO C 77E de 26.3.2004, p.255)
  • [18]  Um outro teve lugar em 3 e 4 de Dezembro de 2007, já após o acordo político sobre o Tratado de Lisboa.
  • [19]  A designação dada aos dois representantes de cada Estado-Membro, bem como do PE e da Comissão, que participaram nesta fase prévia de consultas. As "sherpas" do PE eram Klaus Welle, Chefe de Gabinete do Presidente Hans-Gert Pöttering, e José Muís Pacheco, membro do Secretariado da Comissão dos Assuntos Constitucionais.
  • [20]  Projecto de relatório de Carlos Carnero González sobre a incorporação, no Regimento do Parlamento Europeu, de um novo artigo 202.º-A relativo à utilização pelo Parlamento dos símbolos da União Europeia, doc. PE 398.505 v03-00
  • [21]  Note‑se que o Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA/Euratom) não é, porém, afectado pela Constituição – mantendo‑se assim em vigor paralelamente a esta –, embora algumas das suas disposições sejam modificadas pelo Protocolo que modifica o Tratado Euratom, a fim de as tornar compatíveis com o texto constitucional. No entanto, a Alemanha, a Irlanda e a Áustria manifestaram, na Declaração n.º 54 anexa à Acta Final da CIG, o desejo de que seja convocada, o mais rapidamente possível, uma Conferência Intergovernamental para rever o Tratado Euratom.
    Além disso, não podemos deixar de constatar que o novo Tratado inclui um número excessivo de protocolos, anexos e declarações: 12 protocolos (ao passo que muitos dos anexados aos Tratados em vigor são simplesmente adaptados ao texto constitucional), entre os quais os que dizem respeito ao acervo de Schengen, ao papel dos parlamentos nacionais, aos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, às medidas de transição relativas às instituições, à estruturação da cooperação permanente em matérias como a defesa, etc.), 2 anexos (já existentes, relativos à lista dos produtos agrícolas e à lista dos países e territórios ultramarinos) e 65 declarações. Os protocolos, com a mesma força de lei do Tratado, devem ser também ratificados por todos os Estados‑Membros. Pelo contrário, as declarações não são juridicamente vinculativas, mas podem ser utilizadas como elementos de interpretação dos Tratados.
  • [22]  Ainda que seja assaz discutível que a União Europeia não tenha, enquanto tal, personalidade jurídica internacional, apesar de os Tratados não lha atribuírem.
  • [23]  De notar o abandono, na sequência de uma proposta francesa, da referência, neste artigo, à concorrência leal, na qual, segundo o texto da Constituição, o mercado interno se basearia. Este abandono justificava-se, na medida em que a "concorrência leal" seria apenas um dos meios de construção deste mercado interno, que, este sim, constitui, de facto, o objectivo da União. Aliás, este abandono não tem implicações jurídicas no papel da concorrrência, como o prova o Protocolo (n.º6) sobre o mercado interno e a concorrência.
  • [24] 2 Coisa que, de qualquer modo, resultava já da primeira parte do n.º 2 do artigo 5.º do TUE.
  • [25]  Na verdade, o projecto de Tratado apresentado em Julho de 2007 remetia para o TFUE a definição de cidadania, e somente a acção dos representantes do PE na CIG permitiu reintroduzi-la nas disposições iniciais do TUE (algo tanto mais necessário quanto as disposições deste Tratado fazem frequentemente referência aos "cidadãos"...)
  • [26]  Protocolo n.º 2, sobre a aplicação dos princípios da subsidiariedade e proporcionalidade.
  • [27]  Mais exactamente, 750 "mais o Presidente", segundo a fórmula consagrada no artigo 14.º do TUE. À parte este aditamento de última hora para satisfazer as pretensões da Itália, as regras relativas à composição do PE e ao processo para a determinar são idênticas às da Constituição. O Conselho Europeu de Junho de 2007 havia convidado o PE a apresentar em tempo útil, tendo em vista o Conselho Europeu de Outubro, uma proposta de redistribuição de lugares no PE segundo as novas regras, o que foi feito mediante a aprovação da resolução contida no relatório Lamassoure/‑Severin (Resolução do Parlamento Europeu de 11 de Outubro de 2007 sobre a composição do Parlamento Europeu, P6_ TA-PROV(2007)0429). Neste relatório, o PE procurava propor uma redistribuição em conformidade com a noção de proporcionalidade degressiva, estabelecida no novo Tratado, e que não implicava qualquer perda adicional de lugares para nenhum Estado‑Membro, para além do que já tinha sido acordado no Tratado de Adesão da Bulgária e da Roménia. A Itália não estava satisfeita com esta proposta e, no final, conseguiu que um lugar adicional fosse acrescentado no Tratado, em derrogação ao princípio da proporcionalidade degressiva, a fim de manter a sua paridade com o Reino Unido. Uma declaração (n.º 4), anexa ao Tratado de Lisboa, preconiza que "o lugar adicional no Parlamento Europeu será atribuído à Itália". Naturalmente, a nova distribuição só vigorará depois de o Tratado ter entrado em vigor e de a decisão prevista no artigo 9.º‑C ter sido formalmente adoptada.
  • [28]  Embora o papel confiado ao Conselho Europeu em matéria de "travagem de emergência" relativamente a certas decisões respeitantes à segurança social e à cooperação judiciária penal o possam levar, se não a exercer directamente funções legislativas (não participa na adopção das normas), pelo menos, a interferir de forma virtualmente decisiva no desenrolar de um processo legislativo) ‑ cf. infra, pontos 9.1. e 9.2.
  • [29]  Resolução do Parlamento Europeu, de 18 de Novembro de 1999, sobre a preparação da reforma dos Tratados e a próxima Conferência Intertgovernamental (JOC 189, de 07.07.2000, p. 222)
  • [30]  Com efeito, o facto de a CIG ter introduzido o requisito do voto negativo de, no mínimo, 4 Estados‑Membros para a formação de uma minoria de bloqueio significa que, em certas circunstâncias, uma decisão poderá ser aprovada com muito menos de 62% da população, limiar fixado em Nice no critério de população: assim, uma decisão a que se opusessem a Alemanha, a França e o Reino Unido seria, contudo, adoptada, apesar de representar um pouco mais de 58% da população, pois esses três Estados não podem constituir uma minoria de bloqueio, muito embora representem, por si só, mais de 41% da população da União (com base nos actuais 27 Estados‑Membros). Por outro lado, é necessário ter presente que, hoje em dia, o jogo das diferentes combinações susceptíveis de obter o limiar dos votos ponderados necessários para atingir a maioria qualificada faz que, em muitos casos, a percentagem requerida da população seja sensivelmente superior a esses valores.
    Por outro lado, o aumento do limiar dos Estados‑Membros não produzirá efeitos na prática, pois este só fazia sentido na União de 25 Estados‑Membros, como era o caso em 2004: com efeito, 55% dos Estados‑Membros em vez de metade (50%) significava, na União de 25, o voto positivo de pelo menos 14 desses Estados (em vez de 13), se não existisse a exigência adicional, aprovada pela CIG, de a maioria incluir pelo menos 15 Estados‑Membros; por seu turno, o número de Estados‑Membros necessário para impedir que uma decisão seja aprovada passava a 12, em vez de 13. No entanto, de qualquer modo, numa União de 27, 55% dos Estados‑Membros equivalem a 15 Estados‑Membros. Por outro lado, na prática, os riscos de bloqueio decorrentes deste aumento não serão certamente muito elevados. Com efeito, a hipótese de uma decisão tomada com os Estados‑Membros divididos em dois blocos antagónicos quase idênticos nunca se verifica na realidade.
  • [31]  Nesta matéria, o novo Tratado seguiu praticamente todas as alterações previstas na Constituição. As únicas excepções dizem respeito ao Tratado de Adesão à Convenção Europeia dos Direitos do Homem, que deverá ser adoptado por unanimidade (VMQ, segundo a Constituição), e à criação de uma nova base jurídica relativa ao estabelecimento de regras relativas ao tratamento dos dados pessoais no quadro da PESC (artigo 39.º TUE). Apesar de, segundo a interpretação habitual, se tratar apenas de estabelecer regras comuns para o exercício de uma competência que pertence totalmente aos Estados‑Membros (tudo o que respeita à competência da União em matéria de protecção dos dados pessoais está sujeito ao artigo 16.º TFUE), é lamentável que o Parlamento não esteja associado a este processo e que nenhuma referência explícita tenha aí sido feita ao controlo do Tribunal de Justiça.
  • [32]  Uma declaração (n.º 9) anexa ao Tratado exprime o acordo político entre os Estados‑Membros sobre uma decisão que prevê equipas de Presidência de três Estados‑Membros por períodos de 18 meses, que poderão eventualmente partilhar o conjunto das presidências das diferentes formações sectoriais do Conselho por períodos de 6 meses (como actualmente) ou dividi‑las entre si para a totalidade dos 18 meses, por exemplo.
  • [33]  Note‑se que a CIG 2004 não seguiu a proposta da Convenção que visava a apresentação, pelo Governo de cada Estado‑Membro, de uma lista de três nomes, de entre os quais o Presidente escolheria um comissário proposto por esse Estado‑Membro. Aliás, pode também lamentar‑se o facto de a CIG 2004 não ter apoiado a proposta da Comissão, nos termos da qual a investidura da Comissão terminava pela votação politicamente simbólica do Parlamento Europeu, tendo acrescentado ainda uma fase ao processo, que se conclui com a nomeação da Comissão pelo Conselho Europeu, deliberando por maioria qualificada.
  • [34]  A transição para a nova realidade institucional decorrente da criação do Alto Representante originou algumas dificuldades nos últimos dias das negociações, pretendendo o PE assegurar a integralidade dos seus direitos em relação a uma nomeação a título provisório, logo após a entrada em vigor do Tratado (prevista para 1 de Janeiro de 2009) e à nomeação do novo Alto Representante aquando da constituição da próxima Comissão, em Novembro de 2009, após as eleições europeias. Uma declaração (n.º12) adoptada no Conselho Europeu de Lisboa satisfaz o PE.
  • [35]  Adoptados pelo Parlamento e pelo Conselho segundo o processo legislativo ordinário, quer sob proposta da Comissão e após consulta do Tribunal de Justiça, quer a pedido do Tribunal de Justiça e após consulta da Comissão.
  • [36]  Mecanismos estes entretanto já amplamente aplicados através do Acordo Interinstitucional sobre a revisão do sistema de comitologia negociado em 2006 por Richard Corbett e Joseph Daul, em nome do PE [celebração de um acordo interinstitucional sob a forma de uma declaração conjunta relativo a um projecto de decisão do Conselho que altera a Decisão 1999/468/CE que fixa as regras de exercício das competências de execução atribuídas à Comissão (novo procedimento de regulamentação com controlo)].
  • [37]  Os regulamentos que estabelecem o Estatuto dos Deputados Europeus, o Estatuto do Provedor de Justiça Europeu e que definem as modalidades do exercício do direito de inquérito (que deve também ser aprovada pela Comissão) ‑ cf. Anexo 4
  • [38]  Em 22 destes casos, o Conselho decide por unanimidade (5 casos com a aprovação do Parlamento Europeu, 17 mediante parecer simples); em 6 casos decide por maioria qualificada (1 com aprovação do Parlamento Europeu, 5 com parecer simples) ‑ cf. Anexo 4.
  • [39]  Em contrapartida, a Convenção propunha que as medidas de execução do sistema de recursos próprios fossem adoptadas por uma lei do Conselho, deliberando por maioria qualificada, com a aprovação do Parlamento.
  • [40]  Com efeito, a lei que define o sistema e os limites máximos dos recursos próprios é convertida em regulamento, tal com a lei que estabelece medidas de aplicação deste sistema; a lei que estabelece o quadro financeiro plurianual é igualmente convertida em regulamento, enquanto que o orçamento, previsto para ser aprovado através de uma lei, se torna agora pura e simplesmente "o orçamento", sem que seja definida a forma do acto legislativo que o aprova; no entanto, o artigo 314.º do TFUE refere que é aprovado através de um processo legislativo especial, o que o configura como acto legislativo, nos termos do n.º 3 do artigo 289.º do TFUE.
  • [41]  É esta a regra geral. Num caso específico, o PE continua a poder impor a sua posição através de uma maioria muito elevada. Trata-se, porém, de uma possibilidade bastante teórica.
  • [42]  A posição particular do Reino Unido e da Irlanda resulta dos dois protocolos mencionados nas duas notas seguintes. A da Dinamarca, que não sofreu alterações importantes, resulta do protocolo relativo à posição da Dinamarca.
  • [43]  Protocolo relativo à posição do Reino Unido e da Irlanda em relação ao espaço de liberdade, segurança e justiça
  • [44]  Protocolo que integra o acervo de Schengen no âmbito da União Europeia
  • [45]  Artigo 10.º do Protocolo (n.º 11) relativo às disposições transitórias
  • [46]  Artigo 1.º, terceiro parágrafo, do TUE e n.º 2, artigo 1.ºbis, do TFUE.
  • [47]  A decisão de criação, no momento adequado, de uma defesa comum é tomada pelo Conselho Europeu, por unanimidade, exigindo, além disso, a aprovação de todos os Estados‑Membros em conformidade com os respectivos procedimentos constitucionais.
  • [48]  Mediante a inclusão de missões de desarmamento, de aconselhamento em matéria militar, de estabilização no termo dos conflitos, de luta contra o terrorismo, incluindo nos territórios de países terceiros, que vêm acrescentar‑se às missões já previstas, isto é, humanitárias e de evacuação, às missões de prevenção de conflitos e de manutenção da paz e às missões de forças de combate, para gestão das crises e de restabelecimento da paz.
  • [49]  Cuja missão consiste nomeadamente em promover a racionalização das capacidades militares dos Estados‑Membros, a coordenação das actividades de investigação em matéria de tecnologia de defesa e a melhoria da eficácia das despesas militares.
  • [50]  É o caso da Declaração n.º 13, que salienta que as disposições relativas à PESC "não afectam" as responsabilidades dos Estados‑Membros, tal como presentemente consagradas, para a "formulação e condução das respectivas políticas de negócios estrangeiros" e que as disposições em matéria de política de segurança e defesa comum não prejudicam o carácter específico das suas políticas nacionais de segurança e defesa. O mesmo é válido para a Declaração n.º 14, segundo a qual nada no novo Tratado põe em causa a representação dos Estados‑Membros nas organizações internacionais, nomeadamente na qualidade de membro do Conselho de Segurança das Nações Unidas .... Particularmente injustificado, para além de parcialmente incorrecto, é o segundo parágrafo desta declaração, que afirma que A Conferência toma igualmente nota de que as "disposições referentes à política externa e de segurança comum não atribuem à Comissão novas competências para propor decisões nem reforçam o papel do Parlamento Europeu".
  • [51]  A Convenção propusera que o Conselho deliberasse por unanimidade no que respeita aos acordos no domínio dos serviços culturais e audiovisuais, sempre que estes fossem susceptíveis de afectar a diversidade cultural e linguística da União. Esta "excepção" foi "alargada" pela CIG de 2004 ao comércio de serviços sociais, da educação e da saúde, sempre que esses acordos possam perturbar gravemente a organização desses serviços a nível nacional e afectar a competência dos Estados‑Membros em matéria de fornecimento desses serviços. Por outro lado, o Conselho tem também de estatuir por unanimidade no que respeita aos acordos no domínio dos serviços, em geral, e dos aspectos da propriedade intelectual, quando estes incluam disposições para as quais é requerida a unanimidade para adopção de normas internas.

ANEXO I: As competências da União   O TFUE refere também a política externa e de segurança comum e a coordenação das políticas económicas e de emprego, as quais não se inserem nas três categorias do presente quadro, tendo em conta a sua natureza específica. Os domínios de competência sublinhados em cada uma das colunas correspondem a domínios para os quais não se encontra actualmente prevista qualquer disposição específica nos Tratados, mas no âmbito dos quais a União já actuou, nomeadamente, com recurso às disposições relativas ao mercado interno ou ao artigo 308.º do TCE.

 

Tipo de competências

 

Exclusivas

(Lista exaustiva)[2]

 

Partilhadas

(Lista não exaustiva)[3]

 

Complementares

(Lista exaustiva)

 

 

 

Definição

 

Só a União pode adoptar actos juridicamente vinculativos; os Estados‑Membros só podem intervir se forem autorizados a fazê‑lo pela União, ou para dar cumprimento aos actos por ela adoptados

 

A União e os Estados‑Membros têm a possibilidade de aprovar actos jurídicos vinculativos, podendo os Estados‑Membros agir na medida em que a União não o faça

A União só pode intervir para apoiar a acção dos Estados‑Membros (sobretudo através de intervenções financeiras); pode legislar, mas não harmonizar as disposições legislativas e regulamentares nacionais

 

 

 

 

 

 

 

 

Matérias

 

União aduaneira

 

Estabelecimento das regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno

 

Política monetária dos Estados‑Membros cuja moeda seja o euro

 

Conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum das pescas

 

Política comercial comum

 

Mercado interno

Política social

Coesão económica, social e territorial

Agricultura e pescas (com excepção da conservação dos recursos biológicos do mar)

Ambiente

Defesa dos consumidores

Transportes

Redes transeuropeias

Energia

Espaço de liberdade, segurança e justiça

Problemas comuns de segurança em matéria de saúde pública

Investigação e desenvolvimento tecnológico

Política espacial

Cooperação para o desenvolvimento

 

Protecção e melhoria da saúde humana

 

Indústria

 

Cultura

 

Turismo

 

Educação

 

Juventude

 

Desporto

 

Formação profissional

 

Protecção civil

 

Cooperação administrativa

 

  • [1]    O TFUE refere também a política externa e de segurança comum e a coordenação das políticas económicas e de emprego, as quais não se inserem nas três categorias do presente quadro, tendo em conta a sua natureza específica. Os domínios de competência sublinhados em cada uma das colunas correspondem a domínios para os quais não se encontra actualmente prevista qualquer disposição específica nos Tratados, mas no âmbito dos quais a União já actuou, nomeadamente, com recurso às disposições relativas ao mercado interno ou ao artigo 308.º do TCE.
  • [2]    Para além destas competências, a União dispõe igualmente de competência exclusiva para celebrar acordos internacionais quando tal celebração esteja prevista num acto legislativo da União, seja necessária para lhe dar a possibilidade de exercer a sua competência interna, ou seja susceptível de afectar regras comuns ou de alterar o alcance das mesmas.
  • [3]    A despeito do facto de o TFUE tratar as políticas indicadas em itálico nesta coluna no artigo relativo às competências partilhadas, trata‑se de sectores nos quais a acção da União não tem por efeito impedir o exercício das competências nacionais.

ANEXO 2: Lista dos novos casos de votação por maioria qualificada

I   Bases jurídicas existentes que passam a ser abrangidas pela maioria qualificada

[os números dos artigos do TUE e do TFUE indicados em primeiro lugar referem-se aos artigos que foram retomados no Tratado de Lisboa; entre parêntesis rectos [...] figuram os números que os artigos terão na futura versão consolidada dos tratados (de acordo com o quadro anexo ao Tratado de Lisboa); entre parêntesis e em itálico o procedimento actual]

1.   N.º 3 do artigo 9.°-C [16.°] do TUE e alínea b) do artigo 201.°-B [236.°] do TFUE: Ordem das Presidências do Conselho – decisão do Conselho Europeu, sem proposta da Comissão (artigo 203.º do TCE – O Conselho delibera por unanimidade)

2.   Artigo 42.° [48.º] do TFUE: livre circulação dos trabalhadores, prestações sociais – processo legislativo ordinário[1] (artigo 42.º do TCE: co‑decisão – o Conselho delibera por unanimidade) 

3.   N.º 1 do artigo 47.° [53.º] do TFUE: liberdade de estabelecimento, acesso às actividades não assalariadas – processo legislativo ordinário sempre que a execução das directivas em causa comporte uma modificação dos princípios legislativos num Estado‑Membro (n.º 2 do artigo 47.º do TCE – co‑decisão – o Conselho delibera por unanimidade)

4.   Artigo 61.°-G [74.º] do TFUE: cooperação administrativa no espaço de liberdade, segurança e justiça – regulamento do Conselho, consulta do PE (artigo 66.º do TCE e n.º 1 do artigo 34.º do TUE: processo definido nos n.ºs 1 e 2 do artigo 67.º do TCE: unanimidade no Conselho após consulta do PE – o Conselho pode decidir por unanimidade, após consulta do PE, deliberar por maioria qualificada)

5.   N.º 2 do artigo 62.° [77.º] do TFUE: controlos nas fronteiras – processo legislativo ordinário (artigo 62.º do TCE: processo definido no artigo 67.º do TCE: unanimidade no Conselho após consulta do PE; o Conselho pode decidir por unanimidade, após consulta do PE, deliberar por maioria qualificada)

6.   Artigo 63.° [78.º] do TFUE: asilo e protecção dos refugiados e pessoas deslocadas – processo legislativo ordinário (n.ºs 1 e 2 do artigo 63.º do TCE: processo definido no n.º 5 do artigo 67.º do TCE: unanimidade e consulta do PE para determinados aspectos; o Conselho pode decidir por unanimidade, após consulta do PE, deliberar por maioria qualificada)

7.   Artigo 63.°-A [79.º] do TFUE: imigração – processo legislativo ordinário (n.ºs 3 e 4 do artigo 63.º do TCE: processo definido no artigo 67.º do TCE: unanimidade no Conselho e consulta do PE; o Conselho pode decidir por unanimidade, após consulta do PE, deliberar por maioria qualificada)

8.   N.º 2 do artigo 65.° [81.º] do TFUE: cooperação judiciária em matéria civil (excepto direito da família)[2] (artigo 65.° do TCE: processo definido no artigo 67.° do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE, com a possibilidade de passagem à co‑decisão na sequência de uma decisão do Conselho adoptada por unanimidade, após consulta do Parlamento Europeu)

9.   N.ºs 1 e 2 do artigo 69.°-A [82.º] do TFUE: cooperação judiciária em matéria penal – processo legislativo ordinário[3] (n.º 1, alíneas a), b), c) e d), do artigo 31.º do TUE – unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

10. N.ºs 1 e 2 do artigo 69.°-B [83.º] do TFUE: aproximação das normas penais, infracções e sanções[4] (n.º 1, alínea e) do artigo 31.º do TUE – unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

11. Artigo 69.°-D [85.º] do TFUE: Eurojust – processo legislativo ordinário (n.º 2 do artigo 31.º do TUE – unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

12. N.º 2 do artigo 69.°-F [87.º] do TFUE: cooperação policial não operacional – processo legislativo ordinário (n.º 1 do artigo 30.º do TUE – unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

13. N.º 2 do artigo 69.°-G [88.º] do TFUE: Europol – processo legislativo ordinário (n.º 2 do artigo 30.º do TUE – unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

14. N.º 1 do artigo 71.° [91.º] do TFUE: política comum dos transportes (inclusivamente nos casos referidos no n.º 3) – processo legislativo ordinário (n.º 2 do artigo 71.º do TCE – o Conselho delibera por unanimidade após consulta do PE apenas no caso das derrogações referidas nesse n.º 2)

15. N.º 3 do artigo 107.° [129.º] do TFUE: modificação de certas disposições do Estatuto do SEBC – processo legislativo ordinário (proposta da Comissão após consulta do BCE ou recomendação do BCE com consulta da Comissão) (N.º 5 do artigo 107.º do TCE – no caso de uma proposta da Comissão, o Conselho delibera por unanimidade, após consulta do BCE; em qualquer dos casos é necessário o parecer favorável do PE; no caso de uma recomendação do BCE, o Conselho delibera por maioria qualificada após consulta da Comissão)

16. N.º 5 do artigo 151.° [167.º]: medidas de incentivo no domínio da cultura – processo legislativo ordinário (recomendações do Conselho também por maioria qualificada) (n.º 5 do artigo 151.º do TCE – co‑decisão com unanimidade no Conselho; recomendações: o Conselho delibera por unanimidade sob proposta da Comissão)

17. Artigo 161.° [177.º] do TFUE: Fundos Estruturais e de coesão (Artigo 161.º do TCE: Actualmente: unanimidade no Conselho e parecer favorável do PE)

18. Artigo 225.°-A [257.°] do TFUE: Criação de tribunais especializados (artigo 257.º do TFUE) (artigo 225.º‑A do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

19. Artigo 245.° [281.º ] do TFUE: Alteração do estatuto do Tribunal de Justiça, excepto título I e artigo 64.º (artigo 281.º do TFUE) (artigo 245.º do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

20. N.º 2 do artigo 245.°-B [283.º] do TFUE: nomeação dos membros da Comissão Executiva do BCE – decisão do Conselho Europeu, sob recomendação do Conselho e após este ter consultado o PE e o Conselho de Governadores do BCE (artigo 112.º do TCE – de comum acordo, pelos Governos dos Estados‑Membros a nível de Chefes de Estado ou de Governo; o resto inalterado)

21. N.° 2 do artigo 249.°-B [290.°] e n.° 3 do artigo 249.°-C [291.°] do TFUE: modalidade de controlo do exercício das competências de execução da Comissão (actual decisão comitologia) – processo legislativo ordinário (artigo 202.° do TCE – decisão do Conselho por unanimidade, após parecer do PE)

II  Novas bases jurídicas para a maioria qualificada

1.   N.° 5 do artigo 9.°-B [15.°] do TUE : eleição do Presidente do Conselho Europeu pelo Conselho Europeu

2.   N.° 1 do artigo 9.°-E [18.°] do TUE : nomeação do Alto Representante pelo Conselho Europeu, com o acordo do Presidente da Comissão

3.   N.º 2, alínea b), do artigo 15.°-B [31.º] do TUE: iniciativas do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança a pedido do Conselho Europeu – decisão do Conselho

4.   Artigo 16.° [14.º] do TFUE: princípios e condições para o funcionamento dos serviços de interesse económico geral – processo legislativo ordinário

5.   Artigo 20.° [23.º] do TFUE: medidas para facilitar a protecção diplomática e consular – directiva do Conselho, consulta do PE

6.   Artigo 21.° [24.º] do TFUE: iniciativa de cidadania com vista a uma proposta de lei europeia – processo legislativo ordinário

7.   N.º 2 do artigo 28.°-D [45.º] do TUE: estatuto e sede da Agência Europeia de Defesa – decisão do Conselho sem proposta da Comissão

8.   N.º 2 do artigo 28.°-E [46.º] do TUE: estabelecimento de uma cooperação estruturada permanente no domínio da defesa – decisão do Conselho sem proposta da Comissão, consulta do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança

9.   N.º 3 do artigo 28.°-E [46.º] do TUE: admissão de um Estado‑Membro na cooperação estruturada permanente no domínio da defesa – decisão do Conselho (só tomam parte na votação os membros do Conselho que representem os Estados‑Membros participantes) sem proposta da Comissão, consulta do Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança

10. N.º 4 do artigo 28.°-E [46.º] do TUE: suspensão de um Estado‑Membro da cooperação estruturada permanente no domínio da defesa – decisão do Conselho (só tomam parte na votação os membros do Conselho que representem os Estados‑Membros participantes) sem proposta da Comissão

11. N.º 2 do artigo 49.°-A [50.º] do TFUE: acordo de saída de um Estado‑Membro – decisão do Conselho sob proposta do negociador do acordo (em princípio a Comissão), após aprovação do PE

12. Artigo 61.°-C [70.°] do TFUE : medidas de avaliação da construção do espaço de liberdade, segurança e justiça, após simples informação do Parlamento Europeu e dos parlamentos nacionais

13. Artigo 69.°-C [84.º] do TFUE: medidas de incentivo no domínio da prevenção da criminalidade – processo legislativo ordinário

14. Primeiro parágrafo do artigo 97.°-A [118.º] do TFUE: propriedade intelectual – processo legislativo ordinário

15. N.ºs 1 e 2 do artigo 115.°-C [138.º] do TFUE: Estados‑Membros cuja moeda seja o euro, posição comum e representação unificada na cena internacional – decisão do Conselho, consulta do BCE

16. N.º 4 do artigo 149.° [165.º] do TFUE: desporto – processo legislativo ordinário

17. N.º 4, alínea c), do artigo 152.° [168.º] do TFUE: medidas para fazer face aos desafios comuns de segurança no domínio da saúde[5]

18.  N.º 5 do artigo 152.° [168.º] do TFUE: medidas de incentivo que visam a protecção da saúde humana, nomeadamente luta contra os grandes flagelos transfronteiriços e a luta contra o tabagismo e o consumo excessivo de álcool[6]

19. N.º 2 do artigo 172.°-A [189.º] do TFUE: política espacial – processo legislativo ordinário

20. N.º 2 do artigo 176.°-A [194.º] do TFUE: energia – processo legislativo ordinário[7]

21. N.º 2 do artigo 176.°-B [195.º] do TFUE: turismo – processo legislativo ordinário

22. N.º 2 do artigo 176.°-C [196.º] do TFUE: protecção civil[8]

23. N.º 2 do artigo 176.°-D [197.º] do TFUE: cooperação administrativa – processo legislativo ordinário

24. N.ºs 3 e 5 do artigo 188.°-J [214.º] do TFUE: ajuda humanitária[9] e criação do Corpo Europeu de Voluntários

25. Alínea a) do artigo 201.°-B [236.º] do TFUE: lista das formações do Conselho – decisão do Conselho Europeu (sem proposta da Comissão)

26. N.º 2 do artigo 254.°-A [298.º] do TFUE: administração da União Europeia

27. N.º 5 do artigo 256.°-A [300.º] do TFUE: revisão das regras relativas à natureza e composição do Comité das Regiões e do Comité Económico e Social – decisão do Conselho

28. Quarto parágrafo do artigo 269.° [311.º] do TFUE: medidas de execução do sistema de recursos próprios – regulamento do Conselho, aprovação do PE (processo legislativo especial, mas sem se fazer referência à unanimidade)

  • [1]    Este processo é acompanhado por um mecanismos de "travão de emergência": caso um Estado‑Membro considere que as medidas em causa poderiam prejudicar "aspectos importantes do seu sistema de segurança social, designadamente no que diz respeito ao âmbito de aplicação, custo ou estrutura financeira", ou afectar o "equilíbrio financeiro", pode solicitar que esse projecto seja submetido ao Conselho Europeu (o que conduz à suspensão do processo legislativo ordinário). O Conselho Europeu deverá, num prazo de 4 meses, ou remeter o projecto ao Conselho, o qual porá fim à suspensão do processo legislativo ordinário; ou solicitar à Comissão que apresente uma nova proposta.
  • [2]    As alíneas e), g) e h) do n.° 2 deste artigo contêm bases jurídicas novas; as outras alíneas já eram abrangidas pelo artigo 65.° do TCE. O n.° 3 deste mesmo artigo 65.° [81.°] do TFUE prevê ainda a possibilidade de o Conselho adoptar uma decisão que determine os aspectos do direito da família que tenham incidência transfronteiriça, passíveis de serem objecto de actos adoptados de acordo com o processo legislativo ordinário.
  • [3]    Este processo é acompanhado por um mecanismos de "travão de emergência": caso um Estado‑Membro considere que a proposta de legislação em causa poderia prejudicar aspectos importantes do seu sistema de justiça penal, pode solicitar que esse projecto seja submetido ao Conselho Europeu, suspendendo o processo legislativo ordinário. O Conselho Europeu deverá, num prazo de 4 meses, ou remeter o projecto ao Conselho, o qual porá fim à suspensão do processo legislativo ordinário, ou solicitar à Comissão ou ao grupo de Estados autor da iniciativa que apresentem uma nova proposta legislativa. Se o Conselho não tomar a decisão referida no prazo de 4 meses, ou se o novo processo legislativo iniciado a seu pedido não for concluído no prazo de doze meses, e se pelo menos nove Estados‑Membros pretenderem instituir uma cooperação reforçada, então, será automaticamente autorizada uma cooperação reforçada nesta matéria.
  • [4]    Ibidem.
  • [5]    As medidas previstas nas alíneas c) e d) são, de facto, novas. As medidas previstas nas alíneas a) e b) já estavam previstas no artigo 152.º do TCE e estavam sujeitas ao processo de co‑decisão.
  • [6]    As bases jurídicas previstas neste número são todas novas, à excepção da relativa às medidas de incentivo à protecção da saúde humana, que já estava prevista no artigo 152.º do TCE.
  • [7]    Note‑se que actualmente a União já toma medidas no domínio da energia, quer com base em disposições que já prevêem a votação por maioria qualificada, quer com base no artigo 308.º do TCE.
  • [8]    Já são tomadas medidas neste domínio com base no artigo 308.º do TCE.
  • [9]    Já são tomadas medidas neste domínio ou com base no artigo 179.º (por maioria qualificada), ou com base no artigo 308.º do TCE (por unanimidade).

ANEXO 3: Actos legislativos ‑ processo legislativo ordinário

Este anexo contém uma lista das bases jurídicas às quais se aplicará o processo legislativo ordinário previsto no Tratado de Lisboa (que corresponde grosso modo ao processo actual definido no artigo 251.º do TCE denominado processo de co‑decisão).

As matérias sublinhadas são aquelas cuja base jurídica ou é completamente nova, ou sofre uma alteração processual, passando a estar sujeitas à “co‑decisão/processo legislativo ordinário”.

Os números dos artigos do TUE e do TFUE referem-se aos artigos que foram retomados no Tratado de Lisboa; entre parêntesis rectos [...] figuram os números que os artigos terão na futura versão consolidada dos tratados (de acordo com o quadro anexo ao Tratado de Lisboa).

Indicam‑se em itálico os artigos correspondentes do Tratado actualmente em vigor e, nos casos em que o Tratado de Lisboa altera o processo, o processo que actualmente se aplica.

1.   Serviços de interesse económico geral (artigo 16.° [14.º] do TFUE) (artigo 16.º do TCE)

2.   Modalidades do direito de acesso aos documentos (n.º 3 do artigo 16.°-A [15.º] do TFUE) (n.º 2 do artigo 255.º)

3.   Protecção de dados (n.º 2 do artigo 16.°-B [16.º] do TFUE) (n.º 2 do artigo 286.º)

4.   Medidas de combate à discriminação em razão da nacionalidade (artigo 16.°-D [18.º] do TFUE) (artigo 12.º do TCE)

5.   Princípios de base das medidas de incentivo em matéria de não discriminação (n.º 2 do artigo 16.°-E [19.°] do TFUE) (n.º 2 do artigo 13.º do TCE)

6.   Disposições que visam facilitar o exercício do direito dos cidadãos de circularem e permanecerem livremente no território dos Estados‑Membros (n.º 2 do artigo 18.° [21.º] do TFUE) (n.º 2 do artigo 18.º do TCE)

7.   Iniciativa dos cidadãos (artigo 21.° [24.º] do TFUE)

8.   Cooperação aduaneira (artigo 27.°-A [33.º] do TFUE) (artigo 135.º do TCE)

9.   Aplicação das regras da concorrência à política agrícola comum (artigo 36.° [42.º] que remete para o n.º 2 do artigo 43.º do TFUE) (artigo 36.º do TCE: maioria qualificada no Conselho e parecer simples do PE)

10. Legislação em matéria de política agrícola comum (n.º 2 do artigo 37.° [43.º] do TFUE) (n.º 2 do artigo 37.º: maioria qualificada no Conselho e parecer simples do PE)

11. Livre circulação de trabalhadores (artigo 40.° [46.º] do TFUE) (artigo 40.º do TCE)

12. Mercado interno – medidas de segurança social para os trabalhadores migrantes comunitários[1] (artigo 42.° [48.º] do TFUE) (artigo 42.º do TCE: co‑decisão – o Conselho delibera por unanimidade)

13. Direito de estabelecimento (n.º 1 do artigo 44.° [50.º] do TFUE) (artigo 44.º do TCE)

14. Exclusão num Estado‑Membro de certas actividades do âmbito de aplicação das disposições relativas ao direito de estabelecimento (segundo parágrafo do artigo 45.° [51.º] do TFUE) (segundo parágrafo do artigo 45.º do TCE: maioria qualificada no Conselho sem participação do PE)

15. Coordenação das disposições legislativas, regulamentares ou administrativas que prevêem um regime especial para os nacionais dos outros Estados‑Membros no exercício do direito de estabelecimento (n.º 2 do artigo 46.° [52.º] do TFUE) (segundo parágrafo do artigo 46.º do TCE)

16. Coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros respeitantes ao acesso a actividades não assalariadas e ao seu exercício e ao reconhecimento mútuo dos diplomas (n.º 1 do artigo 47.° [53.º] do TFUE) (artigo 47.º do TCE: co‑decisão – o Conselho delibera por unanimidade sempre que a execução implique uma modificação das disposições legislativas dos Estados‑Membros)

17. Extensão do benefício das disposições relativas às prestações de serviços aos nacionais de países terceiros estabelecidos na Comunidade. (segundo parágrafo do artigo 49.° [56.º] do TFUE) (segundo parágrafo do artigo 49.º do TCE: maioria qualificada no Conselho sem participação do PE)

18. Liberalização dos serviços em sectores determinados (n.º 1 do artigo 52.° [59.º] do TFUE) (n.º 1 do artigo 52.º do TCE: maioria qualificada no Conselho e parecer simples do PE)

19. Serviços (artigo 55.° [62.º] do TFUE) (artigo 55.º do TCE)

20. Adopção de outras medidas relativas aos movimentos de capitais com destino ou origem num país terceiro (n.º 2 do artigo 57.° [64.º] do TFUE) (n.º 2, primeira frase, do artigo 57.º do TCE: maioria qualificada no Conselho sem participação do PE)

21. Medidas administrativas relativas aos movimentos de capitais em matéria de prevenção e luta contra a criminalidade e o terrorismo (artigo 61.°-H [75.º] do TFUE) (artigo 60.º do TCE)

22. Vistos, controlos nas fronteiras externas, condições de livre circulação dos nacionais de países terceiros, gestão das fronteiras externas, ausência de controlo nas fronteiras internas (n.º 2 do artigo 62.° [77.º] do TFUE) (Artigo 62.º do TCE: processo definido no artigo 67.º do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE com a possibilidade de passagem à co‑decisão na sequência de uma decisão do Conselho adoptada por unanimidade, após consulta do Parlamento Europeu)

23. Asilo, protecção temporária ou subsidiária das pessoas (n.º 2 do artigo 63.° [78.º] do TFUE) (n.ºs 1 e 2 do artigo 63.º e n.º 2 do artigo 64.º do TCE: processo definido no artigo 67.º do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE com a possibilidade de passagem à co‑decisão na sequência de uma decisão do Conselho adoptada por unanimidade, após consulta do Parlamento Europeu)

24. Imigração e luta contra o tráfico de seres humanos (n.º 2 do artigo 63.°-A [79.º] do TFUE) (n.ºs 3 e 4 do artigo 63.º do TCE: processo definido no artigo 67.º do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE com a possibilidade de passagem à co‑decisão na sequência de uma decisão do Conselho adoptada por unanimidade, após consulta do Parlamento Europeu)

25. Medidas de incentivo com vista a favorecer a integração dos nacionais de países terceiros (n.º 4 do artigo 63.°-A [79.º] do TFUE)

26. Cooperação judiciária em matéria civil (excepto direito da família)[2] (n.º 2 do artigo 65.° [81.º] do TFUE) (artigo 65.º do TCE ‑ processo definido no artigo 67.º do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE, com a possibilidade de passagem à co‑decisão na sequência de uma decisão do Conselho adoptada por unanimidade, após consulta do Parlamento Europeu)

27. Cooperação judiciária em matéria penal ‑ processos, cooperação, formação, conflitos de competências, regras mínimas para o reconhecimento das decisões judiciais) (n.ºs 1 e 2 do artigo 69.° [82.º] do TFUE)[3] (artigo 31.º do TUE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

28. Regras mínimas para a definição de infracções e sanções em matéria de criminalidade grave de dimensão transfronteiriça (n.º 1 e eventualmente n.º 2 do artigo 69.°-B [83.º] do TFUE)7 (artigo 31.º do TUE: processo definido no n.º 2 do artigo 34.º e n.º 1 do artigo 39.º do TUE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

29. Medidas de apoio à prevenção da criminalidade (Artigo 69.°-C [84.º] do TFUE)

30. Eurojust (n.º 1, segundo parágrafo, do artigo 69.°-D [85.º] do TFUE) (artigo 31.º do TUE: processo definido no n.º 2 do artigo 34.º e n.º 1 do artigo 39.º do TUE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

31. Modalidades de associação do Parlamento Europeu e dos parlamentos nacionais na avaliação do Eurojust (n.º 1, terceiro parágrafo, do artigo 69.°-D [85.º] do TFUE)

32. Cooperação policial (certos aspectos) (n.º 2 do artigo 69.°-F [87.º] do TFUE) (artigo 30.º do TUE: processo definido no n.º 2 do artigo 34.º e n.º 1 do artigo 39.º do TUE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

33. Europol (n.º 2, primeiro parágrafo, do artigo 69.°-G [88.º] do TFUE) (artigo 30.º do TUE: processo definido no n.º 2 do artigo 34.º e n.º 1 do artigo 39.º do TUE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

34. Modalidades de controlo da Europol pelo PE e pelos parlamentos nacionais (n.º 2, segundo parágrafo, do artigo 69.°-G [88.º] do TFUE)

35. Execução da política comum dos transportes (n.º 1 do artigo 71.° [91.º] do TFUE) (artigo 71.º do TCE)

36. Navegação marítima e aérea (n.º 1 do artigo 80.° [100.º] do TFUE) (n.º 2 do artigo 80.º do TCE)

37. Medidas relativas à aproximação das disposições dos Estados‑Membros que tenham por objecto o estabelecimento ou o funcionamento do mercado interno com vista à promoção dos objectivos do artigo 22.°-A [26.°] (n.º 1 do artigo 94.° [114.º] do TFUE) (n.º 1 do artigo 95.º do TCE)

38. Medidas necessárias para eliminar as distorções do mercado interno (artigo 96.° [116.º] do TFUE) (artigo 96.º do TCE: maioria qualificada no Conselho sem participação do PE)

39. Propriedade intelectual excepto regimes linguísticos dos títulos europeus (primeiro parágrafo do artigo 97.°-A [118.º] do TFUE)[4]

40. Supervisão multilateral (n.º 6 do artigo 99.° [121.º] do TFUE) (n.º 5 do artigo 99.º do TCE: processo de cooperação)

41. Alteração do protocolo relativo aos Estatutos do SEBC e do BCE (n.º 3 do artigo 107.° [129.º] do TFUE) (n.º 5 do artigo 107.º do TCE: unanimidade no Conselho ou, consoante os casos, maioria qualificada, após parecer favorável do Parlamento Europeu)

42. Medidas necessárias à utilização do euro (artigo 111.°-A [133.º] do TFUE) (n.º 4 do artigo 123.º do TCE)

43. Medidas de apoio ao emprego (artigo 129.° [149.º] do TFUE) (artigo 129.º do TCE)

44. Política social (n.º 1 do artigo 137.° [153.º], excepto alíneas c), d), f) e g) e n.º 2, primeiro, segundo e último parágrafo, do artigo 137.° [153.º][5] do TFUE) (n.ºs 1 e 2 do artigo 137.º do TCE)

45. Política social (igualdade de oportunidades, de tratamento e de remuneração) (n.º 3 do artigo 141.° [157.o] do TFUE) (n.º 3 do artigo 141.º do TCE)

46. Fundo Social Europeu (artigo 148.° [164.º] do TFUE) (artigo 148.º do TCE)

47. Educação (excepto recomendações) (n.º 4, alínea a), do artigo 149.° [165.º] do TFUE) (n.º 4 do artigo 149.º do TCE)

48. Desporto (n.ºs 2, alínea g), e 4 do artigo 149.° [165.º] do TFUE)

49. Formação profissional (n.º 4 do artigo 150.° [166.º] do TFUE) (n.º 4 do artigo 150.º do TCE)

50. Cultura (excepto recomendações) (n.º 5, primeiro travessão, do artigo 151.° [167.º] do TFUE) (artigo 151.º do TCE: co‑decisão – o Conselho delibera por unanimidade)

51. Saúde pública – medidas para fazer face aos desafios comuns de segurança no domínio da saúde[6] (n.º 4 do artigo 152.° [168.º] do TFUE) (n.º 4 do artigo 152.º do TCE)

52. Saúde pública – medidas de incentivo que visam a protecção da saúde humana, nomeadamente a luta contra os grandes flagelos transfronteiriços e a luta contra o tabaco e o consumo excessivo de álcool (n.º 5 do artigo 152.° [168.º] do TFUE[7])

53. Protecção dos consumidores (n.º 3 do artigo 153.° [169.º] do TFUE) (n.º 4 do artigo 153.º do TCE)

54. Redes transeuropeias (artigo 156.° [172.º] do TFUE) (artigo 156.º do TCE)

55. Indústria (n.º 3 do artigo 157.° [173.º] do TFUE) (n.º 3 do artigo 157.º do TCE)

56. Medidas no domínio da coesão económica e social (terceiro parágrafo do artigo 159.° [175.º] do TFUE) (artigo 159.º do TCE)

57. Fundos Estruturais (primeiro parágrafo do artigo 161.° [177.º] do TFUE) (artigo 161.º do TCE: actualmente: unanimidade no Conselho e parecer favorável do PE)

58. Fundo de Coesão (segundo parágrafo do artigo 161.° [177.º] do TFUE) (artigo 161.º do TCE: actualmente: unanimidade e parecer favorável do PE; a partir de 2007: maioria qualificada no Conselho e parecer favorável do PE)

59. Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (artigo 162.° [178.º] do TFUE) (artigo 162.º do TCE)

60. Programa‑quadro em matéria de investigação (n.º 1 do artigo 166.° [182.º] do TFUE) (n.º 1 do artigo 166.º do TCE).

61. Realização do espaço europeu de investigação (n.º 5 do artigo 166.° [182.º] do TFUE)

62. Aplicação do programa‑quadro em matéria de investigação: regras para a participação das empresas e a difusão dos resultados (artigo 167.° [183.º] e segundo parágrafo do artigo 172.° [188.º] do TFUE) (artigo 167.º do TCE)

63. Programas complementares de investigação para determinados Estados‑Membros (artigo 168.° [184.º] e segundo parágrafo do artigo 172.° [188.º] do TFUE) (artigo 168.º do TCE)

64. Participação em programas de investigação realizados por diversos Estados‑Membros (artigo 169.° [185.º] e segundo parágrafo do artigo 172.° [188.º] do TFUE) (artigo 169.º do TCE)

65. Política espacial (artigo 172.°-A [189.º] do TFUE)

66. Ambiente (acções comunitárias tendo em vista realizar os objectivos nesta matéria, excepto quando de natureza fiscal) (n.º 1 do artigo 175.° [192.º] do TFUE) (n.º 1 do artigo 175.º do TCE)

67. Programa de acção no domínio do ambiente (n.º 3 do artigo 175.° [192.º] do TFUE) (n.º 3 do artigo 175.º do TCE)

68. Energia, à excepção das medidas de natureza fiscal (n.º 2 do artigo 176.°-A [194.º] do TFUE)[8].

69. Turismo – medidas para complementar as acções levadas a cabo pelos Estados‑Membros (n.º 2 do artigo 176.°-B [195.º] do TFUE)

70. Protecção civil contra as catástrofes naturais ou de origem humana (n.º 2 do artigo 176.°-C [196.º] do TFUE)[9]

71. Cooperação administrativa para a execução do direito da União pelos Estados‑Membros (n.º 2 do artigo 176.°-D [197.º] do TFUE)

72. Política comercial – medidas de execução (n.º 2 do artigo 188.°-C [207.º] do TFUE) (artigo 133.º do TCE: maioria qualificada no Conselho sem consulta do PE)

73. Cooperação para o desenvolvimento (n.º 1 do artigo 188.°-E [209.º] do TFUE) (artigo 179.º do TCE)

74. Cooperação económica, financeira e técnica com os países terceiros (n.º 2 do artigo 188.°-H [212.º] do TFUE) (artigo 181.º‑A do TCE: maioria qualificada no Conselho e parecer simples do PE)

75. Quadro geral para as acções em matéria de ajuda humanitária (n.º 3 do artigo 188.°-J [214.º] do TFUE)

76. Corpo Europeu de Voluntários para a Ajuda Humanitária (n.º 5 do artigo 188.°-J [214.º] do TFUE)

77. Estatuto e regras de financiamento dos partidos políticos a nível europeu (artigo 191.° [224.º] do TFUE) (artigo 191.º do TCE)

78. Criação de tribunais especializados (artigo 225.°-A [257.°] do TFUE) (artigo 225.°-A do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

79. Alteração do Estatuto do Tribunal de Justiça, com excepção do Título I e do artigo 64.° (artigo 245.° [281.°] do TFUE) (artigo 245.° do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE)

80. Modalidades de controlo das competências de execução (n.º 3 do artigo 249.°-C [291.º] do TFUE) (artigo 202.º do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do Parlamento)

81. Administração europeia (n.º 2 do artigo 254.°6ª [298.º] do TFUE)

82. Adopção das regras financeiras (n.º 1 do artigo 279.° [322.º] do TFUE) (n.º 1 do artigo 279.º do TCE: unanimidade no Conselho após consulta do Parlamento Europeu, e posteriormente, a partir de 2007, maioria qualificada no Conselho)

83. Luta contra a fraude lesiva dos interesses financeiros da Comunidade (n.º 4 do artigo 280.° [325.º] do TFUE) (n.º 4 do artigo 280.º do TCE)

84. Estatuto dos Funcionários e regime aplicável aos outros agentes da União (artigo 283.° [336.º] do TFUE) (artigo 283.º do TCE: maioria qualificada no Conselho e parecer simples do PE)

85. Estatísticas (n.º 1 do artigo 285.° [338.º] do TFUE) (n.º 1 do artigo 285.º do TCE)

  • [1]    Com um mecanismo de "travão de emergência": caso um Estado‑Membro considere que as medidas em causa poderiam prejudicar "aspectos importantes do seu sistema de segurança social, designadamente no que diz respeito ao âmbito de aplicação, custo ou estrutura financeira", ou afectar o seu "equilíbrio financeiro", pode solicitar que esta questão seja submetida ao Conselho Europeu (o que conduz à suspensão do processo legislativo ordinário). O Conselho Europeu deverá, num prazo de 4 meses, ou remeter o projecto ao Conselho, o qual porá fim à suspensão do processo legislativo ordinário, ou solicitar à Comissão que apresente uma nova proposta (a Constituição nada diz quanto às consequências de uma eventual falta de actuação do Conselho...).
  • [2]    As alíneas e), g) e h) do n.° 2 deste artigo contêm bases jurídicas novas; as outras alíneas já eram abrangidas pelo artigo 65.° do TCE. O n.° 3 deste mesmo artigo 65.° [81.°] do TFUE prevê ainda a possibilidade de o Conselho adoptar uma decisão que determine os aspectos do direito da família que tenham incidência transfronteiriça, passíveis de serem objecto de actos adoptados de acordo com o processo legislativo ordinário..
  • [3]    Está previsto um mecanismo de "travão de emergência" nos n.ºs 3 e 4 destes artigos: caso um Estado‑Membro considere que as medidas em causa poderiam prejudicar "aspectos importantes do seu sistema de justiça penal, pode solicitar que esse projecto seja submetido ao Conselho Europeu, suspendendo o processo legislativo ordinário). O Conselho Europeu deverá, num prazo de 4 meses, ou remeter o projecto ao Conselho, o qual porá fim à suspensão do processo legislativo ordinário, ou solicitar à Comissão ou ao grupo de Estados autor da iniciativa que apresentem uma nova proposta legislativa. Se o Conselho não tomar a decisão referida no prazo de 4 meses, ou se o novo processo legislativo iniciado a seu pedido não for concluído no prazo de doze meses e se pelo menos um terço dos Estados‑Membros pretenderem instituir uma cooperação reforçada, então, será automaticamente autorizada uma cooperação reforçada nesta matéria.
  • [4]    Na ausência de uma base jurídica específica, a União agiu até à data nesta matéria com base no artigo 308.º do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE.
  • [5]    Nos domínios previstos nestes pontos, a legislação é adoptada pelo Conselho por unanimidade, após consulta do PE. No entanto, o último parágrafo do n.º 2 contém uma cláusula "passerelle" segundo a qual o Conselho pode decidir por unanimidade que o processo legislativo ordinário seja aplicável às alíneas d), f) e g) do n.º 1.
  • [6]    As medidas previstas nas alíneas a) e b) do n.º 4 deste artigo já estavam previstas no artigo 152.º do TCE. As medidas previstas nas alíneas c) e d) são novas.
  • [7]    Todas as bases jurídicas previstas neste n.º são novas, à excepção da que respeita às medidas de incentivo à protecção da saúde humana, que já estava prevista no artigo 152.º do TCE.
  • [8]    Na ausência de uma base jurídica específica, a União agiu até à data nesta matéria com base no artigo 308.º do TCE: Unanimidade no Conselho e parecer simples do PE.
  • [9]    Na ausência de uma base jurídica específica, a União agiu até à data nesta matéria com base no artigo 308.º do TCE: unanimidade no Conselho e o parecer simples do PE.

ANEXO 4: Actos legislativos – processos legislativos especiais

A presente nota contém a lista das bases jurídicas relativas aos processos legislativos especiais. Os números dos artigos do TUE e do TFUE referem-se aos artigos que foram retomados no Tratado de Lisboa; entre parêntesis rectos [...] figuram os números que os artigos terão na futura versão consolidada dos tratados (de acordo com o quadro anexo ao Tratado de Lisboa). São referidos em itálico, quando existem, os artigos correspondentes dos Tratados actuais e, no caso de uma alteração de processo, o que se aplica actualmente.

I   Processos ad hoc

1.   Orçamento anual – decisão conjunta PE‑Conselho (artigo 272.° [314.º] do TFUE) (artigo 272.º do TCE: processo ad hoc)

II  Actos do Parlamento Europeu

2.   Estatuto dos deputados ao Parlamento Europeu (n.º 2 do artigo 190.° [223.º] do TFUE): adopção pelo PE, por iniciativa própria, após aprovação do Conselho (por unanimidade no que se refere ao regime fiscal) e o parecer da Comissão (n.º 5 do artigo 190.º do TCE)

3.   Modalidades do exercício do direito de inquérito (terceiro parágrafo do artigo 193.° [226.º] do TFUE): adopção pelo PE, por iniciativa própria, após a aprovação do Conselho e a Comissão (artigo 193.º do TCE: comum acordo)

4.   Estatuto do Provedor de Justiça Europeu (n.º 4 do artigo 195.° [228.º] do TFUE): adopção pelo PE, por iniciativa própria, após aprovação do Conselho e o parecer da Comissão (n.º 4 do artigo 195.º do TCE)

III     Actos do Conselho

A.  Unanimidade e aprovação do Parlamento Europeu

5.   Medidas destinadas a combater a discriminação (n.º 1 do artigo 16.°-E [19.º] do TFUE) (n.º 1 do artigo 13.º do TCE: parecer simples do PE)

6.   Extensão dos direitos ligados à cidadania (artigo 22.° [25.º] do TFUE) – ratificação nacional exigida (artigo 22.º do TCE)

7.   Procuradoria Europeia (n.º 1 do artigo 69.°-E [86.º] do TFUE)

8.   Processo eleitoral uniforme (n.º 1 do artigo 190.° [223.º] do TFUE): por iniciativa e com a aprovação do PE – ratificação nacional exigida (n.º 4 do artigo 190.º do TCE)

B.  Unanimidade e consulta do Parlamento Europeu

9.   Quadro financeiro plurianual (n.º 2 do artigo 270.°-A [312.º] do TFUE) Ausência de referência nos Tratados. Coberto actualmente por um Acordo Interinstitucional

10. Artigo 6.º do TUE (com os n.ºs 6 e 8 do artigo 188.°-N [218.º]): adesão à CEDH – decisão do Conselho sob proposta do negociador do acordo (em princípio a Comissão), após aprovação do PE

11. Medidas relacionadas com a segurança social ou a protecção social (n.º 3 do artigo 18.° [21.º] do TFUE) (n.º 3 do artigo 18.º do TCE)

12. Cidadania: direito de voto e elegibilidade no Estado‑Membro de residência nas eleições municipais e europeias (artigo 19.° [22.º] do TFUE) (artigo 19.º do TCE)

13. Adopção de medidas relativas aos movimentos de capitais com destino ou origem em países terceiros, que constituem um retrocesso no processo de liberalização previsto pelo direito comunitário (n.º 3 do artigo 57.° [64.º] do TFUE) (n.º 2 in fine do artigo 57.º do TCE: Unanimidade no Conselho sem parecer do PE)

14. Medidas relacionadas com os passaportes, bilhetes de identidade e títulos de residência (n.º 3 do artigo 62.° [77.°] do TFUE)

15. Cooperação judiciária em matéria civil no que respeita às medidas relativas ao direito da família com incidência transfronteiriça[1] (n.º 3 do artigo 65.° [81.º] do TFUE) (n.º 5, segundo travessão, do artigo 67.º do TCE)

16. Cooperação policial operacional (n.º 3 do artigo 69.°-F [87.º] do TFUE) (n.º 1, alínea a) do artigo 30.º: processo definido no n.º 2 do artigo 34.º e no n.º 1 do artigo 39.º do TUE)

17. Intervenções das autoridades de um Estado‑Membro no território de um outro Estado‑Membro (artigo 69.°-H [89.º] do TFUE) (artigo 32.º do TUE: processo definido no n.º 2 do artigo 34.º e no n.º 1 do artigo 39.º do TUE)

18. Harmonização dos impostos sobre o volume de negócios e da fiscalidade indirecta (artigo 93.° [113.º] do TFUE) (artigo 93.º do TCE)

19. Aproximação das disposições que tenham incidência directa no mercado interno (artigo 95.° [115.º] do TFUE) (artigo 94.º do TCE)

20. Regime linguístico dos títulos de propriedade intelectual (artigo 97.°-A [118.º] do TFUE)

21. Substituição do Protocolo sobre o procedimento relativo aos défices excessivos (n.º 14 do artigo 104.° [126.º] do TFUE) (n.º 14 do artigo 104.º do TCE)

22. Missões específicas do Banco Central Europeu em matéria de supervisão prudencial (n.º 6 do artigo 105.° [127.º] do TFUE) (n.º 6 do artigo 105.º do TCE: unanimidade no Conselho após consulta do BCE e parecer favorável do PE)

23. Política social: segurança social e protecção social dos trabalhadores, protecção dos trabalhadores em caso de rescisão do contrato de trabalho, representação e defesa colectiva e condições de emprego de nacionais de países terceiros[2] (n.º 1, alíneas c), d), f) e g) e n.º 2, alínea b) do artigo 137.° [153.º] do TFUE) (n.º 1, alíneas c), d), f) e g) e n.º 2, alínea b) do segundo parágrafo do artigo 137.º do TCE)

24. Ambiente: disposições de carácter fiscal, medidas relativas ao ordenamento do território, à gestão dos recursos hídricos e à afectação dos solos e medidas que afectam o aprovisionamento e a diversificação dos recursos energéticos (n.º 2 do artigo 175.° [192.º] do TFUE) (n.º 2 do artigo 175.º do TCE)

25. Energia: medidas de carácter fiscal (n.º 3 do artigo 176.°-A [194.º] do TFUE)

26. Associação entre os países e territórios ultramarinos e a União – processo e modalidades (artigo 187.° [203.º] do TFUE – com consulta do PE) (artigo 187.º do TCE – sem consulta do PE)

27. Jurisdição do Tribunal em matéria de propriedade intelectual (artigo 229.°-A [262.º] do TFUE) (artigo 229.º‑A do TCE: unanimidade no Conselho e parecer simples do PE, seguido de ratificação nacional)

28. Alteração do Protocolo relativo ao Estatuto do Banco Europeu de Investimento (terceiro parágrafo do artigo 266.° [308.º]) (terceiro parágrafo do artigo 266.º do TCE)

29. Recursos próprios da União – nível e criação dos novos recursos (terceiro parágrafo do artigo 269.° [311.º] do TFUE) – Ratificação nacional exigida (artigo 269.º do TCE)

C.  Maioria qualificada e aprovação do PE

30. Medidas de execução do sistema de recursos próprios da União (quarto parágrafo do artigo 269.° [311.º] do TFUE)

D.  Maioria qualificada e consulta do PE

31. Medidas para facilitar a protecção diplomática (artigo 20.° [23.º] do TFUE, ‑ aprovação de directivas através do processo legislativo especial) (artigo 20.º do TCE – acordo entre os Estados‑Membros: cooperação intergovernamental)

32. Investigação: programas específicos de execução do programa‑quadro (n.º 4 do artigo 166.° [182.º] do TFUE) (n.º 4 do artigo 166.º do TCE)

33. Regiões ultraperiféricas (n.º 2, segundo parágrafo, do artigo 299.° [349.º] do TFUE) (n.º 2, segundo parágrafo, do artigo 299.º do TCE)

  • [1]    O Conselho pode decidir por unanimidade, após consulta do PE, aplicar o processo legislativo ordinário (segundo parágrafo do n.º 3 do artigo 65.° [81.°] do TFUE).
  • [2]    O Conselho pode decidir por unanimidade, após consulta do PE, aplicar o processo legislativo ordinário no que respeita às alíneas d), f) e g) (segundo parágrafo do n.º 2 do artigo 137.° [153.°] do TFUE).

PARECER DA COMISSÃO DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Carta endereçada em 23 de Janeiro de 2008 por Gerardo Galeote, presidente da Comissão do Desenvolvimento Regional, a Jo Leinen, presidente da Comissão dos Assuntos Constitucionais

Ex.mo Senhor Jo Leinen

Presidente

Comissão dos Assuntos Constitucionais

Assunto: Tratado de Lisboa

Senhor Presidente,

Dadas as limitações de tempo, a Comissão do Desenvolvimento Regional não poderá adoptar um parecer sobre o documento supramencionado que, no entanto, consideramos revestir elevada importância para o desenvolvimento regional. Consequentemente, e em nome da comissão, gostaria de transmitir a V. Exa. a posição da comissão.

O Tratado de Lisboa introduz diversas alterações importantes que, sendo ratificadas, terão um impacto directo nas actividades da Comissão do Desenvolvimento Regional. O Tratado permitirá à União avançar numa base comum renovada rumo a um futuro mais democrático, eficiente e visível. Particularmente importante neste contexto é o reforço da dimensão regional no processo europeu de definição de políticas e de tomada de decisões.

A nossa comissão gostaria, por conseguinte, de solicitar à Comissão dos Assuntos Constitucionais que tenha em conta os seguintes aspectos no seu relatório (2007/2286(INI) Relatores: Richard Corbett e Íñigo Méndez de Vigo):

A Comissão do Desenvolvimento Regional:

1. Aprecia e aprova a inclusão, no Tratado de Lisboa, de aspectos regionais fundamentais, como sejam o reconhecimento da diversidade cultural e linguística, como um dos objectivos da UE, a renovada definição do princípio da subsidiariedade, a tomada em consideração dos efeitos da legislação comunitária para as autoridades locais e regionais, bem como o reconhecimento do princípio da consulta das autoridades locais e regionais;

2. Congratula-se com o ajustamento no sentido de introduzir o conceito de "coesão territorial" e com o seu reconhecimento como objectivo da UE; constata que a coesão territorial é citada como um domínio de competência partilhada entre a União e os Estados-Membros; apoia, além disso, o facto de o artigo 158.º do TCE, que define a política de coesão, ser alterado por forma a incluir um novo parágrafo em que se reconhece o estatuto especial das regiões ultraperiféricas;

3. Congratula-se com o alargamento da votação por maioria qualificada e do processo de co‑decisão, por exemplo, ao Regulamento Geral relativo aos Fundos Estruturais; entende que estes elementos reforçarão a possibilidade de as comissões parlamentares competentes no domínio da política estrutural e de coesão influenciarem as políticas;

4. Congratula-se com a particular atenção dada às zonas rurais, às zonas afectadas pela transição industrial e às regiões com limitações naturais ou demográficas graves e permanentes, tais como as regiões mais setentrionais com densidade populacional muito baixas, e as regiões insulares, transfronteiriças e de montanha;

5. Solicita às autoridades competentes que implementem plenamente as disposições relativas à participação dos parlamentos nacionais e regionais com poderes legislativos no procedimento de alerta precoce destinado a assegurar o respeito do princípio da subsidiariedade; assinala que a disposição que permite aos parlamentos nacionais e ao Comité das Regiões interpor um recurso em caso de violação do princípio da subsidiariedade poderá alterar as relações entre, em particular, a Comissão Europeia e os Estados-Membros;

6. Considera que uma implementação bem sucedida do Tratado de Lisboa e as novas disposições criadas no domínio do desenvolvimento regional e da política de coesão implicam um diálogo melhorado entre as instituições da UE e as associações regionais.

(Fórmula de cortesia e assinatura)

PARECER da Comissão dos Assuntos Externos (22.1.2008)

dirigido à Comissão dos Assuntos Constitucionais

sobre o Tratado de Lisboa
(2007/2286(INI))

Relator de parecer: Andrew Duff

SUGESTÕES

A Comissão dos Assuntos Externos insta a Comissão dos Assuntos Constitucionais, competente quanto à matéria de fundo, a incorporar as seguintes sugestões na proposta de resolução que aprovar:

Estrutura

1.  Salienta que, no tocante à acção externa da União, o Tratado de Lisboa introduz importantes alterações estruturais em comparação com o Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa (2004) mediante a separação do Título V do Tratado da União Europeia – que contém disposições gerais aplicáveis à acção externa da União, disposições específicas relativas à política externa e de segurança comum (PESC) e disposições relativas à política de segurança e defesa comum (PESD) – da Parte V do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia – que contém disposições gerais sobre a acção externa da União, a política comercial comum, a cooperação com países terceiros e ajuda humanitária, medidas restritivas, acordos internacionais, relações com organizações internacionais e países terceiros e delegações da UE, bem como sobre a cláusula de solidariedade;

2.  Assinala, por conseguinte, que os dois Tratados alterados possuem o mesmo valor jurídico e recomenda, a bem da coerência e da compreensão, que sejam sempre interpretados conjuntamente;

Substância

3.  Regista que, não obstante as diferenças estruturais observadas, o Tratado de Lisboa é similar, quanto à substância, ao Tratado Constitucional de 2004 no referente ao domínio da política externa, de segurança e de defesa e que, em particular no que se refere às relações internacionais da União, o novo Tratado constitui uma considerável melhoria relativamente às disposições actualmente em vigor;

4.  Congratula-se vivamente com o novo Tratado, na medida e[1]m que o mesmo contribui para incrementar o perfil internacional da União e reforça a sua capacidade de actuar eficazmente em assuntos de alcance mundial; assinala que o Tratado de Lisboa:

      –  clarifica as competências da União e define e alarga os seus valores e objectivos para o seguinte feito:"- Nas suas relações com o resto do mundo, a União afirma e promove os seus valores e interesses e contribui para a protecção dos seus cidadãos. Contribui para a paz, a segurança, o desenvolvimento sustentável do planeta, a solidariedade e o respeito mútuo entre os povos, o comércio livre e equitativo, a erradicação da pobreza e a protecção dos direitos do Homem, em especial os da criança, bem como para a rigorosa observância e o desenvolvimento do direito internacional, incluindo o respeito dos princípios da Carta das Nações Unidas"1.

      –  confere carácter vinculativo à Carta dos Direitos Fundamentais e permite à União aderir à Convenção Internacional de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH)[2];

      –  afirma que os critérios de Copenhaga terão de ser tidos em conta em futuros alargamentos;

      –  propicia uma base jurídica explícita para a Política de Vizinhança;

      –  estabelece uma personalidade jurídica única para a União, no seu todo;

      –  obriga os Estados-Membros a consultarem-se entre si e a demonstrarem solidariedade mútua;

      –  introduz um modesto elemento de votação por maioria qualificada nas decisões do Conselho em matéria de PESC, a par da possibilidade de abstenção construtiva[3];

      –  permite o futuro alargamento da votação por maioria qualificada (para decisões fora do âmbito da defesa) quando o Conselho Europeu, deliberando por unanimidade, assim o decida;

      –  facilita a cooperação reforçada (de, pelo menos, nove Estados-Membros) na PESC;

      –  cria o lugar de Presidente permanente do Conselho Europeu, a quem incumbirá a representação externa da União na PESC, a seu nível e nessa capacidade;

      –  institui o poderoso lugar de Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, que será Vice-Presidente da Comissão, presidirá ao Conselho dos Ministros dos Negócios Estrangeiros e dirigirá a PESC e a PESD, contribuirá para a política de desenvolvimento e garantirá a coerência da acção externa da União;

      –  estabelece, com a aprovação da Comissão e após consulta do Parlamento Europeu, um Serviço Europeu para a Acção Externa, que assistirá o Alto Representante e que será composto por funcionário provenientes do Secretariado-Geral do Conselho e da Comissão e por pessoal dos serviços diplomáticos nacionais ;

      –  reforça os poderes orçamentais do Parlamento Europeu relativamente a todas as despesas da UE, incluindo as do Serviço Europeu para a Acção Externa, o que coloca o Parlamento em situação de paridade com o Conselho;

      –  comete ao Parlamento o poder de co-decisão no âmbito da política comercial comum;

      –  torna extensivo o recurso à votação por maioria qualificada no Conselho e o direito de aprovação do Parlamento a todos os acordos internacionais concluídos pela UE em domínios em que o processo legislativo ordinário seja aplicável ou quando o processo legislativo especial requeira a aprovação do Parlamento relativamente a assuntos internos;

      –  fornece novas bases jurídicas para instrumentos ou políticas respeitantes a apoio financeiro de emergência a países terceiros, ajuda humanitária, sanções contra organismos não estatais, política espacial, segurança do aprovisionamento energético, combate às alterações climáticas, prevenção do terrorismo internacional e protecção dos dados pessoais;

5.       Regozija-se, além disso, com a importante reforma da Política Comum de Segurança Defesa, que compreende:

      –    a atribuição de capacidades civis e militares de todos os Estados-Membros[4], incluindo forças multinacionais, à PESD, com a possibilidade de confiar a realização de missões a um grupo de Estados-Membros;

      –    o estabelecimento de uma cooperação estruturada permanente em matéria de defesa entre os Estados-Membros com as capacidades militares e a vontade política requeridas para a realização das missões mais exigentes;

      –    o compromisso de melhoria progressiva das capacidades militares;

      –    a expansão do papel da Agência Europeia de Defesa;

      –    a obrigação que incumbe aos Estados-Membros de prestação recíproca de auxílio e assistência quando um Estado-Membro vier a ser alvo de agressão (sem prejuízo do estatuto de neutralidade de alguns Estados-Membros ou do estatuto de membro da NATO, de outros);

      –    a valorização de objectivos (as "tarefas de Petersberg") visando incluir a luta contra o terrorismo;

      –    a insistência na solidariedade mútua em caso de ameaça ou atentado terrorista ou de catástrofe natural;

6.  Lamenta, todavia, que alguns Estados-Membros se tenham esforçado manifestamente, no quadro da CIG: a)         por estabelecer uma demarcação rígida entre a PESC e a PESD, por um lado, e outros aspectos da acção externa da União, por outro, b) por diluir os efeitos práticos da decisão, visando teoricamente o desenvolvimento de políticas e recursos comuns nesta área e c) por limitar estritamente o papel político da Comissão e do Parlamento e o papel judicial do Tribunal de Justiça (TJE)[5];

7.  Lamenta que o Reino Unido e a Polónia tenham procurado limitar a aplicação jurisdicional da Carta dos Direitos Fundamentais;

8.  Deplora, em particular, o disposto no artigo 25º-A do Tratado UE, nos termos do qual o tratamento de dados pessoais no domínio da política de segurança será regido por normas estabelecidas exclusivamente pelo Conselho, sem a participação do Parlamento ou a supervisão dos tribunais da UE;

9.  Assinala, neste contexto, a Declaração Nº 13 da Conferência Intergovernamental, em que se afirma que as disposições em matéria de PESC não afectam as responsabilidades dos Estados-Membros, tal como presentemente consagradas, para a formulação e condução das respectivas políticas externas, nem as representações nacionais em países terceiros e em organizações internacionais – em particular, as principais responsabilidades dos membros do Conselho de Segurança das Nações Unidas;

10. Frisa, além disso, a Declaração Nº 14, em que se afirma que a PESC não afectará a base jurídica existente, as responsabilidades e competências actuais de cada Estado-Membro no que diz respeito à formulação e condução da sua política externa; deplora, ainda, vivamente a declaração, simultaneamente gratuita e enganosa, de que as novas disposições referentes à PESC não atribuem à Comissão novas competências para propor decisões, nem reforçam o papel do Parlamento Europeu;

11. Salienta, outrossim, a Declaração Nº 24, que procura minimizar o efeito da decisão de valorizar a situação legal da União no direito internacional;

Aplicação

12. Salienta que, em conformidade com o disposto na Declaração Nº 12, serão estabelecidos "os contactos adequados" com o Parlamento Europeu sobre a nomeação pelo Conselho Europeu, com a aprovação do Presidente da Comissão, do primeiro Alto Representante, que tomará posse na data prevista de entrada em vigor do Tratado, em 1 de Janeiro de 2009; insiste em que o espírito do artigo 9º-E do Tratado UE seja plenamente aplicado no caso desta nomeação ad interim (nos termos do nº 7 do artigo 9º-D do Tratado UE, o Parlamento teria, normalmente, o direito de aprovar a nomeação de todos os membros da Comissão, incluindo o Alto Representante); comunica, por conseguinte, que espera ser devidamente consultado sobre esta primeira nomeação;

13. Insiste na necessidade de estabelecimento de uma colaboração tão estrita quanto possível entre o Presidente do Conselho Europeu, o Presidente da Comissão e o Alto Representante, bem como de respeito mútuo das suas diferentes funções;

14. Congratula-se com o artigo 21º do Tratado UE, nos termos do qual o Alto Representante "consulta regularmente o Parlamento Europeu sobre os principais aspectos e as opções fundamentais" da PESC e da PESD, e "informa-o sobre a evolução destas políticas", velando por que as opiniões do Parlamento sejam devidamente tidas em conta; compromete-se, além disso, a utilizar plenamente as suas competências consultivas e a realizar um exame completo e sistemático da formulação e aplicação das operações e políticas externas de segurança e defesa da União, utilizando plenamente a sua autoridade orçamental; assinala as maiores possibilidades ao dispor do Parlamento para exercer o controlo democrático das actividades do Alto Representante enquanto Vice‑Presidente da Comissão;

15. Exorta, neste contexto, à revisão do Acordo Interinstitucional de 20 de Novembro de 2002 sobre o acesso do Parlamento Europeu a informações sensíveis do Conselho no domínio da política de segurança e de defesa à luz do novo Tratado;

16. Destaca a importância de garantir a responsabilidade democrática e a transparência das actividades da Agência Europeia de Defesa;

17. É seu intento, à luz do novo potencial que o Tratado de Lisboa confere à PESC e à PESD, promover uma colaboração mais estreita entre as comissões competentes do Parlamento Europeu e dos parlamentos nacionais, incluindo os observadores parlamentares dos países membros da NATO que não pertencem à UE, conjuntamente com membros da Assembleia Parlamentar da NATO; propõe, ainda, que a Assembleia Parlamentar da União da Europa Ocidental seja dissolvida após a entrada em vigor do Tratado de Lisboa;

18. Lamenta a desnecessária complexidade dos acordos estabelecidos no artigo 28º do Tratado UE no respeitante ao financiamento urgente das iniciativas no âmbito da política externa e de segurança comum que não sejam imputadas ao orçamento da UE; salienta que o Acordo Interinstitucional sobre a disciplina orçamental e a boa gestão financeira, de 17 de Maio de 2006, e o diálogo estruturado entre o Conselho e o Parlamento no mesmo previsto, devem ser plenamente aplicados;

19. No tocante à criação do Serviço Europeu para a Acção Externa:

      –    salienta que, nos termos do nº 3 do artigo 13º-A do Tratado UE, o Parlamento tem o direito de ser consultado sobre a criação do Serviço Europeu para a Acção Externa e recorda que já deu início ao processo de elaboração de um relatório sobre a matéria;

      –    assinala que, de acordo com a Declaração Nº 15, logo que for assinado o Tratado de Lisboa, deverão ter início os trabalhos preparatórios relativos ao Serviço Europeu para a Acção Externa; exorta o Conselho a associar o Parlamento aos trabalhos preparatórios; insta, ainda, o Conselho, a Comissão e os Estados-Membros a apresentarem as suas propostas, o mais tardar, em Julho de 2008;

      –    salienta ser necessário que o Serviço Europeu para a Acção Externa se converta num serviço diplomático permanente e profissional, que contribua eficazmente para a consecução dos objectivos da acção externa da União e que apoie, de modo eficiente, o trabalho do Alto Representante;

      –    assinala ser necessário que o Serviço Europeu para a Acção Externa seja organicamente associado à Comissão, à semelhança das delegações externas existentes e que seja financiado pelo orçamento da UE;

      –    recorda à Comissão que o Serviço Europeu para a Acção Externa só pode ser instituído com a sua aprovação;

PROCESSO

Título

Tratado de Lisboa

Número de processo

2007/2286(INI)

Comissão competente quanto ao fundo

AFCO

Parecer emitido por

  Data de comunicação em sessão

AFET

13.12.2007

 

 

 

Relator de parecer

  Data de designação

Andrew Duff

27.11.2007

 

 

Exame em comissão

18.12.2007

22.1.2008

 

 

Data de aprovação

22.1.2008

 

 

 

Resultado da votação final

+:

–:

0:

41

5

2

Deputados presentes no momento da votação final

Christopher Beazley, Bastiaan Belder, André Brie, Elmar Brok, Colm Burke, Michael Gahler, Jas Gawronski, Bronisław Geremek, Ana Maria Gomes, Alfred Gomolka, Klaus Hänsch, Richard Howitt, Jana Hybášková, Anna Ibrisagic, Jelko Kacin, Metin Kazak, Helmut Kuhne, Vytautas Landsbergis, Johannes Lebech, Emilio Menéndez del Valle, Francisco José Millán Mon, Pasqualina Napoletano, Raimon Obiols i Germà, Vural Öger, Cem Özdemir, Ioan Mircea Paşcu, Alojz Peterle, João de Deus Pinheiro, Mirosław Mariusz Piotrowski, Samuli Pohjamo, Michel Rocard, Raül Romeva i Rueda, Libor Rouček, José Ignacio Salafranca Sánchez-Neyra, Jacek Saryusz-Wolski, György Schöpflin, Marek Siwiec, István Szent-Iványi, Konrad Szymański, Charles Tannock, Inese Vaidere, Geoffrey Van Orden, Zbigniew Zaleski e Josef Zieleniec

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Irena Belohorská, Giulietto Chiesa, Andrew Duff, Árpád Duka-Zólyomi, Evgeni Kirilov, Jo Leinen, Peter Liese, Sarah Ludford, Nickolay Mladenov e Antolín Sánchez Presedo

  • [1]  1 Artigo 2.º, n.º 5, do Tratado UE.
  • [2]  Contrariamente ao observado no Tratado Constitucional de 2004, a decisão de aderir à CEDH terá agora de ser tomada por unanimidade.
  • [3]  No que respeita à PESC, a votação por maioria qualificada aplica-se no caso dos artigos 15º-B, nº 2, 28º, nº 3, 28º-D, nº 2, e 28º-E, nºs 2 e 3, do Tratado UE.
  • [4]  À excepção da Dinamarca.
  • [5]  Cabe ao TJE o papel de fiscalização da fronteira entre os assuntos que se inscrevem na PESC e os demais (artigo 25º-B do Tratado UE), de verificação da legalidade das sanções (artigo 240º-A do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia) e de emissão de pareceres sobre a compatibilidade dos acordos internacionais (artigo 188º-E do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia).

PARECER da Comissão do Desenvolvimento (15.1.2008)

dirigido à Comissão dos Assuntos Constitucionais

sobre o Tratado de Lisboa
(2007/2286(INI))

Relator de parecer: Thijs Berman

SUGESTÕES

A Comissão do Desenvolvimento insta a Comissão dos Assuntos Constitucionais, competente quanto à matéria de fundo, a incorporar as seguintes sugestões na proposta de resolução que aprovar:

1.  Regista que o n.º 6 do artigo 9.º-C do Tratado de Lisboa (o novo Tratado) estipula que "o Conselho dos Negócios Estrangeiros elabora a acção externa da União, de acordo com as linha estratégicas fixadas pelo Conselho Europeu, e assegura a coerência da acção da União" e que o n.º 4 do artigo 9.º-E prevê que o Vice-presidente da Comissão/Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança "assegura a coerência da acção externa da União";

2.  Congratula-se com o facto de o n.º 2 do artigo 10.º-A do novo Tratado, no capítulo V, Título I, mencionar explicitamente entre os objectivos da acção externa da União "apoiar o desenvolvimento sustentável nos planos económico, social e ambiental dos países em desenvolvimento, tendo como principal objectivo erradicar a pobreza" e prestar assistência a "populações, países e regiões confrontados com catástrofes naturais ou de origem humana";

3.  Regozija-se com o facto de no Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) Parte Quinta (Acção Externa da União), Título III (Cooperação com Países Terceiros e Ajuda Humanitária), a cooperação para o desenvolvimento ser tratada como uma área de política autónoma, em pé de igualdade com outras áreas;

4.  Congratula-se também com o facto de o TFUE ( artigo 188 J)reconhecer a ajuda humanitária como uma política da União por direito próprio, sendo a União o primeiro doador mundial de ajuda humanitária; regista que este reconhecimento levou à adopção pelas três instituições, em 18 de Dezembro de 2007, de um consenso europeu sobre a ajuda humanitária, após uma muito fecunda reflexão comum;

5.  Regozija-se com o facto de o TFUE (artigo 188.º D) reconhecer como objectivo primeiro da política de desenvolvimento da União "a redução e, a prazo, a erradicação da pobreza"; insiste em que este principal objectivo deve ser colocado no contexto da realização dos objectivos de desenvolvimento do milénio, em consequência do empenho da comunidade internacional na Cimeira do Milénio da ONU em 2000;

6.  Acolhe favoravelmente o facto de o novo Tratado incluir disposições vinculativas para a protecção dos direitos da criança entre os objectivos internos e externos da União Europeia;...

7.  Congratula-se com o facto de o TFUE (artigo 188.º D) prever que a política de cooperação para o desenvolvimento da União e as dos Estados-Membros "completam-se e reforçam‑se mutuamente", exigindo assim que os Estados-Membros e a União se esforcem para uma melhor coordenação enquanto doadores e para uma melhor divisão do trabalho, o que contribuirá para uma maior eficácia da ajuda;

8.  Espera que esta exigência de complementaridade mútua entre a União e os Estados Membros leve a uma maior clareza no papel da Comissão e dos Estados Membros, como solicitado na DAC Peer Review da OCDE de Junho de 2007, dando simultaneamente origem a uma política de desenvolvimento comum forte, capaz de proporcionar uma melhor coordenação entre as políticas dos diferentes Estados-Membros e evitar duplicações entre Estados-Membros e a Comissão, melhorando assim a eficácia em termos de custos e a eficiência da ajuda;

9.  Regista também que, nos termos do artigo 188.º D do TFUE "na execução das políticas susceptíveis de afectar os países em desenvolvimento, a União tem em conta os objectivos da cooperação para o desenvolvimento"; sublinha que só dando elevada prioridade à coerência das políticas para o desenvolvimento a União conseguirá cumprir tanto os objectivos de desenvolvimento como os valores da União tal como definidos no novo Tratado; nota que a revisão intermédia da Política Agrícola Comum de 2008 deverá conduzir a passos concretos e decisivos para atingir uma coerência integral com os objectivos da política de desenvolvimento da UE, tal como o fim rápido de todos os subsídios que distorcem o comércio;

10. Insiste em que, a fim de assegurar a coerência da política de desenvolvimento, há uma necessidade continuada de uma Direcção-Geral do Desenvolvimento específica a nível administrativo responsável pela definição de políticas, aconselhamento e gestão da cooperação para o desenvolvimento da UE e, a nível político, um comissário especificamente responsável pela política de desenvolvimento da UE em todos os países em desenvolvimento e que tenha a possibilidade de promover os interesses da política de desenvolvimento da UE no seio do Colégio de Comissários e face ao Conselho;

9.  Solicita à Comissão que corrija as incoerências existentes na estrutura e competências das suas direcções-gerais, tanto em termos de políticas quanto de orçamento e apela à integração da EuropeAid na Direcção-Geral do Desenvolvimento;

10. Congratula-se com a extensão do processo legislativo ordinário (co-decisão), e sublinha que tal deve significar que o Parlamento disponha de um direito real e efectivo de controlo democrático sobre todos os aspectos da política de cooperação para o desenvolvimento da União;

11. Solicita à Comissão que corrija as incoerências existentes na estrutura e competências das suas direcções-gerais, tanto em termos de políticas quanto de orçamento e apela a que a Direcção-Geral do Desenvolvimento se torne responsável por toda a cooperação para o desenvolvimento da UE, incluindo a cooperação com países em desenvolvimento não‑ACP, e ainda à integração da EuropeAid na Direcção-Geral do Desenvolvimento;

12. Solicita à Comissão e ao Conselho, dado que grande parte das relações externas actuais e futuras da UE se centram na cooperação para o desenvolvimento, que assegurem que peritos em desenvolvimento da Direcção-Geral do Desenvolvimento e dos ministérios dos Estados-Membros se encontrem adequadamente representados tanto na concepção do serviço externo como no próprio serviço;

13. Congratula-se com a extensão do processo legislativo ordinário (co-decisão), e sublinha que tal deve significar que o Parlamento disponha de um direito real e efectivo de controlo democrático sobre todos os aspectos da política de cooperação para o desenvolvimento da União;

14. Sublinha que o Parlamento deve estruturar-se e organizar-se da forma mais eficaz possível, de maneira a poder controlar efectivamente a implementação da legislação que ponha em vigor as disposições do novo Tratado;

15. Lamenta que tanto o Conselho como a Comissão tenham manifestado relutância em reconhecer, no passado, todos os direitos de controlo do Parlamento; congratula-se com os recentes melhoramentos conseguidos pelo Acordo Interinstitucional sobre a comitologia como um primeiro passo nesta direcção;  

16. Apela, a este propósito, à extensão dos domínios a que se aplica o processo de regulamentação com controlo;

17. Acolhe favoravelmente a eliminação, pelo novo Tratado, do n.º 3 do artigo 179.º do Tratado que institui a Comunidade Europeia, o qual excluía o Fundo Europeu de Desenvolvimento (FED) do âmbito do Tratado, e considera que essa eliminação abre caminho para incluir o FED no orçamento da União sem necessidade de rever o Tratado. Apela ao Conselho e à Comissão para que incluam o FED no orçamento da União aquando da revisão intercalar de 2008/2009, o que aumentará a legitimidade democrática de uma parte importante da política de desenvolvimento da União e respectivo orçamento.

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

14.1.2008

Resultado da votação final

+:

–:

0:

25

0

0

Deputados presentes no momento da votação final

Margrete Auken, Alessandro Battilocchio, Thijs Berman, Josep Borrell Fontelles, Danutė Budreikaitė, Marie-Arlette Carlotti, Thierry Cornillet, Corina Creţu, Beniamino Donnici, Alain Hutchinson, Romana Jordan Cizelj, Madeleine Jouye de Grandmaison, Filip Kaczmarek, Glenys Kinnock, Maria Martens, Gay Mitchell, José Javier Pomés Ruiz, Frithjof Schmidt, Jürgen Schröder, Johan Van Hecke, Anna Záborská

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Fiona Hall, Manolis Mavrommatis

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final

Colm Burke, Michael Gahler

PARECER da Comissão do Comércio Internacional (14.1.2008)

dirigido à Comissão dos Assuntos Constitucionais

sobre o Tratado de Lisboa
(2007/2286(INI))

Relator de parecer: Carlos Carnero González

SUGESTÕES

A Comissão do Comércio Internacional insta a Comissão dos Assuntos Constitucionais, competente quanto à matéria de fundo, a incorporar as seguintes sugestões na proposta de resolução que aprovar:

1.  Considera que, em relação aos Tratados existentes, o Tratado de Lisboa representa um progresso significativo para a política comercial comum (PCC);

2.  Salienta que os Tratados modificados têm o mesmo valor jurídico e que, no interesse da coerência, da eficácia, da transparência e da democracia, deveriam ser sempre interpretados do mesmo modo;

3.  Congratula-se com o facto de o Tratado de Lisboa manter as melhorias introduzidas nas disposições do projecto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa relativas à PCC, em particular no que se refere aos seguintes pontos:

     a)  o reconhecimento da PCC como uma competência exclusiva da União, o que implica uma participação plena e comparável de todas as Instituições da União no processo de tomada de decisão sobre questões ligadas à PCC,

     b)  a extensão do âmbito da PCC ao comércio de serviços e a todos os sectores relacionados com o comércio, nomeadamente os aspectos comerciais da propriedade intelectual e os investimentos estrangeiros directos,

     c)  o reconhecimento da redução dos entraves (que não aduaneiros) entre os objectivos da PCC (artigo 188º-B do Tratado de Lisboa/artigo 131º do Tratado CE);

     d)  a aplicação do processo legislativo ordinário (ou seja, votação por maioria qualificada e co-decisão com o Parlamento Europeu) aos actos legislativos relativos à PCC,

     e)  o facto de as reuniões do Conselho serem públicas quando se trate de debater e adoptar legislação comunitária, em particular a legislação no domínio da PCC,

     f)   o facto de, doravante, quando se aplicar o processo legislativo ordinário, o parecer favorável do Parlamento ser, regra geral, obrigatório para todos os acordos concluídos nos termos da PCC, sejam ou não necessárias disposições de execução,

     g)  a aplicação do processo de parecer favorável antes da ratificação de acordos sobre matéria essencialmente relacionada com o comércio externo;

4.  Congratula-se com o facto de que, no que se refere à negociação e à conclusão de acordos internacionais a título da PCC, o Tratado de Lisboa obriga a Comissão a informar o Parlamento sobre o estado de adiantamento das negociações, ao mesmo título que o "comité especial" do Conselho previsto no artigo especial 188.º-N do Tratado de Lisboa (artigo 133.º do Tratado CE);

5.  Condena expressamente o facto de o Tratado de Lisboa não conceder ao Parlamento o direito de aprovar o mandato a conferir à Comissão para negociar um acordo comercial e salienta o desequilíbrio – no que se refere ao papel e às competências do Parlamento – entre a competência interna e externa nos domínios cobertos pela PCC;

6.  Solicita, por conseguinte, à Comissão que inclua cláusulas e normas sociais e ambientais de grande alcance nos acordos comerciais bilaterais ou regionais; salienta que nenhum acordo de comércio livre deverá ser assinado sem a conclusão de um acordo de parceria e de cooperação;

7.  Congratula-se com o requisito explicito de que a PCC deve servir os princípios e os objectivos da acção externa da União, inter alia, a protecção dos seus interesses fundamentais, a defesa da democracia e do Estado de direito e a promoção do desenvolvimento sustentável;

8.  Felicita a instituição de um Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, com uma dupla função, que velará pela homogeneidade e pela coerência de todas as acções externas da União; considera que a perseguição dos objectivos da política comercial contribuirá para a interdependência global, a estabilidade internacional e a segurança;

9.  Observa, a este respeito, que a acção externa da União abrange igualmente a PCC e que o Alto Representante não deveria limitar-se a assegurar um equilíbrio correcto entre a lógica intergovernamental da PESC (Política Externa e de Segurança Comum) e a lógica supranacional da PCC, mas garantir também que o carácter intergovernamental da PESC não contamina a PCC;

10. Toma nota de que a negociação e a conclusão de acordos no domínio dos investimentos estrangeiros directos, dos serviços e dos aspectos comerciais da propriedade intelectual estão sujeitas aos mesmos critérios de votação que a legislação internacional; toma igualmente nota do requisito de unanimidade, em condições específicas, no domínio dos serviços culturais, audiovisuais, sociais, educativos e de saúde, que deixarão de se inserir no âmbito da competência mista;

11. Solicita ao Conselho Europeu, ao Conselho e à Comissão que considerem a negociação de um novo Acordo Interinstitucional que preveja uma definição substancial do papel do Parlamento e da sua participação em todas as etapas da conclusão de um acordo internacional;

12. Solicita à Comissão que forneça ao Parlamento todas as informações necessárias relativas à PCC e à negociação de acordos comerciais ou à negociação das componentes comerciais de qualquer acordo, nomeadamente das propostas e projectos de propostas de mandatos e/ou directrizes de negociação, numa fase suficientemente precoce que permita ao Parlamento Europeu e aos Parlamentos nacionais expressarem os seus pontos de vista e à Comissão ter os mesmos em conta;

13. Solicita à Comissão que, no que se refere à transparência das operações no âmbito do futuro comité previsto no artigo 188.º-N do Tratado de Lisboa (artigo 133.º do Tratado CE), coloque todos os documentos à disposição da Comissão do Comércio Internacional do Parlamento Europeu;

14. Solicita à Comissão que, no quadro da adopção de futuras normas de execução da política comercial, se abstenha de proceder a alterações ao conteúdo do acto legislativo de base ou a aditamentos que afectem a vontade política expressa no acto legislativo de base; salienta, por esse motivo, que o papel do Parlamento no domínio da PCC é muito importante para assegurar a legitimidade e responsabilidade democráticas;

15. Solicita ao Conselho que transmita ao Parlamento as ordens do dia do Conselho "Assuntos Externos" e solicita a plena participação de representantes do Parlamento em todas as reuniões do COREPER II que abordem questões do domínio do processo legislativo ordinário;

16. Solicita ao futuro Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e ao vice-presidente da Comissão que examinem com o Parlamento métodos adequados para garantir que o Parlamento é plenamente informado e consultado sobre a acção externa da União.

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

14.1.2008

Resultado da votação final

+:

–:

0:

13

1

0

Deputados presentes no momento da votação final

Francisco Assis; Carlos Carnero González; Françoise Castex; Christofer Fjellner; Ignasi Guardans Cambó, Helmuth Markov; David Martin; Georgios Papastamkos; Tokia Saïfi; Iuliu Winkler; Corien Wortmann-Kool

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Harlem Désir, Pia Elda Locatelli, Carl Schlyter

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final

 

PARECER da Comissão dos Orçamentos (23.1.2008)

dirigido à Comissão dos Assuntos Constitucionais

sobre o Tratado de Lisboa
(2007/2286(INI))

Relator de parecer: Costas Botopoulos

SUGESTÕES

A Comissão dos Orçamentos insta a Comissão dos Assuntos Constitucionais, competente quanto à matéria de fundo, a incorporar as seguintes sugestões na proposta de resolução que aprovar:

1.  Realça o facto de o Tratado de Lisboa ter introduzido importantes modificações no tocante às questões orçamentais e financeiras:

a)   o Quadro Financeiro Plurianual (QFP) torna-se juridicamente vinculativo, tal como é expressamente referido no Tratado, sendo a sua duração fixada por um período de, pelo menos, 5 anos; é importante que o Parlamento disponha do direito de emissão de parecer favorável em relação ao QFP, mesmo que formalmente não esteja em posição de estabelecer as disposições do QFP indispensáveis ao bom desenrolar do processo orçamental anual, tal como actualmente acontece ao abrigo do Acordo Interinstitucional sobre a disciplina orçamental e a boa gestão financeira;

b)   é abolida a distinção actual entre despesas “obrigatórias” e despesas “não obrigatórias”, o que garante a paridade absoluta entre o Parlamento e o Conselho;

c)   é criado um novo processo orçamental simplificado, com uma leitura única, seguida de um Comité de Conciliação específico, que terá de chegar a um acordo entre o Parlamento e o Conselho no curto prazo de 21 dias, sujeito à aprovação dos dois ramos da autoridade orçamental, na certeza de que o Parlamento disporá da possibilidade de, em última análise, proceder à aprovação do orçamento, caso o acordo seja rejeitado pelo Conselho;

d)   as Instituições da UE ficam formalmente vinculadas à salvaguarda da disciplina orçamental, ao aprovarem qualquer acto susceptível de ter implicações substanciais no orçamento;

e)   a co-decisão passa a ser aplicada à aprovação do Regulamento Financeiro e das suas normas de execução;

2.  Saúda as modificações introduzidas, na medida em que elas tornam todo o processo orçamental mais democrático e racional, notando igualmente que elas implicam o estabelecimento de uma relação inteiramente nova entre os dois ramos da autoridade orçamental;

3.  Lamenta o facto de o papel do Parlamento no que diz respeito ao sistema de recursos próprios da União não ter sido alargado; entende, porém, que o seu direito de emissão de parecer favorável em relação às correspondentes medidas de execução, definidas pelo Conselho por maioria qualificada, poderá constituir um progresso no sentido de um procedimento mais democrático e mais eficaz, embora haja que ter em conta que o alcance das medidas de execução esteja limitado ao que foi definido no âmbito da decisão respeitante aos recursos próprios;

4.  Recomenda que o Acordo Interinstitucional, de 17 de Maio de 2006, sobre a disciplina orçamental e a boa gestão financeira seja ajustado de acordo com o novo processo orçamental, em conformidade com o respectivo ponto 4;

5.  Declara a sua intenção de elaborar um relatório de iniciativa sobre o novo processo orçamental, com o objectivo de levar a cabo uma análise exaustiva e uma avaliação aprofundada do seu impacto, tanto na organização interna do Parlamento, como na esfera inter­‑institucional; considera que, na sequência da adopção desse relatório, a comissão responsável estará em posição de propor as necessárias alterações ao Regimento, incluindo ao respectivo Anexo IV, tendo em conta todo o leque de consequências que decorrem da aprovação do Tratado e do seu impacto na reforma do Parlamento;

6.  Considera que a avaliação das implicações orçamentais e financeiras decorrentes do Tratado de Lisboa deverá também constituir uma oportunidade para que o Parlamento contribua para o debate em curso sobre a revisão do orçamento da UE.

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

23.1.2008

Resultado da votação final

+:

–:

0:

28

0

0

Deputados presentes no momento da votação final

Reimer Böge, Konstantinos Botopoulos, Simon Busuttil, Daniel Daianu, Gérard Deprez, Brigitte Douay, Hynek Fajmon, Ingeborg Gräßle, Catherine Guy-Quint, Jutta Haug, Monica Maria Iacob-Ridzi, Anne E. Jensen, Wiesław Stefan Kuc, Janusz Lewandowski, Vladimír Maňka, Jan Mulder, Catalin Nechifor, Gérard Onesta, Margaritis Schinas, Nina Škottová, Theodor Stolojan, László Surján, Gary Titley, Kyösti Virrankoski e Ralf Walter

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Thijs Berman, Esther De Lange e Hans-Peter Martin

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final

 

PARECER da Comissão da Indústria, da Investigação e da Energia (19.12.2007)

dirigido à Comissão dos Assuntos Constitucionais

sobre o Tratado de Lisboa
(2007/2286(INI))

Relator de parecer: Ján Hudacký

SUGESTÕES

A Comissão da Indústria, da Investigação e da Energia insta a Comissão dos Assuntos Constitucionais, competente quanto à matéria de fundo, a incorporar as seguintes sugestões na proposta de resolução que aprovar:

Em geral

1.  Reitera a sua posição, que assumiu já há muito tempo, no sentido de que deverá ser produzido um texto consolidado dos Tratados uma vez que o actual Tratado modificativo seja ratificado pelos Estados-Membros;

2.  É de parecer que o Protocolo nº 6 sobre o Mercado Interno e a Concorrência deverá ser aplicado com prudência, e que a disposição do Tratado segundo a qual "para esse efeito, a União, se necessário, tomará medidas ao abrigo do disposto nos Tratados" deveria ser clarificada através de uma referência às outras disposições dos Tratados e ao acervo comunitário;

Indústria

3.  Crê que, no domínio da indústria, as alterações às disposições existentes do Tratado CE não interferirão com a actual estrutura de interesses comerciais e decisões de investimento visto que:

      (a) A indústria se encontra na zona de competência UE para apoiar, coordenar ou complementar as acções dos Estados-Membros, cabendo assim aos Estados-Membros determinar e promover a sua política industrial,

      (b)  Para o desenvolvimento do sector industrial, criar-se-ão a nível da União directrizes, indicadores comuns e disposições para a avaliação e controlo periódicos das políticas industriais, encorajando-se o intercâmbio de melhores práticas entre os Estados‑Membros,

      (c) A disposição que exclui qualquer harmonização das disposições legislativas e regulamentares dos Estados-Membros não significa necessariamente o fim de uma abordagem comum da indústria,

      (d) O Parlamento Europeu congratula-se com o empenho da UE no sentido de melhorar a sua coesão económica, social e territorial com base numa especial atenção a dar às zonas rurais e às zonas afectadas pela transição industrial;

     e) o Parlamento Europeu já não participará no processo de tomada de decisões quando for considerada necessária uma acção coordenada. Será apenas informado.

I & D  

4.  Regista que os artigos 163º, 165º e 166º do Tratado CE, na sua redacção alterada, deverão ser considerados melhoramentos visto que reforçam as bases científicas e tecnológicas através da criação de uma Área Europeia de Investigação na qual os investigadores, os conhecimentos científicos e a tecnologia circulam livremente, permitindo assim aos investigadores cooperar livremente transfronteiras, estimulando simultaneamente a competitividade na União, especialmente no sector industrial;

5.  Regista duas questões eventualmente contenciosas entre o Parlamento Europeu e o Conselho, sendo este último apoiado pela Comissão:

    a) os acordos internacionais já não serão abrangidos pelo tradicional processo do artigo 300º,

    b) a manutenção dos artigos 171º e 172º significa a continuação do processo de consulta para criar agências, comprometendo assim a prerrogativa do Parlamento de participar inteiramente na criação de agências.

Espaço

6.  Exprime a sua satisfação pela inserção de uma disposição relativa à política europeia do espaço na secção sobre investigação e desenvolvimento tecnológico, e consequente reconhecimento no Tratado de que o espaço tem uma importância igual para a I&D;

7.  Acolhe favoravelmente a oportunidade dada ao Parlamento, bem como ao Conselho, de estabelecer, ao abrigo do processo de co-decisão, as medidas necessárias que podem assumir a forma de um Programa Espacial Europeu; contudo considera que a "exclusão de qualquer harmonização das disposições legislativas e regulamentares dos Estados‑Membros" neste domínio pode implicar alguns obstáculos para a implementação de uma Política Europeia do Espaço Comum;

8.  Acolhe também favoravelmente a disposição relativa ao estabelecimento de relações adequadas explicitamente com a Agência Espacial Europeia;

Energia

9.  Congratula-se com o facto de a energia dispor agora de um título autónomo no Tratado e, assim, de uma base jurídica no contexto do mercado interno, sendo que se terá em atenção o funcionamento do mercado da energia, a segurança do fornecimento da energia, a eficiência energética e a poupança de energia, o desenvolvimento de formas novas e renováveis de energia e a interconexão das redes de energia;

10. Exprime a sua satisfação e apoio à cláusula de solidariedade a aplicar caso surjam graves dificuldades no fornecimento de certos produtos, nomeadamente na área da energia;

11. Sublinha que, enquanto o processo legislativo ordinário no futuro (actualmente co‑decisão) será seguido por via de regra, a decisão quanto à conjugação das diferentes formas de energia permanecerá na competência dos Estados-Membros, e as medidas fiscais neste domínio necessitarão de consulta do Parlamento e de unanimidade no Conselho;

Tratado da Comunidade Europeia da Energia Atómica

12. Considera que, apesar das suas imperfeições, o Tratado Euratom continua a ser para já um quadro jurídico indispensável, não tendo sofrido mudanças em particular por parte do actual Tratado reformador; considera, no entanto, que o Protocolo nº 12 ao Tratado reformador, relativo ao Tratado Euratom, torna o texto ilegível e muito complicado, devido às numerosas referências cruzadas e à revogação de certos artigos do Tratado Euratom;

13. Regista que o Tratado Euratom continuará a produzir a plenitude dos seus efeitos jurídicos; chama a atenção para o Protocolo nº 12 que procura adaptar o Tratado Euratom a fim de ter em conta as disposições comuns estabelecidas nos outros Tratados, como as disposições institucionais e financeiras; reitera, por conseguinte, a necessidade de um texto consolidado do Tratado Euratom;

Fundo de Investigação do Carvão e do Aço

14. Chama a atenção da Comissão para o facto de o Protocolo nº 11 relativo ao Fundo de Investigação do Carvão e do Aço instituir disposições processuais que não melhorarão a participação do Parlamento Europeu no processo de tomada de decisões, mantendo o processo de consulta num sector, a investigação e desenvolvimento tecnológico, em que o Parlamento é co-legislador, independentemente das implicações orçamentais deste fundo.

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

19.12.2007

Resultado da votação final

+:

–:

0:

42

5

0

Deputados presentes no momento da votação final

Šarūnas Birutis, Jan Březina, Renato Brunetta, Jerzy Buzek, Pilar del Castillo Vera, Jorgo Chatzimarkakis, Giles Chichester, Dragoş Florin David, Den Dover, Lena Ek, Nicole Fontaine, Adam Gierek, Norbert Glante, Umberto Guidoni, Fiona Hall, David Hammerstein, Rebecca Harms, Mary Honeyball, Ján Hudacký, Romana Jordan Cizelj, Anne Laperrouze, Romano Maria La Russa, Pia Elda Locatelli, Angelika Niebler, Reino Paasilinna, Atanas Paparizov, Anni Podimata, Miloslav Ransdorf, Vladimír Remek, Herbert Reul, Mechtild Rothe, Paul Rübig, Andres Tarand, Britta Thomsen, Catherine Trautmann, Claude Turmes, Nikolaos Vakalis, Alejo Vidal-Quadras e Dominique Vlasto.

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Danutė Budreikaitė, Joan Calabuig Rull, Edit Herczog, Lambert van Nistelrooij, Pierre Pribetich, Dirk Sterckx, Silvia-Adriana Ţicău e Vladimir Urutchev.

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final

 

PARECER da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos (18.12.2007)

dirigido à Comissão dos Assuntos Constitucionais

sobre o Tratado de Lisboa
(2007/2286 (INI))

Relator de parecer: Jean-Marie Cavada

SUGESTÕES

A Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos insta a Comissão dos Assuntos Constitucionais, competente quanto à matéria de fundo, a incorporar as seguintes sugestões na proposta de resolução que aprovar:

O novo Tratado: saída há muito aguardada da situação jurídica e institucional absurda no domínio da liberdade, segurança e justiça ...

1.   Regozija-se com os seguintes progressos gerais introduzidos pelo novo Tratado no tocante às políticas relacionadas com o espaço de liberdade, de segurança e de justiça:

a)   a definição coerente, vinculativa e transparente do ponto de vista jurídico, a nível do Tratado, do elo existente entre os direitos fundamentais consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e as políticas conexas que a União deve levar a bom termo para garantir a salvaguarda e promoção desses direitos. Com uma Carta vinculativa, o legislador comunitário dispõe doravante dos meios necessários para aplicar, de forma mais coerente, o conjunto de políticas susceptíveis de surtir efeitos a nível dos direitos fundamentais de cada pessoa. Tal aplica-se não apenas aos domínios explicitamente abrangidos pelo espaço de liberdade, de segurança e de justiça, como sejam o direito de asilo ou o direito a um processo equitativo, mas também às políticas de natureza mais geral relativas à protecção da dignidade humana contra toda e qualquer forma de discriminação, à protecção das minorias, ao direito à transparência e a uma boa administração a nível europeu, aos direitos sociais e ao direito à protecção de dados. Além disso, a adesão à Convenção Europeia dos Direitos do Homem permitirá reforçar este elo, na medida em que as instituições europeias deverão responder pelas suas acções perante o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem;

b)   o fim do bloqueio da situação jurídica e institucional absurda criada há quinze anos pelo Tratado de Maastricht que previa um regime jurídico paralelo e provisório no domínio da justiça e dos assuntos internos (o chamado "terceiro pilar"). Ao restabelecer todas as prerrogativas do Tribunal de Justiça, o Estado de direito volta a apropriar-se dos domínios de que não dispunha e a legitimidade democrática das políticas visadas é consideravelmente reforçada mercê da associação do Parlamento Europeu ao processo através de co-decisão;

c)   o reforço da responsabilidade democrática da União Europeia ao alargar o procedimento de co-decisão (procedimento legislativo ordinário) às medidas relativas à cooperação policial e judicial em matéria penal. Importa também saudar o facto de o Conselho dever requerer o parecer favorável do Parlamento caso pretenda estabelecer regras mínimas em "outros" domínios específicos do processo penal, criar um Ministério Público Europeu a partir da Eurojust e alargar as atribuições desse Ministério Público;

d)   a associação do Parlamento Europeu à conclusão dos tratados internacionais assinados pela União Europeia. Até à data, e não obstante o disposto no artigo 21º do Tratado UE, que prevê a consulta do Parlamento Europeu, este jamais foi consultado pelo Conselho, mesmo que o Tratado em negociação constituísse manifestamente um aspecto principal da política externa e de segurança comum (como foi o caso do Acordo UE-EUA em matéria de extradição e de assistência jurídica recíproca);

e)   a abolição, num certo número de casos, do princípio da unanimidade no Conselho. O sistema de maioria qualificada facilitará a negociação nas Instituições da UE e permitirá a adopção de normas mais elevadas em matéria de protecção dos direitos fundamentais (contrariamente ao princípio da unanimidade, que favorece a procura de um mínimo denominador comum e, em diversos casos, suscita dúvidas quanto à mais-valia da legislação comunitária).

Ao generalizar a utilização da votação por maioria qualificada e do procedimento de co-decisão, o novo Tratado facilita a adopção, num quadro político coerente, de medidas que, no momento presente, são abrangidas, em alguns casos, pela exigência de unanimidade e, noutros, pela exigência de maioria qualificada (como acontece com a migração legal e clandestina);

f)    a harmonização dos instrumentos legislativos. A União Europeia adoptará instrumentos comunitários tradicionais como regulamentos, directivas e decisões de direito comunitário em vez de "posições comuns", "decisões-quadro" e "convenções" na acepção do actual artigo 34º do Tratado da União. Será assim possível uma alteração de grande envergadura: a possibilidade, relativamente a certos actos legislativos, de produção de efeitos directos;

g)   o aumento da transparência e da responsabilidade democrática nas relações entre as instituições da UE, por um lado, e os cidadãos, a sociedade civil, os partidos políticos e os parlamentos nacionais, por outro. Neste contexto, é extremamente positivo que, para avaliar as políticas em matéria do espaço de liberdade de segurança e justiça, tenha sido instituído um modelo específico, mediante o qual a Comissão, os governos dos Estados-Membros, o Parlamento Europeu e os parlamentos nacionais serão associados à avaliação do impacto dessas políticas na UE. No que respeita à boa governação da União Europeia, solicita à Comissão e ao Conselho que acelerem o ritmo das deliberações sobre o plano de criação de um "Ministério Público Europeu", que constitui um requisito prévio para o cumprimento do objectivo enunciado na primeira frase do presente ponto;

2. Lamenta que o preço a pagar por estes progressos tenha sido:

a)   a manutenção, em conformidade com o artigo 10.º do Protocolo ao Tratado relativo às disposições transitórias, de medidas adoptadas a título do terceiro pilar fora do controlo da Comissão e, além disso, do Tribunal de Justiça, por um período de cinco anos a contar da entrada em vigor do novo Tratado. Afigura-se difícil compreender as razões que levaram os Estados-Membros a fazer perdurar uma situação que eles próprios qualificam de imperfeita no plano jurídico. Trata-se agora de saber como reduzir ao mínimo as repercussões negativas para os cidadãos da UE:

- uma primeira resposta é dada pelo mesmo protocolo que prevê que, se um acto for modificado, o período transitório deixará de se aplicar ao acto modificado. As instituições deveriam, por isso, decidir se não seria preferível modificar, a partir da entrada em vigor do novo Tratado, determinadas medidas existentes e pouco satisfatórias do âmbito do terceiro pilar;

-uma outra solução poderia consistir em protelar a adopção formal das medidas que actualmente se alicerçam no terceiro pilar e que poderão afectar os direitos fundamentais dos cidadãos e esperar até ao período compreendido entre 1 de Janeiro e Maio de 2009. Os cidadãos europeus compreenderão certamente este adiamento de alguns meses caso as novas regras sejam judicialmente exequíveis perante os tribunais europeus;

b)   a introdução de novas disposições bastante complexas para contemplar a possibilidade de um Estado-Membro considerar que uma proposta de directiva é susceptível de afectar aspectos fundamentais do seu sistema de justiça penal ou de não ser possível lograr a unanimidade (cooperação policial). Nessas circunstâncias, o Estado-Membro em questão pode requerer que a proposta de directiva seja enviada ao Conselho Europeu. A primeira razão é perfeitamente compreensível ou mesmo justificável, nomeadamente no caso de um Estado-Membro correr o risco de se ver confrontado com uma redução substancial da protecção dos direitos fundamentais; a segunda reporta-se mais propriamente ao equilíbrio de poderes.

Nestes casos importa suspender o processo legislativo "ordinário" por um período de quatro meses. Em caso de desacordo, e se pelo menos nove Estados-Membros desejarem instaurar uma cooperação reforçada com base no projecto de directiva em causa, a autorização para proceder à cooperação reforçada será considerada concedida (não necessitando da aprovação do Parlamento, tal como requerido no artigo 280º do Tratado CE). Convém, todavia, sublinhar que, quando se aplica o processo ordinário, a adopção da própria medida continua a requerer co-decisão com o Parlamento Europeu;

c)   uma maior complexidade do regime de participação "à la carte" (“opt-in” e “opt-out”, ou seja, participação e não participação). Ainda que as novas disposições em matéria de cooperação reforçada não se apliquem a medidas alicerçadas no acervo de Schengen, este regime será modificado (ver infra). Além disso, as possibilidades de não participação em medidas que não se alicercem no acervo de Schengen, nomeadamente no domínio da cooperação judicial em matéria civil, são alargadas à cooperação policial e judicial (cf. modificações aos Protocolos de Schengen e posição do Reino Unido, Irlanda e Dinamarca);

d)   no que se refere à situação do Reino Unido e da Irlanda, importa recordar que o Parlamento não foi formalmente consultado aquando da decisão de um regime separado para estes países no contexto do mecanismo Schengen em 2000 e 2001. Actualmente o Reino Unido deve observar o acervo de Schengen nos casos em que decidiu participar e pode beneficiar de derrogação quando optou por uma não participação[1]. As modificações ao Protocolo Schengen não alterarão estas normas mas propiciarão ao Reino Unido e à Irlanda a possibilidade de declinarem participar numa medida com base no acervo de Schengen e relativamente à qual haviam previamente decidido participar.

      Esta situação é susceptível de causar uma fragmentação das normas. O Parlamento não será consultado em relação à participação numa medida e às consequências no acervo de Schengen. Não obstante, a medida em questão continua a ter de ser adoptada mediante o procedimento de co-decisão, se for caso disso.

e)   Além disso, o Reino Unido e a Irlanda poderão optar por uma não participação no tocante a propostas de modificação de medidas do Título IV, mesmo que anteriormente tenham feito uma escolha contrária, e não estarão vinculados pelas novas regras em matéria de protecção de dados adoptadas com base no disposto no novo tratado, que isenta estes países não das normas substantivas aplicáveis à cooperação policial e judiciária em matéria penal.

3.   Considera que as melhorias introduzidas pelo novo Tratado são superiores às suas deficiências. As instituições da União deveriam agora envidar todos os esforços ao seu alcance para assegurar que os Estados-Membros ratifiquem o novo Tratado, nomeadamente:

      a) explicar aos cidadãos europeus os seus novos direitos e o novo quadro jurídico da União Europeia, e, nesse contexto, convidar os Estados-Membros a lançar vastas campanhas de informação e a introduzir uma formação profissional específica para o pessoal dos serviços judiciários e de segurança nacionais, no sentido de impedir qualquer acto ilegal de discriminação entre cidadãos europeus;

     b)  associar os parlamentos nacionais à definição do próximo programa plurianual relativo ao Espaço de Liberdade, de Segurança e de Justiça; esta associação poderia ser efectuada de forma mais adequada mediante

           -  fóruns informais (tais como o Grupo "Futuro" que se reunirá regularmente durante as seis presidências do Conselho em 2008 e 2009),

           -  a transmissão oficial, regular e atempada de todos os textos preparatórios legislativos, desde as propostas legislativas iniciais, a fim de evitar a discriminação entre deputados aos parlamentos nacionais e entre cidadãos europeus;

     c)  conduzir, em 2008, as negociações relativas à adopção, no início de 2009, de todas as medidas necessárias para o lançamento bem sucedido pelo novo Parlamento, partir de 2010, do novo Espaço de Liberdade, de Segurança e de Justiça; tendo em mente as reservas nacionais e/ou parlamentares suscitadas a respeito de alguns procedimentos legislativos, convidar a Comissão e o Conselho a reexaminar, à luz das novas bases jurídicas previstas pelo Tratado de Lisboa e tendo em conta o debate político, os seguintes textos legislativos:

           Direitos gerais

          -  Decisão-Quadro relativa a certos direitos processuais (2004/0113(CNS));

           -  Decisão-Quadro relativa à protecção de dados para fins de segurança (a integrar na revisão da Directiva 95/46/CE) (2005/0202(CNS)) (reservas parlamentares formuladas pela Dinamarca, pela Irlanda, pelos Países Baixos, pela Suécia e pelo Reino Unido).

     Cooperação judiciária

     -   Decisão-Quadro relativa à luta contra o racismo e a xenofobia (2007/2067(CNS)) (reservas parlamentares formuladas pela Suécia, pelos Países Baixos, pela Dinamarca, pela Irlanda e pela Letónia);

     -   Decisão-Quadro relativa às decisões aprovadas "in absentia" (a apresentar);

     -   Decisão-Quadro relativa a um mandado europeu de obtenção de provas (2003/0270(CNS)) (reservas parlamentares formuladas pela Suécia e pela Dinamarca);

     -   Decisão-Quadro relativa ao reconhecimento recíproco das decisões de condenação (2005/0018(CNS)) (reservas parlamentares formuladas pela Suécia, pelos Países Baixos e pela Irlanda);

     -   Decisão-Quadro relativa à decisão europeia de controlo judicial no âmbito dos procedimentos cautelares (2006/0158(CNS));

     -   Decisão-Quadro relativa aos intercâmbios de informações extraídas do registo criminal (2005/0267(CNS)) (reservas parlamentares formuladas pela Suécia, pela Finlândia, pelos Países Baixos, pela Irlanda, pela Grécia e pela Dinamarca);

     -   Decisão-Quadro relativa à EUROJUST (a apresentar).

Cooperação policial

     -   Decisão-Quadro relativa à luta contra a criminalidade organizada (reservas parlamentares formuladas pela Suécia);

     -   Decisão-Quadro relativa ao acesso ao Sistema de Informação sobre Vistos (VIS) para fins de segurança (a integrar como alteração ao Regulamento VIS) (2005/0232(CNS));

     -   Decisão-Quadro relativa ao acesso ao EURODAC para fins de segurança (a integrar como alteração ao Regulamento VIS) (2006/0310(CNS));

     -   Decisão-Quadro relativa à EUROPOL (aguarda consulta do Parlamento Europeu);

4.  Declara a sua vontade de participar na reformulação destas propostas ao longo de 2008, num espírito de cooperação com a Comissão e a Presidência do Conselho, e reserva-se o direito de fazer as recomendações formais necessárias para melhorar os acordos políticos já alcançados, tal como previsto no artigo 39.º do Tratado da União Europeia; neste sentido, propõe a criação, desde inícios de 2008, de um Grupo de Trabalho de alto nível encarregado de discutir abertamente as melhorias a introduzir nos textos supracitados;

5.  Acolhe com satisfação a Declaração da Conferência respeitante ao artigo10.º do Protocolo relativo às disposições transitórias (Declaração 39-A) e convida a Comissão a dar início, já em 2008, aos trabalhos relativos aos actos jurídicos a modificar ou a substituir porque já se afiguram insatisfatórios ou ineficazes (como a Convenção sobre o Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal e outros textos que, conforme demonstrado pela experiência, devem ser melhorados);

6.  Considera que, a partir de 2008, o Parlamento deve ser regularmente informado e consultado sobre os principais programas e acordos com países terceiros, como, por exemplo, o espaço de liberdade, de segurança e de justiça com a Rússia, a estratégia internacional contra o tráfico de seres humanos e questões relacionadas com o tráfico de drogas e a prevenção e luta contra o terrorismo, mesmo quando essa consulta não é obrigatória.

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

18.12.2007

Resultado da votação final

+:

–:

0:

41

1

0

Deputados presentes no momento da votação final

Alexander Alvaro, Roberta Angelilli, Mihael Brejc, Kathalijne Maria Buitenweg, Michael Cashman, Giuseppe Castiglione, Giusto Catania, Jean-Marie Cavada, Carlos Coelho, Panayiotis Demetriou, Gérard Deprez, Agustín Díaz de Mera García Consuegra, Bárbara Dührkop Dührkop, Claudio Fava, Armando França, Urszula Gacek, Kinga Gál, Roland Gewalt, Ewa Klamt, Henrik Lax, Roselyne Lefrançois, Sarah Ludford, Viktória Mohácsi, Claude Moraes, Javier Moreno Sánchez, Rareş-Lucian Niculescu, Martine Roure, Luciana Sbarbati, Inger Segelström, Søren Bo Søndergaard, Vladimir Urutchev, Ioannis Varvitsiotis, Manfred Weber, Renate Weber, Tatjana Ždanoka

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Edit Bauer, Genowefa Grabowska, Sophia in 't Veld, Sylvia-Yvonne Kaufmann, Jean Lambert, Antonio Masip Hidalgo, Bill Newton Dunn

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final

Manuel Medina Ortega

  • [1]  Em consequência, o Conselho não autorizou o Reino Unido a participar na criação do Frontex nem na elaboração do Regulamento (CE) N.º 2252/2004, de 13 de Dezembro de 2004, que estabelece normas para os dispositivos de segurança e dados biométricos dos passaportes e documentos de viagem emitidos pelos Estados-Membros, tendo o Reino Unido intentado duas acções contra o Conselho (Processos C-77/05 - Reino Unido v Conselho - [2007] - Col. I-0000, e C-137/05 - Reino Unido v Conselho [2007] - Col. I-0000).

RESULTADO DA VOTAÇÃO FINAL EM COMISSÃO

Data de aprovação

23.1.2008

Resultado da votação final

+:

–:

0:

20

6

0

Deputados presentes no momento da votação final

Jim Allister, Enrique Barón Crespo, Bastiaan Belder, Jens-Peter Bonde, Richard Corbett, Brian Crowley, Jean-Luc Dehaene, Andrew Duff, Ingo Friedrich, Genowefa Grabowska, Anneli Jäätteenmäki, Sylvia-Yvonne Kaufmann, Timothy Kirkhope, Jo Leinen, Íñigo Méndez de Vigo, Ashley Mote, Borut Pahor, Rihards Pīks, József Szájer, Riccardo Ventre, Johannes Voggenhuber, Dushana Zdravkova

Suplente(s) presente(s) no momento da votação final

Konstantinos Botopoulos, Urszula Krupa, Gérard Onesta, Alexander Stubb

Suplente(s) (nº 2 do art. 178º) presente(s) no momento da votação final